O Superior Tribunal de Justiça suspendeu a decisão que equiparava o salário dos delegados da Polícia Civil do Piauí ao dos defensores públicos. O presidente do STJ, ministro Raphael de Barros Monteiro Filho, acolheu o pedido de suspensão de segurança apresentado pelo estado, que alegava lesão à ordem e à economia pública, além do potencial efeito multiplicador da decisão atacada.
Primeiro, o grupo de delegados da Polícia Civil entrou com Mandado de Segurança contra ato do governador com o objetivo de receber salários iguais aos dos delegados bacharéis em Direito. No Piauí existem delegados que não são formados em Direito. O Tribunal de Justiça concedeu a segurança para “extensão paritária de vencimentos dos delegados bacharéis em direito aos impetrantes”.
No mesmo Mandado de Segurança, depois do trânsito em julgado, os delegados mudaram de idéia e decidiram que preferiam que o salário fosse equiparado ao dos defensores públicos estaduais. O presidente do TJ-PI negou o pedido. Contra esta decisão, os delegados entraram com recurso que foi julgado procedente pelo Plenário do tribunal, “a fim de que sejam implantados nos contracheques dos impetrantes os subsídios percebidos pelos defensores públicos”.
Daí o governo do estado entrou com pedido de suspensão, sob a alegação de lesão à ordem e à economia públicas. Argumentou que inexiste a paridade salarial absoluta, mas, somente, a isonomia de vencimento interna corporis, ou seja, a isonomia salarial com outros delegados que, por decisão judicial, passaram a receber os mesmos vencimentos percebidos pelos defensores públicos estaduais.
Afirmou, ainda, que a diferença obtida pelos delegados em razão da decisão que visa suspender corresponde a R$ 7 mil por delegado. Para o governo, é evidente o potencial efeito multiplicador dessa decisão.
Ao conceder a suspensão de segurança ao estado do Piauí, o ministro Barros Monteiro afirmou que estão presentes os pressupostos específicos para o deferimento da medida. Segundo ele, a equiparação dos salários dos delegados da Polícia Civil com o dos defensores públicos é pleito diverso do formulado na petição inicial do Mandado de Segurança (que se referia à isonomia com outros delegados e a vencimento — o que difere de remuneração ou subsídio) e, por conseqüência, distinto da coisa julgada no aludido mandamus.
Dessa forma, afirma o ministro, é inegável a potencialidade lesiva à ordem pública contida na decisão. Revela-se, também, evidente a instabilidade jurídica, pois membros da mesma carreira estão a perceber valores diferenciados, embora regidos pela mesma legislação.
Leia a decisão
Superior Tribunal de Justiça
SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Nº 1.818 – PI (2008/0057654-5)
REQUERENTE : ESTADO DO PIAUÍ
PROCURADOR : SÂMEA BEATRIZ BEZERRA DA SILVA E OUTRO(S)
REQUERIDO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ
IMPETRANTE : CARLOS JORGE MOURA DE QUEIROZ E OUTROS
ADVOGADO : RICARDO ILTON CORREIA DOS SANTOS
DECISÃO
Vistos, etc.
1. Carlos Jorge Moura de Queiroz e outros impetraram mandado de segurança contra ato do Governador do Estado do Piauí, objetivando, na qualidade de delegados da Polícia Civil, receber vencimentos iguais aos dos delegados bacharéis em Direito. O Tribunal de Justiça do Estado do Piauí concedeu a segurança, conforme acórdão assim ementado:
“Mandado de Segurança. Rejeição à unanimidade das preliminares suscitadas. Concessão do Mandamus para extensão paritária de vencimentos dos delegados bacharéis em direito aos impetrantes. O cargo de delegado, em qualquer hipótese é sempre delegado. É odioso se discriminar a mesma classe com remuneração alta para uns e baixa para outros. No caso vertente os impetrantes já exercem o cargo de delegado por determinado período, sendo inconcebível constitucionalmente remunerá-los de maneira diferente dos atuais delegados bacharéis em direito. As funções de ambos são absolutamente iguais. Para cargos iguais remunerações iguais.” (fl. 19).
Nos autos desse mandado de segurança (98.001001-2), após o trânsito em julgado, os impetrantes pediram a implantação em seus contracheques do valor dos subsídios recebidos pelos defensores públicos estaduais, o que foi indeferido pelo Presidente do Tribunal a quo.
Inconformados, os mencionados delegados interpuseram agravo interno, o qual foi provimento pelo Pleno daquela Corte “a fim de que sejam implantados nos contracheques dos impetrantes os subsídios percebidos pelos Defensores Públicos”.
Daí este pedido de suspensão formulado pelo Estado do Piauí, com base no art. 4º da Lei n. 4.348/64, sob alegação de lesão à ordem e à economia públicas. Argumenta o requerente que inexiste a paridade absoluta salarial, mas, tão-somente, a isonomia de vencimentos interna corporis, ou seja, a isonomia vencimental com outros delegados que, por decisão judicial (MS 97.1289-6), passaram a receber os mesmos vencimentos percebidos pelos defensores públicos estaduais. Afirma que a diferença pecuniária obtida pelos impetrantes, em razão do decisum ora atacado, corresponde a R$ 7.000,00 (sete mil reais), por delegado. Aduz ser evidente o potencial efeito multiplicador do referido decisório.
2. Acham-se presentes, in casu, os pressupostos específicos para o deferimento da medida. O acórdão impugnado deferiu o pedido postulado pelos impetrantes após o trânsito em julgado do feito e determinou a equiparação dos subsídios por eles recebidos como delegados da Polícia Civil àqueles percebidos pelos defensores públicos estaduais.
Todavia, esse pleito é diverso do formulado na petição inicial do mandado de segurança (que se referia à isonomia com outros delegados e a vencimento – o que difere de remuneração ou subsídio) e por conseqüência, distinto da coisa julgada no aludido mandamus.
Dessa forma, é inegável a potencialidade lesiva à ordem pública contida no aresto atacado, na medida em que fere de forma flagrante os princípios da moralidade e da legalidade, ínsitos ao Estado Democrático de Direito, e que, a par de estarem previstos nas disposições referentes à Administração Pública, também norteiam a atividade do julgador quando este equipara subsídios de servidores públicos de carreiras distintas, em típica atuação administrativa e legislativa.
Revela-se, também, evidente a instabilidade jurídica, pois membros da mesma carreira estão a perceber valores diferenciados, embora regidos pela mesma legislação. Verifica-se, ainda, a ocorrência do efeito multiplicador do julgado, capaz de incentivar o mesmo pleito em relação aos demais membros da carreira, não só naquele Estado como também em outras unidades da Federação, de forma a provocar concreta lesão ao erário público, uma vez que tal equiparação pode gerar um acréscimo de R$ 7.000,00 (sete mil reais) para cada delegado, sem previsão legal e orçamentária.
Ademais, a Corte Especial deste Tribunal confirmou o entendimento desta Presidência em questão similar, ao julgar o AgRg na Suspensão de Segurança n. 1.618-PI, in verbis:
“AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. DECISÃO POSTERIOR AO TRÂNSITO EM JULGADO DO MANDAMUS. LESÃO À ORDEM E ECONOMIA PÚBLICAS CONFIGURADA.
1. Paridade concedida aos defensores públicos em relação aos membros do Ministério Público que ficou restrita ao “vencimento básico”, e não ao total da remuneração.
2. Violação da ordem pública administrativa e da economia pública caracterizada. Agravo regimental improvido .” (AgRg na SS 1618/PI, de minha relatoria, Corte Especial, DJ de 18.12.2006).
3. Isso posto, defiro o pedido para suspender os efeitos do acórdão do Agravo Regimental no Mandado de Segurança n. 98.001001-2 (fls. 51/54) até o seu trânsito em julgado.
Comunique-se ao Tribunal de Justiça do Estado do Piauí.
Publique-se.
Intimem-se
Brasília, 12 de março de 2008.
MINISTRO BARROS MONTEIRO
Presidente
Revista Consultor Jurídico