Ausência de advogado em causa superior a 20 salários mínimos em JEC de Porto Alegre

Um caso reclama a intervenção imediata da OAB gaúcha. Uma decisão do juiz leigo Oscar Carvalho de Lima Filho – do Juizado Especial Cível do Posto UFRGS, de Porto Alegre (RS) – suscita a dúvida sobre se o “caput” do artigo 9º da Lei nº 9.099/95, corroborado pelo enunciado nº 27 do Fonaje – estaria sendo aplicado pelos JECs.

Reza o dispositivo legal que, “nas causas de valor até 20 salários mínimos, as partes comparecerão pessoalmente, podendo ser assistidas por advogado; nas de valor superior, a assistência é obrigatória.”

Após a edição da Lei dos JECs, o Fonaje – Forum Nacional de Juizados Especiais ratificou a regra, inclusive explicando que a mesma se aplica também em caso de contraposto. A norma estabelece que “na hipótese de pedido de valor até 20 salários mínimos, é admitido pedido contraposto no valor superior ao da inicial, até o limite de 40 salários mínimos, sendo obrigatória a assistência de advogados às partes.”

Contudo, em ação de indenização de danos morais e materiais ajuizada por Francisco Marshal – sem a atuação de advogado – em face de Roberto Maciel, houve propositura de contrapedido pelo réu, também para a reparação de danos, no valor de R$ 20.400,00 (40 salários mínimos).

Por ocasião da audiência de instrução e julgamento, o autor-demandado compareceu à solenidade sem se fazer representar por advogado, apesar de o valor do contrapedido ser superior a 20 salários mínimos. Na ocasião, ele foi advertido pelo juiz leigo sobre a conveniência de ser defendido por advogado. Marshal, então, respondeu que pretendia prosseguir litigando sem a assistência técnica. Tal foi deferido pelo julgador.

A própria parte respondeu ao contrapedido e formulou quesitos a testemunhas, sob o acolhimento do juiz leigo, apesar de o procurador da parte contrária haver feito o alerta de que aquela era “atividade privativa de advogado”.

A sentença proposta pelo juiz leigo e homologada por juiz de Direito julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para condenar o réu a pagar a quantia de R$ 2.000,00 como reparação por dano moral, e improcedentes os contrapedidos.

O autor-demandado aviou, ele próprio, embargos de declaração, que não foram conhecidos porque objetivavam reabrir a instrução para produzir nova prova documental. Os embargos do réu foram desprovidos, mas formulados por advogado. Ainda não há trânsito em julgado. (Proc. nº 001/3.10.0004992-8).

Advogado sem curso, sem carteira, sem Exame de Ordem?

A propósito dos fatos que estão sendo revelados pelo Espaço Vital, o advogado Luiz Rocca, que atuou no processo em nome do réu-contrapedinte, faz uma pergunta instigante, traz um desabafo e conclui com uma informação:

“Por que nós advogados regularmente inscritos somos obrigados a pagar as altas taxas de anuidades para poder exercer a profissão dignamente, se qualquer um do povo, tendo ou não conhecimento jurídico, pode atuar como se advogado fosse, praticando atos que são privativos de advogado?

Estou profundamente indignado com o fato de, após anos de trabalho praticando a mais linda das profissões que é a Advocacia, ter de atuar dentro de uma sala de audiência de um determinado Juizado Especial, tendo pela frente um cidadão que, com a concordância de um juiz leigo, pratica atos que são privativos de um advogado como se advogado fosse.

Já oficiei à OAB-RS, pedindo providências”.

Jurisprudência

Há julgados das Turmas Recursais do RS mantendo a obrigatoriedade da assistência por advogado em causas de valor maior do que 20 salários mínimos.

1. AÇÃO DE COBRANÇA. VALOR SUPERIOR A 20 SALÁRIOS MÍNIMOS. INSTRUÇÃO E CONTESTAÇÃO EFETUADAS SEM ACOMPANHAMENTO DE ADVOGADO. NULIDADE DECRETADA. Sendo o valor da causa superior a 20 salários mínimos, a assistência por advogado mostra-se obrigatória. Decisão desconstituída. Recurso provido. (Recurso Cível Nº 71001163526, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Clovis Moacyr Mattana Ramos, Julgado em 10/01/2007).

2. PROCESSUAL CIVIL. NULIDADE ABSOLUTA. CAUSA COM VALOR SUPERIOR A VINTE SALÁRIOS MÍNIMOS. REPRESENTAÇÃO OBRIGATÓRIA POR ADVOGADO. AUSÊNCIA DE NOMEAÇÃO DE PROCURADOR AO RÉU. 1. Tratando-se de causa com valor superior a vinte salários mínimos, na qual a assistência de advogado é obrigatória, tem-se que a ausência de nomeação de procurador ao réu por parte do juízo, diante de sua alegação de impossibilidade econômica para tal, ainda mais havendo fatos controvertidos a serem dirimidos em dilação probatória, é causa apta a gerar a nulidade do feito. 2. Desconstituição da sentença que se impõe. Recurso provido. (Recurso Cível Nº 71001623438, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 19/06/2008)

3. MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE NOMEAÇÃO DE ADVOGADO EM DEMANDA DE VALOR SUPERIOR A 20 SALÁRIOS MÍNIMOS. NULIDADE PROCESSUAL. MANDADO DE SEGURANÇA CONCEDIDA. É obrigatória a nomeação de advogado à parte que litigar sem assistência de um, nas causas do JEC que tiverem valor superior a 20 salários mínimos, nos termos do art. 9º da Lei 9.099/95. A ausência de nomeação de advogado, havendo prejuízo para a parte desassistida, acarreta a nulidade do processo, desde a audiência de instrução. (Mandado de Segurança Nº 71002258176, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 28/01/2010)

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