Credor indefinido – Clube alemão deposita dinheiro por compra de jogador

por Fernando Porfírio

O clube alemão Werder Bremen ganhou, nesta quinta-feira (24/4), o direito líquido e certo de fazer depósito em juízo da dívida que tem com a compra do jogador Carlos Alberto, que atuou no Corinthians. O craque foi transferido para o futebol alemão por 8 milhões de euros, sobrando hoje um débito de 4 milhões. O restante da dívida estava previsto para ser quitado este ano com uma parcela a ser paga em janeiro e outra em dezembro. O problema é que os alemães não sabem a quem pagar. A decisão, por votação unânime, é da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça.

O Corinthians diz que é o credor do dinheiro porque as negociações só podem ser feitas entre clubes, e, portanto, os quatro milhões de euros pertencem ao time do Parque São Jorge. O MSI, por sua vez, não abre mão de receber o restante da dívida. Os alemães, para se precaverem, preferem depositar em juízo, com temor de no futuro a empresa (MSI) reclamar esse dinheiro.

Diante do dilema, o Werder teve que contratar um advogado brasileiro para garantir o direito de pagar a dívida. O motivo é que o time alemão negociou a transferência de Carlos Alberto diretamente com representantes do Grupo MSI, que desfaz parceria com o Corinthians e o time paulista só assinou a liberação do jogador.

O clube alemão queria quitar a primeira parcela da dívida, prevista para 4 de janeiro, mas não sabia como fazer. Decidiu recorrer à Justiça e entrou com ação de consignação de pagamento na 1ª Vara Cível Central da Capital paulista. São réus no processo o MSI Group Limited, o Rio Football Service Limited e o Sport Club Corinthians Paulista.

A juíza Cynthia Torres Cristófaro, da 1ª Vara Cível da Capital, determinou a extinção da ação, sem o julgamento de mérito, com o fundamento de que a Justiça paulista não teria competência para julgar o caso. A magistrada justificou sua decisão com o argumento de que o Werder Bremen tinha sede na Alemanha, enquanto o Corinthians tinha sede no Brasil e os outros envolvidos no processo estavam sediados em outros países, como as Ilhas Virgens (caso da MSI) e Gilbratar e Israel (Rio Football Service Limited).

Ela afirmou também que, como no contrato as partes escolheram a cidade de Nova York e até apontaram uma conta da agência Bradesco de Nova York para o pagamento da dívida, a Justiça brasileira não teria atribuição para julgar pretensão do clube alemão. A juíza entendeu que o melhor local para decidir o litígio seria o Tribunal Arbitral da Federação Internacional de Futebol (Fifa).

O Tribunal de Justiça decidiu que a ação proposta pelo clube alemão foi apresentada à Justiça paulista por conta da dúvida do Werder sobre a quem pagar quantia. Ainda de acordo com a turma julgadora, com a decisão de primeira instância de extinguir a ação, surgiu a possibilidade de perigo do time alemão arcar com prejuízo por conta da falta de depósito em juízo.

Para o relator, desembargador Fábio Quadros, a decisão da juíza da 1ª Vara Cível ofendeu o princípio constitucional que impede o afastamento de controle jurisdicional. Na opinião do relator, um dos réus, o Corinthians, tem domicílio no país. E o outro, o MSI, escritório que cuida de seus interesses no Brasil.

Leia a decisão cassada pelo TJ

Trata-se de pedido de consignação em pagamento de prestação devida pela autora em razão da “compra” de jogador de futebol contratada com o Corinthians, fundada a pretensão em dúvida quanto a quem seria legítimo credor em razão de afirmação que teria sido dirigida à requerente por MSI e Rio no sentido de que seriam as titulares dos direitos sobre o jogador transferido à autora.

É o relatório do essencial.

Decido.

É de ser de plano reconhecida e declarada a incompetência deste Juízo para processo e julgamento da ação consignatória proposta. A autora, que litiga sem oferecer caução, é domiciliada na Alemanha, ao passo que, dos réus, Corinthians é domiciliado no Brasil, nesta Comarca de São Paulo, MSI é domiciliada nas Ilhas Virgens e Rio é domiciliada em Gibraltar e estabelecida em Israel. Ocorre que explicita a requerente na própria inicial que, tal como o pagamento já realizado, relativo à primeira parcela do ajuste que celebrou com o Corinthians, o pagamento da parcela que se irá vencer ainda em 04/01/2008, o qual se pretende consignar, haveria de ser realizado nos Estados Unidos da América, na cidade de Nova Iorque.

Ora, irrelevante a situação de domicílio das partes envolvidas no feito consignatório, é expresso o artigo 891 do CPC ao dispor que a consignação será requerida no lugar do pagamento, convindo notar que o contrato, que se encontra copiado a fls. 36/40, expressamente estabelece no item 2.3 modo e local de pagamento (“na conta bancária do CONRINTHIANS abaixo indicada: Banco Bradesco SA / Agência: New York Bank, Conta Corrente: 655041289 / Bank of América New York / Swift BBDEBRSPSPO”). Releva notar, outrossim, que as partes não elegeram foro contratual, porém optaram pela arbitragem, consoante disposto no item 5 do contrato, convindo destacar, ainda, que embora redigido o instrumento contratual em português e em inglês, expressamente dispuseram as partes prevalecer, para fins de interpretação do contrato, sua versão na língua inglesa, bem evidenciada por aí sua intenção de não trazerem eventual desacordo ao Judiciário no Brasil.

A regra do artigo 88, inciso I, do Código de Processo Civil, em face da qual se poderia cogitar de competência concorrente da autoridade judiciária brasileira em razão do domicílio do Corinthians no Brasil restaria superada porque, entre a autora e o único requerido domiciliado neste país, foi convencionada arbitragem (art. 267, VII, CPC), não prevalecendo ela, ademais, em se tratando de discussão acerca do cumprimento de obrigação a ser realizado fora do país. Dada a incompetência, que reclama pronunciamento de ofício, não comporta admissão a petição inicial, razão pela qual JULGO EXTINTO o processo sem apreciação de mérito, na forma do disposto pelo artigo 267 do Código de Processo Civil. Custas pela autora. P. R. I. São Paulo, 7 de dezembro de 2007.

Cynthia Torres Cristófaro Juíza de Direito

Revista Consultor Jurídico

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