Dono da dívida – Construtora paga condomínio enquanto não transferir bem

Construtora paga taxa de condomínio enquanto não transferir imóvel para o proprietário. O entendimento é da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Os desembargadores condenaram uma construtora de Belo Horizonte a pagar as taxas condominiais em atraso, relativas a um apartamento que vendeu, mas que ainda está registrado em cartório como de sua propriedade. A construtora deverá quitar as taxas de julho de 2003 até janeiro de 2007.

A ação foi movida pelo comprador do apartamento. A construtora se defendeu. Afirmou não ser parte legítima no processo porque os débitos são de responsabilidade dos promissários compradores do imóvel, desde que passaram a ocupá-lo.

O juiz Llewellyn Davies A. Medina, da 13ª Vara Cível, condenou a construtora a pagar mais de R$ 3 mil, valor relativo às taxas condominiais dos meses de julho de 2003 a janeiro de 2007 e a quitar os encargos condominiais vencidos durante o curso da ação. A empresa recorreu. A sentença foi mantida pelo TJ mineiro.

A relatora do recurso, desembargadora Selma Marques, considerou que as taxas cobradas são de responsabilidade da construtora, na qualidade de proprietária da unidade habitacional geradora do débito. “É ela que detém relação direta de responsabilidade com o condomínio, não lhe socorrendo o argumento de que não seria responsável pelas taxas posteriores à ocupação do imóvel”, explicou.

“Além disso, a promessa de compra e venda foi realizada por instrumento particular não registrado e, por conseguinte, não pode ser oposta ao condôminio, pois não tem validade perante o mesmo, tendo em vista a ausência de registro do contrato”, concluiu.

Votaram de acordo com a relatora os desembargadores Fernando Caldeira Brant e Afrânio Vilela.

Processo 1.0024.07.488594-8/001

Leia a decisão

Número do processo: 1.0024.07.488594-8/001(1)

Relator: SELMA MARQUES

Relator do Acordão: SELMA MARQUES

Data do Julgamento: 12/12/2007

Data da Publicação: 12/01/2008

EMENTA: AÇÃO DE COBRANÇA – TAXA CONDOMINIAL – RESPONSABILIDADE DE PAGAMENTO DO CONDOMÍNIO – PROPRIETÁRIO, PROMITENTE COMPRADOR, CESSIONÁRIO OU PROMITENTE CESSIONÁRIO – JUROS DE MORA. A taxa condominial possui natureza propter rem, acompanhando a coisa, independentemente de quem esteja na sua posse. A relação existente entre o proprietário que celebra contrato de compra e venda do imóvel e o promissário comprador constitui res inter alios em face do Condomínio, respondendo aquele, na qualidade de proprietário da unidade habitacional geradora do débito, pelas taxas condominiais em atraso de seu imóvel.

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 11ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR A PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO AO APELO.

Belo Horizonte, 12 de dezembro de 2007.

DESª. SELMA MARQUES – Relatora

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

A SRª. DESª. SELMA MARQUES:

VOTO

Cuida-se de apelação interposta contra a r. sentença de f. 88/89, que julgou procedente o pedido de cobrança de taxas condominiais ajuizado pelo Condomínio do Edifício Residencial Mar Egeu contra a MRV Serviços de Engenharia Ltda., condenando-o aos pagamentos requeridos na inicial, acrescido de multa moratória de 2%, além de juros de mora de 1% ao mês a partir do vencimento de cada parcela e correção monetária até a data do efetivo pagamento.

Inconformada, f. 90/105, apela a requerida, aduzindo, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva, porque os débitos relacionados na inicial são de responsabilidade dos promissários compradores do imóvel. Com isto, requer a inclusão destes últimos na lide como litisconsortes necessários. No mérito, repete a tese de ausência de sua responsabilidade quanto ao débito e afirma que não há prova da inadimplência. Por fim, questiona os valores cobrados.

Conheço do recurso, porque presentes os pressupostos de sua admissibilidade.

Versam os autos sobre ação de cobrança de taxa condominial proposta pelo Condomínio contra a MRV Serviços de Engenharia, visando ao recebimento das parcelas relativas às taxas ordinárias dos meses de julho de 2003 a janeiro de 2007 e aquelas que se vencerem no curso da lide.

Bate-se a ré pela sua ilegitimidade passiva, porque os débitos relacionados na inicial são de responsabilidade dos promissários compradores do imóvel.

Não lhe assiste qualquer razão neste ponto.

Nos termos da Lei n. 4.591/64, a responsabilidade direta das despesas de condomínio é do proprietário. Pode ser que este, eventualmente, tenha direito de regresso contra outrem, como parece ser o caso, ante o teor do documento de f. 54 (cláusula 8.1).

Entretanto, isto não tem o condão de afastar a responsabilidade do recorrente, pois a taxa condominial não é devida em razão da ocupação do imóvel, tratando-se de obrigação “propter rem”, a qual possui característica própria dos direitos reais, isto é, de acompanhar a coisa objeto do direito em decorrência de cuja existência a obrigação nasceu.

Além disso, o condomínio é terceiro alheio à relação jurídica firmada no mencionado termo, pois a obrigação dele decorrente advém de vínculo negocial que faz lei entre as parte que o celebraram, ou seja, o recorrente e os terceiros mencionados.

Aliás, é pacifico o posicionamento de que mesmo estando o imóvel locado, emprestado ou retido a que título seja, seus encargos serão assumidos pelo proprietário, pois o condomínio é terceiro nesta relação jurídica, não podendo ser prejudicado em seus direitos por situação a que não deu causa direta ou indiretamente, não podendo ficar prejudicado em sua defesa, que é a penhora do bem em caso de não pagamento, visto que o imóvel responde pelas dívidas condominiais.

Neste sentido o entendimento doutrinário:

“Incorre em erro quem pretenda a possibilidade de alteração do pólo passivo da relação jurídica, de contribuir para a despesa comum em decorrência de qualquer ato não transmissivo do domínio, porque tais contribuições independem da efetiva utilização da coisa comum. A promessa de compra e venda da unidade autônoma, a locação da unidade a terceiros geram, por certo, uma pretensão ao condômino no sentido de ver atendido, pelo adquirente ou pelo inquilino, o pagamento das contribuições à despesa comum. Entretanto, tal obrigação contratual não tem efeitos em relação ao Condomínio, terceiro alheio à relação das partes contratantes. Isto por que a obrigação de contribuir do condômino ao Condomínio decorre de lei, e a obrigação de contribuir do terceiro, quando existente, decorrerá do contrato, portanto, com origens e naturezas distintas.” (Manual Teórico e Prático do Condomínio – JOÃO ALFREDO MELLO NETO – Ed. Aide, p.102).

Colha-se, ainda, a lição de Maria Helena Diniz, constante de sua obra “Código Civil Anotado”, Saraiva, 8ª ed., 2002, p. 829, a respeito do tema, ao comentar o art. 1.345 do CC/02:

“Quem vier a adquirir unidade imobiliária deverá responder pelas dívidas do alienante, relativas ao condomínio, inclusive pelas multas e juros moratórios, por serem obrigações propter rem. Isto é assim porque as dívidas condominiais são débitos do imóvel e o acompanham, independentemente de o proprietário haver mudado ou não. Assim, quem adquire o imóvel cujos débitos estão sendo cobrados assume a obrigação de saldá-los (1º TARJ, Adcoas, 1982, n. 82.356).”

Portanto, o devedor das taxas de condomínio cobradas nos autos é do réu, recorrente, na qualidade de proprietário da unidade habitacional geradora do débito, posto que detêm relação direta de responsabilidade com o Condomínio, não lhe socorrendo o argumento de que não seria responsável pelas taxas posteriores à ocupação do imóvel.

A propósito:

“O condômino responde pelo débito condominial anterior à aquisição da unidade, mesmo havendo declaração expressa na escritura no sentido de que inexistia dívida, pois tal questão, quanto ao condomínio, é res inter alios, reconhecido, todavia, o direito de regresso do adquirente contra o alienante. Porém, alienado o bem pelo condômino, no curso da ação, responde ele apenas até o ato de alienação, independentemente do registro do título, passando a obrigação, a partir daí, a ser de responsabilidade do adquirente da unidade” (RT 780/284).

“Condomínio. Proprietário. Responsabilidade. Responde o proprietário pelas despesas de condomínio do imóvel mesmo que ocupado por terceiro a qualquer título que seja, visto que a relação existente entre o mesmo e terceiro constitui res inter alios em face do Condomínio.” (Apelação Cível nº 334.252-5, 1ª Câmara Civil do TAMG, Relatora Juíza Vanessa Verdolim Andrade, j. 22 de maio de 2001.)

Além disto, a promessa de compra e venda foi realizada por instrumento particular não registrado e, por conseguinte, não pode ser oposto ao condomínio, pois não tem validade perante o mesmo, tendo em vista a ausência de registro do contrato, só produzindo referido instrumento efeitos entre os contratantes.

Assim, se conclui que só poderia o condomínio acionar a pessoa em nome de quem o imóvel estava registrado no Cartório de Registro de Imóveis, ou seja, a recorrente.

Dessa forma, forçoso concluir que ela é parte legítima para figurar no pólo passivo da demanda, tendo em vista que o imóvel se encontra registrado em seu nome.

Rejeito a preliminar.

No mérito, afirma a ré que não há prova de sua inadimplência, questionando também os valores cobrados.

Entendo, contudo, sem razão o recorrente.

Como se sabe, o Código de Processo Civil vigente distribui o ônus da prova de igual forma entre as partes, cabendo ao autor demonstrar o fato constitutivo do seu direito (art. 333, I) e ao réu, a seu turno, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo daquele (art. 333, II).

A propósito, ensina MOACYR AMARAL SANTOS que, em Juízo, “os fatos não se presumem. A verdade sobre eles precisa aparecer: os fatos devem ser provados.”

Sobre o ônus da prova, leciona HUMBERTO THEODORO JÚNIOR:

“Não há um dever de provar, nem à parte contrária assiste o direito de exigir a prova do adversário. Há um simples ônus, de modo que o litigante assume o risco de perder a causa, se não provar os fatos alegados e do qual depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional. Isto porque, segundo máxima antiga, fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente. No dizer de Kisch, o ônus da prova vem a ser, portanto, a necessidade de provar para vencer a causa, de sorte que nela se pode ver uma imposição e uma sanção de ordem processual” (grifos do autor) (“Curso de Direito Processual Civil”, Forense, 25ª ed. , vol. I, 1998, p. 423).

“Quando o réu contesta apenas negando o fato em que se baseia a pretensão do autor, todo o ônus probatório recai sobre este. Mesmo sem nenhuma iniciativa de prova, o réu ganhará a causa, se o autor não demonstrar a veracidade do fato constitutivo do seu pretenso direito. Actore non probante absolvitur reus.” (HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, Curso de Direito Processual Civil, vol. 1, Forense, 20a ed. , p. 424).

Ao condômino inadimplente cabe demonstrar a ilegalidade da cobrança, de forma a exonerar-se da obrigação.

Segundo a técnica processual vigente, não cabe ao réu apenas declinar que não são devidos os valores das taxas de condomínio genericamente, e sim, demonstrar aquilo que efetivamente pagou, ou seja, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, o que não ocorreu no presente caso.

Pelo exposto, rejeito a preliminar e nego provimento ao recurso.

Custas recursais, pelo apelante.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): FERNANDO CALDEIRA BRANT e AFRÂNIO VILELA.

SÚMULA : REJEITARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO APELO.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.07.488594-8/001

Revista Consultor Jurídico

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