Ação de exoneração de pensao alimentícia ajuizada por ex-marido separado há vinte anos

Julio Honório Giancursi dos Anjos
Advogado atuante na área de família,
com escritório na cidade de Marília – SP
OAB-SP nº 97.122

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ________ VARA CÍVEL DA COMARCA DE ____________.

Distribuição por dependência ao
Processo nº ______/84

JOSÉ, RG. 00.000.000, CPF 000.000.000-00, brasileiro, casado, motorista, residente na Rua _______________, 000, Bairro __________, em __________-SP, por seu advogado que esta subscreve (provisão anexa), devidamente constituído conforme mandato incluso, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fundamento nas disposições legais vigentes, propor a presente

AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA

em face de JOSEFA, brasileira, divorciada, cabeleireira, filha de _____________ e ________________, CAIO, brasileiro, industriário, amasiado, nascido em __/__/1982 (certidão de nascimento nº _____), atualmente com 21 anos completos de idade e TÍCIO, brasileiro, solteiro, servente de pedreiro, nascido em __/__/1985 (certidão de nascimento nº _____), atualmente com 19 anos completos de idade, todos residentes e domiciliados na Rua ___________, ______, Bairro __________, na cidade de ___________ (outra Comarca) – SP, expondo e ao final requerendo o seguinte:

Dos fatos

O Requerente separou-se consensualmente em janeiro/1985 (já há quase VINTE anos) da Sra. Josefa e divorciou-se em fevereiro/1994 (vide certidão averbada anexa).

Desde a separação o Requerente tem cumprido sua obrigação de prestar alimentos tanto à ex-mulher como aos filhos, conforme ficou acordado quando da separação, hoje no valor mensal de R$ 220,00 (duzentos e vinte reais), que são aceitos sem qualquer restrição pelos Requeridos (recibos dos depósitos deste semestre anexos).

Josefa, que segundo informações trabalha como cabeleireira, já manteve outros dois relacionamentos, tendo tido filhos oriundos de ambos, __________________ e _________________.

Caio, com 21 anos completos de idade, segundo informações não mais estuda e trabalha na empresa _______________. É casado com a Sra. ____________ com a qual tem uma filha chamada ____________, nascida em __ de ________ de 2003.

Tício, com 19 anos completos de idade, segundo informações não estuda e trabalha como servente de pedreiro. Ao que sabe é solteiro.

Tais informações foram obtidas a muito custo, tendo em vista que o relacionamento afetuoso entre Requerente e Requeridos há muito deixou de existir, restringindo-se somente aos assuntos relativos à pensão alimentícia.

O Requerente, por sua vez, trabalha como motorista autônomo de transporte intermunicipal de cargas (docs. anexos) percebendo mensalmente rendimentos entre seiscentos e setecentos reais, aproximadamente.

Atualmente casado com a Sra. ____________________ (certidão anexa), trabalha para sustentar casa e esposa, e para custear os medicamentos necessários ao seu tratamento de saúde, posto que portador de _________ (declaração médica anexa) .

Tanto a ex-mulher, como os demais Requeridos maiores de idade, todos plenamente saudáveis e em condições de sustentarem-se pelo próprio trabalho, já não dependem da ajuda financeira do Requerente para sobreviver, não mais se justificando a manutenção do encargo.

Assim, em homenagem ao esforço do Requerente, que nestes quase vinte anos de separação, vem pagando regularmente a pensão, e diante da maioridade alcançada pelos filhos, é justo que todos concordem com o teor deste pedido, aceitando a exoneração ora pleiteada.

Do direito

No que pertine ao pagamento de pensão a ex-cônjuge, Washington Epaminondas Medeiros Barra, Procurador de Justiça do Estado de São Paulo (in RT 795 p. 111-119), esclarece que ?A jurisprudência, após a Carta de 1988, tem reafirmado a desobrigação alimentar desde que haja possibilidade de trabalho daquele que pleiteia o favor legal. Inúmeras lições pretorianas reiteram a igualdade de direitos e obrigações entre o homem e a mulher no âmbito da relação obrigacional alimentar. O E. TJSP, com notável frequência e exatidão, tem interpretado as regras de igualdade entre os cônjuges e ex-cônjuges:

?…Mesmo antes da Constituição Federal, desapareceu do campo normativo o dever de o marido sustentar a esposa que possa prover sua própria manutenção, em face não só da independência econômica e jurídica das mulheres casadas, que se operou por força da Lei 4.121, de 1962, como das modificações introduzidas à Lei 883 e do advento da Lei 6.515.

A atual Carta Magna estatuiu a perfeita igualdade jurídica entre marido e mulher, art. 226, § 5º, e os deveres conjugais passaram a correr tanto em mão como em contramão, podendo ser exercidos da mesma forma pelo homem e pela mulher? (RT 724/303).

Destaco trecho do precioso acórdão publicado na JTJ 159/237 (TJSP) que merece detida reflexão:

?Esta C. Câmara tem, com frequência, adotado a tese da plena igualdade de condições, pois, ?Ainda em igualdade de condições financeiras, não se deve mais verberar o homem, por uma espécie de automatismo, impingindo-lhe, porque é homem, o dever de prestar alimentos. A igualdade de tratamento tem de imperar, em obediência aos princípios constitucionais. Ademais, no contexto sociopolítico do momento, quando as forças femininas, com muita propriedade, manifestam-se em pleito de tratamento igualitário, não há mais lugar para o culto do protecionismo exacerbado da mulher, sobretudo se exerce ou pode exercer algum trabalho para o próprio sustento. Hoje, as mulheres como os homens exercem, em igualdade de condições, as mais variadas profissões, tais como as de engenheiras, aeronautas, arquitetas, médicas, psicólogas, advogadas, promotoras, juízas, delegadas de polícia e tantas outras, de tal sorte que, para que receba pensão alimentícia do ex-marido, a prova da necessidade há de ser robusta, assim como a do homem que, em caso de necessidade, devesse a ela se dirigir. São iguais. (cf. Apelações Cíveis 179.954-1 e 181.926-1)?

No mesmo sentido, também por amostragem, algumas outras decisões: RJTJESP 159/237, 130/38, 128/34, 120/23; RT 647/86. ApCív 097.140.4/8-00, São Paulo, F. R. Lapa, j. 05.02.1999, v.u., rel. Des. Fernando Horta.

?Medida cautelar. Alimentos provisionais. Pedido indeferido. Não comprovação da necessidade. Mulher que exerce atividade remunerada pode prover seu sustento. Recurso desprovido? (AgIn 200.895.4/6, Mairiporã, j. 09.08.2001, v.u. rel. Des. Reis Kunts).?

Importa, neste passo, registrar a primeira parte do art. 1.695 do Código Civil: ?São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença…?.

Continua o Procurador, ?Em se adotando tese diversa, poder-se-á transformar qualquer um dos cônjuges em verdadeiro instituto de previdência social do outro, o que será um incentivo para as parasitas das sociedades conjugais falidas e instituir-se-á nova e inusitada modalidade de enriquecimento injusto, imoral e ilícito, circunstância abominável e que conflita com os mais comezinhos princípios inspiradores da nossa ordem social e jurídica.

Aliás, já se decidiu que: ?o trabalho é obrigação social. A mulher, sendo válida, pode concorrer com a própria subsistência com o produto de seu esforço. Alimentos são devidos a título de necessidade? (TJSP, RT 534/80)

O trabalho, além de gerar renda, serve de estímulo à prole e já foi objeto de Encíclica: ?É mediante o trabalho que o homem deve procurar o pão quotidiano e contribuir para o progresso contínuo das ciências e da técnica, e sobretudo para a incessante elevação cultural e moral da sociedade na qual vive em comunidade com os próprios irmãos? (Laborens exercem, João Paulo II, setembro de 1981).

Não é admissível que uma pessoa saudável, com idade produtiva e vivendo com liberdade irrestrita queira se manter beneficiária de pensão alimentícia do outro cônjuge ou ex-cônjuge só porque com ele é ou foi casada. Também não se pode cogitar de impor a qualquer das partes a obrigação ad eternum de sustentar a outra, em face de uma relação jurídica da qual só restaram indesejáveis lembranças dos dissabores e das máculas do passado.

Em regra, a separação dos cônjuges, de fato ou de direito, gera natural modificação do status das partes, competindo àquelas adequar suas despesas, compatibilizando-as com suas rendas.

Enfim, com a separação tudo muda, como, aliás, foi muito bem e oportunamente lembrado no corpo do v. acórdão do E. TSJP: ?após a separação, não se pode exigir a manutenção do mesmo padrão de vida, mostrando a experiência que nada mais será como antes? (AgIn 102.285.4/8-SP, j. 18.05.1999, v.u., rel. Des. Laerte Nordi).

Nada mais será como antes…

Os desgastes psico-afetivos, os estremecimentos das relações matrimoniais e o crepúsculo do amor, vicissitudes matrinomiais, não são e não podem ser fatos geradores de pensão alimentícia?.

Por outro lado, em relação aos alimentos pagos aos filhos maiores de idade, conforme leciona Yussef Cahali, ?o dever de sustento se extingue com a maioridade, ou mesmo com a emancipação do filho: ao romper-se o vínculo do pátrio poder, cessam os efeitos pessoais do mesmo, entre os quais o dever de sustento do filho, e surge como única e autônoma prestação legal de alimentos, condicionada, agora, esta, ao estado de necessidade do filho e à possibilidade do genitor? (in Dos Alimentos, 1984, Revista dos Tribunais, p. 366).

Jorge Luis Costa Beber, Juiz de Direito em Criciúma, Santa Catarina, em seu artigo intitulado A MAIORIDADE DOS FILHOS E A EXONERAÇÃO LIMINAR DOS ALIMENTOS (in buscalegis.ccj.ufsc.br), sustenta que ?…lícito é concluir que os filhos, tão-somente pelo fato de alcançarem a maioridade, não perdem o direito de pugnar por eventual amparo alimentar. Continuam eles com legitimidade para o pedido de alimentos, porém fulcrada tal pretensão na relação de parentesco, sujeitando-se o pedido aos pressupostos da prova da necessidade e da possibilidade, o que deve ser efetuado em ação própria.

Pontes de Miranda, sobre o tema, preleciona que ?até a maioridade, por força dos deveres da paternidade, em resultado somente dela, desponta a responsabilidade alimentar do pai com o filho. Depois disso, presume-se o descendente apto a viver por si. Tão-só surge o direito de pedir alimentos, nos casos previstos no art. 399 do CC (anterior). Por essas razões a pensão alimentar susta-se depois da maioridade dos filhos, com ressalva de nova, sob outros motivos, diversos dos alegados.?

O advogado e professor gaúcho Rolf Madaleno, especializado na matéria familiar, enfatiza que ?Ascendendo à adultíce, compete aos próprios filhos se auto-sustentarem e o crédito pensional passa a ser uma verdadeira exceção. Sucede neste caso, a cessação do que era obrigação alimentar absoluta, arbitrada por presunção natural de necessidade, para dar lugar excepcional, ao dever de alimentos, conquanto que o filho já maior, demonstre seu estado de miserabilidade.? ?

A jurisprudência confirma tais assertivas:

ALIMENTOS ? Exoneração ? Admissibilidade ? Maioridade civil alcançada ? Recurso não provido. A maioridade civil de filha faz cessar o dever do progenitor prestar-lhe alimentos, desde que ela não esteja incapacitada para o trabalho e nem esteja a frequentar curso superior. (TJSP ? AC 252.582-1 ? Taubaté ? 8ª C. Cív. ? Rel. Des. Massami Uyeda ? j. 30.08.1995 ? v.u.).

AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA ? OBRIGAÇÃO ALIMENTAR DO FILHO QUE ATINGIU A MAIORIDADE ? PEDIDO DEFERIDO ? RECURSO NÃO PROVIDO ? A obrigação de prestar alimentos decorre do pátrio poder. Extinto este pela maioridade cessa a obrigação alimentar. Persistindo a necessidade dos alimentos, o alimentando deve promover ação própria para continuar a recebê-los, isto, com fundamento no artigo 399 do Código Civil. PRELIMINAR ? CERCEAMERNTO DE DEFESA ? INOCORRENTE ? REJEITADA ? O julgamento antecipado da lide independe de produção de provas, não se constituindo em cerceamento de defesa. (TJMS ? AC ? Classe B ? XXI ? N. 57.557-7 ? Porto Mourtinho ? 3ª T. ? Rel. Des. Nelson Mendes Fontoura ? j. 29.04.1998).

ALIMENTOS ? Pensão alimentícia ? Verba pleiteada por filha maior que possui condições de prover o próprio sustento ? Inadmissibilidade ? Possibilidade de o pai arcar com os alimentos ? Irrelevância ? Circunstância em que, para a manutenção da obrigação alimentar, é necessário que a filha esteja impossibilitada de trabalhar.

Ementa oficial: Não basta o pai poder arcar com os alimentos para que seja estabelecida ou mantida obrigação alimentar. É preciso, antes, que a filha maior esteja impossibilitada de trabalhar, não tendo condições de prover o próprio sustento… (RT 807/392)

ALIMENTOS ? Pensão alimentícia pleiteada ao genitor por filhos maiores e capazes ? Verba indevida.

Ementa da Redação: O dever do genitor em prestar alimentos a sua prole cessa quando os filhos atingem a maioridade, salvo quando estes foram portadores de deficiência física ou mental ou, ainda, frequentarem curso universitário. (RT 752/273)

Assim, emerge cristalina a proteção oferecida ao pleito do Requerente.

Do pedido

Ante o exposto, e com fulcro na legislação vigente que rege a espécie, requer:

1 – A CITAÇÃO dos Requeridos por Carta Precatória, com os benefícios previstos no artigo 172, § 2º, do CPC, para, querendo, contestar a presente ação.

2 – A intimação do Ilustre Representante do Ministério Público para acompanhar o feito.

3 – A concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, tendo em vista não reunir condições de suportar as custas e despesas processuais sem prejuízo do próprio sustento.

4 – A procedência total da presente ação para o fim de exonerar o Requerente do encargo alimentar em questão.

5 – A produção de todos os meios de prova em direito admitidos, sem exceção.

Dá-se à causa, para efeitos fiscais, o valor de R$ 2.640,00 (dois mil e seiscentos e quarenta reais).

Termos em que, com os documentos juntos,

p. deferimento.

__________, __ de junho de 2004.

Julio Honorio Giancursi dos Anjos
Advogado OAB/SP 97122

Fonte: Escritório Online

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