Usando a Justiça para levar vantagem

O mundo realmente mudou. Agora a moda é processar por “danos morais”, não importando os fatos motivadores da demanda. O que estamos vendo é a verdadeira indústria do “dano moral”, usada para fins escusos, na contramão do objetivo da lei e do direito do cidadão resguardar sua honra atacada.

Agora, qualquer fato, mesmo que seja irrelevante, o “suposto ofendido” se sente “afrontado em sua honra”, e maliciosamente encontra argumentos para intentar ação e aborrecer pessoas apontadas como rés.

Fiquei sabendo que meses atrás um deputado federal do Estado foi processado nas pequenas causas por dano moral, onde o suposto “agredido” arbitrou a sua “honra” em 10 mil reais. A audiência foi marcada para uma quarta-feira à noite e, como o deputado estava em Brasília, mandou um representante. O preposto não foi aceito, em razão das normas do juizado em só aceitar a presença da pessoa processada, e o nosso parlamentar foi condenado em 10 mil reais.

Inacreditáveis as ponderações de certos pedidos de indenização por dano moral, que ao invés de circunscrever a “honra atacada”, passam a apontar ilações ou preconceitos, pretendendo ressarcimentos baseado em histórias subjetivas (me desculpe a franqueza).

Esta artimanha jurídica tem levado muitos políticos e seus asseclas, a usarem o instituto da indenização por danos morais como um instrumento de coação contra seus desafetos.

A imprensa noticia um fato, informando o que está ocorrendo em determinada administração ou fato originário de ato administrativo e, no outro dia, o jornalista que escreveu a matéria, junto com o dono do jornal, recebem intimação de “queixa-crime” e citação de ação de indenização por danos morais.

Em razão da nossa legislação penal, muitas vezes o acusado tem que passar por uma interminável relação processual, para posteriormente provar a sua inocência. Ao contrário, o dito “ofendido” (que se acha vítima de calúnia, injúria ou difamação), fica tranquilo com a absolvição de quem acusou. Se o inocente sentir-se prejudicado com o processo, deve intentar ação contra o acusador leviano, o que pode demorar anos e muitas vezes caducar a punição pelo lapso temporal.

Estas brechas jurídicas têm levado muitos políticos sob suspeita de corrupção a processarem os órgãos de imprensa e jornalistas, que informam as falcatruas e desvios do dinheiro público, com intuito de dar um “cala-a-boca” na liberdade de informação. A história é sempre a mesma, e poderíamos resumir no seguinte: primeiro o político que não é famoso vive paparicando jornalistas e donos de órgãos de imprensa, para ver suas fotos e seu nome destacado pelos veículos; posteriormente, quando conseguem ascensão na política, passam a ser intolerantes e arrogantes a qualquer matéria que critique a sua administração. E mesmo que a notícia veiculada não acuse, e apenas informe a versão das partes, creditam motivos suficientes para ingressarem com ação de “perdas e danos morais”.

Ao chegarmos à etapa acima citada, todo jornalista passa a ser um “achacador”, um “usurpador do bolso do político”, que não admitem que suas falhas administrativas sejam levadas ao conhecimento dos cidadãos, como se o poder público que administra fosse propriedade particular. A partir deste momento, no pensamento dos outrora bajuladores, nenhum jornalista informa, e sim, “destrói” a imagem do “homem público”, que se diz homem probo e “cidadão de moral inatacável”.

O que vejo com atitudes insanas de punir e criticar todas as informações de jornalistas é o lastimável predomínio da prepotência e da arrogância, que faz sucumbir a democracia, fazendo muitos profissionais da mídia cansarem de tentar mostrar a verdade, passando ao trivial, apenas para não serem esmagados pela máquina perversa da corrupção.

Acredito que este fato poderia mudar, dada a necessidade de termos imprensa livre informando à população as pilantragens que ocorrem com o dinheiro público. É “serviço de utilidade pública”, e a nação brasileira agradece.

Mas, para mudar, é necessário que os nossos magistrados analisem com rapidez, indeferindo, de plano, pedidos requeridos por puro “demandismo” do “moralmente afetado” pela matéria jornalística, especialmente daqueles ditos “homens públicos”, que podem estar tentando coagir a imprensa e calar a verdade.

Nestes casos, salutar seria condenar o acusador desvairado em litigância de má-fé, por tentar usar a Justiça para se beneficiar, cometendo um dos maiores crimes da humanidade: calar a imprensa.

E após o dito “perseguido” sentir que o Judiciário não é local para satisfazer interesses mesquinhos ou tacanhos, deverá dispor de uma parte de seu patrimônio (muitas vezes adquirido de forma suspeita), para corrigir seu pensamento errôneo quanto à finalidade da “indenização por dano moral”.

Sergio Maidana
Advogado em C. Grande

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