Por que jovens de família viram sequestradores e assassinos? A psiquiatria forense explica

Como entender jovens egressos de famílias bem constituídas se transformando em sequestradores e assassinos? É bastante considerável a contribuição da psiquiatria forense ou judiciária no desvendamento de causas anormais do crime

Dijonilson Paulo Amaral Veríssimo

O conceito de normalidade psíquica é relativo, e não absoluto, tendo influência os fatores sociais, culturais e estatísticos. Sob o prisma médico-legal, a doença mental, no dizer de Nerio Rojas é “um transtorno geral e persistente das funções psíquicas, cujo caráter patológico é ignorado ou mal compreendido pelo paciente e que impede a adaptação lógica e ativa às normas do meio ambiente, sem proveito para si nem para a sociedade”.

É demais importante esse conceito de “doença mental”, visto que, no artigo 26 do Código Penal brasileiro trata da isenção da pena para o criminoso que “por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado”, sendo estes incapazes de entender a ilicitude do fato. Gozam, assim de proteção especial no ordenamento jurídico brasileiro, os portadores de doença mental, como também as crianças e adolescentes, pois o legislador presumiu que estes não atingiram, de forma satisfatória para entender o caráter ilícito da conduta, seu desenvolvimento psíquico, sendo considerados inimputáveis.

A Psiquiatria é uma ciência médica, ramo da Medicina, e a Psiquiatria Forense, é ramo da Medicina Legal esta, por sua vez, é responsável pelos exames e perícias especializadas que auxiliam o Direito a conhecer como se perpetrou o crime ou lesões, enquanto a Psiquiatria tem por função estudar e tratar dos aspectos e distúrbios mentais, em indivíduos desnormalizados com o fim de estabelecer o grau e a Responsabilidade Penal. Psicopatia, por outro lado, é a denominação genérica das doenças mentais, estado mental patológico caracterizado pelos chamados desvios caracterológicos que conduzem o indivíduo perturbado à conduta anti-social.

Falaremos, de modo sucinto, sobre alguns tipos de doenças mentais que tornam o indivíduo, juridicamente, inimputável.

As oligofrenias, consideradas distúrbios mentais que se caracterizam por retardamento, insuficiência ou parada do desenvolvimento normal do psiquismo, com acentuado déficit de inteligência. Caracteriza-se pela dificuldade do indivíduo em conduzir-se por si, rendimento social fraco e falta de capacidade intelectiva, sem as condições de solucionar situações novas. Os portadores desse distúrbio dividem-se, basicamente em três grupos: os idiotas, os imbecis e os débeis mentais. De modo geral os dois primeiros são civilmente incapazes e penalmente são totalmente irresponsáveis; enquanto que os últimos encontra-se na condição de semi-responsáveis.

A esquizofrenia é uma psicose endógena, de forma episódica ou progressiva, de manifestações polimorfas e variadas, sobrevindo, quase sempre, na adolescência e de etiologia desconhecida. Considerada a mais freqüente das psicoses, abrangendo cerca de cinqüenta por cento das populações manicomias. Os elementos fundamentais que a caracteriza são: desordem do pensamento, delírios paranóicos, incongruência da afetividade, alucinações, idéias de referência, neologismos, despersonalização, maneirismos, bloqueio de pensamento. Dentre as formas mais típicas, classifica-se em quatro formas clínicas: a simples, a hebefrênica, a catatônica e a forma paranóide. Ela pode levar a uma variedade de delitos, exóticos e incompreensíveis pela sua inutilidade; o crime é repentino, inesperado e sem motivos, sendo acometidos de fugas constantes e inexplicáveis.

A psicose maníaco-depressiva é uma enfermidade cíclica, com crises de excitação psicomotora e estado depressivo, isoladas, cominadas ou alteradas, de intensidade, duração e disposição variáveis, sem maior repercussão sobre a inteligência. Duas fases podem caracterizar essa enfermidade; a primeira é a maníaca, caracterizada por uma hiperatividade motora e psíquica, de forma desorganizada, com agitação e exaltação da enfermidade e do humor. A Segunda é a de hipomania, considerada a mais perigosa, pois os sentimentos de poder, euforia, autoconfiança e otimismo estão mais exaltados, levando o paciente a irrefletidas atitudes, negócios fantásticos, compras astronômicas, criações de empresas e iniciativas esdrúxulas e inconseqüente.

A paranóia é a perturbação metal marcada por permanentes concepções delirantes ou ilusórias, que permitem manifestações de autofilia e egocentrismo, conservando-se o pensamento, a vontade e as ações. É uma doença esporádica e mais freqüente nos homens surgindo, geralmente entre os 25 e 40 anos, comumente entre os filhos únicos ou aqueles criados por tias, avós, dos quais recebem um tratamento exageradamente pródigo e educação viciosa, criando uma falsa concepção de mundo. São cheios de amor-próprio, de vaidade melindres, suscetíveis às coisas fúteis e tolas; acham-se com o direito a tudo, e quando não obtém o que querem, julgam-se perseguidos, explorados e humilhados. As formas clínicas mais comuns de paranóia são: de ciúme, erótica, genealógica, de intervenção e de reformas, e de perseguição.

Por último, a personalidade psicopática, caracterizada por um estado psíquico capaz de determinar profundas modificações do caráter e do afeto. Não são, essencialmente, personalidades doentes ou patológicas, permanecendo a inteligência normal ou acima do normal. As características mais marcantes nas personalidades psicopáticas são: distúrbios de afetividade, ausência de delírios, boa intelig6encia, inconstância, insinceridade, falta de vergonha e de remorso, conduta social inadequada, falta de ponderação, egocentrismo, falta de previsão, vida sexual pobre, dentre outras. Para o Direito, a grande indagação é se as chamadas personalidades psicopáticas são doentes mentais propriamente ditos ou detentoras de personalidades anormais, desajustadas, pervertidas ou degeneradas.

Sendo todos esses conceitos médicos, cabe à Psiquiatria Forense fazer a classificação criminógena do louco ou perturbado mental, fornecendo, ao Judiciário, bases para a aplicação de medidas de segurança ou penas.

É bastante considerável a contribuição da psiquiatria forense ou judiciária no desvendamento de causas anormais do crime

No que se refere ao criminoso, para Lombroso, aquele era um enfermo, não devendo ser colocado em prisões, mas tratado pela Medicina, enquanto Ferri argumentava que as causas sociais estavam sempre presentes nas causas do crime. Ainda, Afrânio Peixoto reafirmava tal posição, como reforçava dizendo que as causas sociais eram sempre presentes e o fator econômico a combinação material para empurrar o homem ao crime.

Sendo o crime praticado por um louco ou perturbado, não poderá ser responsabilizado penalmente vez que não é portador de consciência plena de seu ato, sendo por isso inimputável. Para tanto, ou seja, para poder determinar-se se há ou não responsabilidade não caberá ao jurista fazê-lo, mas ao especialista, um médico ou psiquiatra.

É mister a transformação do sentimento carregado contra o criminoso, que é vítima de um processo social cruel, de condições injustas, de ignorância, submetido à rigidez do estigma e discriminação.

As soluções para o controle do crime e da criminalidade só serão possíveis se houver um movimento forte e definido, amplo e estruturado, indo além de meras leis de desarmamento, que não desarmam bandos e quadrilhas, ou assaltantes, mas somente o cidadão comum e muito menos da redução da idade penal. Tais medidas até podem fazer parte de um elenco de medidas, porém, estruturadas em uma única ação política e social.

No mais das vezes, enquanto o sistema prisional continua mantendo a tradição da pena de prisão, sem outra finalidade senão a privação da liberdade, o fracasso do sistema repressivo continuará em detrimento da própria ressocialização dos indivíduos, simplesmente porque o homem criminoso é um doente e o remédio que lhe está sendo ministrado não é o adequado para a sua cura. É bom frisar que “não são apenas os criminosos que matam; piores que eles, são os que roubam e fraudam o erário, o tesouro e o patrimônio público”.

Dijonilson Paulo Amaral Veríssimo é acadêmico de Direito – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

1. FRANÇA, Genival Velodo de. Medicina legal. Rio de Janeiro: editora Guanabara Koogan
S.A., 1995. 4ª edição.

2. Internet (endereço eletrônico): www.ccj.ufsc.br/doutrina

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