STF invalida lei da baiana que limitava sanções do tribunal de contas a gestores públicos

Por unanimidade, Plenário entendeu que a norma viola a autonomia da corte de contas.


O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, anular uma lei da Bahia que que restringia a aplicação de multas e outras punições a gestores públicos. Segundo a norma, só haveria responsabilização se fosse comprovado que o desvio de recursos beneficiou o próprio agente ou seus familiares. A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7082, na sessão virtual finalizada no dia 26/9.

Autora da ADI, a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) alegou que a Lei estadual 14.460/2022, que trata das atribuições, da estrutura e do funcionamento do Tribunal de Contas dos Municípios e do Estado da Bahia (TCM/BA), foi proposta por um deputado estadual. Contudo, ela só poderia ter sido proposta pelo próprio tribunal.

Em voto que conduziu o julgamento, o ministro Cristiano Zanin, relator da ação, ressaltou que o STF já decidiu que leis de iniciativa parlamentar sobre a organização e o funcionamento de tribunais de contas são inconstitucionais, pois violam a autonomia desses órgãos.

Segundo o relator, embora o Legislativo tenha o dever de fiscalizar as contas públicas com o apoio dos tribunais de contas, isso não significa que eles sejam subordinados ao Parlamento.

Além disso, ele observou que a lei baiana, na prática, alterou a Lei de Improbidade Administrativa ao excluir a modalidade culposa e admitir apenas o dolo (intenção) do agente público. Para o ministro, essa mudança não pode, fora do processo legislativo adequado, reduzir as competências da corte de contas.

TST: Instrutor de yoga dispensado dias antes de sair de férias será indenizado

Para a 2ª Turma, a conduta do empregador foi considerada abuso de direito.


Resumo:

  • Uma empresa dispensou o empregado quando ele ia iniciar o período de férias.
  • Ele entrou na Justiça alegando que teve de desmarcar diversos compromissos, além de ter seu direito frustrado.
  • Para a 2ª Turma, houve abuso de direito e violação da boa-fé que deve existir no contrato de trabalho.

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Administração Regional do Serviço Social do Comércio (Sesc) em Salvador (BA) a indenizar um instrutor de yoga por tê-lo dispensado dias antes do início de suas férias já agendadas. Para o colegiado, houve violação da boa-fé objetiva exigida na relação de emprego.

Dispensa ocorreu cinco dias antes das férias
O instrutor disse que trabalhou no Sesc por seis anos. Em 4/5/2019, ele recebeu o aviso de férias, que começariam em 3/6. Todavia, em 29/5, foi comunicado da demissão. Na ação trabalhista, ele argumentou que o recebimento do pedido de férias, a concordância com o período e a comunicação da concessão são incompatíveis com a dispensa em um período inferior a 30 dias. Com a medida, ele ficou frustrado e constrangido, porque teve de cancelar diversos compromissos.

Em sua defesa, o Sesc alegou direito do empregador (direito potestativo) e questionou a falta de provas do dano moral sofrido pelo empregado.

O juízo de primeiro grau condenou o Sesc a pagar R$ 3 mil de indenização, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA). Para o TRT, o aviso de férias não implica garantia de emprego.

Dispensa afrontou a dignidade do trabalhador
Segundo a ministra Maria Helena Mallmann, relatora do recurso do instrutor, embora a demissão seja um direito do empregador, exercê-lo neste contexto específico configura abuso de direito e violação da boa-fé objetiva.

A ministra ressaltou que, ao conceder as férias e, logo em seguida, demitir o empregado, o Sesc frustrou a legítima expectativa de exercer um direito social de grande importância. A entidade também errou, segundo Mallmann, pelo comportamento contraditório, ao conceder o descanso e depois retirar o direito, gerando quebra de confiança.

A decisão já transitou em julgado, ou seja, não cabe mais recurso.

Veja o acórdão.
Processo: RRAg-582-19.2019.5.05.0018

TRT/BA: Empresa de segurança é condenada por impor cursos nas folgas e refeitório com ratos e baratas

A 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) reconheceu dois danos morais em ação movida por vigilante contra a Prosegur Brasil S/A Transportadora de Valores e Segurança. O colegiado fixou indenização de R$ 5 mil pela violação do período de descanso — cursos obrigatórios nas folgas, sob risco de punição — e manteve as condenações de 1º grau por más condições de higienização, com mais R$ 5 mil pelo manuseio de lixo sem luvas e R$ 10 mil pela presença de pragas no refeitório (ratos e baratas)

Direito à desconexão

Testemunhas confirmaram que os cursos corporativos eram obrigatórios, feitos fora do horário de trabalho, nas folgas, e que havia penalidades para quem não concluísse . Um colega chegou a ser afastado, e um inspetor aplicou punição em caso semelhante. Diante da impossibilidade prática de estudar durante a vigilância, o relator, desembargador Marcelo Rodrigues Prata, assentou que “a interrupção do período de repouso para atender a uma demanda da empresa afronta o direito do trabalhador a um ambiente saudável e ao descanso efetivo”, fixando a reparação moral em R$ 5 mil. O “direito à desconexão” assegura que o empregado não seja obrigado a realizar tarefas fora do expediente, resguardando seu tempo de descanso e vida pessoal.

Más condições de higienização

Segundo a prova oral, o vigilante revistava e manipulava lixo sem luvas, e o refeitório registrava ratos e baratas, especialmente após uma enchente. As testemunhas descreveram que o lixo continha restos de comida e até papel higiênico com catarro, o que evidenciou o risco biológico e a ofensa à dignidade. Ao manter a condenação de 1º grau, o relator destacou: “Provada, portanto, as más condições de higienização do ambiente laboral.” Permanecem os valores de R$ 5 mil pelo manuseio de lixo sem EPI e R$ 10 mil pela presença de pragas.

TST: Cervejaria deverá pagar adicional de periculosidade a motociclista

Para 5ª Turma, direito previsto na CLT não depende de portaria ministerial.


Resumo:

  • Uma cervejaria pretendia excluir o pagamento de adicional de periculosidade a um empregado que usa motocicleta para o trabalho.
  • A empresa alegava que uma portaria do MTE havia suspendido a parcela para empresas associadas a entidades do setor.
  • Para a 5ª Turma, porém, uma portaria não pode suspender um direito já previsto na CLT.

A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação da Cervejaria Petrópolis S.A., de Eunápolis (BA), em recuperação judicial, a pagar adicional de periculosidade a um motociclista. A empresa alegava que uma portaria do Ministério do Trabalho suspendia esse direito para empregados do setor. Contudo, o colegiado concluiu que uma portaria não pode suspender um direito já estabelecido na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

De acordo com o artigo 193 da CLT, o trabalho em motocicleta dá ao empregado o direito ao adicional, e a situação é regulamentada pela Portaria 1.565/2014 do MTE, que inseriu a atividade no Anexo 5 da Norma Regulamentadora (NR) 16. Contudo, em 2025, uma nova portaria suspendeu os efeitos da primeira para empresas associadas da Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (Abir) e da Confederação Nacional das Revendas Ambev e das Empresas de Logística da Distribuição.

O adicional de periculosidade foi concedido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, para quem a empresa não poderia se eximir de pagar a parcela com a alegação de que não exigia o uso de motocicleta. “Uma vez implementado o fato gerador de um direito trabalhista, este deve ser observado, pouco importando se tal fato gerador decorre de uma opção do trabalhador”, concluiu.

A cervejaria então recorreu ao TST.

Para 5ª Turma, direito previsto na CLT é autoaplicável
O relator, ministro Douglas Alencar Rodrigues, disse que o direito ao adicional está expressamente garantido na CLT (artigo 193, parágrafo 4º). Esse dispositivo tem aplicação imediata desde a publicação da Lei 12.997/2014, ainda que se trate de empregados que prestem serviços a essas empresas associadas.

Segundo o relator, o direito é autoaplicável e não depende de regulamentação ministerial para ter validade. A regulamentação do Ministério do Trabalho seria necessária apenas para atividades que não têm previsão legal expressa.

O tema ainda não está pacificado entre as Turmas do TST.

Veja o acórdão.
Processo: Ag-RRAg-0000061-45.2022.5.05.0511

TRT/BA: Menina levada ainda criança para Salvador era empregada doméstica, não “filha de criação”

A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) reconheceu que uma mulher, levada ainda criança do interior para Salvador, não era “filha de criação” de um casal, mas atuava como empregada doméstica desde jovem. A menina não teve as mesmas oportunidades que os demais moradores da casa. Às vezes era apresentada como filha, outras como empregada. A Justiça determinou o pagamento de indenização de R$ 50 mil. Cabe recurso.

Entenda o caso
Em 2000, uma menina de seis anos, moradora de Lamarão, no interior da Bahia, foi levada para Salvador para morar com um casal. Inicialmente, foi para auxiliar o patrão, que havia sofrido um acidente. Com o tempo, passou a viver de forma definitiva na casa e, em 2003, o casal obteve sua guarda. A partir daí, ela passou a trabalhar para a família.

A menina realizava tarefas domésticas, sendo ensinada por empregadas que já trabalhavam no local. Precisava acordar às 4h para preparar o café da manhã da família antes de a patroa sair para o trabalho. Em alguns anos estudava pela manhã, em outros à tarde, e o período de aula era seu único momento de “descanso” entre os afazeres, que iam até a noite.

Aos 15 anos, quando nasceu o neto dos patrões, foi obrigada a deixar os estudos temporariamente para cuidar do bebê. Só aos 24 anos conseguiu concluir o ensino médio por meio de supletivo. Segundo ela, também era destratada. Em 2020, ao questionar sua situação, foi expulsa de casa.

“Como uma filha”
Os patrões alegaram que conheciam a menina desde cedo, pois visitavam Lamarão com frequência, e que a mãe dela a entregou alegando que a família passava fome. Disseram que a receberam apenas com a roupa do corpo e uma sandália nos pés.

Segundo eles, a jovem era tratada como filha: não precisava acordar cedo para fazer café, frequentava a escola, brincava e chegou a fazer um curso técnico de enfermagem pago por eles. Disseram ainda que o comportamento dela mudou em 2018, quando começou a namorar um vizinho.

Decisão
Para a juíza Viviane Martins, da 12ª Vara do Trabalho de Salvador, é necessário analisar fatores socioeconômicos, históricos e culturais na aplicação do direito, em uma perspectiva antidiscriminatória.

Segundo ela, as testemunhas comprovaram que a mulher nunca foi tratada como filha ou irmã. Ela explica que de acordo com o que dito por uma testemunha a mulher passou a ser vista como um peso para a família pela sua presença sem a realização das atividades domésticas. . O “irmão”, segundo seu próprio relato, “tomou as rédeas” e decidiu expulsá-la, sem se preocupar com seu destino. Outra testemunha, amiga da dona da casa há mais de 15 anos, nem se lembrava do nome da jovem.

A juíza fez um paralelo com a pesquisadora Grada Kilomba, que relata ter sido convidada aos 12 anos para acompanhar uma família em viagem de férias, mas, na prática, para prestar serviços domésticos à família de um médico. Para a magistrada, a menina negra deixou de ser vista como criança e passou a ser tratada como “corpo disponível para o trabalho”.

Ela determinou que fosse reconhecido o vínculo de emprego, com anotação em carteira, pagamento de salários e indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil.

Primeira Turma
Os patrões recorreram, e o caso foi julgado pela 1ª Turma do TRT-BA. A relatora, juíza convocada Dilza Crispina, destacou que a prática de “adoção” de meninas do interior ou de periferias por famílias de centros urbanos, sob promessa de acesso à educação e mobilidade social, é comum no Brasil. “Essas crianças acabam submetidas a precárias relações de trabalho doméstico infantil que perpassam aspectos relacionados à herança colonialista/escravista”, destaca.

A relatora manteve o reconhecimento do vínculo de emprego, reforçando que a menina nunca foi integrada à família como filha ou irmã. Porém, considerou que o valor da indenização ultrapassava a capacidade econômica dos patrões e reduziu para R$ 50 mil. A decisão foi unânime quanto ao vínculo de emprego e por maioria quanto ao valor da indenização.

STJ: Condição análoga à de escravo não exige restrição à liberdade de locomoção para se configurar

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a jurisprudência segundo a qual a configuração do delito de redução à condição análoga à de escravo, previsto no artigo 149 do Código Penal, não exige que os trabalhadores sejam privados de sua liberdade de ir e vir, bastando que estejam submetidos a condições degradantes.

Com esse entendimento, o colegiado deu provimento a recurso do Ministério Público Federal para reconhecer a tipicidade da conduta dos responsáveis por uma fazenda na qual a fiscalização do Ministério do Trabalho identificou 13 trabalhadores submetidos a condições degradantes de trabalho. Eles foram contratados em 2008 para prestar serviços em propriedade localizada nas zonas rurais dos municípios de Correntina e São Desidério (BA).

O relatório de fiscalização apontou que os trabalhadores estavam alojados no meio do mato, dividindo-se entre os que dormiam em um ônibus velho e os que dormiam em um barraco de plástico preto, sem piso e sem energia elétrica; a água estava armazenada em caminhão pipa velho e enferrujado, estacionado sob o sol, e era consumida sem tratamento; não havia instalações sanitárias nem local adequado para banho, e as refeições eram preparadas ao lado do ônibus, em fogão improvisado no chão.

Os acusados foram absolvidos em primeiro grau e no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que, apesar de reconhecer a precariedade do local e a violação dos direitos trabalhistas, entendeu não estar caracterizada a condição análoga à de escravo, pois os trabalhadores não teriam restrição à sua liberdade de locomoção.

Crime ocorre quando se verifica qualquer das condutas previstas na lei
Para o relator do recurso no STJ, ministro Sebastião Reis Júnior, os fatos demonstrados no processo – condições degradantes de trabalho, ausência de instalações sanitárias, alojamento inadequado e falta de equipamentos de proteção individual – são suficientes, conforme a jurisprudência, para caracterizar o delito.

Segundo o ministro, o artigo 149 do Código Penal estabelece tipo misto alternativo, que se configura mediante a submissão de alguém a trabalhos forçados, jornada exaustiva, condições degradantes de trabalho ou restrição da liberdade de locomoção. “Trata-se de crime plurissubsistente, cuja tipicidade se aperfeiçoa com a verificação de qualquer das condutas previstas, independentemente da ofensa ao bem jurídico liberdade de locomoção”, explicou.

Na avaliação do relator, as circunstâncias do caso em análise configuram condições degradantes de trabalho, caracterizando o delito previsto no artigo 149. “Trata-se de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social, aliciadas em contexto de miserabilidade e, consequentemente, propensas à submissão a condições desumanas que objetivam tão somente a redução máxima dos custos da atividade empresarial”, afirmou, ressaltando que os acusados “tinham pleno conhecimento das condições a que submetiam os empregados”.

Sebastião Reis Júnior concluiu que o acórdão do TRF1, ao exigir demonstração de cerceamento da liberdade de ir e vir para configuração do crime, aplicou incorretamente o artigo 149 do Código Penal, contrariando a jurisprudência consolidada do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2204503

TRT/BA: Plano de Saúde da Petrobrás deverá fornecer Ozempic a paciente com obesidade e diabetes

A Associação Petrobrás de Saúde (APS) foi condenada a fornecer o medicamento Ozempic a uma beneficiária do plano de saúde. Além disso, a APS deverá indenizar a paciente em R$ 1.000 por dano moral e em R$ 2.034 pelo reembolso de canetas de medicamento que ela precisou comprar após terem sido negadas pelo plano. A decisão é da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) e ainda cabe recurso.

Uso de Ozempic

A autora do processo informou que é beneficiária do plano de saúde e necessita do Ozempic para tratar diabetes tipo 2 e obesidade grau 1. Ela utilizava o medicamento há três anos, mas em agosto de 2023 teve o fornecimento negado pelo plano.

Ela argumenta que, segundo entendimento do Judiciário, tratamentos, diagnósticos e exames, mesmo que ambulatoriais ou domiciliares e não incluídos no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), devem ser custeados integralmente pelo plano de saúde. Por isso, pediu judicialmente que a APS forneça o medicamento na dose prescrita pelo médico.

O plano de saúde, por sua vez, afirmou que a negativa ocorreu devido à falta de documentação fornecida pela beneficiária. A APS também alegou que liberações anteriores haviam sido concedidas de forma equivocada, sem a análise técnica adequada. Além disso, sustentou que a paciente não teria diagnóstico de diabetes tipo 2 e que o uso do Ozempic seria off-label, ou seja, fora da indicação da bula.

Decisões judiciais

A juíza da 8ª Vara do Trabalho de Salvador manteve a decisão liminar que concedia o fornecimento do Ozempic e a indenização por dano moral de R$ 1.000. Para a juíza Giselli Gordiano, “havendo indicação médica, não cabe à operadora de plano determinar o tratamento do paciente”. A decisão também garantiu o reembolso de R$ 2.034 referente à compra do medicamento.

A APS recorreu, e o caso passou à relatoria da juíza convocada Cristina de Azevedo. O plano alegou que possui critérios para fornecer medicamentos e que a negativa ocorreu por se tratar de uso off-label.

A relatora, no entanto, concluiu que a autora comprovou documentalmente que possui diabetes e obesidade. O relatório médico demonstrou que a paciente respondia bem ao tratamento e necessitava do uso contínuo do Ozempic devido às doenças crônicas. Segundo a magistrada, “cai por terra o argumento de que o Benefício Farmácia não cobriria a situação da autora”. Ela votou por manter a indenização por dano material e moral. A decisão da 4ª Turma contou com os votos dos desembargadores Agenor Calazans e Angélica Ferreira.

STJ admite interesse processual em retificar profissão na certidão de casamento

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que há interesse processual no pedido de retificação da profissão constante na certidão de casamento, de modo que não cabe ao juízo indeferir a petição inicial sob o fundamento de falta desse requisito.

O autor da ação de retificação de registro civil alegou que sempre foi lavrador, mas em sua certidão de casamento constou a profissão de pedreiro. Além de apresentar documentos para comprovar sua alegação, ele afirmou que a alteração era necessária porque estava com dificuldade para obter um benefício previdenciário devido à divergência de dados.

O juízo considerou que a informação sobre a profissão na certidão de casamento seria um dado transitório e não essencial, e com base nisso extinguiu o processo sem analisar o mérito, apontando falta de interesse processual. O Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), no entanto, reformou a sentença e determinou o prosseguimento da ação.

No recurso interposto no STJ, o Ministério Público sustentou que a ausência de interesse processual estaria evidenciada pela falta de utilidade da tutela judicial pretendida pelo autor da ação.

Informações dos registros públicos têm presunção relativa de veracidade
A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que os registros públicos, como a certidão de casamento, em regra são imutáveis, de acordo com o regime jurídico especial estabelecido na Lei 6.015/1973. Contudo, ela reconheceu que esses documentos possuem presunção relativa de veracidade, pois podem conter erros ou omissões, que devem ser identificados e corrigidos.

No entendimento da relatora, o pedido de retificação pode ser ajuizado por quem estiver vinculado ao documento (inclusive ascendentes, descendentes e herdeiros), situação que demonstra o seu interesse jurídico na correção do erro. Ela apontou, porém, a necessidade de diferenciar a retificação, que busca corrigir erro, da alteração, que substitui um estado por outro sem haver necessariamente um erro. Como exemplo da segunda hipótese, a ministra citou a alteração do regime de bens do casamento.

Quanto à informação sobre a profissão dos cônjuges, Nancy Andrighi lembrou que é um dos elementos da certidão de casamento, segundo disposto no artigo 70, item 1º, da Lei 6.015/1973. Para ela, o fato de não haver na lei previsão de procedimento específico para a correção de erros referentes aos elementos da certidão não torna o pedido juridicamente impossível, pois não há vedação ou incompatibilidade legal. Desse modo, sendo constatado erro, caberá a retificação, que deve ser requerida conforme o artigo 109 da Lei de Registros Públicos, que trata da correção de registro civil.

Interesse processual deve ser avaliado com base nas afirmações do autor
A ministra observou que, nos termos da Lei de Registros Públicos, a correção de registro civil deve ser feita por petição fundamentada, juntamente com documentos e indicação de testemunhas.

Por outro lado – ela explicou –, o interesse processual é um dos requisitos para a apreciação do mérito da ação, ao lado da legitimidade, e o magistrado deve avaliar a presença desse requisito com base nas afirmações feitas pelo autor na petição inicial.

Assim, para ser verificado o interesse processual na ação que pede a retificação de registro civil, basta que a petição inicial traga informações suficientes acerca da possível existência de erro. “Se assiste razão ou não ao autor, trata-se de julgamento de mérito, hipótese de procedência ou improcedência do pedido”, declarou.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2195205

TRT/BA: Professora receberá horas extras por “Aulão do Enem”

A 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) decidiu, por unanimidade, que uma professora do Centro Educacional Miguel Alves Ltda., em Camaçari, deve receber horas extras pelas aulas de revisão e pelo “Aulão do Enem”.

Contratada como horista, a docente recebia por hora/aula, mas os comprovantes não registravam o pagamento dessas atividades. Ainda cabe recurso da decisão.

Revisões para o Enem
Segundo a professora, ela ministrava três aulas extras de revisão, com duas horas cada, além de participar do “Aulão do Enem”, com mais quatro horas, sem remuneração. No total, reivindicou o pagamento de dez horas extras.

A escola alegou que as atividades estavam dentro da jornada regular da docente, o que não geraria pagamento adicional. A juíza da 5ª Vara do Trabalho de Camaçari rejeitou o pedido, considerando que o contrato não previa a jornada indicada pela professora (de 7h30 às 12h15) e que os contracheques comprovavam pagamentos variáveis conforme o número de aulas mensais.

Aulas aos sábados
A professora recorreu, e o caso ficou sob relatoria do desembargador Luís Carneiro. Ele destacou que, por ser horista, a escola deveria ter um controle de jornada mais detalhado, especialmente em uma instituição com cerca de 200 funcionários – informação revelada por uma testemunha levada pela própria empresa.

Luís Carneiro também observou que os contracheques apresentados não permitem verificar de forma clara a relação entre horas/aula e valores pagos, principalmente no que se refere às horas extraordinárias.

Um folheto de divulgação do “Aulão do Enem” mostrou que o evento ocorreu em 6 de novembro de 2021, um sábado, fora do horário normal da professora. Os contracheques do mês seguinte não registraram pagamento referente a essa atividade.

Com isso, a Turma reconheceu o direito da docente ao recebimento de dez horas extras. A decisão teve o voto do desembargador Marcelo Prata e da juíza convocada Alice Braga.

TST: Empresa é condenada por demitir motorista com deficiência visual de forma discriminatória

Empregador tinha conhecimento da condição do empregado e não apresentou outra justificativa para o desligamento.


Resumo:

  • Um motorista pediu indenização por acreditar que foi demitido em razão de doença visual.
  • A empresa rechaçou o argumento porque o motorista não estava em licença quando foi demitido.
  • Para a 2ª Turma, como o empregador tinha ciência da doença e não apresentou justificativa para a dispensa, presume-se que a dispensa foi discriminatória.

A 2ª Turma do TST confirmou a condenação da Sanjuan Engenharia Ltda., de Salvador (BA), pela dispensa discriminatória de um motorista com deficiência visual. Segundo o colegiado, a empresa tinha conhecimento da condição do empregado e não apresentou nenhuma outra razão para sua demissão.

Motorista ficou impossibilitado de exercer a função
Na reclamação trabalhista, o empregado disse que foi contratado em novembro de 2013 como motorista de caminhão. A dispensa ocorreu em março de 2017, quando ele já havia sido diagnosticado com visão subnormal em ambos os olhos, doença que o impediria de exercer a função.

O trabalhador afirmou ainda que a empresa sabia de sua limitação e da impossibilidade de continuar a exercer a função de motorista. Contudo, em vez de buscar seu correto afastamento pelo INSS, inclusive contestando a alta médica, a Sanjuan preferiu “livrar-se” dele, demitindo-o menos de 15 dias após seu retorno, depois do fim do benefício previdenciário.
Todavia, disse ele, ao invés de buscar o seu correto afastamento pelo INSS, inclusive contestando a alta médica, preferiu “livrar-se” dele, despedindo-o menos de 15 dias de seu retorno após cessado o benefício.

Doença diminui visão periférica
Uma pessoa é considerada com visão subnormal quando apresenta 20% ou menos da chamada visão normal. Esse problema pode vir acompanhado de uma alteração do campo visual, ou seja, a pessoa pode enxergar como se estivesse vendo por dentro de um tubo (ausência ou diminuição da visão periférica) ou com uma mancha escura na parte central da visão, quando tenta fixá-la em um objeto (ausência ou diminuição da visão central).

Empregado apresentou atestado de incapacidade
O empregado disse que a doença foi diagnosticada em 2016. Em decorrência disso, foi encaminhado ao INSS em 30/8/2016, quando passou a receber o auxílio-doença previdenciário, terminado em 30/5/2017. No dia 16/5/2017, ele apresentou à empresa um atestado de incapacidade para a função de motorista. No entanto, disse que o laudo foi desconsiderado pela Sanjuan, que o despediu um mês depois.

Por sua vez, a empresa sustentou que não houve dispensa discriminatória e que nunca teve ciência de doença incapacitante. Segundo a Sanjuan, todos os documentos comprovavam, na época do desligamento, a aptidão plena do empregado atestada pelo INSS.

Empresa não comprovou outro motivo para a dispensa
As decisões de primeiro e segundo graus reconheceram a dispensa discriminatória, uma vez que a empresa já tinha ciência de que o empregado tinha uma doença estigmatizante e não deveria ter sido demitido. De acordo com a Súmula 443 do TST, caberia à empresa comprovar que a dispensa não decorreu de razões discriminatórias.

Para a ministra Liana Chaib, relatora do recurso de revista da Sanjuan, se a empregadora tem ciência da enfermidade e ela é grave, presume-se em favor do empregado a ocorrência de dispensa discriminatória. No caso, o TRT deixou claro que essas condições estavam presentes. Nesse contexto, para concluir de forma diversa, seria necessário reexaminar fatos e provas, procedimento vedado pela Súmula 126 do TST.

Veja o acórdão.
Processo: Ag-AIRR-99-69.2018.5.05.0132


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