Terra ocupada – Cutrale consegue manter posse de fazenda em SP

A empresa Sucocítrico Cutrale, de São Paulo, pode continuar na Fazenda Santo Henrique, em Araraquara, pelo menos até o julgamento do mérito da ação reivindicatória movida pelo Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) para imissão na posse. A decisão é do vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Francisco Peçanha Martins. Ele negou o pedido do Incra para suspender a decisão favorável à empresa.

Na ação, o Incra afirmou que em 1919 a União adquiriu aproximadamente 50 mil hectares de terras particulares para promover um projeto de colonização no interior do estado de São Paulo. Com o tempo, partes das terras foram transferidas para os cidadãos destinatários por meio de alienação. Outras ficaram em poder da União, como a propriedade ocupada pela empresa.

A 1ª Vara Federal de Ourinhos negou o pedido de Antecipação de Tutela feito pela Incra. O instituto entrou com Agravo de Instrumento com pedido de efeito suspensivo no Tribunal Regional Federal da 3ª Região. O tribunal atendeu ao pedido para permitir a imissão. A Cutrale entrou com pedido de reconsideração. A segunda instância reformou a decisão, restabelecendo a decisão da Vara Federal de Ourinhos.

O Incra apelou, então, ao STJ. Sustentou que a União é a proprietária do imóvel. Outro argumento foi o de ofensa à segurança pública. “Os movimentos sociais, utilizando-se de seu direito de manifestação (….), poderão vir, eventualmente, a ocupar indevidamente o imóvel em questão ou até mesmo outros, como forma de pressão, e nesse processo, vir a causar danos materiais, bem com à sua incolumidade física ou de outrem”, asseverou. Alegou, ainda, que a implementação da reforma agrária sofrerá paralisação na região do imóvel.

O ministro Peçanha Martins observou que o Incra não demonstrou concretamente o potencial lesivo da decisão e a existência de violação da ordem e segurança públicas. “Demais disso, consta dos autos que o interessado ocupa a área reivindicada há mais de dez anos, não se vislumbrando, assim, risco de dano irreparável à União, pelo que se mostra razoável a manutenção do ‘status quo’ até que se ultime o julgamento da ação reivindicatória”, concluiu.

SLS 806

Leia a decisão

SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 806 – SP (2007/0305248-5)

REQUERENTE: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA INCRA

PROCURADOR: VALDEZ ADRIANI FARIAS E OUTRO(S)

REQUERIDO : DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DO AGRAVO DE INSTRUMENTO NR 200703000368512 DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO

INTERES.: SUCOCITRICO CUTRALE LTDA

ADVOGADO: LUIZ ANTONIO BETTIOL E OUTRO(S)

DECISÃO

Vistos, etc.

1. O “Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA” ajuizou ação reivindicatória contra “Sucocítrico Cutrale Ltda.” requerendo a concessão de tutela antecipada para sua imediata imissão na posse da área denominada “Fazenda Santo Henrique”. Sustentou a autarquia que no ano de 1919 a União Federal, visando promover um projeto de colonização no interior do Estado de São Paulo, adquiriu área de aproximadamente 50.000 (cinqüenta mil) hectares de terras particulares, com o propósito de garantir o desenvolvimento da região com a fixação de colonos imigrantes europeus. Para tanto – alegou – apenas parte das terras foram transferidas aos cidadãos destinatários por meio de alienações, sendo que muitas continuaram em poder da União, como seria o caso da propriedade em questão ocupada pelo réu.

Indeferida a tutela antecipada pelo Juiz da 1ª Vara Federal de Ourinhos-SP, o INCRA interpôs agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo, que foi deferido pelo Desembargador Relator para permitir a imissão pleiteada. Todavia, analisando pedido de reconsideração da “Sucocítrico Cutrale Ltda.”, o mesmo Desembargador entendeu por reconsiderar sua decisão e revigorar o decisum de 1ª instância.

Daí este pedido de suspensão, apresentado pelo INCRA com base nos arts. 4º da Lei n. 8.437/92 e 25 da Lei n. 8.038/90. Sustenta o requerente que: a) a União é a proprietária do imóvel, sendo que o registro da suposta aquisição, a ancianidade da posse e a produtividade do bem não podem ser opostos ao poder público; b) o INCRA é parte legítima para propositura da ação reivindicatória; e c) não subsistem os argumentos de emancipação do Núcleo Colonial Monções. Assevera haver ofensa à ordem e segurança públicas, sob alegação de que “os movimentos sociais, utilizando-se de seu direito de manifestação, (…), poderão vir, eventualmente, a ocupar indevidamente o imóvel em questão ou até mesmo outros, como forma de pressão, e nesse processo, vir a causar danos materiais, bem como à sua incolumidade física e de outrem ”. Aduz também que “a implementação da reforma agrária sofrerá uma paralisação na região do imóvel reivindicado, haja vista a demanda por terras para esse mister ali existente ”.

O Ministério Público Federal opinou pelo não conhecimento da medida (fls. 149/153).

2. Observe-se, de início, que a suspensão de liminar é medida excepcional, cingindo-se a sua análise à verificação dos bens jurídicos tutelados pela norma de regência: a ordem, a saúde, a segurança e a economia públicas.

A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que “a expedita via da suspensão de segurança não é própria para a apreciação de lesão à ordem jurídica. É inadmissível, ante a sistemática de distribuição de competências do Judiciário brasileiro, a Presidência arvorar-se em instância revisora das decisões emanadas dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais” (AgRg na SS n. 1.302/PA, Relator Ministro Nilson Naves, entre outros).

Os argumentos concernentes ao domínio da União sobre as terras reivindicadas e à legitimidade para propositura da ação reivindicatória dizem respeito ao mérito do litígio instaurado, insuscetível de apreciação nesta sede. Conforme decidido pela Eg. Corte Especial, não se admite, na via excepcional da suspensão, discussão sobre o mérito da controvérsia, pois não se trata de instância recursal (AgRg na SS n. 1.355/DF, Relator Min. Edson Vidigal).

Por outro lado, o requerente não logrou êxito em demonstrar, concretamente, o potencial lesivo da decisão impugnada e a existência de violação à ordem e segurança públicas. Alegações genéricas não encontram amparo para justificar o deferimento da medida extrema e excepcional como é a suspensão de que trata a Lei n. 8.437/92.

Demais disso, consta dos autos que o interessado ocupa a área reivindicada há mais de dez anos, não se vislumbrando, assim, risco de dano irreparável à União, pelo que se mostra razoável a manutenção do “status quo” até que se ultime o julgamento da ação reivindicatória.

Não restou evidenciado, portanto, o dano aos bens tutelados nesta via. Na realidade, ressai clara a intenção da requerente de modificar decisão que lhe foi desfavorável, para o que não se presta, todavia, a via eleita.

3. Ante o exposto, ausentes os requisitos autorizadores, indefiro o pedido.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 21 de janeiro de 2008.

Ministro FRANCISCO PEÇANHA MARTINS

Vice-Presidente, no exercício da Presidência

Revista Consultor Jurídico

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