Consulta pública: caminho para mudar leis

por Luiz de França

Ao colocar recentemente em consulta pública o projeto que substituirá a Lei Rouanet, o Ministério da Cultura (Minc) abriu espaço para que qualquer cidadão participe da reformulação do principal mecanismo de fomento da área – uma discussão que, até então, estava restrita a um seleto grupo de produtores culturais e diretores de marketing das grandes empresas. Mas essa não é a única matéria de interesse nacional esperando por sugestões do cidadão comum: dezenas de projetos estão disponíveis na internet, em várias instâncias públicas.

Somente no ano passado, seis das dez agências reguladoras federais realizaram 173 consultas públicas: mecanismo pelo qual qualquer brasileiro pode enviar sugestões para a reformulação de leis e normas. Até a primeira semana deste mês, essas mesmas agências já haviam disponibilizado 57 pesquisas.

Interesse crescente – Na opinião de Pedro Ivo Ramalho, assessor da presidência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o interesse da sociedade organizada em geral pelas consultas públicas tem crescido nos últimos anos, apesar de admitir que elas ainda são pouco conhecidas de grande parcela da população. “O interesse é maior principalmente entre os profissionais e órgãos de defesa do consumidor”, afirma.

Para Leonardo Avritzer, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenador do projeto Democracia Participativa, mesmo ainda restrita na sua maior parte a representantes de setores, “as evidências apontam que o brasileiro está mais participativo”.

Números – Essa participação, no entanto, varia conforme o assunto. As duas últimas grandes consultas organizadas pela Anvisa tiveram cerca de 1.400 contribuições. Dessas, 805 foram sugeridas entre novembro de 2005 e março de 2006 para a nova resolução que regulamentou a propaganda, publicidade e informação dos medicamentos. Das sugestões recebidas, 226 foram integradas à resolução, publicada em dezembro do ano passado. Já a consulta do Conselho Nacional de Justiça sobre os concursos públicos para ingresso de juízes, que ficou disponível até o dia 7 deste mês, recebeu cerca de 700 sugestões.

Assuntos como a proposta de revisão do Plano Geral de Outorgas de Serviços de Telecomunicações, que possibilitou a fusão entre as empresas de telefonia Oi e Brasil Telecom, em novembro do ano passado, recebeu 433 contribuições entre junho e agosto de 2008. Enquanto isso, o interesse para discutir a revisão das condições gerais para a formação, funcionamento e operacionalização dos Conselhos de Consumidores de Energia Elétrica, ainda em aberto, recebeu até o momento 11 contribuições, sendo apenas três de pessoas físicas.

Educação e outros temas – De acordo com Avritzer, a consulta pública é uma das 14 ferramentas de participação popular que a Constituição de 1988 estabeleceu. “Consulta é um mecanismo corrente da democracia”, diz, ao criticar o seu uso majoritário apenas por órgãos do Executivo.

A Assembleia de Minas Gerais pode ser considerada uma exceção. O Legislativo mineiro resolveu abrir uma consulta pública para as pessoas participarem da formulação do projeto de lei do Executivo sobre educação antes de ser levado a plenário. “A consulta no Brasil tem um caráter mais qualitativo, com objetivo claro de antecipar certo tipo de crítica”, diz Avritzer. Para ele, as audiências públicas acabam assumindo um papel mais decisório, possibilitando uma maior participação popular.

Segundo Regina Silvia Pacheco, professora e coordenadora do mestrado profissional em gestão e políticas públicas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), os órgãos que mais possibilitam a participação popular por meio de consultas continuam sendo as agências reguladoras. “Isso porque elas são obrigadas por lei a colocarem toda e qualquer norma em consultas públicas antes de publicá-la.”

Participar do processo, no entanto, não é garantia de que as sugestões feitas serão aceitas e incorporadas às novas normas. “Isso ficará a critério do comitê da análise de cada órgão. A única diferença é que as agências reguladoras são obrigadas a justificarem a não aceitação da contribuição devendo tornar isso público.”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?