Publicado acórdão que autoriza de Pis/Cofins às tarifas de energia elétrica

Foi publicado o acórdão do STJ que julgou legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica, a serem pagas pelos consumidores, do valor correspondente ao pagamento da contribuição ao Programa de Integração Social (Pis) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), incidentes sobre o faturamento das empresas concessionárias.

A conclusão, unânime, é da 1ª Seção do STJ. O julgamento ocorrido em 22 de setembro seguiu o rito dos recursos repetitivos. Assim, o julgado passa a ter aplicação nas demais instâncias da Justiça brasileira.

O recurso era do consumidor gaúcho Eder Girard, contra a CEEE. A ação tinha como objetivo o reconhecimento da ilegalidade do repasse às faturas de consumo de energia elétrica do custo correspondente ao recolhimento pelo Fisco do Pis e da Cofins. Ele pediu que fosse devolvido em dobro o valor indevidamente recolhido.

Em primeira instância, o pedido foi julgado improcedente. Na 7ª Vara Cível de Porto Alegre, a sentença foi do juiz Heráclito José de Oliveira Brito.

O consumidor apelou, mas a 2ª Câmara Cível do TJRS manteve a sentença, ao entender que “o repasse é legítimo, pois autorizado pelo parágrafo 3º do artigo 9º da Lei nº. 8.987/1995”. A decisão foi dos desembargadores Pedro Bossle (relator), Sandra Brisolara Medeiros e Denise Oliveira César.

Já no STJ, o ministro Teori Albino Zavascki, relator do recurso, decidiu submeter o caso ao regime do artigo 543-C do CPC, devido à relevância da questão e aos processos repetitivos sobre o mesmo tema.

Seguindo o voto do relator, a 1ª Seção entendeu que “a tese defendida pelo consumidor parte de um pressuposto equivocado, qual seja, o de atribuir à controvérsia uma natureza tributária, com o fisco de um lado e o contribuinte do outro”.

Para o ministro Zavascki, “a relação que se estabelece é de consumo de serviço público, cujas fontes normativas são próprias, especiais e distintas da tributária”.

De acordo com o ministro, “o que está em questão não é saber se o consumidor de energia elétrica pode ser alçado à condição de contribuinte do Pis e da Cofins – que a toda evidência não o é – mas sim a legitimidade da cobrança de uma tarifa cujo valor é estabelecido e controlado pela Administração Pública e no qual foi embutido o custo correspondente àqueles tributos devidos ao Fisco pela concessionária”.

Em seu voto, o ministro ressaltou, ainda, o princípio contratual da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. O relator afirmou que a alteração na forma de cobrança beneficia o consumidor, pois trouxe a possibilidade de que seus valores sejam fiscalizados não apenas pela Aneel, mas por cada um dos consumidores, visto que passaram a ser cobrados de forma destacada nas suas faturas, a exemplo do que ocorre com o ICMS.

Atuam em nome da CEEE os advogados Rosangela Curtinaz Bortoluzzi, Roberto Marquardt Neto e Andrea Schmitz Rodriguez. (REsp nº 1185070-RS).

ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO (07.10.10)
RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR: MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE: EDER GIRARD
ADVOGADO: ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO: ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO: GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA: PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES.: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR: DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES.: INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA: MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO. ENERGIA ELÉTRICA. TARIFA. REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES DO PIS E DA COFINS. LEGITIMIDADE.
1. É legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica do valor correspondente ao pagamento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS devido pela concessionária.
2. Recurso Especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08⁄08.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido e
Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Meira.

Sustentaram, oralmente, os Drs. NILSON DE OLIVEIRA RODRIGUES, pelo recorrente, ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI, pela recorrida, HENRY GONÇALVES LUMMERTZ, pela ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA, e MÁRCIO PINA MARQUES, pela AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL.

Brasília, 22 de setembro de 2010

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR: MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE: EDER GIRARD
ADVOGADO: ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO: ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO: GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA: PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES.: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR: DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES.: INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA: MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

Trata-se de recurso especial interposto em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, em demanda objetivando o reconhecimento da ilegalidade do repasse às faturas de consumo de energia elétrica do custo correspondente ao recolhimento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS, bem assim a repetição do indébito, manteve a sentença que julgou improcedente o pedido. No entender do acórdão, tal repasse é legítimo, já que autorizado pelo § 3º do art. 9º da Lei 8.987⁄95..

No recurso especial, o recorrente aponta, com fundamento na alínea c do permissivo constitucional, a existência de divergência jurisprudencial entre o entendimento manifestado pelo acórdão recorrido e a orientação adotada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (Apelação Cível 2004.001.09056) e pelo STJ (REsp 1.053.778⁄RS), sustentando, em síntese, a ilegalidade do repasse do PIS e da COFINS, bem assim a possibilidade da devolução em dobro dos valores indevidamente recolhidos.

Afirma, ademais, que (a) “(…) a aplicação do disposto no art. 9º da lei ordinária 8.987⁄95 deve ser compreendida de forma restrita, até porque trata-se de matéria reservada à lei complementar – art. 146 da CF⁄88” (fl. 399); (b) “(…) não é todo e qualquer tributo que se pode querer repassar ao preço final por compor o custo da cadeia produtiva (repasse econômico), pois para poder ser repassado o tributo efetivamente deve fazer parte dos custos de produção, operação e serviço, ainda menos os que incidem sobre o faturamento da pessoa jurídica, como é o caso em testilha” (fl. 399).

Em contra-razões (fls. 428⁄471), a recorrida pede, em preliminar, o não conhecimento do recurso especial, porque a divergência jurisprudencial não está devidamente demonstrada, não havendo similitude fática entre os casos confrontados. Afirma, ainda, a incompetência absoluta da Justiça Estadual para julgar a demanda, tendo em vista a legitimidade passiva da ANEEL e da União no presente caso. No mérito, defende a legalidade do repasse do PIS e da COFINS.

Submetido o recurso à sistemática do art. 543-C do CPC pelo Tribunal de origem (fl. 584⁄586), determinei o chamamento, como amici curiae, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC e da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Compareceu a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica – ABRADEE (fls. 599⁄1.053) pedindo sua admissão como amicus curiae e de desde logo se manifestando pelo improvimento.

A ANEEL sustenta, em preliminar, a inadmissibilidade do recurso especial, tendo em vista que (a) não houve indicação de dispositivo divergentemente interpretado, (b) “(…) a matéria não foi analisada à luz tratamento jurídico conferido à questão pela recorrente, o que afasta o requisito do prequestionamento” (fl. 1.109) e (c) os acórdãos apontados como paradigmas não veiculam identidade fática ou jurídica com o acórdão recorrido. No mérito, postula o improvimento do recurso.

O IDEC também se manifestou (fls. 1346⁄1365), sustentando a ilegitimidade do repasse, que no seu entender importa violação da segurança jurídica e modifica, por via oblíqua, os elementos caracterizadores das hipóteses de incidência das exações tributárias repassadas (PIS e COFINS), além de causar lesão ao consumidor e ao interesse econômico do País.

Em seu parecer (fls. 1.331⁄1.343), o Ministério Público Federal opina pelo conhecimento e provimento do recurso especial ao fundamento básico de que “A legislação reguladora do PIS e da COFINS prescreve que o seu fato gerador é o faturamento da empresa, ou seja, sua receita bruta, não a prestação do serviço. Por conseguinte, estes tributos possuem natureza diversa, não se confundem com o ICMS, sendo diversa também a sistemática para sua cobrança, mediante repasse aos consumidores”.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR: MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE: EDER GIRARD
ADVOGADO: ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO: ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO: GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA: PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES.: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR: DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES.: INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA: MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO. ENERGIA ELÉTRICA. TARIFA. REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES DO PIS E DA COFINS. LEGITIMIDADE.
1. É legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica do valor correspondente ao pagamento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS devido pela concessionária.
2. Recurso Especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08⁄08.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI(Relator):

1.A questão jurídica central diz respeito à legitimidade do repasse, às faturas de energia elétrica a serem pagas pelos consumidores, do valor correspondente às contribuições do PIS e da COFINS incidentes sobre o faturamento das empresas concessionárias. A matéria está claramente prequestionada e, ainda que tratem de repasse em tarifas de telefonia, os precedentes indicados como paradigmas enfrentam o mesmo tema, dando-lhe solução diferente da que lhe atribuiu o acórdão recorrido. Invoca-se no recurso, ademais, que o acórdão recorrido deu interpretação extensiva ao § 3º do art. 9º da Lei 8.987⁄95, cujo comando, destarte, não foi devidamente observado, no entender do recorrente. O recurso, portanto, atende satisfatoriamente os requisitos de admissibilidade.

2.Afasta-se, também, a alegação de incompetência da Justiça Estadual, feita em contra-razões. A competência cível da Justiça Federal é ratione personae, somente se configurando pela efetiva presença, no processo, de um dos entes federais enumerados no art. 109, I da Constituição, o que não ocorre na hipótese.

3.No mérito, não há como acolher o recurso. A tese defendida pelo demandante e aqui chancelada pelo IDEC e pelo Ministério Público, parte de um pressuposto manifestamente equivocado: o de atribuir à controvérsia uma natureza tributária. Com efeito, a relação jurídica que se estabelece entre concessionária e consumidor de energia elétrica não é relação tributária, cujos partícipes necessários são o Fisco e o contribuinte. Aqui, o que se tem é relação de consumo de serviço público, cujas fontes normativas são próprias, especiais e distintas das que regem as relações tributárias. Em outras palavras, o que está em questão não é saber se o consumidor de energia elétrica pode ser alçado à condição de contribuinte do PIS e da COFINS, que à toda evidência não o é, mas sim a legitimidade da cobrança de uma tarifa, cujo valor é estabelecido e controlado pela Administração Pública e no qual foi embutido o custo correspondente aqueles tributos, devidos ao Fisco pela concessionária. Essa a questão.

4.Esse argumento equivocado, de justificar com base no direito tributário a ilegitimidade do repasse das contribuições do PIS e da COFINS, foi também invocado em relação às tarifas de telefonia, objeto de exame nesta Seção no REsp 976.836⁄RS, Min. Luiz Fux, julgado em 25.08.10 sob o regime do art. 543-C do CPC. Na oportunidade, a Seção, por representativa maioria, deixou anotada a impropriedade da qualificação tributária que se pretendeu dar à questão, cujo deslinde, na verdade, deveria se dar à luz do regime jurídico estabelecido pelas normas próprias da concessão do serviço público e da correspondente política tarifária. Conforme registrou o Ministro Luiz Fux, na ementa do acórdão, “o repasse de tributos para o valor da tarifa (…) não obedece ao regime tributário da responsabilidade tributária, por transferência, sucessão ou substituição, senão ao edital, ao contrato de concessão, aos atos de regulação do setor e ao Código de Defesa do Consumidor”. Nessa consideração, a Seção decidiu que a legitimidade do repasse tinha sustento no art. 9º, §§ 2º e 4º da Lei 8.987⁄95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, e dos artigos 93, VII e 103, § 4º da Lei 9.472⁄97, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, bem como nos atos normativos da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL e nos contratos de concessão. Invocou-se, nomeadamente no voto do Ministro Mauro Campbell Marques, a Lei 8.666⁄93, que disciplina o regime das licitações e dos contratos administrativos, cujo art. 65, II, d e § 5º consagra o princípio da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da avença, autorizando a revisão da tarifa, entre outras hipóteses, em face do advento de encargos de natureza tributária que produzam repercussão nos preços contratados.

5.Mutatis mutandis, os mesmos fundamentos justificam, aqui, a manutenção do acórdão recorrido. Segundo dispõe o art. 9º da Lei 8.987⁄97, “a tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta lei, no edital e no contrato”. Dada a natureza onerosa e sinalagmática da prestação dos serviços concedidos, é inafastável que a contraprestação a cargo do consumidor (tarifa) seja suficiente para retribuir, pelo menos, os custos suportados pelo prestador, razão pela qual é também inafastável que, na fixação do seu valor, sejam considerados, em regra, os encargos de natureza tributária. É também decorrência natural do caráter oneroso e sinalagmático do contrato de concessão a manutenção, durante toda a sua vigência, da equação econômico-financeira original. Nesse sentido, dispôs a Lei no § 2º do mesmo artigo 9º:

§ 2º Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro.

E entre as hipóteses de revisão tarifária está justamente a do aumento de encargos de natureza tributária, conforme prevê o § 3º, a saber:

§ 3º Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos.

Não se pode dar razão, assim, à alegação central do recurso, de que o repasse das contribuições do PIS e da COFINS às tarifas de energia elétrica ofende o art. 9º da Lei 8.987⁄97. Pelo contrário: foi justamente amparado nesse dispositivo de lei que a 1ª Seção, julgando o antes referido REsp 976.836⁄RS, decidiu pela legitimidade de repasse semelhante, ocorrido em relação às tarifas de serviço de telefonia, infirmando, assim, frontalmente, o entendimento dos acórdãos invocados como paradigmas no recurso especial. São razões por si só suficientes para manter o entendimento do acórdão recorrido.

6.Cumpre registrar, ainda, embora essa questão não integre propriamente o âmbito da controvérsia, que, no que se refere especificamente às tarifas de energia elétrica, o repasse das contribuições do PIS e da COFINS, além de observar as condições e os limites estabelecidos na lei e no contrato, se deu de forma transparente, de modo a evitar dificuldades à compreensão por parte do consumidor, sendo que o repasse é por valor proporcional e limitado à “repercussão econômica do faturamento da empresa com a atividade de distribuição de energia elétrica”. É o que se depreende da manifestação da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, na sua condição de órgão estatal encarregado do controle da prestação desse serviço público e, nesse processo, como amicus curiae, a saber:

(…)
Conforme previsto nos contratos de concessão do serviço público de distribuição de energia elétrica, os custos incorridos pelas concessionárias de distribuição são, para efeitos de revisão e reajuste tarifários, divididos em duas parcelas:

(i) Parcela A, na qual se inserem os custos não gerenciáveis pelas concessionárias de distribuição;
(ii) Parcela B, na qual se inserem os custos gerenciáveis pelas concessionárias de distribuição.

Os custos imputáveis aos concessionários – custos gerenciáveis – não poderão ser invocados contra o Poder concedente para que haja recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão. Os custos da Parcela A, por sua vez, são repassados para as tarifas cobradas dos consumidores das concessionárias. Os tributos, como regra geral, por fazerem parte da Parcela B da receita das concessionárias, são analisados em cada período tarifário, de tal modo que a tarifa contempla receita suficiente para custear aquelas obrigações tributárias que incidem sobre a concessão.

Assim, antes das alterações surgidas com o advento das leis anteriormente mencionadas, havia, nas tarifas homologadas pela ANEEL, um montante tarifário destinado a cobrir os custos que os concessionários incorriam com o pagamento do PIS⁄PASEP e da COFINS. O valor desses tributos, portanto, já estava incluído no valor das tarifas cobradas dos consumidores.

Como anteriormente ao advento das Leis 10.637⁄02, 10,833⁄03 e 10.865⁄04 não havia a previsão de deduções quanto ao PIS⁄PASEP e à COFINS, não havia celeuma a ser tratada, já que a simples previsão da alíquota desses tributos equivalia ao custo efetivo da obrigação tributária (0,65% para o PIS⁄PASEP e 3,00% para a COFINS).

Com a instauração de uma sistemática não-cumulativa, implementada com a edição das Leis 10.637⁄02, 10.833⁄03 e 10.865⁄04, o custo efetivo com o pagamento dos mencionados tributos passa a ser variável, não mais correspondendo ao equivalente simples dos percentuais das alíquotas, tal como anteriormente fixado. Desse modo, não há como se antever qual o valor exato que será despendido pelos concessionários passou a depender não somente da alíquota fixada, mas também da verificação ou não das hipóteses de creditamento das etapas precedentes.

Desta forma, como as tarifas dos concessionários de distribuição de energia elétrica contemplavam apenas o montante anteriormente correspondente à alíquota desses tributos, eventuais diferenças, para mais ou para menos, entre o valor coberto pela tarifa e o efetivamente despendido pelo concessionário só poderiam ser revistos mediante Revisão Tarifária Extraordinária, aumentado ou reduzindo a tarifa a ser cobrada.

Com efeito, após a edição das Lei 10.637⁄02, 10.833⁄03 e 10.865⁄04, a alíquota do PIS⁄PASEP foi majorada, passando de 0,65% para 1,65% e da COFINS de 3,00% para 7,60%. Contudo, como essas mesmas leis que majoraram as alíquotas também criaram uma série de deduções a serem feitas na definição do montante final a ser recolhido junto ao Fisco, duas situações perversamente gravosas para a concessão poderiam ocorrer. Para exemplificá-las, são elucidativos os dois extremos:

(i) O montante repassado à tarifa de 3,65% é menor que o necessário para arcar com o custo efetivo desses tributos, que pode chegar até o máximo de 9,25% caso não haja nada a ser compensado em determinado mês de exercício do concessionário. Nesse caso, o concessionário estaria sofrendo uma mitigação indevida na parcela de retribuição que lhe fora assegurada quando anuiu
em prestar o serviço concedido.

(ii) Diametralmente oposto, o montante repassado à tarifa de 3,65% é maior que o necessário para arcar com o custo efetivo desses tributos, que não obstante possa chegar até 9,25%, em razão de haver inúmeras possibilidades de compensação, o custo efetivo pode ser igual a zero. Nessa segunda hipótese, o concessionário estaria se locupletando indevidamente em detrimento do consumidor, sem justa causa para tanto.

Em ambas as hipóteses, há desvirtuamento da concepção neutra que a carga fiscal deve corresponder no trato das concessões públicas.

Em razão dos institutos de recomposição da tarifa restarem adstritos (i) à revisão – ordinária ou extraordinária – e (ii) ao reajuste a hipótese então cabível para solver essa situação seria a revisão tarifária extraordinária de todos os concessionários de distribuição de energia elétrica, aumentado ou reduzindo a tarifa.

Mas a revisão tarifária extraordinária não extirparia a possibilidade de haver novo descompasso entre o repasse tarifário e os custos efetivos com esses tributos para os meses seguintes à sua realização. É que a revisão extraordinária, apesar de seguir a mesma sistemática da ordinária, apenas corrigiria a situação pretérita, e não a futura, pois novas oscilações quanto à geração de créditos ou não nas etapas precedentes poderia reconstituir essa situação caótica e gerar, por conseqüência, a necessidade de novas revisões extraordinárias.

Acaso não houvesse uma alteração no trato dessa questão, as revisões extraordinárias – como a própria terminologia suscita – que foram criadas para casos excepcionais poderiam vir a ocorrer seguidamente, desvirtuando a essência do instituto.

E, em razão dos tributos constituírem itens da Parcela B, a revisão dos seus valores, de forma ordinária, só poderia ser feita a cada 4 ou 5 anos, a depender da data do contrato, de tal modo que ainda que não houvessem sucessivas revisões extraordinárias, ao cabo de toda revisão tarifária haveria uma ativo ou passivo regulatório a ser tratado. Ou seja, além de ter que analisar todos os elementos que integram a revisão tarifária ordinária – o reposicionamento tarifário e o Fator X – a ANEEL ver-se-ia obrigada a aumentar a tarifa para os consumidores (nos casos em que os custos efetivos com o tributo fossem maiores que o repasse tarifário) ou diminuí-la, em razão de um lucro indevido que o concessionário obteve (nos casos em que o repasse tarifário foi maior que os custos efetivos), sem poder extirpar essas anormalidade.

Diante desta nova realidade, surgiu a necessidade de alteração na sistemática de cobrança destes tributos, tendo em vista que, conforme já salientado, a alteração na carga fiscal que repercute na concessão outorgada deve manter caracteres de neutralidade quanto ao equilíbrio econômico-financeiro acertado quando da celebração dos contratos de concessão.

A solução encontrada pelas áreas técnicas da ANEEL para conformar a cobrança dos tributos à nova realidade jurídica instalada com a legislação em questão foi a de se estender ao PIS⁄PASEP e a COFINS o mesmo tratamento conferido ao ICMS, ou seja, seus valores passaram a não mais ser incluídos nas tarifas de energia elétrica, ficando a cargo dos agentes cobrar tais valores diretamente nas faturas de energia elétrica.

Note-se que essa nova sistemática trouxe dois novos comandos que se complementam:

i) exclusão da tarifa “das alíquotas econômicas do PIS⁄PASEP e da COFINS” – com isto a “Parcela B” das tarifas sofre uma redução;

ii) autorização para inclusão “despesas do PIS⁄PASEP e da COFINS efetivamente incorridas pela concessionária no exercício da atividade de distribuição de energia elétrica” – com isso o consumidor não tem a repercussão econômica de todo o tributo, que incide sobre o faturamento total da empresa, mas apenas a repercussão econômica do faturamento da empresa com a atividade de distribuição de energia elétrica.

Desta feita, a exclusão da cobertura tarifária na Parcela B não autoriza a conclusão de que os concessionários passariam a arcar com as despesas desses impostos, dado que se trata de repercussão econômica do tributo. Cuida-se tão somente de não mais serem homologados repasses tarifários para fazer frente ao pagamento desses tributos. Em outras palavras, a ANEEL, ao homologar as tarifas máximas para o período tarifário do concessionário, não será obrigada a embutir parcelas na tarifa para custear o pagamento destes tributos.

A repercussão econômica destes tributos, todavia, não pode ser negada, de modo que a ANEEL, ato contínuo, autorizou a cobrança em destaque das despesas tributárias efetivamente incorridas pela concessionária no exercício da atividade de distribuição de energia elétrica.

Não se altera, com isso, a sistemática constitucional de tributo direto, nem também:

(i) o responsável tributário, que continua sendo a concessionária;

(ii) o fato gerador, que continua sendo o faturamento;

(iii) a base de cálculo, que continuam sendo o valor do faturamento da empresa, e não o consumo de energia.

A solução mostra-se consentânea com os postulados da razoabilidade, melhor adequação ao regime tarifário pelo preço e a transparência nas relações entre concessionários e usuários. Isso porque, além de atender aos parâmetros do razoável, a modificação na forma de cobrança também melhor se amolda ao regime tarifário pelo preço – típico do serviço de distribuição de energia elétrica. Ademais, ao se possibilitar a apartação desses tributos do repasse tarifário, as competências homologatórias da ANEEL na fixação da tarifa deixarão de ser feitas com base na análise contábil dos custos dos concessionários – típica do regime pelo custo e sujeitas à assimetria de informação. A ANEEL não terá, portanto, que mensurar e analisar, previamente, comportamentos que os concessionários terão de adotar no trato de suas obrigações tributárias para conferir repasse tarifário à composição de suas novas receitas requeridas para os próximos períodos tarifários.

Em harmonia com a Lei nº 8.987⁄95, a Lei nº 9.427⁄96, além de atribuir à ANEEL a competência para homologar reajustes e proceder à revisão de tarifas, dispôs, em seus artigos 14 e 15, sobre a aplicação do regime do serviço pelo preço à fixação das tarifas do serviço público de fornecimento de energia elétrica.

Quanto ao tema, o artigo 15 inaugura o sistema da tarifa limite, no qual, embasado em uma definição pelo preço, a ANEEL fixa os valores máximos admitidos para a contraprestação a ser auferida pelos concessionários em decorrência da prestação de serviços públicos. Na tarifa limites, o Poder Público fixa um valor máximo para a tarifa por um período, dentre do qual o concessionário se apropria de todos os ganhos de eficiência e produtividade decorrentes dos investimentos e aprimoramentos tecnológicos. Após esse período, e levando-se em consideração esses custos, o valor da tarifa é revisto e pode ser reduzido, impedindo-se, assim, uma relação direta entre custos e preços. Essa revisão é conduzida pelo regulador com base em critérios técnicos, sempre com o objetivo de preservar o equilíbrio, de modo a não onerar usuário e prestador de serviço.

O regime pelo preço possibilita a busca de eficiência na concessão. Para materializá-lo, a ANEEL, nos processos de revisão tarifária, mediante critérios que conciliam a modicidade tarifária e o equilíbrio econômico financeiro, reposiciona a tarifa em novos níveis, com base nos custos eficientes para a prestação do serviço concedido. Ocorre que, como já mencionado, o trato a ser reservado aos tributos deve assentar-se em uma perspectiva neutra, de tal modo que não onerem, nem tampouco sejam causa de ganhos econômicos e financeiros à concessão.

Nessa perspectiva, a discussão sobre a definição de custos operacionais eficientes – típica de processo de revisão tarifária – não pode envolver a questão tributária, sob pena de a ANEEL ver-se obrigada a analisar práticas anti-elisivas ou a travar discussões quanto a incidência ou não de creditamentos em matérias tributárias, vindo a confundir suas competências institucionais próprias com a de outros órgãos fiscais, sobretudo a Receita Federal e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.

Assim, caso não houvesse a alteração mencionada – e a ANEEL tivesse que fixar valores máximos da tarifa e neles repassar cobertura para fazer frente aos ônus efetivos que os concessionários incorrerão no pagamento de PIS⁄PASEP e da COFINS – seria necessária analisar todas as hipóteses de cabimento de geração de créditos tributários e, a partir daí, tracejar uma espécie de atuação eficiente dos concessionários para assuntos referentes a obrigações tributárias, algo que se desvirtua do processo de revisão tarifária e das próprias competências da Agência.

Agregue-se que inúmeras interpretações – muitas delas divergentes – pairam sobre as hipóteses de creditamento ou não de algumas atividades que repercutem na prestação da distribuição de energia elétrica e que serão objeto de várias discussões quanto ao PIS⁄PASEP e à COFINS. A alteração implementada, portanto, é a que melhor se ajusta ao modelo tarifário que rege o setor, tendo em vista que evita práticas invasivas por parte da ANEEL em matéria de competência de outros órgãos públicos ou na própria gestão dos concessionários.

Como se não bastasse, é importante observar que a alteração na forma de cobrança dos tributos contribuiu para aumentar a transparência na relação da concessionária com seus consumidores, explicitando a fatura cobrada dos consumidores. Isso porque, ao se estender ao PIS⁄PASEP e a COFINS o mesmo tratamento conferido ao ICMS, o concessionário deixa de ter cobertura na tarifa para fazer frente ao pagamento desses tributos, devendo, por outro lado, informar à ANEEL e à sociedade quanto necessita cobrar nas faturas para honrar essas obrigações perante o Fisco.

Essa necessidade de informação confere maior transparência nas relações entre os concessionários e os seus consumidores usuários. A sociedade, como um todo, passa a ter mais acesso a informações nas faturas de energia elétrica, pois, tal como ocorre com o ICMS, o custo que a empresa incorreu com o pagamento desses tributos que incidem sobre o serviço concedido vem devidamente discriminado na fatura. Nessa perspectiva, a alteração confere maior efetividade ao direito do consumidor de receber informações claras e adequadas sobre os custos que compõem o serviço de distribuição de energia elétrica.

Entretanto, apesar de trazer claramente o valor dos tributos na fatura, cumpre mencionar que a alteração legislativa não teve o intuito de retirar o seu valor do preço final a ser pago pelo consumidor.

Com efeito, ainda que inseridos no valor da tarifa de energia, o PIS⁄PASEP e a COFINS sempre foram cobrados dos consumidores de energia elétrica. Assim, a alteração implementada pela ANEEL teve por escopo melhor informar os consumidores acerca dos custos efetivamente incorridos para a prestação do serviço de distribuição de energia elétrica, sem, no entanto, retirar o valor dos tributos do preço a ser pago pelo usuário do serviço, sob pena de causar desequilíbrio econômico-financeiro ao contrato de concessão.

Por todo o acima exposto, a conclusão a que se chega é a de que, não obstante tenha havido alterações na forma de cobrança dos tributos em comento, em decorrência da edição das Leis nº 10.637⁄02, 10.833⁄03 e 10.865⁄04, o valor do PIS⁄PASEP e da COFINS continua a integrar o preço final a ser pago pelo consumidor pelo serviço público de distribuição de energia elétrica. A implementação da mudança para trazer maior transparência quanto aos valores efetivamente despendidos para pagamento dos tributos não pode servir de embasamento para que o concessionário seja penalizado com o pagamento dos mesmos, sob pena de sofrer desequilíbrio econômico-financeiro em seu contrato, podendo interferir na adequada prestação do serviço público.
Conclui-se, assim, o PIS⁄PASEP e a COFINS são cobrados de acordo com a respectiva legislação, e a alteração na forma de cobrança trouxe a possibilidade de que seus valores sejam fiscalizados não apenas pela ANEEL, mas por cada um dos consumidores de energia elétrica, visto que passaram a ser cobrados de forma destacada nas suas faturas, a exemplo do que ocorre com o ICMS. (fls.1117 ⁄1126).

7.Ante o exposto, nego provimento. Considerando tratar-se de recurso submetido ao regime do art. 543-C, determina-se o envio do inteiro teor do presente acórdão, devidamente publicado:

(a) aos Tribunais Regionais Federais e aos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal (art. 6º da Resolução STJ 08⁄08), para cumprimento do § 7º do art. 543-C do CPC;

(b) à Presidência do STJ, para os fins previstos no art. 5º, II da Resolução STJ 08⁄08;

(c) à Comissão de Jurisprudência, com proposta de aprovação de súmula nos seguintes termos: “É legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica do valor correspondente ao pagamento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS devido pela concessionária”.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA SEÇÃO
Número Registro: 2010⁄0043631-6
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1185070 ⁄ RS

Números Origem: 10900430536 70031873391 70033294646

PAUTA: 22⁄09⁄2010 JULGADO: 22⁄09⁄2010

Relator
Exmo. Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MOACIR GUIMARÃES MORAIS FILHO

Secretária
Bela. Carolina Véras

AUTUAÇÃO

RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR: MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE: EDER GIRARD
ADVOGADO: ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO: ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO: GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA: PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES.: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR: DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES.: INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA: MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)

ASSUNTO: DIREITO TRIBUTÁRIO – Contribuições – Contribuições Sociais – Cofins

SUSTENTAÇÃO ORAL

Sustentaram, oralmente, os Drs. NILSON DE OLIVEIRA RODRIGUES, pelo recorrente, ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI, pela recorrida, HENRY GONÇALVES LUMMERTZ, pela ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA, e MÁRCIO PINA MARQUES, pela AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia PRIMEIRA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Seção, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Meira.

Brasília, 22 de setembro de 2010

Carolina Véras
Secretária

(REsp nº 1185070 – com informações do STJ e da redação do Espaço Vital).

Relação das partes e seus advogados

Recorrente: Eder Girard
Advogado: Alessandro Granato Rodrigues
Recorrido: Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica – CEEE D
Advogada: Rosangela Curtinaz Bortoluzzi
Interessada: Abradee Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica – “Amicus Curiae”
Advogados: Patricia Vasques de Lyra Pessoa Roza e Guilherme Rizzo Amaral
Interessada: Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel – “Amicus Curiae”
Procurador: Daniel Gustavo Santos Roque
Interessado: Instituto Brasileiro de Defesa Do Consumidor Idec – “Amicus Curiae”
Advogada: Mariana Ferreira Alves.

________________________________________
RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR: MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE: EDER GIRARD
ADVOGADO: ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO: COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO: ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO: GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA: PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES.: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR: DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES.: INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA: MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO. ENERGIA ELÉTRICA. TARIFA. REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES DO PIS E DA COFINS. LEGITIMIDADE.
1. É legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica do valor correspondente ao pagamento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS devido pela concessionária.
2. Recurso Especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08⁄08.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Hamilton Carvalhido e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Meira.

Sustentaram, oralmente, os Drs. NILSON DE OLIVEIRA RODRIGUES, pelo recorrente, ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI, pela recorrida, HENRY GONÇALVES LUMMERTZ, pela ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA, e MÁRCIO PINA MARQUES, pela AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL.

Brasília, 22 de setembro de 2010

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE : EDER GIRARD
ADVOGADO : ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO : COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO : ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO : GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES. : AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR : DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES. : INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA : MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)
RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

Trata-se de recurso especial interposto em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, em demanda objetivando o reconhecimento da ilegalidade do repasse às faturas de consumo de energia elétrica do custo correspondente ao recolhimento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS, bem assim a repetição do indébito, manteve a sentença que julgou improcedente o pedido. No entender do acórdão, tal repasse é legítimo, já que autorizado pelo § 3º do art. 9º da Lei 8.987⁄95..
No recurso especial, o recorrente aponta, com fundamento na alínea c do permissivo constitucional, a existência de divergência jurisprudencial entre o entendimento manifestado pelo acórdão recorrido e a orientação adotada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (Apelação Cível 2004.001.09056) e pelo STJ (REsp 1.053.778⁄RS), sustentando, em síntese, a ilegalidade do repasse do PIS e da COFINS, bem assim a possibilidade da devolução em dobro dos valores indevidamente recolhidos. Afirma, ademais, que (a) “(…) a aplicação do disposto no art. 9º da lei ordinária 8.987⁄95 deve ser compreendida de forma restrita, até porque trata-se de matéria reservada à lei complementar – art. 146 da CF⁄88” (fl. 399); (b) “(…) não é todo e qualquer tributo que se pode querer repassar ao preço final por compor o custo da cadeia produtiva (repasse econômico), pois para poder ser repassado o tributo efetivamente deve fazer parte dos custos de produção, operação e serviço, ainda menos os que incidem sobre o faturamento da pessoa jurídica, como é o caso em testilha” (fl. 399).
Em contra-razões (fls. 428⁄471), a recorrida pede, em preliminar, o não conhecimento do recurso especial, porque a divergência jurisprudencial não está devidamente demonstrada, não havendo similitude fática entre os casos confrontados. Afirma, ainda, a incompetência absoluta da Justiça Estadual para julgar a demanda, tendo em vista a legitimidade passiva da ANEEL e da União no presente caso. No mérito, defende a legalidade do repasse do PIS e da COFINS.
Submetido o recurso à sistemática do art. 543-C do CPC pelo Tribunal de origem (fl. 584⁄586), determinei o chamamento, como amici curiae, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor – IDEC e da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Compareceu a Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica – ABRADEE (fls. 599⁄1.053) pedindo sua admissão como amicus curiae e de desde logo se manifestando pelo improvimento.
A ANEEL sustenta, em preliminar, a inadmissibilidade do recurso especial, tendo em vista que (a) não houve indicação de dispositivo divergentemente interpretado, (b) “(…) a matéria não foi analisada à luz tratamento jurídico conferido à questão pela recorrente, o que afasta o requisito do prequestionamento” (fl. 1.109) e (c) os acórdãos apontados como paradigmas não veiculam identidade fática ou jurídica com o acórdão recorrido. No mérito, postula o improvimento do recurso.
O IDEC também se manifestou (fls. 1346⁄1365), sustentando a ilegitimidade do repasse, que no seu entender importa violação da segurança jurídica e modifica, por via oblíqua, os elementos caracterizadores das hipóteses de incidência das exações tributárias repassadas (PIS e COFINS), além de causar lesão ao consumidor e ao interesse econômico do País.
Em seu parecer (fls. 1.331⁄1.343), o Ministério Público Federal opina pelo conhecimento e provimento do recurso especial ao fundamento básico de que “A legislação reguladora do PIS e da COFINS prescreve que o seu fato gerador é o faturamento da empresa, ou seja, sua receita bruta, não a prestação do serviço. Por conseguinte, estes tributos possuem natureza diversa, não se confundem com o ICMS, sendo diversa também a sistemática para sua cobrança, mediante repasse aos consumidores”.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.070 – RS (2010⁄0043631-6)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE : EDER GIRARD
ADVOGADO : ALESSANDRO GRANATO RODRIGUES E OUTRO(S)
RECORRIDO : COMPANHIA ESTADUAL DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA CEEE D
ADVOGADO : ROSANGELA CURTINAZ BORTOLUZZI E OUTRO(S)
INTERES. : ABRADEE ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISTRIBUIDORES DE ENERGIA ELÉTRICA – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADO : GUILHERME RIZZO AMARAL E OUTRO(S)
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)
INTERES. : AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL – “AMICUS CURIAE”
PROCURADOR : DANIEL GUSTAVO SANTOS ROQUE E OUTRO(S)
INTERES. : INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR IDEC – “AMICUS CURIAE”
ADVOGADA : MARIANA FERREIRA ALVES E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO. ENERGIA ELÉTRICA. TARIFA. REPASSE DAS CONTRIBUIÇÕES DO PIS E DA COFINS. LEGITIMIDADE.
1. É legítimo o repasse às tarifas de energia elétrica do valor correspondente ao pagamento da Contribuição de Integração Social – PIS e da Contribuição para financiamento da Seguridade Social – COFINS devido pela concessionária.
2. Recurso Especial improvido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08⁄08.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI(Relator):
1.A questão jurídica central diz respeito à legitimidade do repasse, às faturas de energia elétrica a serem pagas pelos consumidores, do valor correspondente às contribuições do PIS e da COFINS incidentes sobre o faturamento das empresas concessionárias. A matéria está claramente prequestionada e, ainda que tratem de repasse em tarifas de telefonia, os precedentes indicados como paradigmas enfrentam o mesmo tema, dando-lhe solução diferente da que lhe atribuiu o acórdão recorrido. Invoca-se no recurso, ademais, que o acórdão recorrido deu interpretação extensiva ao § 3º do art. 9º da Lei 8.987⁄95, cujo comando, destarte, não foi devidamente observado, no entender do recorrente. O recurso, portanto, atende satisfatoriamente os requisitos de admissibilidade.

2.Afasta-se, também, a alegação de incompetência da Justiça Estadual, feita em contra-razões. A competência cível da Justiça Federal é ratione personae, somente se configurando pela efetiva presença, no processo, de um dos entes federais enumerados no art. 109, I da Constituição, o que não ocorre na hipótese.

3.No mérito, não há como acolher o recurso. A tese defendida pelo demandante e aqui chancelada pelo IDEC e pelo Ministério Público, parte de um pressuposto manifestamente equivocado: o de atribuir à controvérsia uma natureza tributária. Com efeito, a relação jurídica que se estabelece entre concessionária e consumidor de energia elétrica não é relação tributária, cujos partícipes necessários são o Fisco e o contribuinte. Aqui, o que se tem é relação de consumo de serviço público, cujas fontes normativas são próprias, especiais e distintas das que regem as relações tributárias. Em outras palavras, o que está em questão não é saber se o consumidor de energia elétrica pode ser alçado à condição de contribuinte do PIS e da COFINS, que à toda evidência não o é, mas sim a legitimidade da cobrança de uma tarifa, cujo valor é estabelecido e controlado pela Administração Pública e no qual foi embutido o custo correspondente aqueles tributos, devidos ao Fisco pela concessionária. Essa a questão.

4.Esse argumento equivocado, de justificar com base no direito tributário a ilegitimidade do repasse das contribuições do PIS e da COFINS, foi também invocado em relação às tarifas de telefonia, objeto de exame nesta Seção no REsp 976.836⁄RS, Min. Luiz Fux, julgado em 25.08.10 sob o regime do art. 543-C do CPC. Na oportunidade, a Seção, por representativa maioria, deixou anotada a impropriedade da qualificação tributária que se pretendeu dar à questão, cujo deslinde, na verdade, deveria se dar à luz do regime jurídico estabelecido pelas normas próprias da concessão do serviço público e da correspondente política tarifária. Conforme registrou o Ministro Luiz Fux, na ementa do acórdão, “o repasse de tributos para o valor da tarifa (…) não obedece ao regime tributário da responsabilidade tributária, por transferência, sucessão ou substituição, senão ao edital, ao contrato de concessão, aos atos de regulação do setor e ao Código de Defesa do Consumidor”. Nessa consideração, a Seção decidiu que a legitimidade do repasse tinha sustento no art. 9º, §§ 2º e 4º da Lei 8.987⁄95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, e dos artigos 93, VII e 103, § 4º da Lei 9.472⁄97, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, bem como nos atos normativos da Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL e nos contratos de concessão. Invocou-se, nomeadamente no voto do Ministro Mauro Campbell Marques, a Lei 8.666⁄93, que disciplina o regime das licitações e dos contratos administrativos, cujo art. 65, II, d e § 5º consagra o princípio da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da avença, autorizando a revisão da tarifa, entre outras hipóteses, em face do advento de encargos de natureza tributária que produzam repercussão nos preços contratados.

5.Mutatis mutandis, os mesmos fundamentos justificam, aqui, a manutenção do acórdão recorrido. Segundo dispõe o art. 9º da Lei 8.987⁄97, “a tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta lei, no edital e no contrato”. Dada a natureza onerosa e sinalagmática da prestação dos serviços concedidos, é inafastável que a contraprestação a cargo do consumidor (tarifa) seja suficiente para retribuir, pelo menos, os custos suportados pelo prestador, razão pela qual é também inafastável que, na fixação do seu valor, sejam considerados, em regra, os encargos de natureza tributária. É também decorrência natural do caráter oneroso e sinalagmático do contrato de concessão a manutenção, durante toda a sua vigência, da equação econômico-financeira original. Nesse sentido, dispôs a Lei no § 2º do mesmo artigo 9º:

§ 2º Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro.
E entre as hipóteses de revisão tarifária está justamente a do aumento de encargos de natureza tributária, conforme prevê o § 3º, a saber:

§ 3º Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos.

Não se pode dar razão, assim, à alegação central do recurso, de que o repasse das contribuições do PIS e da COFINS às tarifas de energia elétrica ofende o art. 9º da Lei 8.987⁄97. Pelo contrário: foi justamente amparado nesse dispositivo de lei que a 1ª Seção, julgando o antes referido REsp 976.836⁄RS, decidiu pela legitimidade de repasse semelhante, ocorrido em relação às tarifas de serviço de telefonia, infirmando, assim, frontalmente, o entendimento dos acórdãos invocados como paradigmas no recurso especial. São razões por si só suficientes para manter o entendimento do acórdão recorrido.

6.Cumpre registrar, ainda, embora essa questão não integre propriamente o âmbito da controvérsia, que, no que se refere especificamente às tarifas de energia elétrica, o repasse das contribuições do PIS e da COFINS, além de observar as condições e os limites estabelecidos na lei e no contrato, se deu de forma transparente, de modo a evitar dificuldades à compreensão por parte do consumidor, sendo que o repasse é por valor proporcional e limitado à “repercussão econômica do faturamento da empresa com a atividade de distribuição de energia elétrica”. É o que se depreende da manifestação da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL, na sua condição de órgão estatal encarregado do controle da prestação desse serviço público e, nesse processo, como amicus curiae, a saber:

(…)
Conforme previsto nos contratos de concessão do serviço público de distribuição de energia elétrica, os custos incorridos pelas concessionárias de distribuição são, para efeitos de revisão e reajuste tarifários, divididos em duas parcelas:

(i) Parcela A, na qual se inserem os custos não gerenciáveis pelas concessionárias de distribuição;
(ii) Parcela B, na qual se inserem os custos gerenciáveis pelas concessionárias de distribuição.

Os custos imputáveis aos concessionários – custos gerenciáveis – não poderão ser invocados contra o Poder concedente para que haja recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão. Os custos da Parcela A, por sua vez, são repassados para as tarifas cobradas dos consumidores das concessionárias. Os tributos, como regra geral, por fazerem parte da Parcela B da receita das concessionárias, são analisados em cada período tarifário, de tal modo que a tarifa contempla receita suficiente para custear aquelas obrigações tributárias que incidem sobre a concessão.
Assim, antes das alterações surgidas com o advento das leis anteriormente mencionadas, havia, nas tarifas homologadas pela ANEEL, um montante tarifário destinado a cobrir os custos que os concessionários incorriam com o pagamento do PIS⁄PASEP e da COFINS. O valor desses tributos, portanto, já estava incluído no valor das tarifas cobradas dos consumidores.
Como anteriormente ao advento das Leis 10.637⁄02, 10,833⁄03 e 10.865⁄04 não havia a previsão de deduções quanto ao PIS⁄PASEP e à COFINS, não havia celeuma a ser tratada, já que a simples previsão da alíquota desses tributos equivalia ao custo efetivo da obrigação tributária (0,65% para o PIS⁄PASEP e 3,00% para a COFINS).
Com a instauração de uma sistemática não-cumulativa, implementada com a edição das Leis 10.637⁄02, 10.833⁄03 e 10.865⁄04, o custo efetivo com o pagamento dos mencionados tributos passa a ser variável, não mais correspondendo ao equivalente simples dos percentuais das alíquotas, tal como anteriormente fixado. Desse modo, não há como se antever qual o valor exato que será despendido pelos concessionários passou a depender não somente da alíquota fixada, mas também da verificação ou não das hipóteses de creditamento das etapas precedentes.
Desta forma, como as tarifas dos concessionários de distribuição de energia elétrica contemplavam apenas o montante anteriormente correspondente à alíquota desses tributos, eventuais diferenças, para mais ou para menos, entre o valor coberto pela tarifa e o efetivamente despendido pelo concessionário só poderiam ser revistos mediante Revisão Tarifária Extraordinária, aumentado ou reduzindo a tarifa a ser cobrada.
Com efeito, após a edição das Lei 10.637⁄02, 10.833⁄03 e 10.865⁄04, a alíquota do PIS⁄PASEP foi majorada, passando de 0,65% para 1,65% e da COFINS de 3,00% para 7,60%. Contudo, como essas mesmas leis que majoraram as alíquotas também criaram uma série de deduções a serem feitas na definição do montante final a ser recolhido junto ao Fisco, duas situações perversamente gravosas para a concessão poderiam ocorrer. Para exemplificá-las, são elucidativos os dois extremos:

(i) O montante repassado à tarifa de 3,65% é menor que o necessário para arcar com o custo efetivo desses tributos, que pode chegar até o máximo de 9,25% caso não haja nada a ser compensado em determinado mês de exercício do concessionário. Nesse caso, o concessionário estaria sofrendo uma mitigação indevida na parcela de retribuição que lhe fora assegurada quando anuiu em prestar o serviço concedido.
(ii) Diametralmente oposto, o montante repassado à tarifa de 3,65% é maior que o necessário para arcar com o custo efetivo desses tributos, que não obstante possa chegar até 9,25%, em razão de haver inúmeras possibilidades de compensação, o custo efetivo pode ser igual a zero. Nessa segunda hipótese, o concessionário estaria se locupletando indevidamente em detrimento do consumidor, sem justa causa para tanto.

Em ambas as hipóteses, há desvirtuamento da concepção neutra que a carga fiscal deve corresponder no trato das concessões públicas.
Em razão dos institutos de recomposição da tarifa restarem adstritos (i) à revisão – ordinária ou extraordinária – e (ii) ao reajuste a hipótese então cabível para solver essa situação seria a revisão tarifária extraordinária de todos os concessionários de distribuição de energia elétrica, aumentado ou reduzindo a tarifa.
Mas a revisão tarifária extraordinária não extirparia a possibilidade de haver novo descompasso entre o repasse tarifário e os custos efetivos com esses tributos para os meses seguintes à sua realização. É que a revisão extraordinária, apesar de seguir a mesma sistemática da ordinária, apenas corrigiria a situação pretérita, e não a futura, pois novas oscilações quanto à geração de créditos ou não nas etapas precedentes poderia reconstituir essa situação caótica e gerar, por conseqüência, a necessidade de novas revisões extraordinárias.
Acaso não houvesse uma alteração no trato dessa questão, as revisões extraordinárias – como a própria terminologia suscita – que foram criadas para casos excepcionais poderiam vir a ocorrer seguidamente, desvirtuando a essência do instituto.
E, em razão dos tributos constituírem itens da Parcela B, a revisão dos seus valores, de forma ordinária, só poderia ser feita a cada 4 ou 5 anos, a depender da data do contrato, de tal modo que ainda que não houvessem sucessivas revisões extraordinárias, ao cabo de toda revisão tarifária haveria uma ativo ou passivo regulatório a ser tratado. Ou seja, além de ter que analisar todos os elementos que integram a revisão tarifária ordinária – o reposicionamento tarifário e o Fator X – a ANEEL ver-se-ia obrigada a aumentar a tarifa para os consumidores (nos casos em que os custos efetivos com o tributo fossem maiores que o repasse tarifário) ou diminuí-la, em razão de um lucro indevido que o concessionário obteve (nos casos em que o repasse tarifário foi maior que os custos efetivos), sem poder extirpar essas anormalidade.
Diante desta nova realidade, surgiu a necessidade de alteração na sistemática de cobrança destes tributos, tendo em vista que, conforme já salientado, a alteração na carga fiscal que repercute na concessão outorgada deve manter caracteres de neutralidade quanto ao equilíbrio econômico-financeiro acertado quando da celebração dos contratos de concessão.
A solução encontrada pelas áreas técnicas da ANEEL para conformar a cobrança dos tributos à nova realidade jurídica instalada com a legislação em questão foi a de se estender ao PIS⁄PASEP e a COFINS o mesmo tratamento conferido ao ICMS, ou seja, seus valores passaram a não mais ser incluídos nas tarifas de energia elétrica, ficando a cargo dos agentes cobrar tais valores diretamente nas faturas de energia elétrica.
Note-se que essa nova sistemática trouxe dois novos comandos que se complementam:

i) exclusão da tarifa “das alíquotas econômicas do PIS⁄PASEP e da COFINS” – com isto a “Parcela B” das tarifas sofre uma redução;
ii) autorização para inclusão “despesas do PIS⁄PASEP e da COFINS efetivamente incorridas pela concessionária no exercício da atividade de distribuição de energia elétrica” – com isso o consumidor não tem a repercussão econômica de todo o tributo, que incide sobre o faturamento total da empresa, mas apenas a repercussão econômica do faturamento da empresa com a atividade de distribuição de energia elétrica.

Desta feita, a exclusão da cobertura tarifária na Parcela B não autoriza a conclusão de que os concessionários passariam a arcar com as despesas desses impostos, dado que se trata de repercussão econômica do tributo. Cuida-se tão somente de não mais serem homologados repasses tarifários para fazer frente ao pagamento desses tributos. Em outras palavras, a ANEEL, ao homologar as tarifas máximas para o período tarifário do concessionário, não será obrigada a embutir parcelas na tarifa para custear o pagamento destes tributos.
A repercussão econômica destes tributos, todavia, não pode ser negada, de modo que a ANEEL, ato contínuo, autorizou a cobrança em destaque das despesas tributárias efetivamente incorridas pela concessionária no exercício da atividade de distribuição de energia elétrica.
Não se altera, com isso, a sistemática constitucional de tributo direto, nem também:

(i) o responsável tributário, que continua sendo a concessionária;
(ii) o fato gerador, que continua sendo o faturamento;
(iii) a base de cálculo, que continuam sendo o valor do faturamento da empresa, e não o consumo de energia.

A solução mostra-se consentânea com os postulados da razoabilidade, melhor adequação ao regime tarifário pelo preço e a transparência nas relações entre concessionários e usuários. Isso porque, além de atender aos parâmetros do razoável, a modificação na forma de cobrança também melhor se amolda ao regime tarifário pelo preço – típico do serviço de distribuição de energia elétrica. Ademais, ao se possibilitar a apartação desses tributos do repasse tarifário, as competências homologatórias da ANEEL na fixação da tarifa deixarão de ser feitas com base na análise contábil dos custos dos concessionários – típica do regime pelo custo e sujeitas à assimetria de informação. A ANEEL não terá, portanto, que mensurar e analisar, previamente, comportamentos que os concessionários terão de adotar no trato de suas obrigações tributárias para conferir repasse tarifário à composição de suas novas receitas requeridas para os próximos períodos tarifários.
Em harmonia com a Lei nº 8.987⁄95, a Lei nº 9.427⁄96, além de atribuir à ANEEL a competência para homologar reajustes e proceder à revisão de tarifas, dispôs, em seus artigos 14 e 15, sobre a aplicação do regime do serviço pelo preço à fixação das tarifas do serviço público

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