Juizados Esp. Criminais, ampliação do rol dos crimes de menor potencial ofensivo e estatuto do idoso

Damásio E. de Jesus

Presidente e Professor do COMPLEXO JURÍDICO DAMÁSIO DE JESUS
Doutor Honoris Causa em Direito pela Universidade de Estudos de Salerno (Itália)
Diretor-Geral da Faculdade de Direito Prof. Damásio de Jesus
Membro do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo
Professor convidado do Curso de Especialização em Direito Penal da Faculdade de Direito da Universidade Austral de Buenos Aires
Professor convidado do Curso de Especialização em Direito Penal da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo
Professor convidado do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu – Especialização em Direito Penal – da Escola Paulista da Magistratura – São Paulo/SP
Professor convidado do Departamento de Direito Penal da Faculdade de Jurisprudência da Universidade de Estudos de Salerno
Conselheiro do Instituto O Direito por um planeta verde

De acordo com o art. 61 da Lei n. 9.099/95, que instituiu os Juizados Especiais Criminais, em sua redação original, são infrações de menor potencial ofensivo, conduzindo-as à sua competência, os delitos aos quais é cominada pena máxima privativa de liberdade não superior a um ano.

A Lei n. 10.259, de 12 de julho de 2001, criou os Juizados Especiais Criminais na Justiça Federal, determinando em seu art. 1.º aplicar-se a eles a Lei n. 9.099/95, desde que presentes duas regras previstas em seu art. 2.º, caput e parágrafo único:
1.ª) Os Juizados Especiais Criminais Federais julgam exclusivamente infrações da competência da Justiça Federal (caput);
2.ª) Somente são de sua competência as infrações penais de menor potencial ofensivo (caput).
Definindo os crimes de menor potencial ofensivo, reza o parágrafo único do mencionado dispositivo:
“Consideram-se infrações de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, ou multa”.

Interpretando as disposições, verifica-se que o art. 61 da Lei n. 9.099/95 leva em conta a pena máxima abstratamente imposta aos crimes em quantidade não superior a um ano, ao passo que a lei nova prevê que o máximo da sanção detentiva não pode ser superior a dois anos.

Tratando as duas normas do mesmo tema, qual seja conceituação legal de crime de menor potencial ofensivo, e adotando o critério de classificação de conformidade com a quantidade da pena, chega-se à conclusão de que empregam valorações diferentes. Diante disso, prevalece a posterior, de Direito Penal material, que, mais benéfica, derroga a anterior (CF, art. 5.º, XL; CP, art. 2.º, parágrafo único), ampliando o rol dos crimes de menor potencial ofensivo.

Assim, o parágrafo único do art. 2.º da Lei n. 10.259/2001 derrogou o art. 61 da Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/95). Em conseqüência, sejam da competência da Justiça Comum ou Federal, devem ser havidos como delitos de menor potencial ofensivo aqueles aos quais a lei comine, no máximo, pena detentiva não superior a dois anos ou multa. De maneira que os Juizados Especiais Criminais da Justiça Comum passam a ter competência sobre todos os delitos a que a norma de sanção imponha, no máximo, pena privativa de liberdade não superior a dois anos (até dois anos) ou multa, entendimento adotado por quase a unanimidade da doutrina e acatado pela 5.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no RHC n. 12.033, MS, rel. Ministro Félix Fischer, votação unânime, julgado em 13.8.2002.

A Lei n. 10.741, de 1.º de outubro de 2003, que editou o Estatuto do Idoso, em seu art. 94, determina o seguinte:
“Aos crimes previstos nesta Lei, cuja pena máxima privativa de liberdade não ultrapasse 4 (quatro) anos, aplica-se o procedimento previsto na Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995, e, subsidiariamente, no que couber, as disposições do Código Penal e do Código de Processo Penal”.

Teria o referido dispositivo alterado pela segunda vez o art. 61 da Lei dos Juizados Especiais Criminais, cumprindo serem considerados crimes de menor potencial ofensivo todos aqueles cuja pena máxima abstrata detentiva não supere quatro anos, previstos no Estatuto ou não? Seriam de menor potencial ofensivo delitos como a apropriação indébita de pensão de idoso, apenada com quatro anos de reclusão (art. 102 da Lei n. 10.741/2003)? Estaria a lei nova ampliando o rol dos delitos de menor afetação jurídica?

Acreditamos que não. O art. 94 somente pretendeu imprimir à ação penal por crimes contra o idoso, com sanção abstrata máxima não superior a quatro anos, o procedimento da Lei n. 9.099/95, conferindo maior rapidez ao processo. Não seria razoável que, impondo um tratamento penal mais rigoroso aos autores de crimes contra o idoso, contraditoriamente viesse permitir a transação penal, instituto de despenalização (art. 76 da Lei dos Juizados Especiais Criminais). A ampliação do limite máximo viria permitir a concessão da roupagem de infrações de menor afetação jurídica a delitos de gravidade, como aborto consentido, furto e receptação simples, rapto, abandono material, contrabando etc.

O art. 61 da Lei n. 9.099/95 contém a conceituação de crimes de menor potencial ofensivo para efeito da competência dos Juizados Especiais Criminais. O art. 94 do Estatuto do Idoso disciplina a espécie de procedimento aplicável ao processo, não cuidando de infrações de menor potencial ofensivo. Temos, pois, disposições sobre temas diversos, cada uma impondo regras sobre institutos diferentes, sendo incabível a invocação do princípio da proporcionalidade.

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