TJ/MG: Criança que sofreu acidente em escola será indenizada

Estudante de 8 anos foi atingido no rosto por telha em Santa Luzia.


Um estudante deve ser indenizado pelo Município de Santa Luzia por ter se acidentado em uma obra dentro da escola. A decisão, unânime, é da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que manteve decisão da Comarca de Santa Luzia.

O acidente foi registrado em julho de 2022. Segundo o processo, o garoto, de 8 anos, entrou na área sinalizada de obra, escorou em um tapume e foi atingido no rosto por uma telha de zinco. Ele sofreu diversos ferimentos e, como resultado, recebeu vários pontos e ficou com cicatriz permanente no rosto.

Representado pela mãe, o menino acionou o município na Justiça. Em 1ª Instância, o juízo condenou o Município de Santa Luzia a pagar R$ 30 mil em danos estéticos, R$ 20 mil em danos morais e R$ 345,99 em danos materiais.

O município recorreu argumentando que prestou todo o socorro necessário e que a culpa pelo acidente foi exclusiva da criança, que entrou em área isolada para manutenção e encostou em materiais da obra. Também apontou desproporcionalidade nos valores.

Negligência

O relator do recurso, desembargador Maurício Soares, manteve a decisão por considerar que houve negligência do poder público em supervisionar as crianças sob sua responsabilidade na escola:

“Resta comprovada a negligência do ente público, já que o aluno estava lanchando próximo à área da obra e conseguiu acessá-la sem que fosse impedido por qualquer responsável, ou seja, ocorreu falha da supervisão escolar, pelo que deve o município responder pelos danos.”

O magistrado destacou que, embora os depoimentos relatem que o estudante entrou em área sinalizada para obra, este fato “não afasta a responsabilidade do apelante, já que eventual comportamento inadequado possivelmente seria evitado caso os alunos estivessem sendo devidamente monitorados”.

A desembargadora Luzia Peixôto e o desembargador Jair Varão acompanharam o voto do relator.

STJ: Isenção de IPI na compra de carro por taxista não exige exercício anterior da atividade

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o direito à isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na aquisição de veículo para a atividade de taxista não exige o exercício anterior da profissão, bastando a existência prévia de autorização ou de permissão do poder público. Segundo o colegiado, condicionar a concessão da isenção ao exercício prévio da atividade significaria impor uma restrição não prevista pelo legislador na Lei 8.989/1995.

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso especial interposto pela Fazenda Nacional contra o acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que reconheceu o direito de um cidadão à isenção do IPI na compra de seu primeiro carro destinado ao serviço de táxi.

A Fazenda Nacional sustentava que o TRF1 teria dado interpretação extensiva à norma de isenção prevista no artigo 1º, inciso I, da Lei 8.989/1995. Para o ente fazendário, tal dispositivo vincularia a concessão do benefício à comprovação de que o interessado já esteja exercendo a atividade de taxista por ocasião da compra do veículo.

Restringir o benefício reduziria o alcance social da lei
O relator do recurso, ministro Paulo Sérgio Domingues, afirmou que a isenção do IPI tem caráter extrafiscal, configurando uma política pública tributária voltada a estimular o trabalho dos taxistas ao facilitar a aquisição dos veículos que são seus instrumentos de trabalho.

O ministro explicou que, embora o artigo 111, inciso II, do Código Tributário Nacional (CTN) imponha a interpretação literal das normas que concedem isenções tributárias, essa exigência não impede o julgador de considerar a finalidade da norma e sua coerência com o ordenamento jurídico, mas apenas impede a ampliação do benefício para situações não previstas pelo legislador.

Nessa perspectiva, o relator observou que o artigo 1º, inciso I, da Lei 8.989/1995 não estabelece a necessidade de exercício prévio da atividade de taxista. O ministro destacou que a finalidade extrafiscal da norma e a sua coerência com o sistema jurídico conduzem ao entendimento de que a expressão “motoristas profissionais que exerçam” diz respeito à destinação exclusiva do veículo para o serviço de táxi, sendo, conforme frisou, suficiente a autorização ou permissão prévia do poder público para a concessão do benefício fiscal.

“Restringir o benefício apenas aos taxistas já estabelecidos anteriormente na profissão equivaleria a reduzir o alcance social da lei, criando uma barreira injustificada ao ingresso de novos profissionais e incompatível com o objetivo da política pública. Por essa razão, a previsão do artigo 1º, I, da Lei 8.989/1995 favorece tanto os taxistas que já exercem a profissão quanto os que desejam ingressar nela”, concluiu.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2018676

TRF6 reafirma liberdade religiosa e autonomia da vontade de paciente Testemunha de Jeová

O juiz federal convocado Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, atuando em auxílio à terceira turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) e relator da decisão recursal, negou provimento às apelações da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) e de uma paciente Testemunha de Jeová, mantendo a sentença que extinguiu processo movido para autorizar, de forma compulsória, a realização de transfusão de sangue na paciente, internada no Hospital das Clínicas da UFMG (gerido pela EBSERH). O caso reafirma o entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a prevalência da liberdade religiosa e da autonomia da vontade em decisões médicas, mesmo com risco de morte.

A ação foi ajuizada pela EBSERH em março de 2016, após a paciente, diagnosticada com leucemia linfoblástica aguda, recusar transfusão de sangue por convicção religiosa. Na ocasião, a instituição obteve liminar que autorizava o procedimento, posteriormente suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, então responsável pelo julgamento recursal. Com a recuperação da paciente e sua alta, em julho do mesmo ano, o processo foi extinto sem julgamento de mérito, por perda de objeto, já que a transfusão não foi necessária.

Tanto a EBSERH quanto a paciente apelaram. A EBSERH alegou cerceamento de defesa e pediu isenção de custas processuais, enquanto a paciente sustentou que a alta não eliminava seu interesse jurídico, pois desejava uma decisão definitiva sobre o direito de recusa para evitar futuras violações à sua liberdade de crença.

Ao analisar o caso, o relator afirmou que a EBSERH, embora administre hospitais públicos, é empresa pública de direito privado e não possui isenção de custas, conforme o artigo 1º da Lei nº 12.550/2011 e o artigo 173, §1º, II, da Constituição Federal. O magistrado afastou alegação de cerceamento de defesa ao considerar desnecessária nova prova pericial, já que o tratamento alternativo — sem transfusão — foi bem-sucedido e resultou na alta hospitalar.

O relator destacou que o STF, em setembro de 2024, firmou teses com repercussão geral nos Temas 952 e 1.069, reconhecendo o direito de pacientes maiores e capazes, como Testemunhas de Jeová, recusarem transfusões de sangue, desde que a decisão seja “inequívoca, livre, informada e esclarecida”. Segundo o STF, o Estado deve respeitar a autonomia individual e assegurar o acesso a tratamentos alternativos disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS).

Com base nesses precedentes vinculantes, o relator concluiu que não havia necessidade de reexaminar o mérito da recusa, pois a questão já foi definitivamente solucionada pelo STF. A extinção do processo foi mantida, sem risco de violação futura ao direito da paciente.

Quanto ao pedido de indenização por danos morais formulado pela paciente, o TRF6 entendeu que não houve conduta ilícita dos profissionais de saúde. O voto registra que os médicos seguiram protocolos técnicos, ofereceram o tratamento indicado e respeitaram a decisão da paciente, sem coerção. Testemunhas e registros hospitalares confirmaram que, mesmo diante da gravidade da doença, não houve imposição ou realização forçada de transfusão.

A decisão ressaltou o delicado equilíbrio entre princípios constitucionais: de um lado, a liberdade de consciência e de crença; de outro, o dever médico de preservar a vida e o direito à saúde. Concluiu que o respeito à autonomia do paciente é compatível com o exercício ético da medicina, desde que a decisão seja plenamente consciente e informada.

Por fim, a terceira turma do TRF6 manteve a condenação da EBSERH ao pagamento das custas processuais e rejeitou os pedidos de ambas as partes. A decisão reafirma o caráter vinculante dos precedentes do STF e a importância da autodeterminação do paciente, preservando a liberdade religiosa inclusive em situações de risco de morte.

Processo n. 0013951-83.2016.4.01.3800

TRT/MG: Pastor obrigado a fazer vasectomia em BH receberá indenização de R$ 95 mil

A Justiça do Trabalho determinou o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 95 mil, ao ex-pastor de uma igreja evangélica em Belo Horizonte, que foi obrigado a realizar uma vasectomia. Foi reconhecido também o vínculo de emprego entre as partes, com a obrigação de pagamento das parcelas rescisórias devidas.

Segundo o pastor, ele foi coagido a se submeter ao procedimento quando possuía menos de 30 anos de idade, sob pena de ser punido por indisciplina. “Isso revela a intervenção da igreja na vida privada e caracteriza a ocorrência de dano moral indenizável, especialmente por violação ao artigo 226, §7º, da CF”, alegou o pastor na ação trabalhista.

Duas testemunhas, que são pastores, confirmaram a realização do procedimento de vasectomia. Uma delas contou que fez a cirurgia e, até os dias de hoje, está arrependido disso. “(…) fez o procedimento para evitar que fosse rebaixado para pastor auxiliar; que a vasectomia é uma imposição a todos os pastores solteiros, três meses antes de se casarem”, disse.

Segundo a testemunha, a igreja entregou a ele R$ 700,00 para realizar o procedimento com um clínico geral. “Ela custeia o procedimento de todos os pastores”, confirmou o depoente.

Para o desembargador relator da 11ª Turma do TRT-MG, Antônio Gomes de Vasconcelos, o exame médico juntado aos autos e realizado no dia 26/8/2021, com o resultado de azoospermia, ou seja, ausência de espermatozoides no sêmen do reclamante, consiste em prova evidente sobre a realização da vasectomia.

“Nesse contexto, o autor da ação se desincumbiu do ônus de provar os fatos alegados (artigo 818, I, da CLT) acerca do ato ilícito praticado pela igreja, no que diz respeito à imposição de realização de esterilização cirúrgica”, concluiu o relator, determinando a indenização.

O julgador fixou então em R$ 95 mil o valor da indenização. “Montante que considero adequado e proporcional para as circunstâncias da lide”, pontuou o magistrado, reconhecendo que a conduta é extremamente grave, sobretudo porque caracteriza violação a preceitos de ordem constitucional, como o planejamento familiar e a autodeterminação dos indivíduos, ante a ingerência indevida na vida pessoal do pastor.

“A atitude da reclamada de exigir a realização do procedimento de vasectomia pelo empregado implica domínio do corpo do reclamante, privando-o da liberdade sobre a vida pessoal e os projetos de vida”, ponderou. Com base nesse entendimento, acompanhando o voto do relator, os julgadores da 11ª Turma do TRT-MG modificaram a decisão do juízo da 10ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte nesse aspecto.

Vínculo de emprego mantido
Além da indenização por danos morais, a Justiça do Trabalho reconheceu o vínculo de emprego entre o pastor e a igreja evangélica. A empregadora chegou a alegar que não existia a relação de emprego “visto que o pastor evangélico atuou em atividade de cunho religioso”. E sustentou que não houve desvirtuamento da atividade religiosa.

Mas, ao examinar o recurso, o relator manteve a decisão do juízo da 10ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte nesse aspecto. O autor da ação foi admitido em 25/1/2005, para exercer a função de pastor, mediante o pagamento mensal de R$ 3.200,00, tendo pedido demissão em 18/9/2019.

Segundo o julgador, houve desvirtuamento da finalidade religiosa e voluntária, com a presença dos requisitos para a configuração do vínculo de emprego. O relator ressaltou que o fato de a prestação de serviços ter ocorrido em entidades de cunho religioso, por si só, não afasta o vínculo de emprego. “A organização religiosa pode ser considerada empregadora, nos termos do §1º do artigo 2º da CLT”.

O depoimento de uma testemunha provou que a subordinação existente não era apenas eclesiástica. A testemunha exerceu a função de pastor na igreja entre 2002 e 2019 e disse que trabalhou com o autor no México, por oito meses.

“(…) trabalhávamos em cidades diferentes; como pastor, tinha as mesmas atribuições que o reclamante, porque havia ordem do líder no país, que passava para o estadual, que por sua vez passava para os pastores; era tudo igual e era necessário cumprir a ordem; o pastor ia para a rua fazer ponto de oração, distribuir jornais, buscar pessoas para ir para a igreja; (…) participava de reuniões; recolhia ofertas e (…), no dia seguinte, depositava o valor no banco; o pastor tinha que fazer tudo e resolver todas as questões da igreja”, informou a testemunha.

Diante dos fatos, foi negado provimento ao pedido da igreja, mantendo-se o reconhecimento da relação de emprego entre as partes.

“Levando também em consideração a valoração da prova feita pelo juízo de 1º grau, os relatos da testemunha comprovam a efetiva subordinação, tendo em vista a ingerência da reclamada na agenda do pastor, inclusive com a definição dos temas das pregações, além da imposição de metas e cobranças por meio de reuniões diárias sobre a angariação de valores no âmbito da igreja, sob pena de transferência ou alteração da hierarquia do pastor nos casos de redução dos valores obtidos”, concluiu o relator. Atualmente, o andamento processual está suspenso até o julgamento pelo TST e pelo STF de questão referente à definição de critérios para o pagamento do adicional de transferência provisória, tema que era uma das demandas do ex-pastor, abordado no processo.

TJ/MG: Criança com autismo e transtornos deve receber professor de apoio

TJ confirmou decisão da Comarca de Sete Lagoas que obrigou o Estado a disponibilizar educador em classe.

A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) rejeitou, por unanimidade, recurso do Estado de Minas Gerais e manteve decisão da Comarca de Sete Lagoas, na região Central, que determinou a disponibilização de professor para acompanhamento de uma criança com autismo, hiperatividade, déficits de atenção e intelectual e que sofre de epilepsia.

A ação foi ajuizada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), em desfavor do Estado, para que um professor de apoio fosse disponibilizado em sala de aula para acompanhar a criança. Em 1ª Instância, o pedido foi considerado procedente.

O Estado discordou e entrou com apelação salientando que a Superintendência Regional de Ensino emitiu parecer desfavorável à designação de professor de apoio. Isso porque o aluno não se enquadraria nos casos previstos em lei, que dispõe que o professor de apoio é necessário em casos de comunicação alternativa e tecnologias assistivas. Além disso, a defesa argumentou que já teria sido oferecido a esse aluno atendimento em sala de recursos da escola.

O relator do caso, desembargador Alberto Vilas Boas, rejeitou as alegações do Estado e confirmou a condenação, sendo acompanhado no voto pelos desembargadores Márcio Idalmo Santos Miranda e Manoel dos Reis Morais.

“Não se acolhe a argumentação desenvolvida pelo Estado, com base em seu normativo, de que apenas duas espécies de assistência estão previstas, e a tentativa de enquadrar o aluno na que não exige a assistência de um professor de apoio. O laudo médico acostado ao processo demonstra de modo claro a condição apresentada pela criança e suas necessidades, necessitando do acompanhamento especial escolar”, afirmou o relator

O magistrado destacou ainda que “está comprovado que o menor precisa de professor de apoio para suas atividades educacionais em sala de aula, de modo a garantir a assimilação de conteúdos e realização de atividades, não cabendo ao Estado, ao arrepio das recomendações médicas, decidir o que é melhor para o infante, de acordo com sua própria conveniência e não a da criança”.

O acórdão tramita sob segredo de Justiça.

TRT/MG: Justiça garante adicional de insalubridade a trabalhador de cemitério e expõe risco silencioso de contaminação ambiental

No momento em que os olhos do mundo se voltam para o Brasil durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP), uma decisão da Justiça do Trabalho lança luz sobre um problema ambiental e de saúde pública muitas vezes invisível: a contaminação gerada por cemitérios e seus riscos para os trabalhadores. O processo, movido por um trabalhador que atuou em dois cemitérios em Belo Horizonte, resultou na manutenção da condenação da empresa ao pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo (40%).

Em primeiro grau, o juízo da 26ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte reconheceu o direito do trabalhador ao adicional de insalubridade diante do risco biológico nas atividades exercidas. A empregadora recorreu da decisão e os julgadores da Quinta Turma do TRT de Minas negaram provimento ao recurso da empresa em sessão ordinária realizada em 13 de maio de 2025.

O trabalhador, que desempenhava atividades como capina, roçado mecânico, recolhimento de coroas, oferendas e resíduos nas quadras dos jazigos, além de transferir o lixo dos velórios, estava exposto de forma contínua a agentes biológicos patogênicos. O laudo técnico, peça-chave no processo, detalhou que ele recolhia “resíduos presentes nas quadras (restos de metais, trapos e outros provenientes da abertura das covas)” e manuseava lixo sem a devida comprovação de fornecimento e troca de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).

“A insalubridade por agentes biológicos é inerente a tais atividades, pelo que não há a sua neutralização com o uso de EPI’s, os quais podem apenas minimizar o risco”, destacou na decisão a desembargadora relatora, Maria Raquel Ferraz Zagari Valentim, confirmando o entendimento de que o risco é intrínseco à função.

A falta de controle de fornecimento dos EPIs pela empregadora reforçou a condenação, garantindo ao profissional a compensação devida pelo trabalho em condições de risco extremo.

Alerta ambiental
A relevância deste processo extrapola o direito individual e se conecta diretamente com a agenda da COP30, que discute as mudanças climáticas e a preservação do meio ambiente.

O laudo pericial anexado ao processo faz um alerta contundente, classificando os cemitérios como “um aterro sanitário de material biológico que pode carregar microrganismos patogênicos”. Citando a literatura científica, o documento enfatiza que a poluição causada pelos cemitérios é “assintomática para a percepção sensorial da população, de forma silenciosa, porém contínua”.

O ponto crucial para o debate ambiental é: a microbiota da terra dos cemitérios, contaminada por microrganismos patogênicos, pode ser uma fonte e veículo de transmissão de doenças, representando um risco contínuo à saúde pública e ao meio ambiente, especialmente ao solo e, potencialmente, às águas subterrâneas.

A preocupação com a gestão de resíduos biológicos em cemitérios foi amplificada durante a pandemia de Covid-19, quando a Comissão do Meio Ambiente do Conselho Nacional do Ministério Público emitiu notas técnicas sobre o manejo de corpos e o risco de sepultamentos em valas comuns ou rasas. A decisão da Justiça, ao reconhecer o risco biológico para o trabalhador, indiretamente reforça a necessidade de práticas de gestão ambiental mais rigorosas para o setor funerário.

Ao manter a condenação e o grau máximo de insalubridade, a Justiça do Trabalho não só corrige uma dívida com o trabalhador, que dedicou seu tempo à função de alto risco, mas também envia um recado importante para a sociedade e para os órgãos reguladores: a saúde do trabalhador e a gestão ambiental em cemitérios são faces da mesma moeda.

No mês em que o Brasil sedia o debate global sobre sustentabilidade, esse caso serve como um lembrete de que a “agenda verde” deve, obrigatoriamente, incluir o manejo seguro de resíduos biológicos e a proteção da vida e da saúde de quem atua nas áreas mais sensíveis e esquecidas do saneamento urbano.

Processo: PJe 0010713-64.2024.5.03.0105 (RORSum)

TRT/SP mantém condenação de R$ 80 mil a cervejaria por dispensa de gestante em gravidez de risco

A 9ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região manteve a condenação imposta a uma cervejaria, que deverá pagar cerca de R$ 80 mil a uma trabalhadora gestante dispensada durante a gravidez, em descumprimento à garantia provisória de emprego. O colegiado acompanhou, por unanimidade, o voto da relatora, desembargadora Thelma Helena Monteiro de Toledo Vieira, que rejeitou o recurso da empresa e confirmou integralmente a sentença do Juízo da Vara do Trabalho de Tietê/MG.

Segundo a decisão, a autora foi demitida em março de 2023, quando já estava grávida, em gestação considerada de risco. A empresa alegou que havia reintegrado a empregada em abril do mesmo ano, mas os documentos apresentados comprovaram apenas parte dos pagamentos e não a efetiva reintegração. A empregada, por sua vez, demonstrou ter recebido o seguro-desemprego após a dispensa, fato considerado incompatível com a tese da empresa.

Embora a empregadora tenha juntado aos autos comprovantes de pagamento e de FGTS, “estes documentos referem-se apenas a parte do período estabilitário, insuficientes para comprovar a reintegração”, registrou a relatora, ao afastar a tese de julgamento extra petita e confirmar a decisão de origem.

Na sentença mantida pela 9ª Câmara, o Juízo de primeiro grau concluiu que a reintegração tinha ocorrido tardiamente, apenas em setembro de 2023, após o ajuizamento da ação e já próxima à audiência. Por se tratar de gravidez de risco e diante da impossibilidade prática de retorno ao trabalho, o Juízo condenou a cervejaria ao pagamento indenizatório do período de estabilidade, que compreende salários, férias com adicional de um terço, 13º salários proporcionais e indenização referente ao FGTS, até cinco meses após o parto.

Processo 0010855-51.2023.5.15.0111

TJ/MG: Concessionária Cemig deve indenizar por quedas de energia frequentes

Em um dos dias, consumidora da Comarca de Caldas alegou que ficou quase nove horas sem luz.

A Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) deve pagar indenização por danos morais a uma consumidora que sofreu várias interrupções do fornecimento de energia. A decisão da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do de Minas Gerais (TJMG) reformou sentença da Comarca de Caldas, no Sul do Estado, e determinou o pagamento de R$ 5 mil.

A consumidora acionou a Justiça por ter sofrido prejuízos com prolongadas interrupções do serviço. Segundo ela, o problema era constante na vizinhança. Os registros juntados pela própria Cemig demonstram que a residência sofreu 14 interrupções ao longo de 2022. Em uma delas, em 31/12, foram quase nove horas sem o fornecimento de energia. Dois dias antes, a casa já havia ficado sem luz por três horas.

A Cemig alegou que a instabilidade do serviço ocorreu por conta da queda de árvores e de descargas atmosféricas que fugiam ao controle da empresa.

Em 1ª Instância, o pedido de indenização por danos morais e materiais da consumidora foi negado. Ela recorreu, alegando que a sentença ignorou a “sistemática violação do dever legal da concessionária de assegurar continuidade e qualidade no fornecimento de energia elétrica”.

Prática reiterada

O relator, desembargador Manoel dos Reis Morais, deu parcial provimento ao pedido para condenar a Cemig a pagar indenização de R$ 5 mil por danos morais e negou o pleito de danos materiais pela falta de provas nos autos.

“A suspensão indevida de energia elétrica constitui fato gerador de indenização por danos morais sob pena de afronta aos direitos da personalidade do cidadão. A consumidora permaneceu longos períodos sem energia, fato que por si só gera insegurança, desconforto e aflição, sobretudo quando reiterado e sem justificativa convincente”, afirmou o magistrado.

Quanto às alegações da Cemig, o relator avaliou que a empresa não comprovou a ocorrência de eventos naturais, limitando-se a registrar informação interna, e também não demonstrou que tenha restabelecido o serviço dentro dos prazos regulamentares em todas as ocorrências.

Os desembargadores Alberto Vilas Boas e Márcio Idalmo Santos Miranda votaram de acordo com o relator.

Processo nº 5000104-46.2023.8.13.0103

TRT/MG: Justiça do Trabalho reconhece risco em zonas de barragem e condena a Vale a retificar PPPs de trabalhadores

O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Extrativa Mineral e de Pesquisa, Prospecção, Extração e Beneficiamento de Ferrosos, Metais Básicos e Demais Minérios Metálicos e Não Metálicos de Itabira e Região obteve uma vitória significativa na Justiça do Trabalho contra a Vale S.A. A decisão, mantida em segundo grau, condenou a mineradora a fornecer novos Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPPs) para dois trabalhadores.

A determinação judicial baseou-se na prova pericial de que os profissionais exerciam suas atividades em condições de risco grave e iminente, dentro da Zona de Autossalvamento (ZAS), nas proximidades da Barragem de Conceição. O Judiciário reconheceu que essa condição representa um perigo iminente à vida, em caso de rompimento, assemelhando-se às tragédias ocorridas em Mariana (2015) e em Brumadinho (2019).

O PPP é um documento essencial para o trabalhador, pois registra a exposição a agentes nocivos e condições de risco ao longo da vida profissional. Ele é crucial para a eventual concessão da aposentadoria especial pelo INSS aos trabalhadores.

A Vale S.A. recorreu da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara do Trabalho de Itabira, alegando, entre outros pontos, que o risco de barragem não se enquadra na lista taxativa de agentes nocivos prevista em lei e que a decisão criava uma obrigação não legal.

No entanto, o desembargador relator da Primeira Turma do TRT-MG, Luiz Otávio Linhares Renault, manteve a tese adotada na sentença. Segundo o julgador, o rol de agentes nocivos previstos nas Normas Regulamentadoras do Poder Executivo é meramente exemplificativo, conforme, inclusive, entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

“O fato de o trabalho em áreas de barragem não estar formalmente listado não é suficiente para afastar o direito, desde que a perícia técnica comprove que o serviço nessas condições representa perigo à vida do empregado”, reforçou na decisão.

O laudo pericial apontou que os postos de trabalho dos substituídos representados pelo sindicato poderiam ser atingidos em poucos minutos em caso de rompimento, tornando a fuga “muito difícil ou até mesmo improvável”, uma situação agravada pelas falhas nos protocolos de segurança da Vale verificadas pelo perito judicial.

Segundo o magistrado, compete ao empregador emitir o PPP com todos os agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou a associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física do empregado, seja para fins de insalubridade, periculosidade ou concessão de aposentadoria especial.

O relator destacou ainda a urgência de assegurar o registro fidedigno das circunstâncias laborais e das condições de risco no PPP.

Zonas de Autossalvamento (ZAS)
Na decisão, o desembargador explicou que as Zonas de Autossalvamento (ZAS) são áreas localizadas logo abaixo da barragem, ou seja, no caminho por onde a água seguiria se a barragem se rompesse. Essas regiões são consideradas tão próximas da barragem que não daria tempo para os bombeiros, a defesa civil ou outros serviços de emergência chegarem a tempo de ajudar as pessoas em caso de acidente.

A Lei 14.066/2020 define a ZAS como o trecho do vale abaixo da barragem onde não há tempo suficiente para que as autoridades intervenham em uma situação de emergência, como uma inundação causada pelo rompimento da estrutura. Já o Decreto 11.31/2022 explica que, para identificar essas zonas de risco, são feitos estudos que mostram até onde a água chegaria e com que velocidade, caso a barragem se rompesse. Com base nesses estudos, a ZAS é considerada a área que seria atingida pela onda de água nos primeiros 30 minutos após o rompimento, enquanto não houver regras específicas definidas pelo órgão responsável ou uma ação imediata das autoridades.

Sobre o termo “autossalvamento”, o desembargador explicou que, embora ainda não esteja nos dicionários, ele pode ser entendido como “salvar-se por conta própria”. No contexto das barragens, isso significa que qualquer pessoa, seja trabalhador ou morador, que estiver nessa área de risco, terá que agir rapidamente para se proteger, sem esperar ajuda externa. Em outras palavras, a única chance de sobrevivência pode depender da própria pessoa. Por isso, em muitos casos, os trabalhadores usam equipamentos como crachás inteligentes ou aparelhos de localização (como o SPOT), que ajudam a acionar o socorro, mas ainda assim, o tempo é muito curto para depender exclusivamente deles.

Além disso, como ressaltou no voto, o processo traz depoimentos de testemunhas e levantamentos do laudo pericial que confirmam os riscos, no sentido de que há possibilidade de pessoas entrarem nas ZAS sem o uso dos crachás inteligentes ou equipamentos de localização. Segundo o laudo pericial: “Durante a diligência em campo, foram identificados vários empregados de terceiros que acessam a área do ZAS através de e-mail e não possuem o crachá inteligente”.

Conexão com a COP30: A urgência da Segurança e da Sustentabilidade
A condenação da Vale em Itabira ressoa em um contexto global de debates sobre Justiça Climática e Sustentabilidade Ambiental e Social (ESG), que está sendo intensificado no Brasil com a realização da COP30 em Belém do Pará.

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) focará na Amazônia e, por extensão, nos desafios ambientais e sociais do Brasil, incluindo a mineração. O histórico de desastres no setor mineral (Mariana e Brumadinho) e o reconhecimento judicial do risco diário a que os trabalhadores em ZAS estão submetidos evidenciam a falha em internalizar os custos ambientais e humanos da atividade.

A Justiça, ao forçar a inclusão do risco no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), garantiu a transparência corporativa e a proteção dos direitos humanos dos trabalhadores em áreas de risco (ZAS).

A decisão de Minas Gerais é um alerta e um paradigma para a COP30: a responsabilidade social e ambiental das grandes corporações deve ser plena, priorizando a dignidade da pessoa humana e a segurança do trabalhador acima do lucro. O registro do risco garante também os direitos previdenciários desses trabalhadores.

Palavras que ensinam
Ao finalizar, o desembargador citou palavras que ensinam, lições de vida em forma de poesia, da autoria de Carlos Drummond de Andrade e Cecília Meireles.

“Alguns anos vivi em Itabira. Principalmente nasci em Itabira. Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro. Noventa por cento de ferro nas calçadas. Oitenta por cento de ferro nas almas”. (Carlos Drummond de Andrade, Confidência do Itabirano, in Obra Completa. Rio de Janeiro, GB: Companhia José Aguilar Editora, 1967).

“O Rio? É doce. A Vale? Amarga. Ai, antes fosse mais leve a carga. (…) quantas toneladas exportamos de ferro quantas lágrimas disfarçamos sem berro?” (Drummond, Lira Itabirana).

“Que é feito de ti, montanha, que a face escondes no espaço? Mil bateias vão rodando sobre córregos escuros; a terra vai sendo aberta por intermináveis sulcos; infinitas galerias penetram morros profundos. De seu calmo esconderijo, o ouro vem, dócil e ingênuo; torna-se pó, folha, barra, prestígio, poder, engenho… É tão claro! – e turva tudo; honra, amor e pensamento”. (Romanceiro da Inconfidência, Cecília Meireles. Rio de Janeiro, GB: Companhia José Aguilar Editora,1972, p. 415).

Processo PJe: 0010046-19.2024.5.03.0060 (ROT)

TJ/MG: Empresas são condenadas por larvas em biscoito

Fabricante e supermercado devem responder por produto em condições inadequadas.


A 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) manteve sentença da Comarca de Muriaé, na Zona da Mata, que condenou uma fabricante de alimentos e um supermercado a indenizarem uma consumidora que encontrou larvas em um pacote de biscoitos. Ela deve receber R$ 4 mil em danos morais.

Conforme relato no processo, ao iniciar o consumo do produto, a cliente sentiu gosto estranho e identificou larvas vivas e mofo no pacote. Ela argumentou que a ingestão do biscoito estragado causou repulsa e náuseas, por isso juntou nota fiscal, fotografias, vídeo e depoimento de testemunha para acionar a Justiça.

Em 1ª Instância, as empresas foram condenadas a indenizar a consumidora por danos morais; por isso, recorreram.

A fabricante argumentou que não pode ser responsabilizada por má conservação do produto após a saída da fábrica, e também apontou ausência de risco sanitário para desclassificar os danos morais. Já o supermercado alegou que a responsabilidade do produto seria do fabricante.

A relatora do caso, desembargadora Ivone Guilarducci, rejeitou os argumentos das empresas e manteve a sentença.

“A presença de larvas vivas em um produto alimentício industrializado, adquirido devidamente lacrado e dentro do prazo de validade, jamais poderia ser tida como um risco inerente à sua natureza ou como mero dissabor cotidiano. Ao constatar que havia ingerido parte do alimento contaminado, a consumidora experimentou sensação de nojo, repulsa e insegurança, reação plenamente justificável diante da violação ao seu direito à alimentação segura e adequada.”

A magistrada negou ainda ter havido cerceamento de defesa pelo indeferimento de perícia, “considerando a natureza perecível do alimento e a impossibilidade de sua conservação para exame técnico posterior”.

Os desembargadores Francisco Costa e Monteiro de Castro acompanharam o voto da relatora.


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