A remessa do Inquérito Policial diretamente ao Ministério Público

( * ) José Francisco de Oliveira Filho

INTRODUÇÃO:

Com o advento da nova Carta Constitucional Brasileira, promulgada em 05.10.88., o Ministério Público Nacional foi contemplado com o merecido reconhecimento pelos legisladores constituintes, como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, ficando incumbido da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis(Art.127, caput, da C.F.).

O Art. 129 e incisos, da Magna Carta, apontou, por excelência, todas as funções institucionais do órgão ministerial, iniciando-as, com a contemplação à instituição do Ministério Público, da “promoção, privativa, da ação penal pública, na forma da lei” (inc.I, do Art. 129, da C.F.) e, indo mais adiante, apontou, também, dentre outras funções, “o exercício do controle externo da atividade policial” (ex vi do inc. VII, do Art. 129, da C.F.), sendo certo, ainda, a previsão constitucional de “requisição de diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais” (inc. VIII, do Art. 129, da C.F.).

Atentando-se, para o sentido literal dos incisos e artigo constitucional acima recitados, observa-se, até mesmo à vista desarmada, que o parágrafo 1º, do Art. 10, do Código de Processo Penal Brasileiro, não foi atingido pelo fenômeno constitucional da “recepção” , ou seja, ficou completamente revogado, após o surgimento do novo Estado Democrático de Direito.

Assim, despiciendo tornou-se, que a autoridade policial, após relatar o procedimento investigatório levado a efeito, remeta os autos do inquisitório para a autoridade judiciária, porquanto, ao assim agir, estará desrespeitando a Magna Carta Constitucional Brasileira, vez que, sendo o Ministério Público o titular da ação penal pública, por força dos ditames constitucionais, para ele é que se deve remeter o inquérito policial, no sentido de exercer o seu mister funcional.

No entanto, o Estado do Ceará, reconhecido como recanto de competentes e estudiosos profissionais das ciências jurídicas, mais uma vez, chegará de forma extemporânea, no ajuste necessário do novo ordenamento jurídico nacional, isso porque, sem que se saiba as verdadeiras razões, alguns segmentos isolados de nosso respeitável Poder Judiciário Cearense, vêm resistindo a adequação dessa nova realidade, esquecendo-se, porém, que o cumprimento das novas regras jurídicas editadas em nossa Lei Fundamental, apenas viriam patrocinar à sociedade cearense, uma justiça com maior celeridade processual na esfera penal, com inquestionável redução de prazos de lei, que só contribuem para a morosidade no deslinde da causa e conseqüente impunidade dos delinqüentes.

Portanto, é o presente trabalho, destinado a mostrar as vantagens que trará a implantação da CENTRAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS do Ministério Público do Ceará, bem ainda, a atuação funcional adotada pelos Promotores de Justiça Criminais, à partir do recebimento do inquérito até a entrega perante o juízo competente para sua apreciação e julgamento.

VANTAGENS TRAZIDAS COM A INSTALAÇÃO DA CENTRAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS :

Dentre as diversas vantagens que advirão com a implantação da Central de Inquéritos Policiais, se pode destacar as seguintes:

REDUÇÃO DE CONFLITOS DE COMPETÊNCIA JURISDICIONAL:

A remessa dos autos do inquérito policial diretamente para o Órgão do Ministério Público, reduzirá, induvidosamente, possíveis conflitos de competência entre os juízos da esfera penal, surgindo novo instituto jurídico, o CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO, que ocorrerá quando “dois membros do Ministério Público, com exercício funcional em Juízos distintos, se considerarem carecedores, ou possuidores de atribuições, para atuarem na matéria penal trazida no inquérito policial).

O conflito de atribuições será então dirimido pelo Procurador-Geral de Justiça, consoante regulamenta o Art. 10, inciso X, da Lei Federal nº 8.625, de 12.02.93, e, Art. 45, ítem 30, da Lei Estadual nº 10.675, de 08 de julho de 1.982, evitando, destarte, a morosidade que ocorrerá no conflito entre juízes, onde os autos do inquérito policial deverá subir para a instância superior(Tribunal de Justiça), onde alí, sofreria distribuição para uma das câmaras criminais, tendo então de se obedecer prazos legais que só acarretam morosidade no deslinde da persecutio criminis in juditio, enquanto que no conflito de atribuições entre membros do Ministério Público, o Procurador Geral de Justiça, terá prazo legal estabelecido para decidir sobre o incidente (cinco [5] dias, após o recebimento dos autos de inquérito policial).

ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE DA AUTORIDADE JUDICIÁRIA, NO EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DE CULPA DE INDICIADOS PRESOS EM FLAGRANTE, PELA MOROSIDADE DE ATUAÇÃO DO PROMOTOR DE JUSTIÇA:

Remetido o inquérito policial de indiciado preso em flagrante delito, ao órgão do Ministério Público, a morosidade na atuação funcional do agente ministerial, isenta o juiz de qualquer responsabilidade, pois, ocorrendo constrangimento ilegal, a autoridade coatora passa a ser o próprio Promotor de Justiça, sujeitando-se esse último, às cominações legais.

Esse fato só ocorrerá, com relação a indiciados presos em flagrante delito, porquanto, aqueles presos preventivamente, já se acham sob a responsabilidade do Estado-Juiz, uma vez que, o decreto de custódia provisória é da competência da própria autoridade judiciária, cabendo a essa, desenvolver as atividades judicantes necessárias à inocorrência do constrangimento ilegal, a possível excesso de prazo na formação de culpa.

ISENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO, NA OBRIGAÇÃO E DISPÊNDIOS COM A DEVOLUÇÃO DE INQUÉRITOS À POLÍCIA:

Recebidos os autos do inquérito policial, entendendo o membro do Ministério Público da necessidade de novas diligências em torno do fato delituoso, requisitará diretamente à autoridade policial, as providências necessárias (Inciso VIII do Art. 129, da C.F., combinado com o Art. 47, do Código de Processo Penal), cuja devolução do inquérito, fica sob a responsabilidade exclusiva da Procuradoria Geral da Justiça, isentando o Poder Judiciário de qualquer atividade ou dispêndio para o atendimento dessa necessidade.

INALTERABILIDADE DA DISTRIBUIÇÃO ALEATÓRIA DOS INQUÉRITOS POLICIAIS PELO PODER JUDICIÁRIO PARA FIXAÇÃO DO JUÍZO:

A distribuição aleatória dos inquéritos policiais remetidos pela polícia, permanece inalterada, apenas após sofrer a distribuição, no setor competente do fórum, são os mesmos encaminhados para a CENTRAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS DA PGJ/CE, de onde serão imediatamente remetidos, através da Coordenação das Promotorias Criminais, para o membro do Ministério Público atuante perante o Juízo apontado no Setor de Distribuição.

VANTAGENS DE ORDEM LEGAL TRAZIDAS COM A CENTRAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS:

Cumprimento pelo Poder Judiciário do Estado do Ceará, a exemplo da maioria dos Estados Federados, do que se acha estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil, Constituição do Estado do Ceará e na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, ou seja, o reconhecimento das prerrogativas auferidas ao Ministério Público, máxime, a “titularidade da ação penal pública” (inciso I do Art. 129, da C.F.), “controle externo da atividade policial” (inciso VII do Art. 129, da C.F.) e “requisição de diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial pelo Órgão do Ministério Público” (inciso VIII do Art. 129, da C.F.).

LEMBRETE: No caso de inquérito policial instaurado para apuração de delitos que comportam AÇÃO PENAL PRIVADA, permanecerá no status quo ante, após sua distribuição, será encaminhado diretamente ao Juízo, pelo fato de que, carece o Ministério Público de interesse processual, salvo nas situações previstas nos Parágrafos 1º e 2º, do Art. 225, e, Parágrafo Único do Art.145, todos do Código Penal Brasileiro.

PROVIDÊNCIAS ADOTADAS PELO PROCURADOR GERAL DE JUSTIÇA, PARA A IMPLANTAÇÃO DA CENTRAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS:

– Implantação de informática na sala da coordenação das Promotorias Criminais e Central de Inquéritos Policiais no fórum Clóvis Beviláqua, com o sistema interligado diretamente com a Procuradoria Geral da Justiça e Corregedoria Geral do Ministério Público, para o acompanhamento diário da chegada e distribuição dos inquéritos às diversas Promotorias de Justiça, onde o Órgão Corregedor do Ministério Público, ficará controlando todos os prazos legais para a atuação do Ministério Público, prevenindo-se, assim, qualquer morosidade nos despachos à cargo dos agentes ministeriais

– Nomeação de membro ministerial para coordenar as diversas Promotorias Criminais e Central de Inquéritos no fórum, onde além da fiscalização in loco , do andamento de inquéritos e controle de processos-crimes com vistas e com carga aos representantes do Ministério Público, também ficará encarregado da adoção de providências urgentes com relação a substituições eventuais de Promotores de Justiça ausentes, por ocasião da realização de audiências.

– Foi baixado o Provimento nº 09/97, da lavra do Procurador-Geral de Justiça, onde foram estabelecidas regras para as diversas atividades dos membros ministeriais, fixando a cota mínima de atuações, para os Promotores de Justiça em substituição dos titulares, auxílio às Promotorias e os que realizam trabalhos técnico-jurídicos.

OBS.: O Provimento nº 09/97-PGJ/CE, estendeu-se à todas as demais áreas de atuação do Ministério Público perante o Judiciário (Área Cível, Família, Sucessões, Registro Público, Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Fazenda Pública e Juizado da Infância e da Juventude)

– Instalação de FAX com linha telefônica própria, na coordenação das Promotorias Criminais e Central de Inquéritos Policiais, além de outra linha já existente.

– Sistema de malotes para correspondências e encaminhamento de inquéritos policiais à delegacia de origem, nos dois periodos diário.

– Lotação de três servidores da PGJ/Ce, para auxiliarem os trabalhos da coordenação das Promotorias Criminais e Central de Inquéritos Policiais no fórum Clóvis Beviláqua.

– Instalação do Setor de Informações para juízes, advogados e público em geral, sobre os inquéritos policiais remetidos para a Central de Inquéritos da PGJ/Ce., com fornecimento de cópias das peças inquisitoriais e expedição de certidões sobre o andamento dos mesmos.

OBS.: Já está instalada uma máquina XEROX, para o atendimento das necessidades de reprodução fotostática de inquéritos e processos-crimes, caso se faça necessário.

PROCEDIMENTO QUE DEVE SER ADOTADO PELOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO AO RECEBEREM AUTOS DE INQUÉRITO POLICIAL JUNTO À COORDENAÇÃO:

Recebido o inquérito policial, o membro do Ministério Público deverá inicialmente, adotar a seguinte providência:

– Encaminhar as armas e objetos apreendidos e que acompanham o inquisitório para a Secretaria da Vara onde tem atuação, solicitando da diretora daquela Secretaria, a lavratura de certidão nos autos do inquérito policial, de que está sendo entregue todos o material e instrumentos do crime, sem prejuízo de exigir recibo comprobatório da entrega.

– Em seguida, ao apreciar os autos do inquisitório, adotará uma dentre as seguintes providências legais:

I- Oferece a DENÚNCIA-CRIMINAL (Art. 41, do CPP), para a instauração da instância penal;

II- Verificando que a matéria penal trazida à lume, foge de suas atribuições, solicita a autoridade judiciária onde funciona, que remeta ao setor de distribuição do fórum, para ser redistribuído para a Promotoria de Justiça adequada à apreciação do inquisitório;

III- Entendendo ser de sua atribuição a matéria penal trazida nos autos inquisitoriais, porém carecendo de maiores diligências e/ou investigações, promoverá nos próprios autos, requisição ministerial à autoridade policial que presidiu o inquérito e, em seguida, encaminha os autos à coordenação da Central de Inquéritos Policiais, para a remessa do procedimento policial à delegacia de origem com o fito de serem cumpridas as providências requeridas (Art. 129, inc. VIII, da C.F., combinado com o Art. 47, do Código de Processo Penal);

OBS.: Quando a devolução do inquérito policial à delegacia de origem, tratar de indiciado preso em flagrante ou preventivamente, deverá o membro do Ministério Público, na qualidade de guardião da ordem jurídica e responsável pela promoção e fiscalização da execução da lei ( Art. 127, caput , da C.F., combinado com o Art. 257, do CPP), adotar as providências necessárias ao relaxamento da prisão flagrancial ou revogação da prisão preventiva, evitando-se, assim, qualquer constrangimento ilegal ao custodiado do Estado.

IV- Verificando o Promotor de Justiça que os fatos trazidos no inquérito policial são atípicos, ou os elementos de provas, apesar de novas diligências requisitadas são insuficientes para a promoção do oferecimento da denúncia, proferirá manifestação nos autos, requerendo o arquivamento do inquérito, nos exatos termos preconizados no Art. 28, do Código de Processo Penal.

DO CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES ENTRE MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO:

Acatando a autoridade judiciária, o declínio de atribuições do membro do Ministério Público para funcionar no inquérito policial, os autos serão remetidos ao setor de distribuição do fórum, para a promoção da redistribuição ao novo Juízo apontado pelo órgão ministerial. Porém, entendendo o Juiz de que é competente para apreciação e julgamento da matéria trazida no inquisitório, remeterá os autos ao Procurador-Geral de Justiça para manifestar-se sobre o incidente ocorrido, que manterá o posicionamento do membro do Ministério Público ou concordando com o posicionamento da autoridade judiciária, designará novo membro ministerial para funcionar nos autos.

Redistribuído os autos do inquisitório policial à novo Juízo, o membro do Ministério Público com assento nesse último, entendendo, também, carecer de atribuições para sua atuação na matéria penal trazida, promoverá o CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES, solicitando da autoridade judiciária, o encaminhamento dos autos ao Procurador-Geral de Justiça, para decidir sobre o referido conflito (Art. 10, inciso X, da Lei Federal nº 8.625, de 12.02.93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), e, Art. 45, ítem 30, da Lei Estadual nº 10.675, de 08.07.82 (Código do Ministério Público do Ceará).

Entretanto, redistribuído o inquérito policial para o novo Juízo e a autoridade judiciária alí atuante, discordar do reconhecimento de atribuição do membro do Ministério Público em exercício naquela Vara, deverá o Juiz suscitar o CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO, tendo em vista que a autoridade judiciária anterior, acatara o declínio de atribuição do agente ministerial, tornando-se inviável, a devolução dos autos ao primeiro Juízo despachante ( vide Arts. 113 e 114, inciso II, do Código de Processo Penal Pátrio).

POSICIONAMENTO DA AUTORIDADE JUDICIÁRIA AO APRECIAR PEDIDO DE RELAXAMENTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE DE INDICIADO, QUANDO OS AUTOS DO INQUÉRITO POLICIAL AINDA NÃO TIVER SIDO ENTREGUE EM JUÍZO PELO ÓRGÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO:

– Se com o recebimento da comunicação de prisão em flagrante, verificar a autoridade judiciária que o indiciado se acha preso de forma ilegal, obviamente, deverá relaxá-la de imediato (Art. 5º, inciso LXV, da C.F.).

– Recebendo o Juiz, pedido de relaxamento da prisão em flagrante de indiciado, sem que os autos do inquérito tenham sido ainda entregues pelo membro do Ministério Público perante juízo, adotará o magistrado uma dentre as seguintes providências:

I- Se o pedido estiver devida e rigorosamente instruído com cópias do inquérito policial flagrante, ouvirá o órgão ministerial e, em seguida, decide sobre a súplica.

II- Alegando a defesa em seu petitório de relaxamento da prisão flagrancial, que deixou de instruir a súplica com cópias do inquisitório, por se encontrarem os autos em poder do órgão do Ministério Público, o Juiz remeterá expediente à Coordenação das Promotorias Criminais e Central de Inquéritos Policiais, solicitando cópias do inquérito e manifestação do Promotor de Justiça, no prazo legal, e assim, juntadas aos autos inquisitoriais, decidirá sobre o pedido lançado pela defesa.

OBS.: No caso de interposição de recurso de habeas corpus onde é apontado o membro do Ministério Público como autoridade coatora por se achar em poder do inquisitório policial, a competência para apreciação e julgamento é do Tribunal de Justiça do Estado, face a prerrogativa da função do agente ministerial e que lhe assegura foro privilegiado.

CONCLUSÃO:

Diante das razões antes expendidas, tem-se que, a nova sistemática adotada para a CENTRAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS, somente trará benefícios para uma melhor distribuição.

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