Por causa de uma assinatura “tremida”…

Um caso que retrata a forma impessoal e indigna com que – muitas vezes – as instituições financeiras tratam os seus clientes foi julgado recentemente pela 3ª Turma Recursal Cível do RS, que condenou o Banrisul a reparar dano moral, por negar crédito a uma correntista cuja assinatura foi aposta de maneira “tremida” em um contrato.

Detalhe: a consumidora sofria sequela de um derrame que lhe causava tremores.

A ação reparatória é oriunda da comarca de Viamão (RS), onde Maria de Lourdes de Castro Leite relatou que – mesmo sendo correntista antiga do Banrisul – teve crédito negado pela instituição financeira, por suposta divergência de firmas, apesar de haver explicado aos funcionários do banco que a assinatura estava “tremida” por causa do derrame sofrido anos antes. A consumidora foi, contudo, impedida de celebrar o contrato.

A sentença, proferida pelo juiz leigo Tércio Barcellos – do JEC de Viamão – condenou o Banrisul a reparar o dano moral imposto à autora, mediante o pagamento de R$ 1 mil, ocasionando recurso por parte do banco à Turma Recursal.

No acórdão prolatado sob a relatoria do juiz Eugênio Facchini Neto, a decisão de primeiro grau foi mantida, porque “restou incontroverso nos autos ter o banco requerido se negado a conceder empréstimo pessoal à autora, sob o fundamento de que a assinatura colhida não coincidia com a constante dos registros da instituição financeira.”

Identificando que o procedimento do Banrisul foi inadequado, o relator anotou que “o banco possui o dever de conferir dados pessoais e assinaturas nas transações que realiza, pois – como alegado em recurso – são comuns tentativas de fraudes por terceiros de má-fé para obtenção de empréstimos pessoais. No entanto, não se pode deixar de considerar ter sido mal conduzida a negociação com a autora, que poderia ter sido facilmente resolvida de outro modo.”

Segundo o magistrado, diante da alegação da cliente antiga de que a divergência de assinaturas provinha de sequela de um derrame, “cumpriria aos empregados da requerida uma condução mais cuidadosa do caso. Notadamente quando as sequelas são aparentes, pois segundo o laudo médico de fl. 06, a autora apresenta tremores, o que poderia ter sido percebido por um funcionário atento e levado em consideração, já que a assinatura era, justamente, tremida.”

As explicações da autora não foram levadas em consideração e nem sequer checadas, pois o Banrisul não procedeu à comparação da assinatura com outras, nem se certificou da efetiva identidade da correntista de longa data. “Ainda, seria caso de atualização do cadastro da cliente e da própria assinatura registrada na agência, evitando problemas futuros – pois se divergência foi determinante para a negativa de concessão do crédito, poderia acarretar, por exemplo, a devolução de um cheque pelo mesmo motivo”, arrematou o julgador.

O tratamento dispensado pelo Banrisul à consumidora foi tido como desidioso, pois nem sequer houve uma tentativa de averiguação da situação, mesmo diante da explicação dos motivos da divergência da assinatura.

O acórdão, unânimne, já transitou em julgado.

Atuou em nome da autora o advogado Nils Weljan Guimarães. (Proc. nº 71002434462).

ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. NEGATIVA DE CONCESSÃO DE CRÉDITO BANCÁRIO À CLIENTE, SOB O FUNDAMENTO DE DIVERGÊNCIA DE ASSINATURA. DIVERGÊNCIA OCORRIDA EM VIRTUDE DE SEQUELAS DE DERRAME APRESENTADAS PELA CONSUMIDORA, QUE LHE ACARRETAM TREMORES. DESCASO DA FORNECEDORA, QUE NÃO SE PREOCUPA SEQUER EM MELHOR AVERIGUAR A SITUAÇÃO E SE CERTIFICAR DA IDENTIDADE DA CLIENTE. DESPREPARO NO TRATO COM A CLIENTE E TRATAMENTO DESIDIOSO DESPENDIDO QUE AUTORIZAM A CONCESSÃO DOS DANOS MORAIS, EM CARÁTER DISSUASÓRIO.

1) Não se olvida que o banco possui o dever de conferir dados pessoais e assinaturas nas transações que realiza. Uma vez constatada a divergência de assinatura, em se tratando de cliente bancária de longa data, que alega possuir sequelas em virtude de doença, cumpriria aos empregados da requerida uma condução mais cuidadosa do caso, notadamente quando tais sequelas são aparentes.

2) O descaso com que foi tratada a demandante, acarretando-lhe presumível sentimento de impotência, autoriza o acolhimento do pleito de reparação por danos morais, até mesmo para evitar essa espécie de conduta pela ré no futuro, educando-a para um comportamento mais consentâneo com o respeito devido ao consumidor.

RECURSO DESPROVIDO.

Recurso Inominado – Terceira Turma Recursal Cível
Nº 71002434462 – Comarca de Viamão
BANCO BANRISUL S/A – RECORRENTE
MARIA DE LOURDES DE CASTRO LEITE – RECORRIDO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Juízes de Direito integrantes da Terceira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Dr. Carlos Eduardo Richinitti e Dr. Jerson Moacir Gubert.

Porto Alegre, 29 de abril de 2010.

DR. EUGÊNIO FACCHINI NETO,
Presidente e Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de ação de reparação de danos morais. Narra a autora que, na condição de correntista do banco demandado, teve negada a concessão de um empréstimo pessoal, em razão de suposta divergência de assinaturas. Refere ter explicado aos funcionários que sua assinatura estava tremida em razão de um derrame sofrido há alguns anos. Mesmo assim, não pôde celebrar o contrato. Pede a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, a ser arbitrada pelo juízo.
Em sua contestação, o banco requerido argumenta, em síntese, com a inocorrência de danos morais na hipótese.

Sobreveio sentença de parcial procedência do pedido, para condenar a ré ao pagamento da importância de R$ 1.000,00 à autora a título de indenização por danos morais.

Recorre a demandada.

VOTOS

Dr. Eugênio Facchini Neto (PRESIDENTE E RELATOR)

É caso de manutenção da sentença, pelos seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46, última parte, da Lei 9.099/95, uma vez que bem apreciou as questões controvertidas e deu o correto deslinde ao litígio.

Restou incontroverso nos autos ter o banco requerido se negado a conceder empréstimo pessoal à autora, sob o fundamento de que a assinatura colhida não coincidia com a constante dos registros da instituição financeira.

Nesse sentido, o depoimento pessoal da preposta do banco, ao afirmar que “o indeferimento do pleito da autora foi efetuado pela supervisora da agência, argumentando a divergência de assinatura. O problema surgiu quando da atualização do cadastro da autora, lembra ainda que a autora argumentou quanto ao seu problema na mão, mas o pleito restou indeferido”.

Não se olvida que o banco possui o dever de conferir dados pessoais e assinaturas nas transações que realiza, pois – como alegado em recurso – são comuns tentativas de fraudes por terceiros de má-fé para obtenção de empréstimos pessoais. No entanto, não se pode deixar de considerar ter sido mal conduzida a negociação com a autora, que poderia ter sido facilmente resolvida de outro modo.

Uma vez constatada a divergência de assinatura, mas se tratando de cliente bancária de longa data, que alega possuir sequelas em virtude de doença, cumpriria aos empregados da requerida uma condução mais cuidadosa do caso. Notadamente quando as sequelas são aparentes, pois segundo o laudo médico de fl. 06, a autora apresenta tremores, o que poderia ter sido percebido por um funcionário atento e levado em consideração, já que a assinatura era, justamente, tremida.

Nesse contexto, tendo a consumidora explicado sua situação, buscando alternativas para a conclusão do contrato, incumbia à requerida certificar-se, mediante comparações outras, acerca da efetiva identidade da cliente, seja exigindo a apresentação de dados pessoais, como questionando a cliente acerca de informações como seus números de documentos, endereço, telefone, etc, com o que poderia realizar transação segura. Ainda, seria caso de atualização do cadastro da cliente e da própria assinatura registrada na agência, evitando problemas futuros – pois se divergência foi determinante para a negativa de concessão do crédito, poderia acarretar, por exemplo, a devolução de um cheque pelo mesmo motivo.

O que não se admite é que à consumidora tenha sido despendido tratamento tão desidioso, mediante simples negativa de concessão do crédito, sem nem sequer tentativa de averiguação da situação, mesmo diante da explicação dos motivos que levaram à divergência da assinatura.

O descaso com que foi tratada a demandante, acarretando-lhe presumível sentimento de impotência, autoriza o acolhimento do pleito de reparação por danos morais, até mesmo para evitar essa espécie de conduta pela ré no futuro, educando-a para um comportamento mais consentâneo com o respeito devido ao consumidor.

Correto, assim, o deslinde dado à causa.

VOTO, pois, por NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo a sentença recorrida por seus fundamentos.

Arcará a recorrente com as custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 465,00, na forma do art. 20, § 4º, do CPC.

Dr. Carlos Eduardo Richinitti – De acordo com o(a) Relator(a).

Dr. Jerson Moacir Gubert – De acordo com o(a) Relator(a).

DR. EUGÊNIO FACCHINI NETO – Presidente – Recurso Inominado nº 71002434462, Comarca de Viamão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. UNÂNIME.”

Juízo de Origem: 1. VARA CIVEL VIAMAO – Comarca de Viamão

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