A REFORMA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Autor: Elaine Silvana de Souza

Considerações iniciais

Já se vai longe o tempo em que a solução dos conflitos de interesses que se estabeleciam entre os cidadãos se realizava diretamente pelos próprios sujeitos cujos interesses se conflitavam, denominado pela doutrina pátria como autotutela.

Dúvidas, evidentemente, não subsistem, de que a autotutela não se traduz no modo mais civilizado de resolver litígios, seja porque nenhuma contribuição presta à tranquilidade que deve nortear a convivência social, seja porque o resultado da contenda, via de regra, se dá ao mais esperto ou forte, sem que, necessariamente, seja este o detentor de um direito a ser (auto)tutelada.

Registre-se, porém, que o ordenamento jurídico pátrio excepciona situações, específica e restritivamente delimitadas, permissivas à autotutela, como, por exemplo, o direito de retenção de posse (art. 516, CC), penhor (art. 772, CC) — inclusive o legal (art. 776, CC) —, locação (art. 1199, CC) e depósito (art. 1279, CC), bem como, o direito de “desforço imediato” (art. 502 do CC), no terreno do direito possessório.

Ocorre que com o surgimento do Estado e seu fortalecimento como monopolizador da jurisdição — no sentido da assunção, para si, da imposição autoritária da solução para os conflitos de interesses, aos litigantes apenas restou a solução privada de suas pendengas pela autocomposição (em que uma delas abre mão do seu interesse ou de parte dele), pela arbitragem (elegendo pessoas de sua confiança para dar solução à lide), afora, como visto, pela própria autotutela, nos casos excepcionais e rigorosamente previstos em lei.

Essa monopolização da atividade jurisdicional pelo Estado decorre do crescimento da sociedade e, naturalmente, o aumento vertiginoso dos conflitos e de sua complexidade, aliado a uma saturação de sua capacidade de bem resolvê-los e com a celeridade necessária, pelas mais diversas razões, vindas principalmente de duas vertentes: de uma organização judiciária ultrapassada e de uma legislação inadequada.

Ao lado disto, a sociedade, com toda razão insatisfeita, tem expressado das mais diversas formas o seu descontentamento, as mais das vezes buscando formas alternativas para a solução dos conflitos ocorrentes, sob o crivo, ou não, do Estado, por vezes não raro até ao arrepio do ordenamento jurídico vigente (o que é mais perigoso e indesejável).

No Brasil, entretanto, e nos países que consagraram o monopólio jurisdicional nas mãos do Estado, comumente a solução buscada tem se situado na “simplificação (minimização) dos ritos, como sucedeu no Brasil com as medidas cautelares, os procedimentos sumários e especiais, e algumas leis esparsas (e. g., Lei do Mandado de Segurança), ou da antecipação dos julgamentos, como o julgamento antecipado da lide, ou dos provimentos, como a antecipação da tutela.

A Reforma: providência necessária e urgente

Parece sobremodo exemplificativo do que acima foi explicitado acerca da necessidade e urgência da reforma as palavras de Sálvio de Figueiredo Teixeira[1], não por acaso presidente da respectiva comissão revisora da própria reforma — cujos estudos com vistas ao escopo de concretizá-la estavam, à época, em plena atividade —, in verbis :

Foi-se o tempo do Judiciário dependente, encastelado e inerte. O povo, espoliado e desencantado, está nele a confiar e reclama sua efetiva atuação através dessa garantia democrática que é o processo, instrumento da jurisdição.

É de convir-se, todavia, que somente procedimentos rápidos e eficazes têm o condão de realizar o verdadeiro escopo do processo. Daí a imprescindibilidade de um novo processo: ágil, seguro e moderno, sem as amarras fetichistas do passado e do presente, apto a servir de instrumento à realização da Justiça, à defesa da cidadania, a viabilizar a convivência humana e a própria arte de viver.

O que se observa é um cada vez maior distanciamento, pelos processualistas modernos, da antiga compreensão do direito processual como mero ajuntamento de normas técnicas desvestidas de qualquer conteúdo ideológico, insistentemente demonstrada pela prática como capaz de promover alterações na vida dos jurisdicionados.

A nova atitude dos processualistas modernos, pois, fez por transformar o estudioso do direito processual, antes de tudo, num crítico da sistemática processual sob o ponto de vista de que o processo não teria razão de existir senão proporcionando a prestação jurisdicional justa, relegando a segundo plano a velha e singular atitude que se lhe emprestava, meramente tecnicista-formal.

Essa evolução se faz sentir, considerado o direito processual civil, e mais proximamente no tempo e lugar, a partir das diversas alterações e inovações que vêm sendo setorialmente promovidas no Código Civil Brasileiro.

Juristas da lavra do ex-Ministro Athos Gusmão Carneiro, de Ada Pellegrini Grinover, Celso Agrícola Barbi, José Carlos Barbosa Moreira, J. E. Carreira Alvim, Humberto Theodoro Júnior, Sergio Sahione Fadel e Kazuo Watanabe, na década passada, promoveram, diga com sucesso, uma enorme reforma do Código de Processo Civil.

[1] A Reforma processual na perspectiva de uma nova justiça. In : TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.) Reforma do Código de Processo Civil. São Paulo : Saraiva, 1996.

Autor: Elaine Silvana de Souza

Advogada

Formada na Universidade Paranaense – UNIPAR na cidade de Umuaramama – Pr

Avenida Presidente Getulio Vargas n º 5430, Umuarama – Pr.

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