O Júri da mídia

( * ) José Wilson Furtado

Um dos julgamentos que mais abalou a história do Júri brasileiro nossa dias modernos foi sem sombra de dúvida o Júri em que sentaram no banco dos réus como homicida Guilherme de Pádua e sua mulher Paula Tomaz e como vítima, a atriz Daniela Perez, o rostinho lindo do Brasil de 22 anos que fora brutalmente trucidada com 18 golpes de tesoura.

Daniela Perez fora escolhida por sua própria mãe, a novelista Glória Perez, para viver o papel de Yasmim na Novela Corpo e Alma no horário das 20 horas, contracenando com Guilherme de Pádua que vivia na referida novela o personagem Bira, que por orientação da escritora era um indivíduo sisudo e que demonstrava sinais inequívocos de ciúmes de Yasmim.

A ficção transformou-se em realidade, Guilherme de Pádua não conseguiu esconder nos camarins da Rede Globo o seu lucifênico ciúme por Daniela Perez e de modo cruel, contando com vínculo psicológico da co-participação de sua mulher Paula Tomaz investiram violentamente contra a desditosa atriz ceifando-lhe a vida sem oferecer-lhe a mais ínfima defesa possível. O Brasil inteiro focou chocado sem acreditar no noticiário que escutava, o crime ocorreu na noite do dia 28 de dezembro do ano de 1992 por volta das 21 horas e 30 minutos logo após a atriz ter deixado os estúdios depois de um dia de gravação. O que mais revoltou a todos foi o cinismo do homicida Guilherme de Pádua que após ter consumado seu ignóbil ato de carnificina no dia seguinte procurou os familiares da vítima no caso a mãe Glória Perez, e o marido de Daniela Raul Gazolla para prestar solidariedade, dizendo-se que estava bastante emocionado e que a partir daquele momento não invidaria esforços e não sossegaria enquanto não por as mãos nos assassinos. Naquela ocasião Raul Gazolla ao ouvir o cínico homicida teria dito “este realmente é um grande amigo”. Uma semana antes da consumação do abruto ato sanguinolento a atriz Daniela Perez participou de um programa especial da Globo entitulado “Sexta Feira Especial”, onde encantou a todos fazendo o papel de Maria, a mãe de Jesus e que na referida minissérie encontrar-se-ia com Isabel (atriz Cássia Kiss), mãe de João.

Em reportagem publicada pelo jornal O Estado de São Paulo, edição do dia 22 de janeiro de 1997, o ator Guilherme de Pádua confessou ao repórter Gustavo Alves que mantinha um relacionamento amoroso com a atriz Daniela Perez “por interesse”. “Ela era a filha da autora da novela” e trabalhando ao lado de Daniele sua projeção artística subiria.

CRONOLOGIA DO JULGAMENTO

( Rio de Janeiro, 25/1/97 – Arquivos Wilson –Tribuna do Ceará)

0h 55 – volta a sessão, com o prosseguimento do discurso do assistente de acusação, Arthur Lavigne.

2 horas – termina o discurso de Lavigne. O juiz suspende a sessão.

2h 45 – Entra Arthur Lavigne na sala de audiência do I Tribunal do Júri.

2h 46 – Entra Glória Perez.

2h 53 – Recomeça a sessão, com a presença da familia de Pádua.

4h 08 – Glória Perez sai da sessão, enquanto Paulo Ramalho cita novamente a consulta que havia feito ao perito Abraão Lincoln, no qual ele dizia que os ferimentos que não provocaram a morte da vítima eram escoriações leves, e a que estava no olho esquerdo fora produzida entre 12 e 17 dias antes da morte .

4h 11- Ramalho passa mal e pede suspensão as sessão.

4h 39- Recomeça a sessão.

5h 48 – Glória Perez volta à sala de audiência, quando termina o discurso de Ramalho. O júri ouve o quesitamento e começa a reunião para se decidir.

7h 15 – Entra Glória Perfez na sala de audiência.

7h 43 Entre Guilherme de Pádua, ficando no banco das testemunhas, em frente ao juiz.

7h 47 – Entra os jurados, seguidos do juiz, acusação e defesa.

7h 56 – Platéia bate palmas pela sentença de condenação. Glória é abraçada pelos familiares.

7h 58 – Glória sai do plenário, com a família

8h 08 – Tumulto entre uma equipe da TV Globo e a segurança do júri envolve toda a imprensa localizada no saguão ao lado da sala de audiência.

8h 09 – Pádua é levado de camburão do prédio so I Tribunal do Júri para a garagem do Fórum do Rio de Janeiro, do outro lado da rua.

8h 15 – Pádua é levado para o presídio.

8h 37 – Glória Perez sai do tribunal, com a familiares.

SENTENÇA HISTÓRICA

Na madrugada do dia 25 de janeiro de 1997 o juiz José Geraldo Antônio presidente do Tribunal do Júri do Rio de Janeiro, depois da análise dos trabalhos da acusação e defesa proferiu a seguinte sentença:

“O réu Guilherme de Pádua Tomaz foi denunciado, pronunciado e libelado como incurso nas penas do art. 121 §2º, inciso 1 e inciso 4 do Código Penal Brasileiro, por ter no dia 28 de dezembro de 1992, no período noturno, em local erno existente na Barra da Tijuca, nesta cidade, fazendo uso de instrumento pérfuro-cortante, desferindo golpes em Daniela Perez Gazolla, causando-lhe, em conseqüência a morte, conforme descrito no alto de exame cadavérico de fls. 59/60. A acusação ainda envolve as qualificadoras do motivo torno e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima.

Interrogado o réu e relatado os autos, foram ouvidas as testemunhas presentes, conforme termos em apartado.

As diligências para plenário, requerida pelas partes, foram realizadas, conforme registro em ata.

As partes sustentaram suas pretensões em plenário. A acusação, patrocinada pelo ilustre Promotor de Justiça, Dr. José Muñoz Pinheiro Filho, e pelo digno Advogado Dr. Arthur Lavigne, que representou a assistência de acusação, pleiteando a condenação nos termos do libelo.

A defesa patrocinada pelo ilustre Advogado Dr. Paulo Roberto Alves Ramalho, sustentou a tese de negativa de autoria e, subsidiariamente, a do erro do elemento do tipo.

Formulados os quesitos, conforme termo próprio o conselho de sentença acolheu integralmente a pretensão acusatória.

Em face da decisão soberana dos senhores jurados, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal e CONDENO O RÉU GUILHERME DE PÁDUA TOMAZ nas penas do Art. 121, incisos 1 e 4 do Código Penal.

A sanção aplicada ao réu, dentro dos limites fixados em Lei, resultará das circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal.

A conduta do réu exteriorizou uma personalidade violenta, perversa e covarde quando destruiu a vida e uma pessoa indefesa, sem nenhuma chance de escapar ao ataque de seu algoz, pois, além da desvantagem na força física o fato se desesperador e agonizante da vítima.

Demonstrou o réu ser uma pessoa inadaptada ao convívio social, por não vicejarem no seu espírito os sentimento de amizade, generosidade e solidariedade, colocando acima de qualquer outro valor a sua ambição pessoal.

Diante destas circunstâncias, onde se acentuam intenso grau de culpabilidade, impõe-se uma resposta penal condizente com a exigência da necessidade e suficiência para reprovação e prevenção do crime consoante determina o dispositivo legal norteador da aplicação da pena.

O acusado, em que pese sua personalidade antes retratada, é primário.

Nestas condições, fixo a pena base em 19 (dezenove) anos de reclusão, tornando-a definitiva, ante a ausência de circunstância legal ou causa especial que justificariam sua alteração.

Condeno, ainda, o réu a pagar as custas do processo.

O regime prisional para o início do cumprimento da pena é o fechado.

Recomende-se o réu na prisão onde se encontra, porque lhe nego o direito de recorrer em liberdade, pelas razões de sua custódia preventiva e também por força desta condenação.

Transitada em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados e expessa-se carta de sentença.

Publicada nesta sessão plenária, intimada as partes, registre-se e comunique-se.

Rio de Janeiro, em 25 de janeiro de 1997

José Geraldo Antônio

Juiz Presidente

COMENTÁRIOS E CRÍTICAS À SENTENÇA QUE CONDENOU GUILHERME DE PÁDUA

Na qualidade de Jornalista auxiliar do jornal Tribuna do Ceará, tivemos a ousadia de em diversos artigos apontar algumas falhas processuais cometidas na sentença do juiz carioca que laborou um edito condenatório, demonstrando-se bastante emocionado com a situação da novelista Glória Perez, ao perder de modo abrupto a filha, vítima do palco de uma mefistofélica cena. Nos fragmentos abaixo explicitaremos as razões de nossa crítica, na qualidade de Promotor de Justiça e repórter policial.

1 – Procedimento Trifásico da Pena

Assim que o tumultuado Júri de Daniela Perez acabou, e, consequentemente o homicida Guilherme de Pádua fora condenado à pena de 19 anos de reclusão, surgiu uma plêiade de criminalistas que criticaram o resultado, que a sentença de pronúncia, por carência de fundamentação, revestiu-se de erros, por descumprir o entendimento semântico contido no aquiético disciplinador do art. 68 do vigente Código Penal Brasileiro que prescreve invermes: “A pena base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 desse Código; Em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; Por último as causas de diminuição ou de aumento”.

Quem teve a oportunidade de assistir ao Júri carioca, tão badalado pela mídia, face a vítima ser filha de uma novelista da Rede Globo do Sr. Roberto Marinho, sentiu que o Juiz José Geraldo Antônio talvez pelo cansaço de mais de 70 horas de trabalho, ou pelo clima emocional, proferiu a sentença sem atender o desenvolvimento do chamado método trifásico, consagrado pela legislação penal vigente, por força da Lei 7209 de 11 de julho de 1984, pois o juiz deveria fixar uma pena base, o que foi feito, depois declarar o aumento que vai dar a esta pena por cada qualificadora e finalmente a pena quando há circunstâncias atenuantes.

Trata-se pois do método trifásico, em que o comentarista do Código Penal Nelson Hungria, em sua celebérrima obra e a Legislação Penal hodierna consagrou.

Adverte o professor Damásio Evangelista de Jesus, um dos luminários membro do Ministério Público paulista: “O STF, na fixação da pena, adota a posição de Nelson Hungria. Numa primeira fase é fixada a pena base, considerando as circunstâncias judiciais do art. 59. Na segunda, incidem sobre a pena base eventuais circunstâncias agravantes e atenuantes, por fim, se for o caso, as causas de aumento e diminuição da pena” (Código de Processo Penal Anotado, Editora Saraiva, Ed. 2002, São Paulo, Página 228).

Ainda voltaremos a falar sobre o badalado da Daniela Peres, que com certeza ficará na estória (José Wilson Furtado, Jornal Tribuna do Ceará, Edição do dia 13 de fevereiro de 1997).

2 – O Júri e a mídia

Ódio, paixão e ciúme. O que teria reforçado o enleiro, para contribuir ao ânimos necande de Guilherme de Pádua, a ponto de na nefasta noite do dia 28 de dezembro de 1992 numa área erma, munindo-se de um instrumento perfuro cortante, eliminar de modo frio e pusilânime a jovem atriz Daniela Perez? O Ministério Público carioca em sua peça libelária lançou as qualificadoras do motivo torpe e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima.

Na sentença de pronúncia, que serviu de espelho ao libelo crime acusatório do Ministério Público, lavrada na madrugada de sábado, dia 25 de janeiro de 1997 o juiz presidente do Tribunal do júri José Geraldo Antônio tomando por base o veredicto popular, condenou o réu a pena concreta de 19 anos, tornando-a definitiva, ante a ausência de circunstância legal ou causa especial que justificaria sua alteração e ponderou: “A conduta do réu exteriorizou uma personalidade violenta, perversa e covarde”.

A mídia num eivo sensacionalista cognominou o caso Daniela Perez como “O julgamento da década” (Revista Isto É, n.º 1404, ed. 28/08/1996).

A novelista Glória Perez, mãe da vítima, mobilizou o país inteiro no sentido de que o homicida fosse condenado, e em entrevista concedida à repórter Eliane Lobato, sob o titulo Tensão Acumulada, Revista Isto É – 17/04/1996, declarou: “Quero na cadeia estes ratos de esgotos”. A condenação de Guilherme de Pádua no primeiro julgamento, no caso Daniele Perez, deixou Paula Tomás numa situação que os advogados consideraram bastante confortável. Como os jurados entenderam que Guilherme de Pádua foi o autor dos golpes que mataram Daniela Perez, Paula, denunciada como co-partícipe (Lei 7209/84, art. 29) poderia vir a ser inocentada.

Além disso, ela tem a seu favor o fato de ser primária e de que era menor de idade na época em que o crime ocorreu.

Já o Promotor de Justiça José Muñoz Pinheiro Filho como é óbvio pedira a ratificação do libelo crime acusatório, afirmando que “houve um vínculo psicológico de autoria” (José Wilson Furtado, Jornal Tribuna do Ceará, Ed. do dia 30/01/1997).

A LUTA HERCÚLEA DE UMA MAE EM DEFESA DE UMA FILHA

Recentemente o Bispo Marcelo Crivella. Em seu último Cd, num momento glorioso, fez uma homenagem a sua filha., NA música ” Minha Filha.

Um fragmento poético daquele iluminado homem de Deus nos chamou atenção:

‘ NO PALCO DA VIDA, QUANDO ABRE AS CORTINAS, você será sempre a minha estrela, minha filha minha menina;

Ai que vontade de voltar o tempo atras. Te carregar no colo,

Participar das brincadeiras, você cresceu, encontrou novos caminhos,

Mas ainda guardo com lembranças a sua foto na minha carteira”

Além de aparecer no cenário da televisão como novelista de desataque, autora de trabalhos, como ” barrigas de aluguel”, explode coação, e tanta outras, Glória Perez emocionou o país inteiro quando passou a encarar uma luta em prol da moralidade de sua filha.

Logo se comentou-se que o bárbaro crime com a atriz da globo, teve enleios de um crime passional, levantando-se, inclusive duvidas quanto á inegirader moral da atriz, o que fez com que suja mãe lutasse ardorosamente contra todos, inclusive se insurgindo contra a Procuradora Luiza Nagib Eluf, em trechos ciados em seu livro a paixão no banco dos réus, quando colocou o caso Daniele Perez como crime da emoção.

A procuradora Luiza Nagib Eluf levou três anos para concluir livro e foi contestada por Glória Perez, mãe de Daniella Perez, assassinada em 1992: “O crime envolvendo minha filha não foi passional”, diz a autora de novelas

A escritora Glória Perez, mãe da atriz Daniella Perez, morta em 1992, com 18 facadas dadas pelo ator Guilherme de Pádua – que contracenava com Daniella e cujo personagem era apaixonado pelo de Daniella

e a então mulher dele, Paula Thomaz, diz que o crime contra sua filha não é passional, como foi citado no livro. “Crime passional é cometido sob violenta emoção. Nesse caso, no dia do crime, o assassino estava gravando e perguntou ao produtor que espaço de tempo teria entre um cenário e outro”, diz Glória. “Depois, busca a mulher em casa, a esconde sob um lençol, adultera a placa do carro, espera Daniella na saída do estúdio e a embosca num posto de gasolina. Quer dizer: preparou-se o dia todo para ter um descontrole com hora marcada?”

A procuradora diz enfatizou que,, no caso de Pádua, apesar de não haver envolvimento comprovado, ele era obcecado por Daniella, sentiu ódio e quis eliminá-la. E ponderou “Em geral os assassinos não se descontrolam de repente, já estavam cogitando a violência. Todos os crimes passionais que citei foram premeditados. Pode haver a ‘violenta emoção’ (presente no artigo 121 do Código Penal) que ameniza a pena, mas é raro”, diz.

Quando não premeditado, o crime passional é cometido por uma pessoa em um estado de extrema emoção e que, segundo o psiquiatra Sérgio Rigonatti, do Instituto de Psiquiatria da USP, pode durar até 24 horas: “O teor da crítica cai, a pessoa perde a referência e age como animal”. Mas a autora do livro enfatiza: “A paixão só serve para explicar o crime, não para perdoar”. (Revista Isto é, Gente, ! Arquivos Wilson Furtado)

PERSONALIDADE CONTROVERTIDA DO HOMICIDA

Alguns autores que participaram da novela explode coração, de autoria de Gloria Perez, mãe da vítima Daniela Perez, quando ouvidos na imprensa esboçaram suas impressões; Em entrevista ao jornal Estado de S.Paulo, de 31 de dezembro de l992, José Mayer, o médico galão de “Mulheres apaixonadas, disse que Guilherme era um psicopata”, vivia ternso ,crispado, apesar de procurar ser gentil. Disse Ainda, acreditar ser possível que Guilherme tivesse misturado personagem e vida real.

Guilherme Fontes, na mesma reportagem, insinuou que Pádua seria homossexual, lembrando sua participação no show erótico gay, ” A noite dos Leopardos”. Maurício Mattar, ao ser ouvido na Delegacia, informou que Certa vez dividiu o camarim com Guilherme na peça Blue Jeans e verificou eu o colega levava objetos de magia negra consigo” (Matéria extraída, do Jornal, “Estado de S.Paulo, apud, “A paixão no Banco dos réus, Luiz Nagib Eluf, Editora Saraiva, ed. 2002, S.Paulo, loc, cit, pag.87)

A rede Globo de televisão, está apresentando ás Quintas feira, a seqüência, ” linha direta justiça,, ,mostrando para todo o Brasil, os julgamentos mais famosos, e, embora não tenhamos o Dom das Pitonisas, podemos afirmar, que o caso Daniele Perez, tem um espaço reservado, deste júri, que recebeu a antonomásia de júri da década, vale a pena esperar e ver pela telinha o que ora narramos com exclusividade.

José Wilson Furtado,Promotor de justiça titular da 7ª unidade dos Juizados Civeis e criminais, pós graduado em Processo Penal pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR)

( * ) O autor é Promotor de Justiça e titular da 7ª Promotoria de Justiça Criminal de Fortaleza e pós- graduado em Processo Penal pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR

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