Consumo de bebidas alcoólicas deve ser controlado

Luiza Nagib Eluf*

Nossa sociedade teme as drogas ilícitas. Maconha, cocaína, ópio, crack, ecstase – os fantasmas que assombram os pais cada vez que seus filhos vão para uma festa. Sem dúvida, são substâncias nocivas que causam dependência física ou psíquica e, embora proibidas por lei, podem ser encontradas com facilidade nas mãos dos traficantes, que estão em toda a parte.

O maior perigo, porém, não mora aí. O vilão dos vilões é o álcool e nem todo mundo percebe isso. Vendido em larga escala, disponível em todos os restaurantes, padarias, supermercados, residências, bares e casas noturnas em geral, essa droga lícita tem feito vítimas em números astronômicos. Está provado que o álcool causa dependência fortíssima.

É mais fácil deixar a cocaína do que a bebida, até porque esta última pode ser encontrada em qualquer lugar e a qualquer momento, inclusive em casa de amigos e parentes. A força de vontade do alcoolista em processo de cura tem de ser redobrada para se livrar da tentação.

Além da dependência, o álcool é fator inequívoco de criminalidade. Ignorando as leis e as recomendações feitas pelos meios de comunicação, são muitas as pessoas que assumem a direção de veículos automotores embriagadas, provocando acidentes, não raro, muito graves. Há os que ficam agressivos sob efeito de bebidas alcoólicas e as conseqüências são percebidas nas Delegacias de Polícia: mulheres espancadas por seus companheiros, brigas em bares, lesões corporais graves, homicídios. Tudo provocado por essas bebidas perigosas, vendidas sem nenhum controle.

Os jovens têm sido as maiores vítimas. A proibição de venda de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos quase não vigora na prática. Fala-se muito que a maconha, embora não seja uma droga pesada, deve continuar sendo proibida no Brasil porque seria “a porta de entrada para outras drogas”. Pois porta de entrada é o álcool, ou será que ninguém vê?

O cigarro é, também, uma droga lícita, que causa dependência e, a longo prazo, pode levar à morte por câncer, problemas cardíacos e outras doenças. A política de conscientização e combate ao consumo do cigarro é acertada e deve prosseguir cada vez mais intensa. Mas é preciso reconhecer que o tabaco, embora altamente pernicioso à saúde, não torna o dependente um sujeito inútil, insuportável, improdutivo, incapaz de assumir qualquer compromisso. O álcool, sim.

A bebida destrói famílias mais do que qualquer outra droga. É claro que todas as substâncias entorpecentes, após algum tempo de uso, geram a mesma desgraça. A diferença é que o álcool consome o indivíduo rapidamente, tornando-o incapaz para o trabalho e insuportável na convivência. Por turvar imediatamente a consciência, o alcoolismo é impossível de passar desapercebido; a primeira coisa que o dependente perde é o emprego, depois o apoio da família, por fim, a própria vida.

Evidentemente, é possível fazer uso moderado de bebidas alcoólicas, evitando-se o risco de chegar à dependência, quando há muita informação sobre o assunto e, pelo menos, algum controle sobre a comercialização dos produtos para menores e maiores. Não é o que se vê no Brasil. Por essa razão, o problema do alcoolismo no país segue aumentando.

Não se propõe a proibição da venda de bebidas alcoólicas; nenhuma “lei seca” até hoje deu certo. No entanto, o consumo completamente liberado como vem ocorrendo não pode continuar. A exemplo do que se fez com o cigarro, cujas embalagens trazem alertas sobre o perigo do uso regular do tabaco, é preciso informar os consumidores dos perigos do excesso com relação ao álcool, não apenas para dirigir veículos. As embalagens das bebidas deveriam conter avisos de que o álcool pode gerar dependência, sendo que o abuso também provoca doenças.

Não é por outra razão que algumas universidades como a Unicamp e a USP estão desenvolvendo projetos de “prevenção e redução de danos” decorrentes da ingestão de bebidas alcoólicas. O projeto piloto, testado há seis meses com alunos da Unesp, diminuiu pela metade o número de acidentes de carro e o baixo rendimento escolar causado pelo excesso de bebida. Esse tipo de prevenção deveria ser generalizado.

O álcool precisa deixar de ser uma imposição ligada ao lazer. Tanto adolescentes quanto adultos costumam ir a festas já pensando em consumir bebidas alcoólicas. Embebedar-se é o objetivo principal de muitos. Já os que não toleram o álcool ou simplesmente preferem evitar os seus efeitos são pressionados a beber de qualquer jeito, sob pena de sofrer rejeição do grupo, o que, para os inseguros, é desastroso.

Mesmo entre os adultos, o ato de sair para encontrar amigos implica, automaticamente, a ingestão de álcool. Quem não bebe sofre tanta pressão que chega a ser constrangedor. É esse padrão social que precisa mudar. E quem optar pelo álcool, cuidado: não faça dele uma razão de viver.

Revista Consultor Jurídico

Luiza Nagib Eluf é procuradora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo

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