TRT/RS reconhece culpa exclusiva de trabalhador em acidente que resultou em amputação do dedo polegar

Resumo:

  • Um auxiliar de serviços gerais agrícolas teve o polegar amputado ao limpar uma máquina ligada, desrespeitando normas de segurança.
  • A 2ª Turma do TRT-RS entendeu que houve culpa exclusiva do trabalhador, afastando a responsabilidade da empresa e o dever de indenizar.
  • O trabalhador recebeu treinamento, EPIs e orientações claras para desligar a máquina durante a limpeza; vídeos e testemunhas reforçaram essa versão.
  • O TRT da 4ª Região manteve a sentença da juíza Flávia Cristina Padilha Vilande, da Vara do Trabalho de Rosário do Sul.

Um auxiliar de serviços gerais agrícolas que teve o polegar amputado durante a limpeza de uma máquina em funcionamento não obteve o reconhecimento da responsabilidade dos empregadores pelo acidente. A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) entendeu que houve culpa exclusiva da vítima, afastando o dever de indenização por parte da empresa.

A decisão, unânime, manteve a sentença da juíza Flávia Cristina Padilha Vilande, da Vara do Trabalho de Rosário do Sul.

Segundo o trabalhador, o acidente ocorreu quando ele realizava a limpeza de uma calha da máquina sem desligá-la, procedimento que já havia realizado anteriormente. Ele admitiu ter recebido treinamento e todos os equipamentos de proteção individual (EPIs) necessários. Testemunhas ouvidas no processo afirmaram que o empregado foi orientado a sempre desligar o equipamento antes da limpeza.

Na sentença de primeiro grau, a juíza destacou que vídeos anexados ao processo mostram que a máquina possuía proteção adequada e que a área onde ocorreu o acidente era de difícil acesso, sem partes expostas que representassem risco de contato acidental. A magistrada concluiu que o acidente só aconteceu porque o trabalhador, de forma inesperada, subiu na parte superior do equipamento e colocou a mão em uma área interna da máquina, mesmo sabendo que ela estava ligada.

O trabalhador recorreu ao TRT-RS. A relatora do caso, desembargadora Tânia Regina Silva Reckziegel, ressaltou que, para se afastar o dever de indenizar com base na culpa exclusiva da vítima, é necessário que essa culpa esteja comprovada de forma inequívoca e que não haja qualquer contribuição do empregador para o ocorrido. Ela também destacou que cabe à empresa provar esse tipo de alegação.

No entanto, a relatora concluiu que o trabalhador possuía conhecimento técnico para executar sua função, recebeu treinamento adequado e utilizava os EPIs fornecidos e fiscalizados pelos empregadores. Além disso, não foi identificada nenhuma falha organizacional que contribuísse para o acidente.

“Considerando o exame do conjunto probatório, entendo que não há como responsabilizar a reclamada pelo acidente, uma vez que a empresa não teve nenhuma participação na sua ocorrência. O próprio autor foi quem decidiu por realizar a limpeza do equipamento de trabalho em funcionamento, mesmo tendo recebido treinamento prévio e detendo conhecimento técnico de que para fazer a limpeza o correto seria primeiro desligar a máquina. Assim, resta afastado o nexo causal, e, por conseguinte, o dever de indenizar da parte reclamada”.

Além da relatora, participaram do julgamento a desembargadora Cleusa Regina Halfen e o desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo. O acórdão transitou em julgado sem interposição de recurso.

TST: Hospital não prova negligência de técnica de enfermagem em morte de paciente e justa causa não deve ser aplicada

Justa causa foi revertida, e profissional será reintegrada.


Resumo:

  • Uma técnica de enfermagem foi demitida por justa causa, sob a acusação de ser responsável pela morte de um paciente.
  • Contudo, o hospital não abriu sindicância interna nem comunicou o ocorrido às autoridades competentes antes de aplicar a penalidade.
  • Para a 7ª Turma do TST, na falta de provas, o fato de o empregador ter aplicado a punição com base apenas em suposição caracteriza abuso de autoridade.

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou o Hospital Nossa Senhora da Conceição, de Porto Alegre (RS), a indenizar uma técnica de enfermagem demitida por justa causa, acusada de causar a morte de um paciente. Segundo o colegiado, o suposto ato de improbidade não foi comprovado, o que representa abuso de autoridade do empregador.

Técnica foi acusada de negligência
O caso ocorreu em outubro de 2008. Ao dispensar a técnica por justa causa, o hospital disse que ela agiu de forma incorreta ao instalar o oxigênio do paciente, e a obstrução de suas vias aéreas resultou numa parada cardiorrespiratória.

Na reclamação trabalhista, a profissional, admitida em 1993 por concurso público, pediu reintegração e indenização. Ela disse que sempre foi uma funcionária zelosa nos 15 anos de serviço ao Nossa Senhora. Ao negar ter contribuído para o óbito, sustentou que a acusação de responsabilidade por uma morte é o fato mais grave que pode ser atribuído a uma profissional da saúde.

Dispensa foi motivada apenas por testemunho de enfermeira
Para a 27ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, o hospital não comprovou os motivos para a justa causa. A sentença apontou que o empregador não tomou nenhuma iniciativa para apurar formalmente a relação entre o óbito do paciente e a conduta da profissional. O caso também não foi comunicado à polícia nem à entidade fiscalizadora de classe, e a punição foi aplicada com base exclusivamente no entendimento de uma enfermeira diretamente envolvida no episódio. Diante disso, a empresa foi condenada a pagar indenização de R$ 10 mil à técnica. O pedido de reintegração foi rejeitado.

No recurso ordinário, o hospital alegou que não tinha obrigação de abrir sindicância ou processo administrativo disciplinar, pois as provas do cometimento da falta grave eram suficientes. A sentença, porém, foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, levando o hospital a buscar a análise do caso pelo TST.

Nulidade da dispensa resulta em reintegração
O ministro Evandro Valadão, relator do recurso, observou que, de acordo com o entendimento do TST, a administração pública, ao motivar a dispensa de empregados celetistas (como na justa causa), fica vinculada às razões expostas. A ausência de comprovação dessas razões implica a nulidade da dispensa e, consequentemente, a reintegração da trabalhadora, além da condenação da empresa ao pagamento de salários e vantagens do período do afastamento.

Abuso de poder gera dever de indenizar
Em relação à indenização, o ministro explicou que a reversão da justa causa pela Justiça, por si só, não acarreta o pagamento de indenização por danos morais. o entanto, no caso em questão, a demissão foi motivada por um suposto ato de improbidade que não foi comprovado, o que configura abuso de direito pelo empregador. Nessa circunstância, a honra e a imagem da trabalhadora foram afetadas, gerando o dever de reparação.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: RR-9900-75.2009.5.04.0027

TRT/RS: Família de autônomo que morreu por choque elétrico aos 28 anos deve receber pensão vitalícia e indenização

Resumo:

  • Trabalhador autônomo faleceu após tocar em betoneira na obra em que prestava serviços. Não foram fornecidos EPIs.
  • Donos da obra e empreiteiros devem responder de forma solidária pela indenização por danos morais de R$ 200 mil e pela pensão concedida à companheira e à filha do casal.
  • Entre outros dispositivos, fundamentaram a decisão: o artigo 5º, X, da Constituição Federal, o parágrafo único do art. 927 do Código Civil e os artigos 223-B e C da CLT.

A família de um trabalhador vítima de um choque elétrico, aos 28 anos, deve receber indenização por danos morais e pensão vitalícia. Respondem solidariamente pelos créditos os donos de uma empresa de construções de alvenaria e os proprietários da obra. A decisão unânime da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) manteve as reparações reconhecidas pela juíza Deise Anne Longo, da 1ª Vara do Trabalho de Erechim.

No Tribunal, no entanto, a indenização passou de R$ 160 para R$ 200 mil, a ser dividida entre a companheira e a filha do trabalhador. Já a base de cálculo da pensão passou de R$ 1,6 mil determinado no primeiro grau para R$ 998, valor do salário mínimo vigente em 2019, quando aconteceu o óbito. A pensão deve ser paga até a data em que a vítima completaria 78 anos. O valor provisório da condenação é de R$ 380 mil.

O homem trabalhava como autônomo na obra quando encostou em uma betoneira e levou um choque, vindo a sofrer uma parada cardiorrespiratória. Na ocasião, ele usava um chinelo de borracha, sem equipamentos de proteção. A ausência de qualquer medida de proteção foi admitida no inquérito civil do Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) pelo proprietário da empresa.

Com base nas provas, a juíza afastou as alegações de defesa de que houve culpa exclusiva da vítima ou culpa concorrente. Além disso, a magistrada rechaçou a tese dos empreiteiros de que eles não estariam obrigados a fornecer equipamentos de proteção em razão de o trabalhador ser autônomo.

“A legislação trabalhista, bem como as Normas regulamentares editadas pelo Ministério do Trabalho, impõem a obrigatoriedade de prevenção, em todas as atividades empresariais, atribuindo ao empregador se antecipar aos acontecimentos, ou seja, cabe a ele identificar o risco antes da exposição do empregado a ele ou a seus efeitos”, ressaltou a juíza Deise.

A magistrada não reconheceu a responsabilidade da oficina mecânica que fornecia eletricidade à obra. O estabelecimento ficava no terreno vizinho e também era de propriedade dos donos da construção.

TRT-RS

Diferentes matérias foram objeto de recurso ao TRT-RS, pelas partes. A responsabilidade solidária dos empreiteiros e dos donos da obra foi mantida, bem como os consequentes pensionamento e indenização por danos morais. A responsabilidade da oficina também não foi reconhecida no segundo grau.

Ratificando o entendimento exposto em sentença, o relator do acórdão, desembargador Emílio Papaléo Zin, afirmou que a condição de trabalhador autônomo ou “diarista” não afasta o dever dos contratantes em zelar pela saúde e segurança dos mesmos, com o fornecimento de ambiente de trabalho seguro.

“Os elementos dos autos demonstram que o ‘de cujus’, no momento do acidente, teve contato com betoneira, a qual não tinha aterramento elétrico e era abastecida de forma insegura, por fio elétrico puxado da oficina mecânica localizada ao lado. Não foi fornecido equipamento de proteção ou qualquer tipo de controle das condições do ambiente de trabalho. Desta forma, está evidenciada a culpa dos reclamados, bem como o nexo de causalidade entre o óbito e o acidente de trabalho”, concluiu o relator.

Também participaram do julgamento os desembargadores Denise Pacheco e João Pedro Silvestrin. Os empreiteiros recorreram ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

TRF4: Aposentadoria de monitora de creche será revista pelo INSS para equiparação à atividade de professores

A 1ª Vara Federal de Palmeira das Missões (RS) concedeu o direito de revisão de benefício para uma mulher que trabalhou como monitora de creche, para fins de enquadramento como aposentadoria especial de professores. A sentença, do juiz Micael Muller Iserhardt, foi publicada no dia 19/6.

A autora relatou ter requerido sua aposentadoria em 2017, sendo-lhe concedida na modalidade “aposentadoria por tempo de contribuição” comum. Contudo, ela alegou ter trabalhado em uma creche do Município de Santa Cruz do Sul (RS) no período de 1990 a 2022, exercendo a função de monitora. Requereu a equiparação da atividade ao magistério e, consequentemente, a revisão e conversão da aposentadoria para a modalidade especial.

Foram apresentados como prova documental: declaração de tempo de contribuição, emitida pela prefeitura; fichas financeiras, com o detalhamento dos valores recebidos e laudo técnico de condições ambientais do trabalho (LTCAT), documento que lista e descreve os agentes presentes no ambiente de trabalho que podem ser prejudiciais à saúde dos trabalhadores, detalhando as funções de cada cargo.

O magistrado citou jurisprudências acerca do tema, esclarecendo que “mesmo que o cargo para o qual a parte autora tenha sido contratada não seja formalmente de professora, é possível considerar as funções da ‘monitora de creche/atendente de EMEI’ equiparáveis às de assessoramento pedagógico em estabelecimentos de educação infantil, já que o Tema 965 do STF permite o cômputo de serviço prestado em funções diversas da docência para fins de concessão da aposentadoria do professor”.

Ainda, a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), sistema utilizado para padronizar e descrever as ocupações existentes no mercado de trabalho brasileiro, instituído pelo Ministério do Trabalho e Emprego, inclui o termo “auxiliar/atendente de creche” na estrutura de classificação “professores de nível médio na educação infantil”.

Dessa forma, o juízo concluiu que o serviço de monitoria de creche deve ser equiparado às atividades desempenhadas por professores, sendo, portanto, de natureza especial. A aposentadoria especial é garantida constitucionalmente para profissionais que tenham “tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio”, sendo reduzido em cinco anos o tempo de serviço.

O INSS deverá revisar a aposentadoria da autora, sendo devidas as parcelas referentes aos últimos cinco anos, contados do ajuizamento da ação. O período anterior foi considerado prescrito.

STJ: Citação do Paraná e da Vizivali interrompe prescrição em relação à União nas ações sobre o Tema 928

Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.131), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, nas ações cujo objeto seja o Tema Repetitivo 928, a citação válida do Estado do Paraná e da Faculdade Vizivali interrompe a prescrição também em relação à União, com efeitos retroativos à data da propositura da ação.

No julgamento, o colegiado ainda definiu que esse entendimento se aplica, inclusive, aos casos em que a citação da União tenha ocorrido após o decurso de cinco anos desde o ajuizamento da demanda, quando essa demora for imputável exclusivamente ao Poder Judiciário, em razão do reconhecimento, no curso do processo, da necessidade de formação de litisconsórcio passivo necessário.

Com a definição da tese, podem voltar a tramitar todos os processos sobre o mesmo assunto que estavam suspensos à espera do precedente.

A controvérsia remonta à criação, em 2002, do Curso de Capacitação para Docentes, promovido pelo Estado do Paraná em parceria com a Faculdade Vizivali. O curso, ofertado na modalidade semipresencial, foi direcionado a professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental e recebeu autorização do Conselho Estadual de Educação com fundamento no artigo 87, parágrafo 3º, inciso III, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

No entanto, anos após a implementação do curso, surgiram dúvidas quanto à validade dos diplomas emitidos, em razão de o credenciamento da instituição de ensino ter sido feito pelo ente estadual, e não pela União, como exigido pela legislação federal.

Incerteza jurídica justifica interrupção do prazo prescricional também em relação à União
O relator do recurso repetitivo, ministro Afrânio Vilela, destacou que a mudança de posicionamento do Conselho Nacional de Educação – que validou o curso inicialmente e depois passou a considerá-lo irregular – desencadeou uma avalanche de ações judiciais. Diversos alunos ingressaram na Justiça estadual apenas contra o Estado do Paraná e a instituição de ensino, diante da ausência de entendimento pacificado sobre a necessidade de inclusão da União no polo passivo.

Como recordou o ministro, esse cenário começou a ser superado com o julgamento do Tema 584, em 2013, quando se reconheceu que a União deveria compor o polo passivo das ações, entendimento posteriormente aprofundado no Tema 928, de 2017.

Ao examinar a matéria no novo recurso repetitivo, Vilela ressaltou que o ponto central da atual controvérsia é a definição sobre a eficácia da interrupção da prescrição. A questão, conforme observou, é saber se essa interrupção – iniciada com a citação válida do Estado do Paraná e da Vizivali – também pode beneficiar a União, ainda que sua citação tenha ocorrido após o decurso do prazo de cinco anos. Para o julgador, os artigos 240, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil e 202 do Código Civil autorizam essa retroação, desde que não haja inércia da parte autora, o que não se verificou nas ações discutidas.

O relator sustentou a aplicação da teoria da aparência, uma vez que os autores agiram com base em jurisprudência oscilante quanto à legitimidade passiva da União. Segundo o magistrado, não seria razoável exigir que, desde o início, os demandantes incluíssem a União na lide, especialmente diante do histórico de decisões que admitiam o processamento das ações apenas contra o Estado do Paraná e a instituição de ensino. Assim, reconheceu que a incerteza jurídica justifica a interrupção do prazo prescricional também em relação à União.

Prescrição exige inércia injustificada do titular do direito
Outro ponto destacado pelo ministro foi a incidência das regras de solidariedade previstas no artigo 204, parágrafo 1º, do Código Civil. Conforme ponderou Afrânio Vilela, ao analisar o Tema 928, a Primeira Seção do STJ reconheceu a solidariedade entre os entes federativos em determinadas hipóteses, especialmente nos casos de professores sem vínculo formal com instituições de ensino. A partir disso, apontou que a citação de um devedor solidário interrompe a prescrição em relação aos demais, inclusive à União, mesmo que a citação desta tenha ocorrido tardiamente.

Por fim, o relator enfatizou que a parte autora não pode ser prejudicada pela demora na citação da União quando essa mora for atribuível exclusivamente ao serviço judiciário. “Para a caracterização da prescrição, não basta o simples transcurso do tempo: é indispensável a presença simultânea da possibilidade de exercício do direito de ação e da inércia do seu titular”, concluiu.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 1962118

TRF4: Hospital deve pagar danos morais e pensão a paciente vítima de erro médico

A 2ª Vara Federal de Pelotas (RS) condenou um hospital, localizado no referido município, por erro médico durante cirurgia realizada em uma dona de casa. A sentença, do juiz Henrique Franck Naiditch, foi publicada no dia 21/6.

A autora relatou que foi submetida a um procedimento cirúrgico para remoção do rim direito (nefrectomia total) em junho de 2022. Passados dois dias da operação, ela apresentou sintomas inesperados, sendo submetida a uma tomografia computadorizada. O resultado do exame levantou a suspeita de que “compressas foram esquecidas no interior do corpo da autora”. O médico que havia realizado a cirurgia avaliou o quadro e decidiu que a paciente deveria passar por uma nova intervenção cirúrgica. O objeto foi retirado do corpo da mulher.

Inicialmente, a União figurou como ré no processo, apresentou contestação e obteve deferimento do pedido de ilegitimidade passiva. Foi determinada a intimação do hospital, por se tratar de empresa pública que presta serviços de saúde e, portanto, responde objetivamente pelos danos que vier a causar. Contudo, não foi oferecida contestação.

Perícia médica judicial foi realizada. A ocorrência do fato mostrou-se incontroversa, com a demonstração material de que, de fato, havia gaze/compressa no corpo da autora após a primeira cirurgia. Prontuário médico, exames, laudos e imagens comprovaram as alegações.

Ficou evidenciada a correlação direta entre o erro médico e os danos gerados à paciente, sendo atribuída responsabilidade civil ao hospital: “a falha do serviço, portanto, está demonstrada, presentes todos os requisitos da responsabilidade do réu, no caso: a conduta (ação/omissão), o dano, o nexo causal e a culpa, consubstanciada na negligência em razão da desatenção da equipe médica que esqueceu no organismo da paciente uma gaze/compressa”, entendeu Naiditch.

A autora havia requerido indenização por danos morais, danos estéticos e pensão vitalícia, diante da alegação de estar impossibilitada de trabalhar por ter ficado com sequelas físicas decorrentes da dupla intervenção cirúrgica. Ainda, ela informou ter desenvolvido uma hérnia, decorrente da segunda cirurgia, e que aguarda pela autorização de uma terceira intervenção cirúrgica para retirada.

O pagamento de danos morais foi deferido, sendo fixado o valor em R$40 mil. Quanto aos danos estéticos, o magistrado entendeu incabível, pois a cicatriz formada se deu por causa da primeira cirurgia. Já em relação à pensão, a condenação foi ao pagamento de um salário-mínimo, por mês, até a retirada da hérnia, sendo devido os valores a contar da data da realização da primeira cirurgia.

TRT/RS reconhece despedida discriminatória de auxiliar de logística que informou ser autista

Resumo:

  • Auxiliar de logística que trabalhava para uma empresa de comércio eletrônico, por meio de uma empresa prestadora de serviços, foi despedida dias depois de apresentar um atestado médico informando que tem transtorno do espectro autista.
  • A empregada também solicitou fones de ouvido para reduzir o impacto do estresse causado pelo ambiente de trabalho. A empresa de comércio eletrônico negou o pedido.
  • Foi reconhecido o caráter discriminatório da dispensa e fixada uma indenização por danos morais no valor de R$ 50 mil, além de outros pedidos. Valor provisório da condenação é de R$ 100 mil.
  • Fundamentaram a decisão: a Constituição Federal (artigo 5º, V e X), os artigos 223-B e C da CLT, a Lei 12.764/12, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, a Lei 9.029/1995, que proíbe práticas discriminatórias na admissão e na manutenção das relações de trabalho, a Súmula 443 do TST, que trata da discriminação em casos de doenças graves, e as Convenções 111 e 117 da OIT, que vedam a discriminação no emprego.

A 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) confirmou o caráter discriminatório da despedida de uma auxiliar de logística com transtorno do espectro autista (TEA). Por unanimidade, foi confirmada a indenização de R$ 50 mil por danos morais definida pela juíza Valdete Souto Severo, da 4ª Vara do Trabalho de Porto Alegre. Somados aos demais pedidos reconhecidos, o valor provisório da condenação é de R$ 100 mil.

Dias após apresentar um atestado médico informando ser portadora de TEA, a empregada foi despedida. Junto com o atestado, ela solicitou um fone de ouvido, para minimizar os efeitos do estresse que passava no ambiente de trabalho. A empresa de comércio eletrônico que tomava os serviços negou o pedido do fone, alegando que não era compatível com normas de segurança.

Na defesa, as empresas sustentaram que a despedida aconteceu porque se tratava de um contrato de 180 dias entre a empregadora e a tomadora dos serviços e que a trabalhadora não se adaptou. Afirmaram, ainda, que a demanda extraordinária que justificou a contratação não teve sequência.

A partir dos documentos e depoimentos das testemunhas, a juíza Valdete considerou claro que, contrariando as normas de segurança, as empresas não realizaram a adaptação necessária para a autora da ação trabalhar.

“A despedida ocorreu em razão de a autora apresentar atestado médico de sua condição de saúde e ter solicitado adaptação. Chama a atenção o total descaso de todas as rés para as peculiaridades do caso da autora, que inclusive são demonstrados pelo fato de todas apresentarem em audiência prepostos sem nenhum conhecimento dos fatos”, afirmou a magistrada.

As empresas recorreram ao TRT-RS, tendo os recursos parcialmente atendidos. A empresa de comércio eletrônico obteve o reconhecimento da responsabilidade subsidiária (somente terá que quitar o crédito se a empregadora não o quitar). No primeiro grau, havia sido definida a responsabilidade solidária (quando todas respondem pela dívida, sem o benefício de ordem).

No entanto, o dever de indenizar pela discriminação sofrida foi mantido pela Turma. O relator do acórdão, desembargador Luis Carlos Pinto Gastal, entendeu que foi comprovado o caráter discriminatório da dispensa, de acordo com o artigo 1º da Lei 9.029/95, que proíbe todas as formas de discriminação em processos seletivos e nas relações de trabalho.

“Diante dos depoimentos dos prepostos das reclamadas e da testemunha ouvida a convite da primeira e segunda reclamadas, não há como afastar a conclusão do caráter discriminatório do ato demissional. Não restou provada a falta de demanda alegada para a rescisão contratual da parte autora, encargo que compete às reclamadas”, ressaltou o relator.

Os desembargadores Maria da Graça Ribeiro Centeno e Marcelo Gonçalves de Oliveira também participaram do julgamento. Cabe recurso da decisão.

STJ: Falta de contraproposta em audiência de conciliação não gera sanções ao credor

Ao interpretar as disposições da Lei do Superendividamento (Lei 14.181/2021), a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que o credor não tem obrigação legal de aderir ao plano de pagamento formulado pelo devedor nem de apresentar contraproposta em audiência de conciliação. Assim, o colegiado deu provimento a recurso especial do Paraná Banco e afastou as sanções do Código de Defesa do Consumidor (CDC) aplicadas contra a instituição, que litiga com um consumidor superendividado do Rio Grande do Sul.

O relator do recurso, ministro Marco Buzzi, ressaltou que a Lei 14.181/2021 trouxe um modelo de enfrentamento do superendividamento, buscando a preservação do mínimo existencial do devedor e sua reinserção no mercado de consumo. No entanto, afirmou que a legislação impõe penalidades apenas nas hipóteses de não comparecimento injustificado do credor à audiência ou de comparecimento de representante sem poderes para negociar – o que não ocorreu no caso.

Consumidor ajuizou ação revisional para limitar descontos
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) havia mantido decisão que aplicou as penalidades previstas no parágrafo 2º do artigo 104-A do CDC. Segundo o dispositivo, o não comparecimento injustificado do credor ou de seu representante com poderes para transigir gera penalidades como suspensão da exigibilidade da dívida, interrupção dos juros de mora e sujeição compulsória ao plano de pagamento proposto.

Alegando estar em situação de superendividamento, o consumidor ajuizou ação revisional buscando limitar em 30% os descontos de empréstimos bancários em sua conta-salário. Embora tenha sido devidamente representado na audiência, o banco não aceitou a proposta do devedor e não apresentou contraproposta, o que levou o juiz de primeiro grau a aplicar as sanções do CDC, entendimento confirmado pelo TJRS. O banco recorreu ao STJ.

Lei do Superendividamento incentiva, mas não obriga acordo entre as partes
O ministro Buzzi destacou a relevância social e econômica do tema, citando dados que apontam haver mais de 70 milhões de brasileiros inadimplentes, sendo 67% das dívidas contraídas com instituições financeiras. Segundo o Serviço de Proteção ao Crédito Brasil (SPC), 42% da população adulta está negativada.

Conforme o relator, ainda que a audiência e o sistema de autocomposição tenham prestígio na lei, não há respaldo para aplicação, por analogia, das penalidades previstas pelo CDC na hipótese de insucesso da conciliação.

“A ausência de aceitação do plano de pagamento sugerido pelo devedor e a falta de apresentação de contraproposta não geram, como consequência, a aplicação dos efeitos do parágrafo 2º do artigo 104-A do CDC”, afirmou Buzzi. Segundo ele, embora o sistema protetivo do consumidor superendividado dê ênfase à cooperação e à solidariedade, “não há como restringir a liberdade do credor, constrangendo-o a fazer concessões contrárias à sua vontade”.

O relator também lembrou que, se não houver acordo na audiência conciliatória, o CDC prevê uma segunda etapa processual, na qual o juiz pode revisar os contratos e promover a repactuação das dívidas (artigo 104-B).

Processo: REsp 2188689

TST: Loja de calçados indenizará vendedora que transportava valores dentro de shopping

Para a 1ª Turma, o risco da atividade não é eliminado pelo local onde ela ocorre.


Resumo:

  • Uma vendedora de uma loja de calçados de Porto Alegre (RS) pediu indenização por ter de fazer várias viagens diárias para depositar dinheiro em banco dentro do shopping.
  • A empresa alegava que não havia risco, porque o transporte era feito em ambiente controlado.
  • Mas, para a 1ª Turma do TST, o risco é inerente à atividade de transporte de valores, e o local onde ela é feita só é considerado na fixação do montante da reparação.

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação da Paquetá Calçados Ltda. ao pagamento de indenização a uma empregada que transportava valores no interior de um shopping de Porto Alegre (RS). Para a maioria do colegiado, a atividade envolve risco passível de reparação, independentemente do ramo econômico da empresa.

Vendedora fazia dois a três depósitos por dia
No caso analisado, a vendedora disse que, duas a três vezes por dia, tinha de levar em média R$ 5 mil da loja para agências bancárias situadas dentro do shopping. Ao pedir indenização, ela apontou a falta de medidas para garantir sua segurança e sua integridade física nessa tarefa.

Em sua defesa, a Paquetá alegou que a vendedora não fazia “transporte de valores”. O que havia, segundo a empresa, era uma orientação para depósitos em valores menores, normalmente de até R$ 3 mil, ainda que fosse necessário mais de um deslocamento por dia até o banco. O transporte de valores mais elevados era feito por uma empresa especializada.

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região reconheceram que a atividade expunha a empregada a um risco considerável, em razão da movimentação diária de valores entre R$ 4 mil e R$ 5 mil, e deferiram indenização de R$ 10 mil. Segundo a sentença, a atividade, sem nenhuma segurança, gera receio e angústia, somadas à omissão da empresa, que não comprovou ter adotado os procedimentos suficientes para prevenir assaltos.

Jurisprudência do TST presume dano moral
No recurso de revista, a Paquetá argumentou que não houve dano à integridade física ou psíquica da trabalhadora, porque o transporte era feito em ambiente controlado, dentro do shopping. Mas, na avaliação do relator, ministro Hugo Scheuermann, o risco inerente à atividade não é eliminado pelo local onde ocorre, e esse fator deve ser considerado apenas na fixação do valor da indenização.

O ministro lembrou que o TST, no julgamento de incidente de recurso repetitivo (Tema 61), reconheceu o transporte de valores por pessoas não especializadas como situação de risco em que o dano moral é presumido pela simples exposição, independentemente da comprovação de um evento danoso específico.

A decisão foi por maioria, vencido o ministro Amaury Rodrigues.

Veja o acórdão.
Processo: RR-21345-46.2016.5.04.0027

TRF4: Justiça Federal anula atos do Incra que reconheciam território remanescente de quilombo

A 3ª Vara Federal de Santa Maria (RS) declarou nulos um processo administrativo e uma portaria do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) que reconheciam uma área do município de Restinga Seca (RS) como território quilombola remanescente. A sentença, do juiz Rafael Tadeu Rocha da Silva, foi publicada no dia 14/6.

Os autores, treze proprietários de imóveis rurais da localidade de São Miguel, em Restinga Seca, relataram que uma portaria da Fundação Cultural Palmares teria reconhecido uma área, que está inserida em terras de sua propriedade, como remanescente de quilombo, sendo instaurado processo administrativo pelo Incra, que reconheceu o Quilombo de São Miguel dos Pretos, em 2007. O referido quilombo é representado no processo pela Associação Comunitária Vovô Geraldo.

Na análise do mérito, o magistrado esclareceu que há previsão constitucional estabelecendo que “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos” (art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias/ADCT). Para regulamentar a determinação, foi publicado um decreto que atribui ao Incra a responsabilidade pelos procedimentos de regularização das terras, cabendo à Fundação Palmares certificar a autodefinição das comunidades remanescentes dos quilombos.

O processo havia sido julgado procedente, sendo remetido ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) para análise recursal. Foi então determinado o retorno à primeira instância para a realização de perícia técnica, que foi executada por um antropólogo, que investigou a pré-existência de comunidades quilombolas no local.

O perito realizou pesquisas documentais, principalmente cartorárias, analisando a cadeia de escrituras e transferências de propriedades ao longo do tempo, desde a época da colonização.

Segundo o antropólogo, o conceito constitucional de quilombo seria referente a “escravos que habitassem as terras em que encontraram refúgio do sistema escravagista”. Esse conceito seria diferente de descendentes de escravos que adquiriram o domínio da terra pela compra, não se enquadrando como refugiados ou fugitivos de cativeiros, sendo indevida, portanto, a qualidade de quilombola.

“O caso de São Miguel não pode ser considerado quilombo no sentido dado pela redação do art. 68 dos ADCT da Constituição, pois (…) o vínculo com a escravidão provado com uma série de fontes documentais, inventários, registros de batismos e casamentos, cartas de liberdade, etc., não comprova o vínculo com a terra pleiteada desde o período do cativeiro, cuja aquisição e posse ocorreu posteriormente, já na década de 1890”, concluiu o perito.

O entendimento do juízo, no caso julgado, foi no mesmo sentido: “não é possível “ressignificar” o termo quilombo, nos moldes pretendidos pelos réus, para alcançar todas as comunidades negras rurais brasileiras. Foi justamente a concepção de quilombos, como terras de negros fugidos, que permaneceram isolados ao longo do tempo, e que estariam na iminência de serem expulsos de suas terras, por não terem títulos a não ser a posse, que norteou os constituintes a escolher o termo quilombo para figurar na Constituição Federal. Logo, ao se mencionar o termo “quilombo”, deve-se ter em mente que se trata de local de fuga e resistência à escravidão”.

O processo foi julgado procedente, sendo indevida a desapropriação das terras em favor da comunidade quilombola, diante da ausência de demonstração de que havia quilombos na área reivindicada pela Associação antes da promulgação da Constituição de 1988. O processo administrativo e a portaria do Incra que reconheciam o território como remanescente de quilombolas foram anulados.

Cabe recurso ao TRF4.


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