Juiz não tem direito a recuperar inscrição antiga da OAB

Juízes e desembargadores do Rio Grande do Sul não têm direito a recuperar o número da antiga inscrição na OAB. Acórdão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça acatou o pedido da seccional gaúcha da OAB e vedou a restauração do número de inscrição em caso de cancelamento e posterior retorno aos quadros da entidade.

Para os ministros, o exercício de atividade incompatível com a advocacia acarreta o cancelamento da inscrição na OAB e não o seu licenciamento. “A imutabilidade de inscrição somente pode ser assegurada a quem não teve a inscrição cancelada, pois o cancelamento implica a eliminação total do vínculo do profissional com a instituição corporativa”, afirmou o ministro Castro Meira.

O advogado e juiz aposentado Miguel Juchem, impetrou Mandado de Segurança pelo reconhecimento do direito a restabelecer o número de sua inscrição original. O pedido de cancelamento foi feito em 1981, quando o advogado tomou posse como juiz. Após aposentar-se, em 1998, solicitou a sua inscrição no quadro de advogados, com a reativação de sua inscrição anterior, fundamentando o seu pedido na lei nº 4.215/63.

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região concedeu a segurança e determinou que a OAB-RS procedesse à inscrição de Miguel Juchem com o número original. A entidade, representada pelo advogado Pedro Maurício Machado, conselheiro da OAB gaúcha, recorreu ao STJ. A informação é do site Espaço Vital.

Sustentou que a decisão é contrária ao artigo 62 da Lei nº 4.215/63, que se limitava a assegurar a imutabilidade do número atribuído em ordem cronológica, e não para a inscrição subseqüente. Invocou também a Lei nº 8.906/94, que vedou expressamente a restauração do número anterior da inscrição.

A relatora, ministra Eliana Calmon, considerou que “quando o profissional assume, em caráter definitivo, cargo ou função incompatível com o exercício da Advocacia, necessariamente dá-se o cancelamento da sua inscrição, não tendo havido alteração do regime da lei 4.215/63 para o regime da lei 8.906/94. Para voltar a exercer a profissão, deve-se proceder a nova matrícula, daí porque não se pode falar em reativação da matrícula anterior, preservando-se o número antigo”.

O ministro Franciulli Netto, voto vencido, negou provimento ao recurso da Ordem. Ele considerou ser possível a inscrição do juiz aposentado na OAB com o seu número original. Os demais ministros da Turma votaram com a relatora.

RESP nº 475.616

Leia a íntegra do acórdão

RECURSO ESPECIAL Nº 475.616 – RS (2002⁄0148914-0)

RELATORA:MINISTRA ELIANA CALMON

RECORRENTE:ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – SECCIONAL DO RIO GRANDE DO SUL

RECORRIDO :MIGUEL ANTONIO JUCHEM

EMENTA

ADMINISTRATIVO – ADVOGADO – INSCRIÇÃO – CANCELAMENTO – NOVA INSCRIÇÃO – MANUTENÇÃO DO NÚMERO ORIGINÁRIO – IMPOSSIBILIDADE – VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC – QUESTÃO CONSTITUCIONAL.

1. Não cabe ao STJ, a pretexto de violação ao art. 535 do CPC, examinar omissão em torno de dispositivo constitucional, sob pena de usurpar a competência da Suprema Corte na análise do juízo de admissibilidade dos recursos extraordinários. Mudança de entendimento da Relatora em face da orientação traçada no EREsp 162.765⁄PR.

2. Tanto a Lei 4.215⁄63 quanto a Lei 8.906⁄94 estabelecem que o profissional que passasse a exercer, em caráter definitivo, cargo ou função incompatível com a advocacia necessariamente deve ter cancelada sua inscrição. O licenciamento, por sua vez, está previsto para a hipótese em que o profissional exerce, em caráter temporário, cargo ou função incompatível com a advocacia.

3. Cancelado o registro, seja na vigência do Estatuto antigo ou do novo regime, inexiste direito à manutenção do número da inscrição originária, pois o art. 11, § 2º da Lei 8.906⁄94 apenas explicitou o que já estava previsto no art. 62 da Lei 4.215⁄63.

4. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça “Prosseguindo-se no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Castro Meira, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora. Vencido o Sr. Ministro Franciulli Netto, que lhe negou provimento.” Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Castro Meira e Francisco Peçanha Martins votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília-DF, 09 de novembro de 2004 (Data do Julgamento)

MINISTRA ELIANA CALMON

Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: –

Trata-se de recurso especial, interposto com fulcro na alínea “a” do permissivo constitucional, contra acórdão do TRF da 4ª Região assim ementado: “MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO JUNTO À ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. CANCELAMENTO DECORRENTE DO EXERCÍCIO DE CARGO INCOMPATÍVEL COM O EXERCÍCIO DA ADVOCACIA. NÚMERO DE INSCRIÇÃO ANTIGO. LEI 4.215⁄64 E LEI 8.906⁄94. ULTRA-ATIVIDADE DA LEI EM QUE SE DEU A INSCRIÇÃO ORIGINÁRIA.

– Afastada a causa proibitiva do exercício da advocacia, em face de exercício de cargo incompatível com a mesma, e deferida a inscrição do profissional junto à OAB, regulará o ato de inscrição a lei em que se deu a inscrição originária, que na sua ultra-atividade deixará a salvo das reservas da nova lei o direito adquirido do inscrito.

– Tendo a inscrição originária se dado sob a égide da lei 4.215⁄63, onde o número do registro era imutável – art. 62 – não se aplica ao inscrito a vedação do art. 11, § 2º da lei 8.906⁄94, fazendo, pois, o inscrito jus a restabelecer seu número originário de inscrição.

– Apelação e remessa oficial improvidas”. (fls. 200)

Sustenta a OAB que a rejeição dos embargos declaratórios afrontou o art. 535, II do CPC, porque não se manifestou o Tribunal de origem sobre o art. 5º, XXXVI da CF, relativamente à tese da existência de mera expectativa de direito ao número antigo de inscrição, porque os fatos aquisitivos do direito (cancelamento e reinscrição) não se teriam configurado por completo ao tempo da lei antiga (Lei 4.215⁄63).

Aduz contrariedade ao art. 62 da Lei 4.215⁄63, que se limitava a assegurar a imutabilidade do número atribuído em ordem cronológica “a cada inscrição” e não, na hipótese de seu cancelamento, para a inscrição subseqüente, bem como negativa de vigência ao art. 11, § 2º da Lei 8.906⁄94, que vedou expressamente a restauração do número de inscrição anterior.

Afirma que a inscrição foi cancelada (tornada nula, ineficaz), não se tratando de mero licenciamento por impedimento temporário, hipótese em que o registro originário teria permanecido e mesmo sob a égide do Estatuto anterior não havia direito à imutabilidade do número para o advogado que cancelasse a inscrição. Entende que, ainda que o cancelamento tenha se processado na vigência da lei anterior, e que do art. 62 da Lei 4.215⁄63 decorresse o direito à “reativação” do número quando da reinscrição, os elementos configuradores do direito adquirido não se teriam verificados todos, pois a “reinscrição” e a “reativação” do número somente veio a ser requerida quando já vigente a lei nova, o que se constitui mera expectativa de direito, e não direito adquirido.

Alega que o STF já reconheceu inexistir direito adquirido, lato sensu, ao regime jurídico do exercício profissional, inclusive na advocacia, verbis:

“ADVOGADO. INSCRIÇÃO NA O.A.B. ANTERIORMENTE A LEI N. 4.215, DE 27.04.63, QUANDO VIGIA O ART. 11 DO DEC. N. 22.478⁄33. Por não exercer cargo público o recorrente não tinha nenhum impedimento. Nomeado Procurador Estadual, passou a incidir impedimento previsto no art-85, inc-VI, da mencionada Lei n. 4.215. Se o advogado não tem impedimento, ao tempo da sua inscrição, vem a contraí-lo, incide no regime na lei nova (art-149 da Lei n. 4.215⁄63). O respeitável aresto recorrido adotou a melhor exegese da regra legal. o art. 5. do Provimento n. 11 do Conselho Federal da OAB deixou de ser prequestionado. Ao demais, quando assim não fosse, regra de provimento não se sobrepõe a norma legal. Dissidio jurisprudencial não caracterizado. Aplicação da Súmula 369. Recurso extraordinário não conhecido”. (RE 90.190⁄RJ, Relator Min. Djaci Falcão, 2ª Turma, unânime, DJ de 11⁄03⁄1983, página 2.474)

Sustenta que se número de inscrição releva para a identificação do advogado, a intenção do legislador, ao ditar o novo Estatuto da Profissão foi exatamente a de impedir que ex-advogados, tendo-se voltado em caráter permanente a mister diverso, abandonando a condição original de advogado, possam se valer do número de inscrição anterior, já cancelada, como se advogados antigos fossem, pois que, de direito e de fato, não o são. O exercício da magistratura, ou do Ministério Público, da escrivania judicial ou de tabelionato, por exemplo, não se constitui em simples suspensão da advocacia, mas de efetiva desistência dessa profissão, com a efetiva adoção de outra.

Após as contra-razões, subiram os autos, admitido o especial na origem. Relatei.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, para satisfazer-se o requisito do prequestionamento, é necessário que o Tribunal a quo tenha emitido juízo de valor a respeito da tese defendida no recurso especial.

Assim, se a violação a dispositivo infraconstitucional ocorrer com o julgamento na Segunda Instância, devem ser interpostos embargos de declaração para que o Tribunal se manifeste a respeito. Recusando-se o Tribunal a fazê-lo, a orientação desta Corte é no sentido de que o recurso especial deve indicar como violado o art. 535 do CPC, sob pena de aplicação da Súmula 211⁄STJ.

O Supremo Tribunal Federal, diferentemente, no julgamento do RE 219.934⁄SP, prestigiando a Súmula 356⁄STF, sedimentou entendimento no sentido de considerar prequestionada a matéria pela simples interposição de embargos declaratórios, ainda que restem eles rejeitados sem o exame da tese constitucional, desde que a mesma tenha sido devolvida por ocasião do julgamento da apelação. Ficou assentado no precedente que, se a parte suscitou oportunamente a questão, não pode ser ela prejudicada se o Tribunal silencia e se recusa a prestar a jurisdição, rejeitando os embargos.

Desta forma, a Suprema Corte opta por admitir de logo o recurso a reconhecer que houve negativa de prestação jurisdicional e determinar o retorno dos autos ao Tribunal a quo, a não ser que a parte prejudicada, expressamente, alegue violação ao art. 5º, XXXV da CF.

Tais considerações são necessárias para constatar-se que o STJ e o STF, neste particular, procedem de maneira diversa, o que vem sendo consagrado no direito aplicado, como decidiu a Primeira Seção no EREsp 162.765⁄PR.

Com efeito, embora seja da competência do STJ examinar possível violação ao art. 535 do CPC, quando a omissão for de questão constitucional, tendo em vista o encaminhamento dado pelo STF, melhor será que esta Corte reconheça que inexiste interesse de recorrer neste aspecto, deixando o STF dar a última palavra sobre a admissibilidade do recurso extraordinário. Esta é atual posição desta Segunda Turma.

Excluído o exame da tese do direito adquirido ou de expectativa de direito, de competência da Suprema Corte, tem-se para análise a interpretação do art. 62 da Lei 4.215⁄63 e do art. 11, § 2º da Lei 8.906⁄94.

Transcrevo, a seguir, os dispositivos pertinentes e correlatos:

Lei 4.215⁄63:

Art. 60. Será licenciado do exercício da advocacia, mediante requerimento próprio, representação de terceiro, ou de ofício pelo Conselho Seccional, o profissional que:

I – passar a exercer, temporariamente, cargo, função ou atividade incompatíveis com a advocacia (artigos 82 a 86);

(…)

Art. 61. Será cancelado dos quadros da Ordem, além do que incidir na penalidade de eliminação (art. 111), o profissional que:

(…)

II – passar a exercer, em caráter definitivo, cargo, função ou atividade incompatíveis com a advocacia (art. 82 a 86);

(…)

Art. 62. É imutável o número atribuído, em ordem cronológica, a cada inscrição.

Lei 8.906⁄94:

Art. 11. Cancela-se a inscrição do profissional que:

I – assim o requerer;

II – sofrer penalidade de exclusão;

III – falecer;

IV – passar a exercer, em caráter definitivo, atividade incompatível com a advocacia;

V – perder qualquer um dos requisitos necessários para inscrição.

§ 1º Ocorrendo uma das hipóteses dos incisos II, III e IV, o cancelamento deve ser promovido, de ofício, pelo Conselho competente ou em virtude de comunicação por qualquer pessoa.

§ 2º Na hipótese de novo pedido de inscrição – que não restaura o número de inscrição anterior – deve o interessado fazer prova dos requisitos dos incisos I, V, VI e VII do Art. 8º.

§ 3º Na hipótese do inciso II deste artigo, o novo pedido de inscrição também deve ser acompanhado de provas de reabilitação.

Art. 12. Licencia-se o profissional que:

I – assim o requerer, por motivo justificado;

II – passar a exercer, em caráter temporário, atividade incompatível com o exercício da advocacia;

III – sofrer doença mental considerada curável.

Tanto a sentença monocrática como o acórdão recorrido entenderam que, ao proceder à inscrição nos quadros da Ordem e ao cancelamento do respectivo registro, ainda sob a égide da Lei 4.215⁄63, que dispunha sobre a inalterabilidade do número de inscrição do profissional, tem direito o impetrante à manutenção do número originário de inscrição.

Nesta Corte, sobre a tese, há um único precedente:

ADMINISTRATIVO – ADVOGADO – INSCRIÇÃO – CANCELAMENTO – NOVA INSCRIÇÃO – MANUTENÇÃO DO NÚMERO ANTERIOR.

– O Art. 11, § 2º, da Lei 8.906⁄94, ao tratar do retorno aos quadros da OAB, de quem teve inscrição anterior cancelada, limita-se em dizer que o simples requerimento não tem o condão de restaurar a velha inscrição. O dispositivo adverte para a necessidade de que o ex-advogado prove que atende alguns requisitos (não todos) necessários à inscrição originária.

– Tal dispositivo não vedou a manutenção do número originário, nem retirou dos titulares de inscrições canceladas a perspectiva de manter o número que os identifica com a OAB. (REsp 384.365⁄RS, Relator Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, unânime, DJ de 15⁄12⁄2003, página 00187).

Entretanto, o Professor Paulo Luiz Netto Lôbo, em Comentários ao Estatuto da Advocacia (3ª Edição, Editora Saraiva, 2002), relativamente ao art. 11, § 2º da Lei 8.906⁄94, afirma:

O Estatuto regula em numerus clausus as hipóteses de cancelamento da inscrição. O cancelamento é ato desconstitutivo, que afeta definitivamente a existência da inscrição. O efeito do cancelamento é ex nunc, a partir do fato gerador, salvo na hipótese de inscrição obtida com falsa prova, porque a natureza da decisão seria declaratória de inexistência.

(…)

Mesmo quando o ex-inscrito deseje e possa retornar à atividade da advocacia, cessando o óbice legal, sua inscrição anterior jamais se restaura, em nenhum de seus efeitos. Outra inscrição haverá de se dar, comprovados os mesmos requisitos do art. 8º, exceto quanto à comprovação do diploma de graduação em direito, regularidade eleitoral e militar, devendo seu pedido ser aprovado pelo Conselho Seccional e submeter-se a novo compromisso. É este o sentido da explicitação contida no § 2º, do art. 11. A Resolução nº 02⁄94 e o Provimento nº 81⁄96 excepcionou do Exame de Ordem os magistrados, os promotores de justiça e os integrantes das carreiras jurídicas, quando requererem nova inscrição como advogado, mas será nova a inscrição, obtendo-se novo número de registro.

O processo de cancelamento não é prejudicado pela superveniência da aposentadoria do ocupante de cargo incompatível, porque tem natureza desconstitutiva desde a investidura, não podendo convalidar a inscrição irregular.

O cancelamento pode ser requerido pelo inscrito, inclusive desmotivadamente, sendo deferido incontinenti. O pedido tem de ser pessoal (porque personalíssimo), não podendo vir mediante procurador. È definitivo, não havendo possibilidade de arrependimento.(fls. 86⁄87)

Em Comentários ao Estatuto da OAB e às Regras da Profissão do Advogado (Editora Rio), os autores, Eugênio R. Haddock Lobo e Francisco Costa Neto, ao comentarem o art. 61 da Lei 4.215⁄63, trazem à colação decisão administrativa da OAB já no sentido de que, cancelada a inscrição, o pedido de nova inscrição obedecerá aos preceitos da legislação vigente no momento em que for formalizado, inexistindo direito adquirido em relação às condições anteriores (fls. 133⁄134).

Efetivamente, entendo que tem razão o recorrente.

Não se pode deixar de considerar que o licenciamento difere substancialmente do cancelamento. Quando o profissional assume, em caráter definitivo, cargo ou função incompatível com o exercício da advocacia, necessariamente dá-se o cancelamento da sua inscrição, não tendo havido alteração do regime da Lei 4.215⁄63 para o regime da Lei 8.906⁄94. Para voltar a exercer a profissão, deve-se proceder a nova matrícula, daí porque não se pode falar “reativação” da matrícula anterior, preservando-se o número antigo.

Na minha ótica, o novo Estatuto nada inovou, apenas explicitou, no art. 11, § 2º da Lei 8.906⁄94, o que já estava previsto no art. 62 da Lei 4.215⁄63, ao dizer que, havendo novo pedido de inscrição, não poderia ser utilizado o número antigo, enquanto a lei anterior já asseverava que é imutável o número adquirido a cada inscrição, de forma que somente na hipótese de licenciamento (art. 60 da Lei 4.215⁄63 e art. 12 da Lei 8.906⁄94) poderia ser “reativado” o número originário.

A partir de uma interpretação sistêmica, peço vênia aos que adotam entendimento contrário, para votar pelo provimento do recurso.

EXMO. SR. MINISTRO FRANCIULLI NETTO: Cuida-se de recurso especial, interposto pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Rio Grande do Sul, com fundamento no artigo 105, inciso III, letra “a”, da Constituição da República, com o objetivo de reformar, integralmente, v. julgado oriundo do colendo Tribunal Regional Federal da 4a Região.

O v. acórdão impugnado manteve sentença monocrática, a qual, ao examinar mandado de segurança, reconheceu o direito do impetrante à manutenção do número originário de sua inscrição profissional na Ordem dos Advogados da mencionada Secção.

A controvérsia surgiu em decorrência de o impetrante, inscrito sob o império da Lei n. 4.215⁄63, ter-se afastado dos quadros da Ordem por força de assunção no cargo de magistrado, nos idos de 1981. No ano de 1999, após o advento de sua aposentação, o impetrante pugnou por retomar a advocacia, de maneira que almejou seu reingresso e, também, a manutenção do número de inscrição primitiva. O pleito administrativo foi acolhido somente no que toca ao reingresso do requerente como advogado, mas em relação à permanência do seu número de inscrição não foi deferido, razão por que adveio o suso mencionado mandamus.

Consoante já assinalado, o MM. Juízo de 1º grau reconheceu o direito de restabelecer o número de inscrição original do impetrante e a Corte Regional Federal, por seu turno, referendou esse modo de julgar.

A parte recorrente, antes de apresentar os recursos especial e extraordinário, opôs embargos de declaração, com o objetivo de prequestionar as matérias que pretendia trazer para as instâncias excepcionais. O Tribunal a quo entendeu por rejeitá-los, de modo que, ao depois, brotaram os recursos de competência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal.

Em vista do juízo positivo de admissibilidade de ambos os recursos, subiram os autos para este Sodalício.

Distribuído o feito à douta Ministra Eliana Calmon e, após indicado em pauta para julgamento, sobreveio o judicioso pronunciamento no sentido de afastar a violação apontada dos artigos 535 e 458, ambos do Estatuto Processual Civil. No mais, contudo, entendeu a digna Relatora que a pretensão da Ordem dos Advogados estava a merecer acolhimento, uma vez que, em face do cancelamento da anterior inscrição, é de rigor proceder-se uma nova matrícula, tendo em vista a dicção do artigo 11 da Lei n. 8.906⁄94.

Ante a circunstância de a matéria em comento ser inédita no âmbito da colenda 2ª Turma, pedi vistas dos autos para melhor refletir sobre o tema.

É o relatório.

EMENTA

ADMINISTRATIVO – APOSENTADORIA EM CARGO INCOMPATÍVEL COM A ADVOCACIA – PEDIDO DE INSCRIÇÃO NA OAB, COM A MANUTENÇÃO DO NÚMERO ORIGINÁRIO, OBTIDO ANTES DA ASSUNÇÃO NO REFERIDO CARGO – ACOLHIMENTO NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA, TENDO EM VISTA QUE, À ÉPOCA, DEIXOU DE EXERCER A ADVOCACIA, SOB A ÉGIDE DA LEI N. 4.215⁄63, DE MODO QUE NÃO CABERIA CUMPRIR EXIGÊNCIA ESTABELECIDA NA NOVA ORDEM LEGAL (LEI N. 8.906⁄94) – RECURSO ESPECIAL DA OAB – IMPROVIMENTO – DATA VENIA, NÃO ACOMPANHO O MODO DE JULGAR DA MINISTRA RELATORA.

– A Corte de origem, no particular, esclarece que, “tendo a inscrição originária se dado sob a égide da lei 4.215⁄63, onde o número do registro era imutável – art. 62 – não se aplica ao inscrito a vedação do art. 11, § 2º da lei 8.906⁄94, fazendo, pois, o inscrito jus a restabelecer seu número originário de inscrição” (fl. 200).

– Não possui força a observação, trazida pela Lei n. 8.906⁄94, de que o novo pedido de inscrição não restaura o número anterior, se a inscrição originária do recorrido havia-se dado em observância aos ditames da Lei n. 4.215⁄63. Assim, a possibilidade de manutenção do número originário de inscrição na OAB encontra suporte na regra prevista na Lei n. 4.215⁄63.

– No particular, constata-se uma situação de imutabilidade jurídica consolidada sob a égide da lei anterior.

– Acompanho o raciocínio exarado no REsp 384.365-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, v.u., DJ 15⁄12⁄2003.

– Aliás a questão da imutabilidade se mostra mais patente, diante da circunstância de que o número originário obtido pelo advogado fica arquivado nos registros da Ordem dos Advogados do Brasil enquanto o seu titular estiver afastado pela incompatibilidade, ou seja, a numeração obtida na primeira vez que foi efetivada a inscrição não é transferida para outro advogado. Dessarte, não há razão para obstar que o inscrito, quando superado o motivo da incompatibilidade, volte a usar o número originário, o qual, em verdade, identificava-o como advogado. Cumpre consignar, por oportuno, que essas particularidades foram obtidas junto ao setor de cadastro da OAB – Secção São Paulo.

– Recurso especial improvido.

VOTO-VISTA

EXMO. SR. MINISTRO FRANCIULLI NETTO:

De início, registre-se que perfilho o modo de pensar da ilustre Ministra Eliana Calmon no que toca à pretensa afronta aos dispositivos insertos no Código de Processo Civil.

Aliás, a bem da verdade, percebe-se que a própria Ordem dos Advogados do Brasil – Secção do Rio Grande do Sul reconhece, quando da oposição de embargos declaratórios, que o v. julgado proferido na apelação não é detentor de “qualquer defeito que impeça ou dificulte sua intelecção” (fl. 202).

Revista Consultor Jurídico, 14 de Abril de 2005

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