E agora José?

“E agora, José?/ A festa acabou,/ a luz apagou,/ o povo sumiu,/ a noite esfriou,/ e agora, José?/ e agora, Você?/ Você que é sem nome,/ que zomba dos outros,/ Você que faz versos,/ que ama, protesta?/ e agora, José?

Está sem mulher,/ está sem discurso,/ está sem carinho,/ já não pode beber,/ já não pode fumar,/ cuspir já não pode,/ a noite esfriou,/ o dia não veio,/ o bonde não veio,/ o riso não veio,/ não veio a utopia/ e tudo acabou/ e tudo fugiu/ e tudo mofou,/ e agora, José?”

Os versos de Carlos Drumond de Andrade vieram à mente após a cassação do deputado José Dirceu. As palavras poetizadas servem como uma lição de vida e se encaixam no âmago do “Caso Zé Dirceu”.

O deputado paulista que “com unhas e dentes” lutou para salvaguardar o seu mandato, apelando inúmeras vezes para o Judiciário, foi cassado com 293 votos e tanto a oposição como a situação não esboçaram qualquer reação de apupos ou vaias.

O ex-ministro e ex-deputado Zé Dirceu, na sessão de cassação, fez o último discurso na Tribuna da Câmara, afirmando que tinha “as mãos limpas”. Embaixo a bancada da oposição, de braços cruzados, ouvia ansiosa pelo término, o discurso do derrotado.

E o mineiro Dirceu, eleito com 556 mil votos – segunda maior votação do País – desculpou-se por não ter recebido os deputados em audiências agendadas, desculpou-se por ter sido presidente do PT e mentor intelectual da campanha de Lula. Mas não se desculpou por ter sido ministro do governo Lula, onde, com “mão de ferro” traçou os caminhos políticos do governo “esquerdista-petista” e mudou o discurso que trazia do palanque.

A utopia acabou, ficaram sem discurso, como declama o poeta. E quando os amigos descobriram que estavam aparecendo alguns de seus métodos, a tendência foi deixá-lo debatendo com Roberto Jefferson e cada um seguiu o caminho oposto, dissimulando e tergiversando. O dinheiro recebido de Marcos Valério, totalmente ilegal, passou a ser uma “ajuda de campanha”, porém fora de época.

O ex-deputado Zé Dirceu, acreditando no personalismo que o PT criou de sua imagem e nos créditos que recebeu no passado dos políticos – por ter sido voz uníssona no partido – tentou reverter o placar desfavorável, passando a questionar a legalidade na condução do processo acusatório, por três longos meses.

Ao buscar o seu direito de defesa, Zé Dirceu expôs a fragilidade do Judiciário brasileiro, emaranhado na proteção do “direito de defesa” que se contrapõe à celeridade e exagera no formalismo rigoroso, onde sequer os 11 ministros do Supremo Tribunal “se entendem” quanto ao assunto.

As chicanas de Dirceu foram alertas ao sistema jurisdicional que prima pela formalidade em detrimento do fato, e onde as leis processuais são usadas e abusadas para que os vereditos não sejam prolatados com rapidez.

No entanto, geralmente os expedientes deste jaez são usados por advogados de renome, que ao invés de debaterem os fatos e o direito do cidadão, apelam para as picuinhas processuais, tumultuando o andamento dos processos, e atrapalhando o andamento de outros.

Por mais que se fale o contrário – e aqui já prevejo as críticas que receberei – estes advogados chicaneiros são vistos pela sociedade como “competentes”, quando, ao contrário, usam e abusam do direito de recorrer para retardar a decisão, nunca buscando o acordo ou apaziguar os conflitos.

O caso de Zé Dirceu não poderia ser diferente e, até o último instante, seu advogado queria enquadrar o processo acusatório em um eterno debate jurídico, não se importando quanto ao fato de que se tratava de uma peça instrutória e que os juízes seriam os deputados em plenário.

Acredito que isto seja natural no país onde as pessoas não aceitam perder, mesmo que seja uma simples partida de futebol e a palavra “não”, quando dita pelo advogado, é entendida como “incompetência”. A “esperteza”, combinada com o “tráfico de influência” é vista como a solução para o problema jurídico e a ilusão de uma sentença vencedora é traduzida em vereditos condenatórios que demoram, mas acabam sendo proferidos.

Isto é o que ocorreu no “Caso José Dirceu”, onde ao final se confirmou o julgamento que as ruas já haviam proclamado.

“E agora, José? Quer abrir a porta,/ porta já não existe mais. quer ir para Minas,/ Minas não há mais..”

Sergio Maidana
Advogado em C. Grande (sergiomaidana@ig.com.br)

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