TRT/MG: Merendeira tem reconhecido direito a adicional de insalubridade por exposição a calor excessivo

A Justiça do Trabalho reconheceu o direito à percepção do adicional de insalubridade no grau médio a uma empregada do Município de Poços de Caldas, que trabalha na produção de merendas escolares. Ela foi admitida pelo município para exercer a função de merendeira, após aprovação em concurso público. No período em que era juiz titular da 1ª Vara do Trabalho de Poços de Caldas/MG, o desembargador Delane Marcolino Ferreira constatou que a empregada exerceu atividades com exposição a calor excessivo.

A decisão se baseou em perícia técnica, que verificou a presença de “stress térmico” no trabalho da merendeira. As medições realizadas pelo perito apontaram intensidade de calor acima dos limites de tolerância estabelecidos no Anexo 3 da Norma Regulamentar, levando-o a concluir pela caracterização de atividade exercida sob condições insalubres, em grau médio.

O município impugnou as apurações do perito, mas não apresentou prova capaz de afastá-las. Conforme ressaltou o magistrado, o laudo pericial foi confeccionado por profissional de confiança do juízo e baseado nas reais condições de trabalho da merendeira, devendo prevalecer como meio de prova acerca da insalubridade na prestação de serviços.

Na sentença, considerando que o contrato de trabalho ainda estava em curso, o município foi condenado a pagar à merendeira o adicional de insalubridade em grau médio (20%) a incidir sobre o salário mínimo (Súmula nº 46 do TRT da 3ª Região), desde o início do período contratual não prescrito, em valores vencidos e vincendos. A manutenção do pagamento do adicional foi condicionada à permanência da situação de fato que o gerou.

O Município de Poços de Caldas interpôs recurso ordinário, mas a sentença foi mantida, por unanimidade, pelos julgadores da Quinta Turma do TRT-MG. Não cabe mais recurso e, atualmente, o processo está em fase de execução.

TRT/GO não reconhece pagamento “por fora” a pedreiro por falta de provas

A Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) não reconheceu o pagamento “por fora”, e os reflexos decorrentes, de um pedreiro. O relator, desembargador Platon Teixeira Filho, entendeu que o trabalhador não apresentou provas sobre o pagamento supostamente recebido além do valor constante no contracheque. O pagamento extrafolha ou “por fora” ocorre quando o empregado recebe um salário superior ao valor contratado na carteira de trabalho ou no holerite.

Foto de um pedreiro assentando tijolosO recurso foi interposto pelo pedreiro após o Juízo da 1ª Vara do Trabalho de Rio Verde/GO negar o pedido para ser contabilizado o pagamento do salário “por fora”. O trabalhador alegou que sua defesa foi inviabilizada por que a empresa não teria juntado os comprovantes de depósitos e holerites de todo o período trabalhado.

O relator observou que o pedreiro alegou receber como salário o valor de R$3.600,00 mensais, entretanto os contracheques apresentavam remuneração de R$2.956,80. A empresa ao se defender disse que não havia pagamento extrafolha e o salário era o constante dos holerites. O desembargador explicou que o reconhecimento judicial de pagamento de salário “por fora” deve acontecer por meio de provas, por ser uma alegação capaz de gerar sérias consequências ao empregador nos campos penal, tributário, previdenciário e trabalhista.

Platon Filho ressaltou que a responsabilidade de comprovar o pagamento salarial não contabilizado é do trabalhador, por ser fato constitutivo do direito requerido. O desembargador analisou as declarações do pedreiro no sentido de que sempre recebeu via depósito bancário, todavia não teria juntado comprovantes nesse sentido. O relator também considerou que as provas testemunhais não esclareceram o pagamento por fora.

O magistrado observou que a alegação do trabalhador de que a empresa teria cerceado sua defesa ao não apresentar os comprovantes de transferências bancárias não merece prosperar. “Ora, não se mostra plausível o impedimento do autor trazer aos autos alguns extratos de sua(s) conta(s) de banco que comprovassem os valores efetivamente recebidos da empresa”, ponderou.

O desembargador considerou ainda a evolução salarial do pedreiro pelos contracheques juntados aos autos para reafirmar não haver prova nenhuma de pagamento extrafolha. O relator citou ainda jurisprudência da 2ª Turma do TRT-18 no mesmo sentido. Por fim, o relator manteve a sentença questionada e negou provimento ao recurso.

Processo: 0010744-16.2023.5.18.0101

TST: Empresa de limpeza é responsabilizada por lesões nos braços de agente de asseio

Uma delas resultou em cirurgia 20 dias depois da demissão da trabalhadora .


A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a responsabilidade da Verzani & Sandrini Ltda., de Santo André (SP), pelas diversas lesões desenvolvidas por uma agente de asseio em razão do trabalho. Assim, a empresa deverá pagar pensão mensal vitalícia e indenização por dano moral, a ser arbitrada nas instâncias anteriores. Segundo o colegiado, o fato de a empresa conceder intervalos de recuperação regulares não afasta sua responsabilidade civil pelos problemas de saúde relacionados ao serviço.

Doenças e lesões no trabalho
A agente de asseio e conservação trabalhou para a empresa de novembro de 2001 a de julho de 2017. Ela demonstrou ter sofrido uma queda quando removia cera do piso de um shopping em 2005, que resultou em lesão no punho. Em outro momento, desenvolveu doença inflamatória em punhos e cotovelos, por recolher bandejas e limpar pisos dos sanitários do Shopping ABC.

Incapacidade
Em razão disso, teve redução parcial e permanente da capacidade de trabalho em 32,5% e ficou cinco anos afastada pelo INSS. Depois da reabilitação, foi diagnosticada com síndrome do túnel do carpo e, 20 dias após a demissão, passou por cirurgia para tratar esse problema.

Responsabilidade civil
O juízo da 3ª Vara do Trabalho de Santo André (SP) deferiu pensão mensal vitalícia de R$ 414 e indenização por danos morais de R$ 30 mil, além do pagamento de valores relativos à estabilidade de 12 doze meses decorrente de doença do trabalho.

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região excluiu a condenação, por entender que não houve prova da negligência da empresa, que concedia regularmente os intervalos para recuperação. Ainda destacou que, mesmo com o afastamento previdenciário, a doença evoluiu, o que demonstraria que não havia como a empresa evitá-la.

Culpa presumida
A relatora do recurso de revista da agente, ministra Kátia Arruda, explicou que, quando se demonstra o dano e o nexo causal com as atividades desenvolvidas, o TST tem declarado a responsabilidade civil por culpa presumida do empregador, a quem cabe a integridade física de quem presta o serviço e responder pelos danos sofridos.

A ministra ponderou que essa presunção, evidentemente, admite prova em contrário, a cargo do empregador. Mas, embora o TRT tenha afastado a negligência da empregadora, os procedimentos foram insuficientes para impedir a queda, as lesões nos punhos e cotovelos e o diagnóstico posterior de síndrome do túnel do carpo.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: RR-1002209-12.2017.5.02.0433

TST: Honorários não citados no dispositivo da sentença serão incluídos em cálculo dos valores devidos

A matéria havia sido decidida na fundamentação da decisão.


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou a inclusão dos honorários advocatícios no valor a ser pago pela Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros) na execução de uma sentença trabalhista. Embora não constasse na parte dispositiva da sentença, a matéria havia sido decidida na fundamentação e, portanto, a parcela deve ser incluída nos cálculos.

Fundamentação x dispositivo
A fundamentação é a parte em que o julgador expõe as razões que embasam a sua decisão e os elementos que formaram seu convencimento.

O dispositivo, por sua vez, é a conclusão ou parte final de uma decisão judicial, em que o julgador acolhe ou rejeita o pedido formulado na ação.

Aposentado
O caso julgado pela Turma se refere à execução de sentença em ação ajuizada por um aposentado contra a Petros, em março de 2018, após sucesso em ação coletiva movida pela associação de aposentados. Em setembro de 2020, o aposentado recebeu o crédito, mas não os honorários.

Reforma Trabalhista
A Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) incluiu na CLT o artigo 791-A, que prevê o pagamento de honorários pela parte vencida, seja ela a empresa ou o empregado.

Fora do dispositivo
Tanto o juízo da 5ª Vara do Trabalho de Fortaleza (CE) quanto o Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região consideraram indevida a parcela, porque não fizera parte do dispositivo da decisão. Para o TRT, o cumprimento da sentença deve se limitar ao que foi decidido na parte dispositiva, sob pena de violação à coisa julgada. Assim, não seria possível incluir a verba nos cálculos de liquidação.

Verba acessória
Diante da decisão, o aposentado recorreu ao TST, argumentando que os honorários advocatícios são verba acessória à condenação e podem ser executados mesmo quando seu deferimento não constar da parte dispositiva da decisão.

Jurisprudência
Prevaleceu no julgamento a jurisprudência do TST de que a chamada coisa julgada, ou decisão definitiva, da qual não cabe mais recurso, ocorre quando há fundamentação e conclusão favorável, ainda que o decidido não conste da parte dispositiva da sentença ou do acórdão. Segundo o colegiado, o cumprimento da sentença não precisa se limitar ao que foi explicitado na conclusão. “O dispositivo também abrange o conteúdo decisório referente ao enfrentamento das questões de mérito, registrado na fundamentação”, concluiu o relator, ministro Alberto Balazeiro.

Processo: RR-257-63.2018.5.07.0005

TST: Bancária mãe de filhas gêmeas autistas consegue reduzir jornada sem alteração salarial

Decisão se baseou na aplicação, por analogia, de direito garantido aos servidores públicos federais.


A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que seja mantido o salário de uma empregada do Banco Bradesco S.A. cuja jornada foi reduzida de oito para quatro horas por ser mãe de gêmeas autistas. O colegiado aplicou, por analogia, regra do Regime Jurídico Único dos servidores públicos federais (Lei 8.112/1990) que possibilita redução de jornada de quem que tenha filho com deficiência sem a diminuição dos vencimentos.

Requerimento negado
A bancária, moradora de Alegrete (RS), é empregada do Bradesco desde 2006 e exerce a função de supervisora administrativa, com carga horária de oito horas e remuneração mensal que inclui gratificação de função. Mãe de duas gêmeas nascidas em 2011 e diagnosticadas em 2014 com Transtorno do Espectro Autista (TEA), ela havia requerido administrativamente a redução de 50% da jornada, mas o Bradesco negou.

Tratamento de alto custo
Na ação trabalhista, ela reiterou o pedido, argumentando que o transtorno autista das meninas é de moderado a severo em uma delas e severo na outra e que ambas necessitam de tratamento com equipe multidisciplinar, de alto custo, com acompanhamento constante dos pais.

Redução
O juízo de primeiro grau atendeu parcialmente o pedido e determinou a redução da carga horária para quatro horas diárias, no turno da manhã, sem necessidade de compensação e sem redução salarial. Mas retirou a gratificação de função, por ser destinada a cargo de chefia com jornada de oito horas. Ao examinar o recurso da trabalhadora, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região decidiu incluir a gratificação na remuneração, mas reduziu proporcionalmente o salário e a gratificação.

Ônus excessivo
O relator do recurso de revista da bancária, ministro Agra Belmonte, observou que a situação impõe ônus excessivo à bancária. Além de exigir grande parte de seu tempo, também emprega boa parte de sua remuneração, pois as crianças precisam de acompanhamento médico, fonoaudiológico e psicopedagógico.

Situações análogas
Na avaliação de Agra Belmonte, se o servidor federal tem a prerrogativa de reduzir a jornada sem perda de remuneração, os empregados regidos pela CLT também devem ter direito semelhante. “Pessoas em situações análogas não podem ser tratadas de forma absolutamente desigual”, afirmou, sob pena de violação do princípio da igualdade previsto tanto na Constituição Federal quanto na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU (CDPD).

STF
O relator lembrou, ainda, que o Supremo Tribunal Federal (STF) já estendeu essas regras aos servidores estaduais e municipais e que o empregador, no caso, é uma das maiores instituições bancárias do país, de modo que o ônus a ser suportado por ela é razoável diante do benefício social que a medida trará para as crianças com deficiência.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: RR-20253-08.2018.5.04.0821

TJ/MG: Custeio de tratamento prova que não houve discriminação na dispensa de dependente químico

Empresa dispensou técnico depois que ele e esposa faltaram às consultas.


A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de um técnico eletroeletrônico da Vale S.A. que pretendia reconhecer que sua dispensa teria sido discriminatória, por ser dependente químico. Esse argumento foi rejeitado porque a empresa havia custeado sua internação e seu tratamento, e só o dispensou depois que ele faltou a consultas.

Desintoxicação
Na ação trabalhista em que pedia reintegração e indenização, o técnico disse que, ao tomar conhecimento da sua doença, a Vale o encaminhara a um programa custeado por ela. Como a situação era grave, ele foi afastado pelo INSS por auxílio-doença e foi internado numa clínica por 45 dias, para desintoxicação.

Faltas a consultas
Após retornar do afastamento, ele iniciou tratamento com psicólogos, psiquiatras e terapeutas. No entanto, alegando que ele teria faltado a algumas consultas e que sua esposa não comparecera às consultas familiares em setembro de 2014, ele foi desligado do programa e dispensado três dias depois.

O técnico sustentou que havia comparecido a todas as consultas daquele mês técnico e anexou comprovantes. As únicas faltas, em maio de 2014, foram justificadas por e-mail, porque estava fazendo um curso de treinamento da própria Vale. As faltas da esposa, por sua vez, teriam ocorrido porque ela começou a trabalhar naquele mês, o que também teria sido comunicado por e-mail.

Reintegração
A 6ª Vara do Trabalho de Vitória (ES) condenou a Vale a reintegrar e indenizar o técnico. A dispensa foi considerada discriminatória, porque ele estava doente na data da rescisão.

Sem justificativa
Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES), afastou a condenação, por entender que a empresa havia cumprido sua função social ao oferecer tratamento, em vez de demitir sumariamente o empregado ao saber de seu problema com drogas.

O TRT registrou também que o técnico e sua esposa deixaram de comparecer diversas vezes ao programa oferecido pela Vale, sem justificativa que pudesse abonar as faltas.

Atitude inclusiva
O trabalhador tentou rediscutir o caso no TST, mas o relator do agravo, ministro Agra Belmonte, destacou que ficou provado que não houve discriminação, porque a intenção da empresa, desde o início, era recuperar o empregado. Afinal, a empregadora ofereceu programa de readaptação destinado a pessoa com dependência química, “inclusive com acompanhamento familiar, em atitude extremamente inclusiva”, mas ele e a esposa faltaram inúmeras vezes ao programa.

Prova em contrário
Agra Belmonte apontou que a dependência química e de álcool não é uma doença relacionada ao contrato de trabalho. Apesar disso, o TRT, a partir do conjunto de fatos e provas, registrou a aptidão do profissional e a ausência de discriminação na dispensa.

Com isso, a decisão não contrariou a Súmula 443 do TST, que presume ser discriminatória a dispensa em caso de doença grave ou que gere estigma ou preconceito. Por se tratar de presunção, cabe à empresa provar em contrário, o que a Vale conseguiu fazer.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: AIRR-1641-21.2014.5.17.0006

TRT/AM-RR condena conselho profissional de classe a pagar indenização por dispensa discriminatória

Para o juízo da 3ª Vara do Trabalho de Boa Vista/RR a conduta do empregador ofendeu a dignidade da trabalhadora PcD.


O Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR) acolheu o pedido de indenização por danos morais de uma trabalhadora PcD, e condenou um conselho profissional de classe, em Boa Vista, ao pagamento de R$ 40 mil reais, por dispensa discriminatória. A sentença foi proferida pelo juiz do Trabalho Raimundo Paulino Cavalcante Filho, titular da 3ª Vara do Trabalho de Boa Vista, que entendeu presentes os requisitos de ofensa à dignidade da pessoa humana.

A empregada, portadora de transtorno do espectro autista (TEA), foi aprovada em concurso público do conselho para ocupar o cargo de assistente administrativo na vaga de PcD. Admitida em julho de 2022, por meio de contrato de experiência pelo prazo de 90 dias, foi dispensada em outubro de 2022. Na ação, ajuizada no TRT-11 em agosto de 2023, a trabalhadora pediu indenização por danos morais pela dispensa discriminatória, por entender que a demissão aconteceu devido à deficiência.

Em sua defesa, o empregador negou a ocorrência de discriminação. Afirmou que antes de dispensar a empregada tentou, em todos os setores, realizar a adaptação dela, sem sucesso, uma vez que a trabalhadora não se adequava nem tinha afinidade com nenhuma seção do local de trabalho. Isso ocasionou uma avaliação negativa sobre o seu desempenho funcional.

Inclusão não realizada

Por sua vez, o entendimento do juiz do Trabalho Raimundo Paulino foi de que o conjunto das provas do processo deixou claro que o órgão realizou insignificantes esforços de inclusão da trabalhadora PcD, como era seu dever constitucional. Para ele, o conselho optou pelo desligamento da funcionária no lugar de reconhecer suas necessidades e adaptá-la ao ambiente de trabalho.

De acordo com o magistrado competia ao empregador cultivar as aptidões profissionais da trabalhadora de forma adaptada às circunstâncias de pessoa com deficiência, o que não ocorreu. Segundo o juiz, houve falta de sensibilidade e empatia por parte de alguns dos dirigentes do conselho profissional de classe na gestão das atividades da trabalhadora PcD, considerada por lei especialmente vulnerável e necessitando maior proteção, conforme previsto no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015).

TRT/MG: Município é condenado a indenizar viúvo e filhos de agente comunitária de saúde que faleceu por Covid-19

Empregada era diabética e não foi afastada do serviço.


A falecida foi contratada pelo Município de Belo Horizonte, após aprovação em concurso público, em abril de 2008, para trabalhar como agente comunitária de saúde. Em fevereiro de 2021, foi afastada do serviço por ter contraído a Covid-19. Apenas 16 dias depois, morreu em decorrência da doença. Contava com 42 anos de idade, deixou viúvo e dois filhos, um deles menor.

O juiz Walace Heleno Miranda de Alvarenga, no período em que atuou na 19ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, foi o responsável pelo julgamento da ação trabalhista ajuizada pelos herdeiros da falecida contra o Município de Belo Horizonte. Na sentença, o magistrado reconheceu a existência de doença ocupacional e a responsabilidade civil objetiva do empregador pelo ocorrido com a empregada. Entendeu que o município foi negligente na adoção das normas de segurança e medicina do trabalho, principalmente tendo em vista que a agente comunitária de saúde era diabética e não foi afastada de suas atividades durante a pandemia do coronavírus.

Na decisão de primeiro grau, o município foi condenado a pagar a cada um dos herdeiros indenização por danos morais de R$ 100 mil (perfazendo R$ 300 mil), além de indenização por danos materiais, na forma de pensão mensal, no valor de R$ 1.474,77, a ser dividida entre eles, quantia correspondente a 2/3 do último salário da falecida (de R$ 2.212,16 mensais). Em grau de recurso, os julgadores da Oitava Turma do TRT-MG aumentaram o valor da indenização para R$ 250 mil para cada um: o viúvo e os dois filhos, totalizando R$ 750 mil.

Defesa do município
O réu sustentou a impossibilidade de se afirmar que a doença tenha sido contraída pela ex-empregada durante a realização de suas atividades de agente comunitária de saúde. Argumentou que não houve culpa/negligência de sua parte e que adotou todas as medidas e cuidados para evitar a contaminação e a disseminação da Covid-19 durante o contrato de trabalho. Alegou não ser o caso de incidência da responsabilidade objetiva do empregador.

Doença ocupacional
No exercício de suas atividades como agente comunitária de saúde, a falecida atuava de forma direta no enfrentamento e atendimento de pacientes acometidos por Covid-19. Em 6/2/2021, ela foi afastada do trabalho por ter contraído a Covid-19. O óbito ocorreu em 22/2/2021. Comunicação de acidente de trabalho (CAT) emitida pelo próprio município identificou como doença profissional a patologia que causou a morte da trabalhadora.

Na conclusão do juiz, a doença que vitimou a empregada (Covid-19) se amolda integralmente ao conceito legal de doença ocupacional. Ao formar sua convicção, o magistrado se baseou no artigo 20 da Lei 8.213/1991, que considera acidente do trabalho as seguintes entidades mórbidas: “I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social; II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I”.

O entendimento adotado pelo magistrado também levou em conta o disposto no parágrafo 1º, alínea “d” da mesma norma legal, que não considera como doença do trabalho a “doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho”, como ocorrido no caso.

Responsabilidade civil objetiva
Na decisão, foi ressaltado que, pela teoria da responsabilidade civil subjetiva, nos termos dos artigos 186 e 927, do Código Civil, o dever jurídico de indenizar exige a presença dos seguintes elementos: o ato ilícito omissivo ou comissivo, culposo ou doloso, o nexo de causalidade e o dano.

Registrou-se que há ainda a teoria da responsabilidade civil objetiva, prevista no artigo 927, parágrafo único, do Código Civil, quando o dever de indenizar incide sem a necessidade do elemento subjetivo culpa. Essa modalidade de responsabilidade ocorre nas hipóteses legalmente previstas, ou quando a atividade do agente causador do dano implicar risco à vítima. De acordo com o magistrado, essa situação se verificou no caso, tendo em vista que as atividades de agente comunitária de saúde, que a falecida exercia em prol do município, são consideradas de risco, por natureza, diante da necessidade do contato direto com pessoas contaminadas com o coronavírus, sendo evidente o perigo de contágio, especialmente no período da pandemia.

Constitucionalidade
Segundo o pontuado na sentença, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 828040, com repercussão geral reconhecida, decidiu que o trabalhador que atua em atividade de risco tem direito à indenização em razão de danos decorrentes de acidente de trabalho, independentemente da comprovação de culpa ou dolo do empregador. “Assim, a Corte Suprema assentou ser constitucional a imputação da responsabilidade civil objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho em atividades de risco”, destacou o magistrado.

Risco inerente à atividade
Conforme ponderou o julgador, a responsabilidade objetiva exige, para sua incidência, que o risco causador do dano seja uma circunstância inerente à atividade empreendida pelo tomador da mão de obra, como no caso. Citou, no aspecto, a doutrina do desembargador do TRT-MG, Sebastião Geraldo Oliveira: “não é necessário que haja comportamento anormal ou ilícito do empregador para gerar o direito à indenização, pois o simples exercício da sua atividade rotineira, ainda que normalmente desenvolvida, pode acarretar o direito à indenização, caso tenha provocado danos à vítima”. (OLIVEIRA, Sebastião Geraldo. Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional, São Paulo: Ed. LTR, 2014 – pág. 135).

Coronavírus
Sobre o coronavírus, o magistrado ressaltou que é fato cientificamente comprovado, além de amplamente divulgado, que se trata de um agente viral de rápida transmissão e mutabilidade, que não escolhe quem contamina, e que tem a capacidade de produzir efeitos nocivos à saúde e levar a óbito qualquer ser humano, sem distinção.

“Qualquer ambiente que vier a ser periciado, em qualquer momento, desde que por ele circulem pessoas contaminadas, com ou sem sintomas, pode apresentar condições que destaquem a presença do agente viral em determinado momento, e a sua ausência no momento seguinte. E isso é tão evidente que o coronavírus transformou-se em pandemia”, destacou Miranda.

Para o juiz, não houve dúvida de que a ex-empregada atuava de forma direta no enfrentamento do coronavírus e no atendimento de pacientes acometidos por Covid-19. O fato, além de demonstrado por documentos apresentados no processo, foi confirmado pelo próprio município, que informou que a manutenção de agentes comunitários de saúde no exercício de suas funções era necessária ao cumprimento do “relevante papel de levar informações à população sobre medidas preventivas (…), evitando assim risco de maior número de infecções”.

Covid-19 X Doença ocupacional
Sobre a possibilidade de se considerar a existência de nexo causal entre a Covid-19 e o trabalho desempenhado, foi pontuado que o Supremo Tribunal Federal, em controle concentrado de constitucionalidade que realizou sobre o artigo 29, da MP 927/2020, entendeu que o dispositivo legal, ao excluir, como regra, a contaminação pelo coronavírus da lista de doenças ocupacionais, transferindo o ônus da comprovação ao empregado, contrariou entendimento do STF em relação à responsabilidade objetiva do empregador em alguns casos (ADI’s 6342 e 6380).

Comorbidades – Prova – Autodeclaração X Atestado médico
Conforme esclareceu o magistrado, decisão proferida na Ação Civil Pública 0010253-77.2020.5.03.0021 determinou “o afastamento, mediante autodeclaração, dos agentes comunitários de saúde acometidos de doenças que possam agravar seu estado pelo contágio do Covid-19, tais como diabéticos, diagnosticados de pneumopatia e doenças neurológicas, problemas renais, obesidade, asmas e outras comorbidades”.

Decisão que julgou o Mandado de Segurança 0010656-12.2020.5.03.0000O manteve o afastamento das pessoas inseridas no grupo de risco para a Covid-19. Entretanto, determinou que a existência da comorbidade, inclusive para os agentes comunitários de saúde, fosse comprovada por relatório ou atestado médico, e não por autodeclaração.

Comorbidade da empregada – Ciência do empregador
No caso, ficou provado por atestado médico que a ex-empregada era portadora de diabetes do tipo 2, fazendo uso contínuo de insulina. Embora ela não tenha apresentado o atestado/relatório médico comprovando a situação, na análise do juiz, não houve dúvida de que o empregador tinha conhecimento da comorbidade da falecida, principalmente por ela ter realizado o tratamento e recebido a prescrição da medicação na própria unidade de saúde em que trabalhava, conforme comprovado por documentos.

“Isso demonstra que o Município reclamado tinha evidente conhecimento acerca da doença da empregada falecida, de modo que, por ser seu dever manter um meio ambiente de trabalho hígido e equilibrado (art. 19, § 1º, da lei 8.213/91), preservando a integridade física e a saúde de seus trabalhadores, o que mínima e razoavelmente se esperava era a sua própria iniciativa de afastamento da empregada”, destacou o juiz, observando que, entretanto, a esperada conduta do empregador não ocorreu.

Laudo pericial – Necessidade de afastamento do serviço
Laudo pericial provou que houve a infecção por Covid-19, com necessidade de tratamento hospitalar que evoluiu para o óbito da agente comunitária de saúde. Sobre a agressividade do coronavírus no corpo humano, o perito esclareceu que a patologia que acometia a ex-empregada – “diabetes mellitus” – representa um risco adicional de morte. Além disso, registrou que houve a comprovação do diagnóstico da patologia que determinava a necessidade de afastamento do trabalho.

O réu juntou parecer de assistente técnico afirmando que não houve prova de que a falecida solicitou o afastamento do trabalho e que, se ela o tivesse feito, teria sido afastada. A afirmação causou estranheza ao juiz, por induzir à conclusão de que, sob a ótica do empregador, a responsabilidade pelo próprio óbito foi da ex-empregada, que não cumpriu uma formalidade burocrática de autodeclaração da comorbidade que possuía. Como frisou o magistrado, o município tinha conhecimento do quadro de saúde da falecida, que era sua empregada desde 2008 e ainda tratava da diabetes na própria instituição de saúde em que trabalhava. Para o julgador, a justificativa apresentada pelo réu indica desprezo pelo quadro clínico de seus empregados ou, no mínimo, desorganização quanto ao controle das informações específicas de seus trabalhadores.

Nexo de causalidade
A sentença concluiu pela existência do nexo causal entre o trabalho e a doença contraída pela ex-empregada, que conduziu ao falecimento dela, bem como pela responsabilidade civil do município pelo ressarcimento dos danos sofridos pelos autores. Incidiu, no caso, a responsabilidade civil objetiva do empregador, que dispensa a configuração de culpa na ocorrência do evento danoso.

Embora o laudo pericial não tenha concluído de modo categórico pela caracterização do nexo de causalidade entre a atividade da agente comunitária de saúde e a doença da Covid-19 que a levou ao óbito, foi ressaltado na decisão que, nos termos do artigo 479 do CPC/2015, o juiz não está adstrito às conclusões da perícia, cuja função é apenas auxiliar o julgador na apuração e esclarecimento de matéria que exija conhecimentos técnicos especiais. “Por isso mesmo, o juízo, sendo livre na formação do seu convencimento, poderá decidir de forma contrária”, destacou o Miranda.

Ficou esclarecido ainda que o nexo de causalidade entre a Covid-19 e o trabalho desempenhado poderá ocorrer de forma objetiva, ou seja, por previsão expressa em lei, ou quando a atividade, por sua natureza, apresentar exposição habitual a risco especial maior. Para o julgador, esse era o caso das atividades exercidas pela agente comunitária de saúde, consideradas de risco por natureza, porque implicava contato direto e habitual com pessoas contaminadas com o coronavírus. “O nexo de causalidade entre a atividade exercida pela obreira e a contaminação por Covid-19 também se faz presente, sobretudo pelo fato de restar provado que a comorbidade que a falecida possuía (diabetes) era sim de conhecimento da parte reclamada”, destacou ainda o julgador.

O entendimento sobre a existência do nexo de causalidade também se baseou no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 14.128/2021, que assim dispõe: “Presume-se a Covid-19 como causa da incapacidade permanente para o trabalho ou óbito, mesmo que não tenha sido a causa única, principal ou imediata, desde que mantido o nexo temporal entre a data de início da doença e a ocorrência da incapacidade permanente para o trabalho ou óbito, se houver: I – diagnóstico de Covid-19 comprovado mediante laudos de exames laboratoriais; ou II – laudo médico que ateste quadro clínico compatível com a Covid-19”. Segundo observou o julgador, é presumível que a ex-empregada, quando supostamente contraiu a doença, encontrava-se exercendo suas funções sujeitas a alto risco de contaminação pela Covid-19, que resultou em seu falecimento, conforme registrado na certidão de óbito.

Teoria do risco criado
Tendo em vista as circunstâncias apuradas, o juiz não teve dúvida da incidência, no caso, da teoria do risco criado, citando a doutrina de Caio Maio da Silva Pereira: “O conceito de risco que melhor se adapta às condições de vida social é o que se fixa no fato de que, se alguém põe em funcionamento qualquer atividade, responde pelos eventos danosos que esta atividade gera para os indivíduos, independentemente de determinar se em cada caso, isoladamente, o dano é devido à imprudência, à negligência, a um erro de conduta, e assim se configura a teoria do risco criado”. (Responsabilidade Civil. 9 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 270).

Princípio da alteridade contratual
A aplicação ao caso da teoria objetiva da responsabilidade civil tornou desnecessária a pesquisa de eventual culpa do município pelo ocorrido com a ex-empregada. Como ponderou o juiz, pelo princípio da alteridade contratual, os riscos do empreendimento devem ser suportados única e exclusivamente pelo empregador (artigo 2º da CLT). “A interpretação de tal preceito, conjugada com os princípios fundamentais da valorização social do trabalho, da dignidade da pessoa humana e da função socioambiental da propriedade inerente à ordem econômica (arts. 1º, III, IV e 170, III, da CF/88), leva à inexorável ilação de que os riscos que o empregador assume em sua atividade ultrapassa os estritos limites financeiros da relação jurídica trabalhista, pois também deve se responsabilizar pelas lesões acarretadas a seus empregados no exercício do trabalho do qual tira proveito”, destacou.

Danos morais reflexos ou “em ricochete”
Os autores pediram indenização por danos morais em ricochete, decorrentes do acidente de trabalho que resultou no falecimento da esposa e mãe. “Todos os autores se enquadram como vítimas indiretas do evento morte derivado da doença ocupacional sofrida pela vítima, eis que atingidos em sua honra e intimidade (art. 223-C da CLT)”, concluiu a sentença.

Segundo o pontuado, os danos morais são lesões que afetam os atributos íntimos do indivíduo e atingem frontalmente os seus direitos da personalidade, como a vida, honra, dignidade, imagem, privacidade e outros, sendo passíveis de indenização compensatória, nos termos do artigo 5º, V e X, da Constituição Federal de 1988. Ainda, entre as lesões de cunho extrapatrimonial, há o dano moral indireto, reflexo ou em ricochete, “em que o ato ilícito praticado em detrimento da vítima direta reverbera seus efeitos e atingem os detentores de certo vínculo de afetividade para com aquela, notadamente os familiares e parentes mais próximos, o que lhes acarreta o chamado prejuízo de afeição”, explicou Miranda.

Conforme consignado na decisão, a doutrina e a jurisprudência trabalhistas sedimentaram o entendimento de haver uma presunção relativa de dor moral dos filhos, cônjuge ou companheiro(a) e pais do trabalhador falecido em decorrência de acidente de trabalho. O entendimento decorreu da interpretação por analogia do artigo 16, parágrafo 4º, da Lei nº 8.213/1991, segundo o qual o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho se presumem economicamente dependentes do segurado da previdência social, bem como do artigo 20, parágrafo único, do Código Civil, que estabelece a legitimidade do cônjuge, ascendentes e descendentes para requerer indenização no caso de violação da honra, boa fama ou da respeitabilidade da pessoa falecida.

“No caso dos autos, a perda da esposa e genitora, de apenas 42 anos de idade, vítima da fatídica doença que assolou a humanidade nos últimos anos, não deixa espaço para dúvidas acerca do sofrimento extremo impingido aos autores”, destacou o juiz, ressaltando que, para tanto, basta pensar na angústia do marido e filhos que tiveram que acompanhar a evolução negativa do quadro clínico da trabalhadora, que resultou em sua morte.

O juiz chamou atenção para o fato de que um dos autores e filho da falecida contava com apenas seis anos de idade à época do óbito: “terá que prosseguir com sua vida levando de sua mãe apenas as poucas lembranças dela quando viva, tendo em vista a sua tenra idade”, frisou.

“Tal situação acarreta dor, saudade, indignação, sentimento de impotência, sofrimento e transtornos de toda a ordem aos autores, pois formam o núcleo familiar básico que, de forma natural, desenvolve uma relação de intimidade especial entre os seus componentes. Tais sentimentos negativos são deduzidos de forma clarividente do fato de ser paradoxal que uma trabalhadora que sai de casa para ‘ganhar a vida’ com o seu labor acaba por perdê-la em decorrência do exercício de suas funções”, destacou o magistrado.

Dano presumido
Conforme constou da decisão, no caso dos autores, o dano é presumido, sendo desnecessária a prova da lesão ao patrimônio imaterial dos ofendidos, o que se extrai da simples percepção do fato ocorrido por qualquer observador externo que tenha o mínimo senso de cognição. Nessa situação, basta que a vítimas indiretas demonstrem o fato gerador do dano, como ocorreu no caso.

Ao arbitrar o valor da indenização por danos morais reflexos, o julgador considerou a gravidade da conduta praticada pelo ofensor e o grau de sua culpa, os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, bem como o caráter punitivo, pedagógico e compensatório da medida.

Tarifação dos danos morais – Inconstitucionalidade
Na sentença, foi reconhecida, de forma incidental, a inconstitucionalidade dos parágrafos 1º, 2º e 3º do artigo 223-G, da CLT, introduzido pela Lei nº 13.467/2017 (reforma trabalhista), que dispõem sobre a tarifação dos danos morais, para fins de fixação da indenização compensatória. Conforme pontuado, os dispositivos são claramente contrários à Constituição da República, sobretudo ao artigo 5º, V e X, bem como aos princípios da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade e da isonomia (artigos 1º, III, e 5º, caput, da CF/1988), conforme jurisprudência pacificada no Superior Tribunal de Justiça (Súmula 381), no Superior Tribunal Federal (ADPF 130) e no TRT-MG (ArgInc 0011521-69.2019.5.03.0000).

“O sofrimento impingido aos autores é incomensurável, não se podendo estabelecer de forma objetiva se haverá em médio ou longo prazo a superação psicológica da perda do familiar, sendo incontestáveis os reflexos da lesão no universo pessoal e social dos ofendidos, considerando a perda de sua esposa e genitora (art. 944, do CC/02)”, frisou o juiz.

Danos materiais – Pensão mensal vitalícia
A agente comunitária de saúde contratada pelo município teve como último salário bruto a quantia de R$ 2.212,16 e contava com 42 anos de idade à época do óbito, ocorrido em 2021. Era responsável pelo sustento dos filhos e vivia com o cônjuge, pai de seus filhos. Ao analisar o pedido de indenização por danos materiais, o juiz considerou a situação de dependência econômica dos autores.

“Os danos de ordem material, por sua vez, dizem respeito às perdas patrimoniais sofridas pela vítima em decorrência do ato ilícito praticado pelo agente ofensor, abrangendo os danos emergentes e os lucros cessantes (art. 402, do CC)”, destacou Miranda.

Na sentença, foi negado o pedido de pagamento em parcela única, considerando que o objetivo da indenização é a recomposição do patrimônio do ex-empregado, ou de seus dependentes, e não o enriquecimento sem causa. Ressaltou-se ainda que o pagamento em pensão mensal gera muito menos transtorno financeiro do que um valor quitado de uma só vez.

Levando-se em conta que parte do salário que a empregada falecida recebia era para despesas pessoais, o valor da pensão mensal foi fixado em 2/3 do salário (R$ 1.474,77) a ser dividido igualmente entre os autores, com termo inicial na data do óbito (22/1/2021) e termo final em 6/10/2058 (quando a empregada completaria 80 anos idade), considerando a expectativa de vida de pessoas do sexo feminino no Brasil em 2021, conforme última Tabela do IBGE, a não ser no caso de um dos autores falecer antes.

A cota-parte dos filhos cessará quando eles completarem 25 anos de idade, quando o valor deverá ser revertido aos beneficiários remanescentes, por aplicação analógica do artigo 77, parágrafo 1º, da Lei nº. 8.213/1991. A cota-parte do filho menor deverá ser depositada em caderneta de poupança, aberta para essa única finalidade.

Pelo princípio da restituição integral (artigo 944 do Código Civil), a pensão mensal vitalícia incluiu 13ºs salários anuais, com pagamento no mês de dezembro de cada ano, nos termos da Lei 4.090/1962, e uma parcela anual será acrescida de 1/3, a título de férias anuais remuneradas. Os julgadores da Oitava Turma do TRT-MG aumentaram o valor da indenização, que passou a ser de R$ 250 mil para cada autor da ação: o viúvo e os dois filhos, totalizando R$ 750 mil. O processo foi remetido ao TST para exame do recurso de revista do município.

TRT/RS: Restaurante deve pagar indenização por danos existenciais a encarregada que cumpria jornadas de até 14 horas

Uma encarregada de restaurante que trabalhava entre 13 e 14 horas diárias deve receber indenização por danos existenciais. A decisão da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) reformou, por unanimidade, este item da sentença da 1ª Vara do Trabalho de Rio Grande. O valor da reparação foi fixado em R$ 10 mil.

Inicialmente contratada como atendente, a empregada trabalhou nas lojas do shopping e do “Barracão”, localizado na praia do Cassino, entre junho de 2017 e abril de 2019. A partir de dezembro de 2017, ela passou a ser a encarregada de loja e se tornou responsável pelas escalas de horários e folgas dos colegas.

Conforme o processo, a jornada cumprida de segunda a domingo se estendia das 10h à 1h ou 2h. No segundo verão, uma folga semanal, às quartas-feiras, foi concedida à empregada.

No primeiro grau, o juízo condenou a empresa ao pagamento de horas extras e intervalos não concedidos, entre outras verbas. Quanto ao dano existencial, o entendimento foi o de que não houve a comprovação. A Tese Jurídica Prevalecente nº 2 do TRT-4, de que a prática de jornadas de trabalho excessivas não configura, por si só, dano existencial passível de indenização, foi aplicada.

A trabalhadora recorreu ao Tribunal e obteve a reforma da decisão. Para o relator do acórdão, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, apesar da Tese nº 2, na situação em análise é evidente o dano causado pela “jornada extenuante, que extrapola em muito o limite estabelecido no art. 59 da CLT”. O dispositivo permite a extensão da jornada em até duas horas diárias, desde que estabelecidas em acordo individual, convenção ou acordo coletivo.

“Não há como deixar de considerar que a prática afetou diretamente os projetos de vida da autora”, afirmou o desembargador. O magistrado ainda destacou os danos causados à saúde mental e física da trabalhadora pela ausência de intervalos para descanso e alimentação.

Na medida em que a empregada apresentou a identidade da filha de 12 anos, o relator também considerou comprovados prejuízos às relações familiares da trabalhadora. “A extensa jornada impediu o convívio com a filha, nas férias e quando a menina saía da infância e entrava na pré-adolescência. Um momento em que, naturalmente, necessita de cuidados e orientação, conversas, carinho, tudo o que se espera de uma relação saudável entre mãe e filhos”, concluiu o magistrado.

Os desembargadores Tânia Regina Silva Reckziegel e Marçal Henri dos Santos Figueiredo participaram do julgamento. Não houve recurso.

TRT/GO: Transporte de valores por pagamento de mercadoria não gera danos morais

Aplicando o entendimento jurisprudencial da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, o juiz Juliano Braga, titular da 2ª Vara do Trabalho de Anápolis, negou o pedido de reparação por danos morais feito por um motorista entregador. O trabalhador ingressou com uma ação trabalhista em face de uma empresa para pedir reparação por danos morais, entre outras verbas.

O trabalhador alegou que, além de descarregar mercadorias, era responsável pelo recebimento do valor da venda, sendo responsável pelo transporte do dinheiro arrecadado para a empresa. Os valores, de acordo com o motorista, eram colocados em um cofre dentro do caminhão, sob sua responsabilidade. Eventualmente, ele guardava o dinheiro no bolso ou em uma pochete, de sua propriedade. Afirmou que a posse desses valores o deixava receoso com assaltos ou a perda desses valores, inclusive da própria vida. Pediu o pagamento de indenização por dano moral.

Maços de notas de reaisA empresa explicou que cabia ao “motorista entregador de vendas” receber alguns pagamentos e, para isso, foi treinado em relação à segurança do trabalho. Disse que o risco de assaltos é o mesmo que qualquer pessoa está sujeita no cotidiano. Sustentou que o autor não sofreu qualquer tipo de ameaça ou foi assaltado. Argumentou, por fim, que o principal trabalho desempenhado pelo motorista era transporte de mercadorias, mais especificamente bebidas.

O magistrado entendeu que o transporte de valores arrecadados com a vendas de mercadorias, por si só, não configuraria dano moral, pois o recebimento de quantias integra a dinâmica laboral do motorista entregador. Citou recente jurisprudência da 1ª Turma do TRT-18, julgado pelo desembargador Gentil Pio, disponível no Informativo de Jurisprudência do TRT-18 nº 211.

Juliano Braga considerou que, caso a empresa tivesse se omitido em adotar mecanismos de segurança, o resultado da ação poderia ter sido outro. Entretanto, na ação analisada, foi demonstrado que a empresa disponibilizou cofre para o armazenamento do dinheiro em espécie recebido pelo empregado, assim como ofereceu cursos de como usar o cofre.

O magistrado destacou que o motorista não foi vítima de assalto e que não havia relatos de que ele sofreu algum dano físico. Ao final, negou o pedido feito pelo trabalhador. Cabe recurso da decisão.

Processo: 0010957-72.2023.5.18.0052


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