TRT/SP: Julgamento com perspectiva de gênero reverte justa causa aplicada a gestante

A 8ª Vara do Trabalho da Zona Sul (São Paulo) reverteu a rescisão por justa causa aplicada a mulher que, em razão da gravidez, se ausentou por mais de 30 dias seguidos ao trabalho. O julgamento levou em conta o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), documento que, entre outros pontos, estabelece diretrizes para superação de desigualdades de gênero.

Segundo os autos, a empregada foi admitida em janeiro de 2022 e descobriu gravidez em março do mesmo ano, quando apresentou atestado que lhe concedia licença médica. Em abril, 30 dias após o fim do afastamento, foi dispensada por justa causa. Durante todo esse período, manteve contato telefônico com o empregador explicando a situação.

A juíza Yara Campos Souto explica na sentença a origem dos 30 dias de ausência como critério de abandono do emprego: é uma analogia do artigo 474 da Consolidação das Leis do Trabalho, que define o tempo máximo de suspensão de um empregado. “O requisito objetivo parece não ter sido construído e pensado para a situação de uma mulher grávida, no trimestre inicial de gestação, acometida por intenso mal estar físico que a impede de se fazer presente e produtiva no trabalho”, avalia.

A magistrada considera que, embora incontroversas as faltas, a empresa foi cientificada da condição da profissional, inicialmente por apresentação de atestado médico e, posteriormente, por contato telefônico, “de onde se extrai a ausência do ânimo de abandonar o emprego, requisito subjetivo necessário à configuração da justa causa”.

Aplicação do protocolo

Para embasar a decisão, a magistrada relata ter seguido recomendação do documento do CNJ que sugere aos julgadores se perguntarem: “mesmo não havendo tratamento diferenciado por parte da lei, há alguma desigualdade estrutural que possa ter um papel relevante no problema concreto?”

A juíza chegou à conclusão que sim, havia essa desigualdade, uma vez que a condição de mulher e gestante expõe, por si só, a trabalhadora à discriminação no emprego, “ante a ideia socialmente compartilhada de que a maternidade afeta negativamente a produtividade da mulher, sendo este um cargo que só por ela deve ser suportado”.

Identificada a desigualdade, o protocolo recomenda que “a resolução do problema deve ser voltada a desafiar e reduzir hierarquias sociais, buscando, assim, um resultado igualitário”.

Com a decisão favorável, a profissional receberá saldo de salário, 30 dias de aviso prévio, férias proporcionais, 13º proporcional, multa de 40% sobre o FGTS, indenização substitutiva ao período de estabilidade (que abrange cinco meses após o nascimento da criança) e indenização por dano moral no valor de R$ 2 mil.

Cabe recurso.

Processo nº 1000573-83.2022.5.02.0708

TRT/GO: Funcionária não obtém equiparação com função paradigma por falta de provas

A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-18) aplicou o artigo 818 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e a Súmula 6, item VIII, do Tribunal Superior do Trabalho (TST) para negar provimento ao recurso ordinário de uma trabalhadora que pretendia obter equiparação de função. De acordo com o relator, desembargador Gentil Pio, a funcionária deixou de comprovar a identidade de funções com o posto de trabalho paradigma por seu direito. Com a decisão do colegiado foi mantida sentença do Juízo da 16ª Vara do Trabalho de Goiânia (GO).

A trabalhadora pediu à Justiça do Trabalho o reconhecimento da equiparação salarial em relação a um posto de trabalho superior. Ela atuava como repositora de mercadoria e pretendia ser reconhecida como promotora de vendas de uma multinacional. Como o pedido foi negado, ela recorreu ao tribunal.

No recurso, a defesa ponderou ser ônus da empresa demonstrar a ocorrência dos paradigmas e das análises de requisitos para a promoção para o cargo. Afirmou, ainda, que o conjunto de provas testemunhais confirma a identidade de funções entre o repositor e o promotor, que atendem o mesmo porte de estabelecimento, a mesma quantidade de produtos e exposição de mercadorias.

O relator, ao examinar o recurso, ponderou que a funcionária declarou que suas atividades basicamente eram a reposição de mercadorias em gôndolas. Além disso, Gentil Pio salientou que as provas testemunhais distinguiram as atividades realizadas por um promotor de vendas e um repositor. Ele esclareceu que um dos depoimentos diferencia a atividade do repositor que atua na reposição nas gôndolas, verificação de preços, verificação se os produtos disponíveis no estoque estão também expostos e limpeza das gôndolas, enquanto o promotor de vendas substituiu algum vendedor em férias, realiza visitas a clientes fora de Goiânia.

O desembargador salientou, também, que uma testemunha disse que para a promoção da função de repositor para promotor havia uma avaliação anual realizada pela multinacional. “Portanto, a análise dos depoimentos não deixa dúvidas de que a empregada exercia a função de repositora, o que afasta a pretensão de equiparação salarial com os paradigmas promotores”, disse Gentil Pio ao negar provimento ao recurso.

Processo: 0010008-64.2020.5.18.0016

TRT/RS: Vigia que desenvolveu síndrome do pânico após queda de raio não obtém direito a indenização

O empregado sofreu uma descarga elétrica proveniente de um raio que caiu próximo a si enquanto realizava a ronda noturna. Após o incidente, passou a apresentar episódios da síndrome do pânico. Os desembargadores da 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) consideraram que a queda de um raio caracteriza força maior, que afasta o nexo de causalidade e, portanto, o dever da empregadora de indenizar o trabalhador pela doença ocupacional. A decisão unânime confirma a sentença de improcedência proferida pela juíza Patrícia Bley Heim, da 3ª Vara do Trabalho de Gravataí.

O laudo pericial médico elaborado no processo foi conclusivo no sentido de que o choque elétrico atuou como concausa para o desencadeamento das crises de pânico. No entanto, ao analisar o caso em primeiro grau, a magistrada apontou que o empregado não comprovou a ocorrência da descarga elétrica, o que lhe cabia, nos termos do artigo 818, inciso I, da CLT. Além disso, a juíza Patrícia fundamentou que “a descarga elétrica decorrente de queda de raio caracteriza-se como força maior, sendo excludente de responsabilidade”. Nesse panorama, a sentença indeferiu o pedido de indenização.

O empregado recorreu ao TRT-4. O relator do caso na 4ª Turma, desembargador André Reverbel Fernandes, manifestou inicialmente que não foi comprovada a ocorrência do choque, uma vez que o trabalhador não trouxe testemunhas para depor no processo. E, mesmo que fosse verificada a hipótese do acidente, o julgador manteve o entendimento da sentença, no sentido de que a descarga elétrica atmosférica configura força maior, que afasta o nexo de causalidade entre o dano e a conduta da empresa. “Assim, escapando o evento à diligência da reclamada e sendo inteiramente estranho à vontade desta, não há como considerar que a demandada tenha concorrido para o acidente, direta ou indiretamente. Portanto, não há como reconhecer a responsabilidade da reclamada”, concluiu o magistrado.

Também participaram do julgamento a juíza convocada Anita Job Lübbe e a desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse. O empregado apresentou Recurso de Revista do acórdão para o Tribunal Superior do Trabalho (TST).

TST: Gestante demitida ao fim de contrato de experiência consegue indenização relativa à estabilidade

Para a 6ª Turma, o contrato de experiência é, em essência, por tempo indeterminado.


A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Magazine Torra Torra Ltda., de São Paulo (SP), ao pagamento dos salários e demais direitos correspondentes ao período da estabilidade gestante a uma promotora de vendas que engravidou durante o contrato de experiência. A Turma seguiu o entendimento de que a garantia da estabilidade visa, principalmente, à proteção do bebê.

Dispensa

A promotora foi contratada em dezembro de 2019 e demitida em janeiro de 2020. Na reclamação trabalhista, disse que descobriu que estava grávida em fevereiro de 2020 e comunicou o fato à empresa, para verificar a possibilidade de reintegração, porém sem sucesso.

A loja, em sua defesa, negou ter sido comunicada acerca da gravidez, e sustentou que, mesmo se assim não fosse, o desligamento ocorrera ao fim do contrato de experiência, que, a seu ver, era por prazo determinado.

Data da concepção
Para o juízo de 1º grau, a estabilidade gestante é devida mesmo em contrato de experiência, pois prevalece o entendimento de que o direito é adquirido no momento da concepção, independentemente de comunicação do fato ao empregador. De acordo com a sentença, a garantia de emprego visa principalmente resguardar direitos da criança, tratando-se, portanto, de direito irrenunciável.

Termo final
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, contudo, reformou a decisão, por entender que o término do período de experiência não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa, na medida em que as partes, ao firmarem o contrato, já estão cientes do seu termo final, ou seja, já sabem a data de sua extinção

Pretensão de tempo indefinido
Segundo o relator do recurso de revista da promotora, ministro Augusto César, o contrato de experiência é, a rigor, um contrato com a pretensão de ser por tempo indefinido, com cláusula alusiva ao período de prova. “Ou seja, estaria vocacionado à vigência por tempo indeterminado, quando celebrado de boa-fé”, explicou.

Por outro lado, o artigo 10, inciso II, alínea b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, sem impor nenhuma restrição quanto à modalidade de contrato de trabalho, “mesmo porque a garantia visa à tutela do nascituro”.

O ministro destacou que a matéria já foi pacificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que interpretou o sentido e o alcance da garantia de emprego, sendo irrelevante o regime jurídico ou a espécie de contrato de trabalho. Diante desse entendimento, o TST deu nova redação à Súmula 244, no sentido de que, mesmo nas hipóteses de contratos por prazo determinado, a gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no ADCT.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-1001419-65.2020.5.02.0613

TST: Professora será indenizada por dispensa no início do semestre letivo

Para a 3ª Turma, as circunstâncias do caso configuraram abuso de poder diretivo.


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Sociedade Educacional do Vale do Itapocu Ltda., de Guaramirim (SC), a indenizar uma professora universitária demitida um mês antes do início do semestre letivo. Segundo o colegiado, as circunstâncias do caso configuraram abuso de poder diretivo da faculdade, notadamente em razão da dificuldade que a professora teria de conseguir vaga em outra instituição de ensino, tendo em vista o início das aulas.

Dispensa
A professora, responsável pela coordenação de três cursos (Engenharia de Produção, Engenharia Química e Engenharia Elétrica), foi dispensada em 17/1/2019, durante o recesso escolar. Na reclamação trabalhista, ela sustentou que a dispensa a impedira de buscar nova colocação, pois, neste período, as instituições educacionais já haviam formado seu quadro de professores para o semestre letivo.

Segundo ela, como praxe, conforme calendário acadêmico, entre novembro e dezembro de 2018, a faculdade havia solicitado que ela montasse o quadro de horários dos cursos de Engenharia Química e Engenharia de Produção e que organizasse o início do próximo ano. Assim, havia, a seu ver, a expectativa legítima de continuidade na relação de emprego e, por isso, não buscou colocação em outras instituições.

Autonomia universitária
Em sua defesa, a sociedade educacional sustentou que a dispensa se dera de forma respeitosa. Outro argumento foi o de que as instituições universitárias têm autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e a lei não assegura nenhum tipo de estabilidade a professores. Assim, para configurar o dever de indenizar, deve ser comprovada alguma conduta reprovável, indevida ou culposa.

Sem provas
O juízo de primeiro grau concluiu que a dispensa acarretou a perda de uma chance da professora de manter a atividade docente no primeiro semestre de 2019 e deferiu o pagamento de indenização por danos materiais. Negou, entretanto, o pedido relativo aos danos morais, por considerar que não havia prova suficiente de constrangimento ou abalo moral capaz de caracterizar violação de sua honra ou imagem. A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC).

Perda de uma chance
O relator do recurso de revista da professora, ministro Alberto Balazeiro, explicou que, nos termos da “teoria da perda de uma chance” (artigos 186 e 927 do Código Civil), a vítima, privada da oportunidade de obter certa vantagem, em razão de ato ilícito praticado pelo ofensor, tem direito a indenização pelo prejuízo material sofrido, ante a real probabilidade de um resultado favorável esperado

Expectativa justa
Segundo o relator, a despedida sem justa causa não caracteriza, por si só, ato ilícito ou abuso de direito. No caso, porém, a dispensa ocorreu quando a professora já tinha expectativa justa e real de continuar na instituição de ensino. “A despeito das peculiaridades inerentes à atividade, a instituição incorreu em abuso de direito, desrespeitando os princípios da boa-fé objetiva e do valor social do trabalho”, concluiu.

Por unanimidade, a indenização foi fixada em R$ 30 mil.

Veja o acórdão.
Processo: RR-408-28.2019.5.12.0046

TRT/SP: Deixar trabalhador “na geladeira” durante contrato de trabalho intermitente configura rescisão indireta

O juiz titular da 3ª Vara do Trabalho de Mogi das Cruzes-SP, Leonardo Aliaga Betti, reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho intermitente mantido entre a rede de hotéis Club Med Brasil S/A e uma trabalhadora. A mulher, admitida em janeiro de 2021 para exercer a função de auxiliar de garçom, passou um ano inteiro sem um único chamado para prestar serviços, o que foi considerado falta grave praticada pela empresa.

E, segundo a lei, quando o empregador pratica falta grave ou alguma irregularidade contra o trabalhador, agindo de modo a tornar impossível ou intolerável a continuação do contrato, uma das consequências pode ser a rescisão indireta. Para o magistrado, a ausência de chamados foi um desses casos.

“A reclamada deixou passar toda uma alta temporada (janeiro, fevereiro e março de 2022) sem convocar a reclamante, o que, ao meu ver, já é suficiente para o decreto de rescisão do pacto”, afirmou. Ele também considera grave o equívoco quanto à modalidade de contratação:

“Se a reclamada, à época do contrato, já sabia que a reclamante seria convocada exclusivamente nesse período, deveria ter pactuado com ela típico contrato temporário, apenas pelos três primeiros meses de 2021, destinado a ‘atender à necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou à demanda complementar de serviços’”, enfatizou o juiz.

Contrariando essa tese, a rede de hotéis se defendeu afirmando que não houve qualquer irregularidade e que o fato de a profissional não ser convocada para prestar serviços desde fevereiro de 2021 não caracteriza falta grave, tratando-se, ao contrário, de característica peculiar desse tipo de vínculo.

A rede hoteleira foi condenada a pagar todas as verbas rescisórias a que a trabalhadora tem direito, incluindo salário-maternidade pelo período equivalente a 120 dias, com base no salário mínimo estadual vigente à época do nascimento do filho da obreira, que ocorreu durante o contrato de trabalho.

Processo nº 10003429120225020373

TRT/MG afasta sucessão trabalhista em caso de tabelião substituído por interventora que dispensou escrevente por justa causa

Para o juiz, a interventora, que assumiu o posto de forma provisória, interina e precária, agiu em defesa do patrimônio e da imagem do cartório, pois ficou comprovado que o escrevente recebeu pela lavratura de documentos públicos sem fazer repasses ao caixa.

A Justiça do Trabalho mineira descartou a existência de sucessão trabalhista em caso de titular de cartório que, após sofrer processo administrativo disciplinar e intervenção por parte do Ministério Público Estadual, foi afastado provisoriamente e substituído por interventora designada por decisão judicial. A sentença é do juiz Neurisvan Alves Lacerda, titular da 3ª Vara do Trabalho de Montes Claros, que ainda confirmou a dispensa por justa causa de escrevente, realizada pela interventora.

Trata-se de ação ajuizada pelo ex-empregado, que já trabalhava no Cartório de Notas da Comarca de Montes Claros/MG, antes da intervenção estatal, ou seja, quando ainda estava sob a responsabilidade do antigo tabelião. Após este sofrer processo disciplinar e ser afastado por intervenção estatal, foi substituído por interventora, que dispensou o trabalhador por justa causa.

Além de outros direitos trabalhistas que alegou terem sido descumpridos ao longo do período contratual, o escrevente pretendia a declaração de nulidade da dispensa, com o pagamento das verbas próprias da rescisão sem justa causa. Pretendeu também o recebimento de indenização por danos morais. Sustentou que a dispensa por justa causa decorreu do exercício abusivo do poder disciplinar, razão pela qual seria nula, além de gerar danos morais passíveis de reparação. Alegou a configuração de sucessão trabalhista, sustentando que a interventora teria sucedido o antigo tabelião e, dessa forma, ela deveria responder pelos créditos trabalhistas reconhecidos na ação.

Justa causa mantida
Mas, ao analisar as provas documental e oral produzidas no processo, o magistrado concluiu pela legalidade da dispensa por justa causa realizada pela interventora, por constatar que o escrevente incorreu em atos de negociação habitual, desídia, indisciplina, insubordinação (artigo 482, incisos “c”, “e” e “h”, da CLT).

Documentos comprovaram que ele recebeu dinheiro de usuários do cartório, referentes a pedidos de lavratura de escritura, mas não repassou para o caixa do cartório e nem executou os serviços requeridos pelos clientes. As transações irregulares também foram confirmadas por recibos de pagamento assinados pelo trabalhador e por pedidos de providência firmados pelos usuários.

Ficou demonstrado ainda, por documentos, que o escrevente recebeu valores de cliente para lavratura de escritura pública de compra e venda de imóvel, mas não procedeu ao lançamento correto do tipo de tributação e nem recolheu a taxa de fiscalização judiciária, o que levou à devolução do título pelo cartório.

Além disso, o próprio trabalhador admitiu que recebia dinheiro dos usuários, não somente relacionados a emolumentos, mas também a tributos. Ele confessou que recebeu dinheiro de uma cliente, inclusive referente aos emolumentos do registro do imóvel, e não repassou ao cartório, ficando com a quantia em sua gaveta por cerca de dois anos, devolvendo à cliente somente após a intervenção realizada pelo Ministério Público Estadual.

Testemunhas relataram que, antes da intervenção, havia caixas individuais dos escreventes, mas com fechamento diário, ou, no máximo, até o dia seguinte, e transferência do numerário para o caixa geral. Os relatos demonstraram que essa prática era permitida e aceita pelo antigo tabelião, o que mudou por determinação da interventora, que estabeleceu caixa único no cartório.

Uma testemunha confirmou ter ouvido de clientes que o escrevente os encaminhou para a execução dos serviços em outros cartórios e que efetuavam pagamentos a ele, fora do caixa do cartório, no estacionamento de frente, fatos ocorridos depois da intervenção do estabelecimento de clara proibição nesse sentido. Outra testemunha, que trabalhava no cartório desde 1995, garantiu que a interventora proibiu o recebimento de dinheiro pelos escreventes e determinou que todos aqueles que tivessem dinheiro do cartório em seu poder deveriam repassar ao caixa central.

Para o magistrado, as provas apresentadas evidenciaram infração trabalhista grave, capaz de justificar a dispensa por justa causa do empregado. “Se a prática de caixas individuais era aceita pelo antigo tabelião, certamente a apropriação indevida de valores dos clientes não era aceita, a exemplo da modificação do código tributário para apropriação da taxa judiciária, conduta cometida pelo escrevente”, destacou o juiz.

De acordo com o julgador, não houve perdão tácito das infrações, porque a interventora agiu a tempo e modo, tão logo tomou conhecimento das transações e procedimentos irregulares cometidos. Esses atos irregulares, inclusive, foram apurados após a intervenção, quando houve a regularização da serventia determinada pelo juiz diretor do foro, em razão de pedidos de providências e ações judiciais de clientes lesados.

“O escrevente causou inestimável prejuízo ao cartório, não somente do ponto de vista financeiro com o ressarcimento do prejuízo sofrido pelos clientes, mas também do ponto de vista moral, uma vez que a imagem da serventia restou afetada pelo serviço cobrado e não executado”, destacou o juiz. Na sentença, foi mantida a justa causa aplicada pela interventora e, por consequência, foram rejeitados os pedidos de pagamento das parcelas decorrentes da rescisão imotivada.

Dano moral inexistente
Segundo observou a sentença, o ex-empregado não produziu prova convincente de conduta ilícita capaz de afetar os direitos personalíssimos ou que pudesse ofender a esfera moral ou existencial.

Na conclusão do juiz, a interventora utilizou o poder diretivo e disciplinar, sem abuso ou excesso, para defender o patrimônio e a imagem do cartório, não expondo o trabalhador a nenhum procedimento vexatório. O pedido de indenização por danos morais foi rejeitado na sentença.

Sucessão trabalhista não configurada
Ao decidir o caso, o magistrado descartou a existência da sucessão trabalhista. Nesse quadro, julgou improcedentes os pedidos com relação à interventora e manteve a responsabilidade exclusiva do tabelião afastado, em relação aos créditos trabalhistas do ex-empregado reconhecidos na sentença (salários retidos, 13ºs salários, férias + 1/3, horas extras, FGTS).

O escrevente sustentou ter ocorrido a transferência da titularidade do cartório extrajudicial, com a continuidade da prestação de serviços a favor da interventora, razão pela qual teria se configurado a sucessão trabalhista, nos termos do artigo 10 e 448 da CLT. Alegou que, na qualidade de sucessora do antigo tabelião, a interventora deveria ser responsabilizada pelo pagamento de todas as parcelas trabalhistas reconhecidas na ação. Afirmou que a condição de interina ou interventora não seria bastante para afastar a condição de sucessora.

Mas o juiz explicou que, para a configuração da sucessão, “é necessária a transferência de bens, direitos, ações, ativos e passivos da empresa sucedida para a empresa sucessora”. Pontuou que a alteração na estrutura jurídica do empregador ou mudança de sua propriedade, de fato, não afeta os contratos de trabalho dos empregados, tampouco os direitos por eles adquiridos. Registrou que, nos termos do artigo 448-A da CLT, caracterizada a sucessão empresarial ou de empregadores prevista nos artigos 10 e 448 da CLT, as obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas à época em que os empregados trabalhavam para a empresa sucedida, são de responsabilidade do sucessor. Acrescentou que o parágrafo único da norma legal ainda estabelece que a empresa sucedida responderá solidariamente com a sucessora quando ficar comprovada a fraude na transferência.

Quanto aos cartórios, o julgador registrou que a jurisprudência do TST se consolidou no sentido de que os serviços notariais são exercidos por entes despersonalizados, por meio de delegação do Estado, recaindo a responsabilidade pelos encargos daí decorrentes sobre o titular da serventia, nos termos do artigo 21 da Lei 8.935/1994 (Ag-AIRR-450-63.2019.5.08.0119, 8ª Turma, Relatora Ministra Delaíde Alves Miranda Arantes, DEJT 3/9/2021).

Prova
No caso, a prova produzida revelou que o juiz diretor do foro da comarca de Montes Claros-MG, em 19/9/2019, determinou a instauração de processo administrativo disciplinar em face do tabelião titular do cartório, bem como seu afastamento cautelar até a decisão final do processo. Em seguida, o juiz diretor do foro designou a interventora, que também é parte na ação, para responder pelo expediente do cartório, durante o afastamento do titular e seus substitutos.

Na oportunidade, foi fixada a remuneração da interventora, quantia que, em sua renda líquida, não deveria exceder ao teto remuneratório de 90,25% do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal. Determinou-se que a interventora quitasse todas as despesas de custeio e pessoal com os valores auferidos da renda bruta mensal da serventia, conforme portaria aplicável ao caso.

Por outro lado, o juiz diretor determinou que a interventora providenciasse o pagamento da metade da renda líquida auferida pela serventia em favor do tabelião substituído, durante o período de seu afastamento, devendo a outra metade ser depositada em conta especial, com correção monetária.

Afastamento provisório do titular
No entendimento exposto na sentença, a situação retratada não configura sucessão trabalhista, uma vez que a interventora assumiu o cartório de forma provisória, interina e precária, somente até a definição do processo administrativo disciplinar, com limitações administrativas, gerenciais e temporais. “A hipótese não se assemelha aos precedentes baseados na saída definitiva do antigo titular (pela morte, desistência, renúncia, etc.), porque se trata de afastamento provisório do titular, ora primeiro reclamado, a depender do resultado das investigações, cujo veredito não se pode antecipar, antes da produção da prova e do exercício do contraditório e da ampla defesa”, destacou na sentença.

Encargo público
O julgador explicou que, na verdade, a interventora está exercendo um encargo público, a pedido do juiz diretor do foro, e não pode ser penalizada pelo exercício dessa missão, que, nas palavras do magistrado, “já é, por sua natureza, muito espinhosa, não se podendo esquecer que ela já é titular de seu próprio cartório, e, se o juiz a designou, foi pela confiança no desempenho do gravoso encargo”.

Foi pontuado que as medidas tomadas pela interventora não foram em nome próprio, mas em nome da serventia, ente despersonalizado a quem responde o titular, que continua sendo o antigo tabelião e réu na ação, até decisão administrativa ou judicial transitada em julgado.

Além disso, o julgador não vislumbrou risco à garantia da execução, uma vez que os créditos do ex-empregado reconhecidos na sentença serão destacados da renda bruta do cartório, sendo considerados como despesas de pessoal. “Saliento que eventual afastamento definitivo do primeiro reclamado e posse de novo titular também não afeta os créditos do ex-empregado, porque, nesse caso, operar-se-á efetivamente a sucessão, ainda que o processo esteja em execução de sentença”, concluiu. Não houve recurso em relação a essa matéria e a interventora não é mais reclamada no processo.

TRT/RN: Ex-empregada das Lojas Americanas feita refém em assalto é indenizada

A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (TRT-RN) condenou as Lojas Americanas S.A. a pagar indenização por danos morais, no valor de cinco salários, à ex-empregada feita refém durante assalto na antiga loja da Av. Afonso Pena, em Natal.

O assalto ocorreu em 25 de abril de 2020. A ex-empregada ficou como refém dos bandidos armados, junto com mais dois empregados e três clientes.

De acordo com as matérias publicadas nos sites de notícias, ela e os outros só foram liberados após uma hora de negociação com a Polícia Militar, que conseguiu a rendição dos bandidos e a liberação dos reféns.

A autora do processo afirmou, ainda, que foi vítima de vários assaltos à mão armada na loja, o que lhe causou transtornos psicológicos, sendo o mais grave o de abril de 2020.

Alegou também que a empresa ficou inerte após o assalto, sem apoio psicológico ou melhoria nas condições de trabalho.

Em sua defesa, as Lojas Americanas alegaram que não têm responsabilidade pelo ocorrido por não desenvolverem atividade de risco.

No entanto, para o juiz convocado Gustavo Muniz Nunes, relator do processo no TRT-RN, “não há como afastar o risco na atividade desenvolvida pela ex-empregada, que trabalhava nas Lojas Americanas, frequentemente assaltada”.

De acordo com ele, embora o empregador não tenha responsabilidade pela Segurança Pública, a “comercialização pelas Lojas Americanas de produtos com alto valor”, como eletrônicos e eletrodomésticos, “atrai a cobiça de marginais”.

Ele ressaltou, ainda, que, “mesmo com os assaltos”, a empresa não tomou qualquer providência para fornecer um ambiente de trabalho sadio a seus empregados.

“Ao contrário, continuou sem vigilância, não havendo qualquer mecanismo apto a inibir a ação dos meliantes”, concluiu o juiz, “o que resulta na responsabilidade da empresa pelos danos”.

A 9ª Vara do Trabalho de Natal havia condenado as Lojas Americanas ao pagamento da indenização por danos morais no valor de R$ 31.480,00.

Essa quantia foi reduzida, pela Primeira Turma do TRT-RN, para cinco vezes o último salário da ex-empregada.

As decisões da Justiça do Trabalho são passíveis de recursos, de acordo com a legislação vigente.

Processo nº 0000586-68.2021.5.21.0009

TRT/GO mantém pagamento de hora extra devido à ineficácia de acordos coletivos

A Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-18) manteve sentença da Vara do Trabalho de Goiatuba (GO) para condenar uma empresa de bioenergia ao pagamento de horas extras para um trabalhador. O colegiado reconheceu a ineficácia dos acordos coletivos de trabalho em decorrência do elastecimento da jornada de seis horas com regime de turnos ininterruptos de revezamento para além das oito horas diárias, tornando inválido o regime de compensação de jornada.

A empresa de bioenergia, ao recorrer para o TRT-18, pretendia evitar o pagamento das horas extras para o trabalhador. Alegou haver provas no sentido de não ter ocorrido a extrapolação de jornada e, por isso, as normas coletivas seriam válidas.

A desembargadora Kathia Albuquerque, ao negar provimento ao recurso, salientou a confissão da empresa constante no processo sobre a jornada semanal de 36 horas, sempre com dois dias de descanso. Além da confissão, a relatora considerou que os documentos juntados aos autos demonstram que a jornada contratual era de 07h20min, confirmando a existência de acordo coletivo de trabalho.

Albuquerque salientou que as provas nos autos revelaram a prestação habitual de horas extras acima de 8 horas diárias e/ou de 44 horas semanais, o que permitiria concluir que a empresa não cumpriu o convencionado com seu empregado. “Isto descaracteriza o regime de turnos ininterruptos de revezamento”, afirmou a relatora ao salientar a nulidade de regime de compensação de jornada acima de 8 horas diárias.

Neste sentido, a relatora citou jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em que se firmou a tese no sentido de apenas se admitir a exclusão do direito ao pagamento como extras das horas excedentes da sexta diária, quando, além de haver previsão expressa em norma coletiva acerca do elastecimento da jornada, seja respeitado o limite de oito horas, sob pena de se tornar ineficaz a própria norma coletiva. Assim, a desembargadora destacou que, no caso em exame, a norma norma coletiva passou a ser ineficaz, sendo devido ao trabalhador o pagamento das horas extras. A magistrada citou, ainda, julgamento da Segunda Turma do TRT-18 de fevereiro de 2002 com o mesmo entendimento.

Processo: 0010449-97.2020.5.18.0128

TRT/SP nega reintegração e indenização a porteiro contaminado por coronavírus

A Oitava Câmara do Tribunal Regional de Trabalho da 15ª Região manteve, por unanimidade, a decisão de primeiro grau que indeferiu os pedidos de reintegração e indenização a um porteiro contaminado por coronavírus, e que alegou ter sido dispensado de forma discriminatória. Segundo o trabalhador, o condomínio onde atuava não observou as medidas de prevenção e segurança contra a doença.

Conforme consta dos autos, o porteiro, contaminado pelo coronavírus, foi afastado do trabalho por 14 dias, por indicação médica, e ao retornar após a cura, foi dispensado, sem justa causa. Em sua avaliação, essa dispensa teria sido “discriminatória”, pelo simples fato de ter adoecido, e por isso requereu na Justiça do Trabalho a “declaração de nulidade da despedida com ressarcimento em dobro de todo o período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais”.

Na primeira instância, a juíza Cecy Yara Tricca de Oliveira, da 3ª VT de Sorocaba, entendeu que cabia ao trabalhador comprovar que a dispensa tinha sido motivada pela doença. Segundo a magistrada, “não é possível se cogitar em presunção da dispensa discriminatória, pois o retorno do reclamante ocorreu somente após estar curado e apto para o trabalho, conforme documentos médicos juntados”. Ela considerou, assim, que não se comprovou a relação entre a dispensa e a doença, e por isso rejeitou o pedido de reintegração e do pagamento de indenização pelo alegado ato discriminatório.

Para o relator do acórdão, desembargador Luis Roberto Nunes, a enfermidade do trabalhador que, “supostamente teria levado à sua dispensa imotivada não suscita, a rigor, estigma ou preconceito”. Assim, o colegiado entendeu que caberia ao trabalhador a prova do fato constitutivo de seu direito, “ônus do qual não se desvencilhou a contento, porque não há indício algum nos presentes autos de que a dispensa imotivada tenha cunho discriminatório”, concluiu.

A Oitava Câmara considerou, ainda, que não ficou comprovado que o condomínio tenha se descuidado nas medidas de controle e redução de contágio da Covid-19, não sendo possível “estabelecer nexo causal” entre a doença e o trabalho desempenhado, uma vez que as atividades do porteiro “não o expunham de maneira excepcional ao contágio”, nem “há notícia de outros empregados ou moradores do condomínio contaminados à época dos fatos”. Com tais fundamentos, rejeitou o pedido de responsabilização da empresa pelo alegado descumprimento das normas de saúde e segurança do trabalho.

Processo 0011381-29.2020.5.15.0109


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