STJ: Sob o CC/2002, mesmo que casamento com separação de bens seja anterior, hipoteca dispensa autorização conjugal

​​​​Em negócios celebrados após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, deverá ser aplicada a regra do seu artigo 1.647, inciso I – que prevê a dispensa da autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca no regime da separação absoluta de bens –, mesmo que o casamento tenha acontecido ainda sob o Código Civil de 1916.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) que, em virtude da falta de autorização das esposas dos dois sócios de uma empresa, havia declarado a nulidade da hipoteca de imóvel dado em garantia no momento da celebração de contrato de crédito industrial.

Para o TJPB, como os casamentos foram realizados na vigência do CC/1916, deveriam ser obedecidas as normas desse código, inclusive em relação à necessidade de consentimento sobre a garantia, mesmo na hipótese de regime de separação de bens.

A relatora do recurso especial do banco credor, ministra Nancy Andrighi, lembrou que o artigo 1.687 do CC/2002 prevê que, estipulada a separação de bens, o patrimônio permanecerá sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que poderá livremente aliená-lo ou gravá-lo com ônus real. Entretanto, a ministra também lembrou que, segundo o artigo 2.039 do mesmo código, o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do CC/1916 é por ele estabelecido.

Segundo a ministra, o artigo 2.039, ao fixar uma regra de transição quanto ao regime de bens, teve por finalidade disciplinar as relações familiares entre os cônjuges na perspectiva patrimonial, regulando como ocorrerá, por exemplo, a partilha dos bens por ocasião da dissolução do vínculo conjugal.

Sem influê​​ncia
Por esse motivo, a relatora entendeu que não seria possível concluir que o artigo 2.039 do CC/2002 deva influenciar, na perspectiva do direito intertemporal e da definição da legislação aplicável, as hipóteses em que deveria ser dada autorização conjugal, pois esse instituto, “a despeito de se relacionar com o regime de bens (pois, em última análise, visa proteger o patrimônio do casal), é, na realidade, uma condição de eficácia do negócio jurídico cuja validade se examina”.

“Em outras palavras, é correto afirmar que, em se tratando de casamento celebrado na vigência do CC/1916 sob o regime da separação convencional de bens, somente aos negócios jurídicos celebrados na vigência da legislação revogada é que se poderá aplicar a regra do artigo 235, I, do CC/1916 (que previa a necessidade de autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca, independentemente do regime de bens)” – esclareceu a ministra.

No caso dos autos, como o negócio que se buscava invalidar foi celebrado em 2009 – ou seja, já na vigência do CC/2002 –, a relatora concluiu que deveria ser aplicada a regra do artigo 1.647, inciso I, do código vigente, que dispensa a autorização conjugal na hipoteca quando o matrimônio, mesmo realizado sob o CC/1916, tiver estabelecido o regime da separação convencional de bens.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.797.027 – PB (2019/0038611-7)

TRF1: Necessária a prévia conversão em renda dos valores depositados para que a execução fiscal possa ser extinta

A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou provimento à apelação do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) contra a sentença que, em virtude da conversão em renda do depósito judicial, feito por uma empresa, em favor do Inmetro extinguiu a execução fiscal pelo pagamento.

Em seu recurso ao Tribunal, a autarquia sustentou que o valor convertido em renda é insuficiente para quitar os débitos do executado. Com isso, o Inmetro pleiteou a reforma da sentença para o regular prosseguimento da execução até a satisfação integral do débito.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Amilcar Machado, explicou que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal, “o simples depósito em juízo do valor cobrado não é suficiente para que seja quitado o débito”.

Entretanto, segundo o magistrado, diante do fato da conversão em renda dos valores depositados pela empresa, conforme consta dos autos, a sentença deve ser mantida.

A decisão do Colegiado foi unânime acompanhando o voto do relator.

Processo nº 0003134-85.2006.4.01.3807

TJ/DFT: Concessionária é condenada a indenizar motorista que colidiu com animal solto na pista

A Concessionária BR-040 terá que indenizar um motorista cujo veículo colidiu com um cavalo que estava solto na rodovia. O carro teve perda total. A decisão é da juíza do 2º Juizado Especial Cível de Brasília.

O motorista conta que, após a colisão, perdeu o controle do veículo, que caiu em uma ribanceira. Alega que a empresa, responsável por administrar a rodovia não prestou assistência e pede indenização pelos danos morais e materiais.

Em sua defesa, a concessionária afirma que o evento foi causado por culpa exclusiva de terceiro, e pediu que os pedidos sejam julgados improcedentes.

Ao julgar, a magistrada registrou: “O fornecedor de serviços não será responsabilizado quando provar que, prestado o serviço, o defeito é inexistente ou que a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiro, o que não ocorreu na hipótese em análise (…) Considerando-se que a teoria do risco do negócio ou atividade é o fundamento da responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor, reputo configurado o ilícito atribuído à ré, que deve reparar os danos causados ao autor”, explicou.

Dessa forma, a Concessionária foi condenada a pagar ao motorista a quantia de R$ 10 mil, a título de danos materiais. Este valor foi fixado com base na Tabela FIPE e observada a data em que ocorreu o sinistro. A ré terá ainda que pagar o valor de R$ 3 mil pelos danos morais suportados e ressarcir R$ 231,00, referente ao gasto com depósito do veículo na PRF.

Cabe recurso da sentença.

PJe: 0724715-50.2020.8.07.0016

TJ/MS: Consumidor deve informar-se sobre documentos para ingresso em países estrangeiros

A Justiça negou provimento ao recurso de uma consumidora que não conseguiu embarcar em voo internacional por não possuir visto de trânsito para o país onde a aeronave faria escala. A decisão é da 1ª Câmara Cível, por unanimidade, que considerou ser dever do adquirente de passagem aérea buscar informações sobre o ingresso em países para onde viajará.

Segundo os autos do processo, a apelante comprou passagens aéreas pela internet para viajar com sua família a Paris, na França. O voo adquirido possuía escala nos Estados Unidos, o que a consumidora só tomou conhecimento após finalizar a compra. Ela também só soube depois que precisaria de um visto de trânsito para os Estados Unidos por conta da escala de seu voo. Como não possuía referido documento, foi impedida de embarcar, o que lhe acarretou um custo adicional de R$ 2 mil ao comprar passagem aérea de outra empresa.

Após o pedido ser julgado improcedente pelo juízo de 1º Grau, a consumidora ingressou com recurso de Apelação junto ao TJMS. Em suas razões recursais, a apelante defendeu ser de responsabilidade da empresa informar sobre a documentação necessária durante o voo, de forma que os prejuízos por ela sofridos pela ausência desses dados consistem em danos advindos de má prestação de serviço, portanto indenizáveis pela requerida.

Para o relator do recurso, Des. Marcelo Câmara Rasslan, embora seja evidente o dever das fornecedoras de prestar informações essenciais sobre os produtos por ela vendidos, no presente caso a informação da necessidade de visto americano em razão da conexão foi prestada pela demandada em seu sítio eletrônico, local por onde a consumidora adquiriu a passagem.

“Portanto, trata-se de única e exclusiva responsabilidade da recorrente em providenciar e organizar os documentos que se fizessem necessários para a realização de sua viagem internacional, principalmente de visto de entrada ou trânsito nos países em que este fosse exigido, fato este informado explicitamente pela recorrida”, frisou.

O magistrado também ressaltou que, ao optar pela compra via internet, o consumidor abdica de um atendimento mais personalizado e deve, portanto, buscar dentro do site que está visitando todas as informações necessárias.

“Vale ainda registrar que a autora é pessoa instruída, pois conforme consta na peça inicial, é enfermeira, pressupondo-se que era conhecedora dos trâmites burocráticos para concessão da entrada em país estrangeiro, não sendo crível que não tivesse conhecimento da necessidade do visto americano”, destacou o relator.

STF: Anvisa tem 48 horas para informar motivação para a suspensão dos testes da CoronaVac

A decisão é do ministro Ricardo Lewandowski, relator de quatro ações sobre a vacinação contra a Covid-19.


O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) preste, em 48 horas, informações sobre os critérios utilizados para proceder aos estudos e experimentos referentes à vacina desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac Biotech em parceria com o Instituto Butantan, e sobre o estágio de aprovação desta e das demais vacinas contra a Covid-19. A determinação levou em conta a recente decisão da agência, responsável pela concessão de registro dos imunizantes disponibilizados ou comercializados no País, de suspender os testes da vacina, conhecida como CoronaVac.

A decisão foi tomada nas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs 754 e 756). O ministro, que também é relator de outras duas ações ajuizadas por partidos políticos sobre a vacinação da população contra a Covid-19, destacou o relevante interesse público e coletivo discutido nas ações e a disposição constitucional (artigo 196) de que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco à doença e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

As ações foram ajuizadas depois que o presidente da República, Jair Bolsonaro, anunciou que a vacinação contra a Covid-19 não será obrigatória no Brasil e que o país não irá adquirir a CoronaVac. Entre os pedidos formulados estão o de que o STF fixe a orientação de que compete aos estados e aos municípios determinarem a realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas no combate à pandemia da Covid-19 e de que o governo assine protocolo de intenção de compra da 46 milhões de doses da vacina, conforme anunciado pelo Ministério da Saúde.

Processo relacionado: ADPF 754
Processo relacionado: ADPF 756

STJ: Juiz tem legitimidade para recorrer de decisão que o declara suspeito para julgar processo

O magistrado, apesar de não ser parte na ação submetida à sua jurisdição, é parte no incidente de suspeição que possa surgir no processo – situação em que defenderá interesses próprios. Por isso, nesse caso, o juiz tem legitimidade para impugnar, por meio de recurso, a decisão que julga procedente a exceção de suspeição, ainda que ele não seja condenado ao pagamento de custas ou honorários advocatícios, pois também pode haver reflexos em seu patrimônio moral.

Com amparo nesse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) cassou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que não conheceu dos embargos de declaração apresentados por um magistrado contra a decisão que o afastou de um processo. Segundo o tribunal, em entrevista à imprensa, o juiz teria emitido opiniões sobre a idoneidade das partes litigantes.

O caso foi analisado sob as regras do Código de Processo Civil de 1973. Contra a decisão do TJSP – que determinou a remessa dos autos a outro magistrado –, o juiz declarado suspeito opôs dois embargos de declaração, os quais não foram conhecidos pelo tribunal sob o fundamento de inexistência de legitimidade recursal.

Evolução doutrin​​ária
O ministro Marco Buzzi, relator do recurso especial do juiz, explicou que, com base nos princípios tradicionais que regem o direito processual, o magistrado, os auxiliares da Justiça e os demais sujeitos imparciais do processo não são parte nem terceiros nas ações que tramitam sob sua jurisdição ou supervisão. Por esse motivo, em tese, não estariam legitimados a interpor recursos.

Entretanto – ponderou –, existem deliberações judiciais que podem afetar diretamente o patrimônio financeiro desses sujeitos, a exemplo do julgamento procedente de exceção de suspeição ou impedimento, em que o juiz é condenado a pagar despesas processuais.

Por essas razões, o relator destacou que, atualmente, há uma tendência de distanciamento da concepção clássica da chamada “parte”, pois os titulares da relação jurídica material submetida ao Judiciário não se confundem, necessariamente, com os sujeitos da relação jurídica processual.

Legitimaçã​​o recursal
No caso da exceção de suspeição, o ministro Buzzi apontou que o juiz excepto, embora não seja parte na relação jurídica material da demanda, figura como parte legítima no incidente, tanto que, caso não reconheça a sua suspeição, pode apresentar defesa por meio de razões – de acordo com as previsões do CPC/1973.

Segundo o ministro, o CPC/2015, no artigo 146, parágrafo 5º, afastou qualquer dúvida sobre a possibilidade de o juiz interpor recurso contra a decisão que julga a exceção procedente.

Nesse cenário, apesar de o CPC/1973 não haver estabelecido um referencial claro sobre o tema, Marco Buzzi entendeu que o magistrado, como sujeito da exceção de suspeição, possui interesse jurídico e legitimação para recorrer da decisão de procedência do incidente.

Ao acolher o recurso e cassar o acórdão do TJSP, o ministro afirmou ainda que a legitimidade do juiz para recorrer não deve ser reconhecida apenas quando a decisão judicial atinge o seu patrimônio financeiro – ou seja, quando ele é condenado ao pagamento de despesas processuais –, pois, em algumas situações, o prejuízo também pode ser moral.

No caso em discussão, Marco Buzzi assinalou que os fundamentos adotados pelo tribunal de origem para julgar procedente a exceção de suspeição sugerem que o juiz teria agido de maneira inadequada ao dar entrevista à imprensa e manifestar opinião sobre processo em tramitação, o que indicaria um comportamento de parcialidade.

STJ: Nas tutelas antecipadas antecedentes, prazo para emenda à petição começa com intimação específica

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adotou o entendimento de que o prazo para a parte emendar a petição inicial, após a concessão de tutela antecipada em caráter antecedente, somente tem início depois da sua intimação específica para a prática desse ato processual.

O colegiado negou provimento ao recurso em que uma empresa de informática pediu a extinção de processo movido contra ela por um condomínio, o qual, por meio de tutela antecipada antecedente, pleiteou o cumprimento de contrato de prestação de serviços.

Segundo a empresa, o condomínio não realizou, no prazo legal de 15 dias, o aditamento à petição inicial, como determina o Código de Processo Civil (CPC) nos casos de tutela antecipada. Para ela, o prazo passaria a contar da ciência da decisão que concedeu a tutela, a qual teria ocorrido, de forma inequívoca, no momento em que o condomínio apresentou uma nova petição para questionar o cumprimento da tutela antecipada, pleiteando a aplicação de multa à empresa.

Ciência inequ​​ívoca
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, explicou que, em regra, a intimação deve ser cumprida com a observância estrita da forma prevista em lei, para não haver dúvidas de que a parte teve efetiva ciência do ato processual e das eventuais providências que deva tomar.

Segundo a ministra, embora a presunção legal de conhecimento do ato processual proferido no processo eletrônico decorra da intimação formal, “existe a possibilidade de se excepcionar esse preceito, por aplicação do princípio da instrumentalidade das formas, caso seja demonstrada a ciência inequívoca da parte sobre o conteúdo do ato processual”.

Ao citar precedente da Quarta Turma, a relatora ressaltou que a aplicação da teoria da ciência inequívoca é excepcional, não sendo configurada pelo mero peticionamento espontâneo nos autos, sem o comprovado acesso ao seu conteúdo.

Nancy Andrighi ainda destacou que a ciência inequívoca não é resultado inerente da primeira oportunidade para se manifestar no processo, pois não é um critério puramente cronológico, sendo “verificada de acordo com o conteúdo da manifestação que revele a indispensável ciência de todo o conteúdo da decisão, isto é, o inequívoco conhecimento da parte de que deve tomar alguma atitude processual”.

Tutela principa​​​l
A ministra esclareceu que, na petição inicial da tutela provisória antecipada antecedente, o autor somente fez a indicação do pedido de tutela final – artigo 303, parágrafo 1º, I, do CPC –, devendo a sua argumentação ser complementada com a confirmação do pedido de tutela final, no prazo de 15 dias, ou outro maior fixado pelo juiz. Contudo, a relatora observou que o mencionado dispositivo legal não define, expressamente, o termo inicial do prazo.

Para a ministra, essa informação deve ser extraída a partir da interpretação “teleológica e sistemática” do instituto da tutela antecipada antecedente com as previsões dos artigos 4º; 139, IX; 321; 304, caput e parágrafo 1º; e 1.003, parágrafo 5º, do CPC, cuja orientação é de que o prazo para o aditamento da inicial somente tem início se for estritamente necessário para que se dê sequência ao “procedimento provisório” para a tutela principal, quando ocorrerá a cognição plena.

Prazos sucessi​​vos
De acordo com Nancy Andrighi, a intimação do autor para o aditamento da petição inicial e o início do prazo mínimo de 15 dias para a prática desse ato exigem intimação específica, com a indicação precisa da necessidade da emenda da inicial, conforme prevê o artigo 321 do CPC.

Isso porque, “caso concedida a tutela provisória de urgência antecipada e satisfativa, o artigo 304, caput, do novo CPC prevê que a mencionada decisão judicial pode se estabilizar se, regularmente intimada a parte adversa, ela não interpõe recurso da decisão que a concedeu, devendo o processo, nessa hipótese, ser extinto, conforme prevê o parágrafo 1º do referido artigo”.

Por essa razão, a ministra entendeu que os prazos para recorrer da decisão de concessão da tutela antecipada e para aditar a inicial não correm concomitantemente, mas sim de forma sucessiva.

“Solução diversa acarretaria vulnerar os princípios da economia processual e da primazia do julgamento de mérito, porquanto poderia resultar na extinção do processo, a despeito da eventual ausência de contraposição por parte do adversário do autor, suficiente para solucionar a lide trazida a juízo”, afirmou.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.766.376 – TO (2018/0148978-8)

TJ/GO: Estado deve indenizar aluno que recebeu uma ‘gravata’ do professor para obrigá-lo a comer uma bolinha de papel

O Estado de Goiás terá de pagar indenização por danos morais de R$ 20 mil a um estudante que foi agredido por um professor, que, por meio de um golpe popularmente conhecido como “gravata”, tentou fazer com que ele comesse uma bolinha de papel, que o atingiu durante brincadeira da turma em sala de aula. A juíza Patrícia Passoli Ghedin, da 2ª Vara (Fazenda Pública, Criminal, Execuções Penais e Juizado Especial Criminal) da comarca de Bom Jesus, ressaltou que “todas as provas carreadas aos autos pelas partes demonstram de forma indubitável o ato do professor estadual temporário de executar uma gravata e obrigar o aluno a engolir uma “bolinha de papel”.

Representado pelo pai, o estudante sustentou que estava matriculado no 6º ano do ensino fundamental e foi fortemente constrangido diante de todos os alunos que se encontravam na sala de aula. Salientou que ao brincar de jogar bolinha de papel com seus colegas de classe, uma delas atingiu o quadro próximo ao local em que se encontrava o professor. Na época do fato, ocorrido em 8 de dezembro de 2017, ele tinha 13 anos.

Foi então que o professor de educação física de um colégio estadual do Município de Bom Jesus perguntou à classe o que deveria fazer com a bolinha de papel. Se deveria jogá-la de volta ao autor ou fazer com ele a comesse. Os alunos, por sua vez, disseram que ele deveria fazer o responsável comer a bolinha de papel.

Segundo os autos, foi aí que o professor, de maneira violenta, teria ido ao encontro do estudante e por meio de uma “gravata”, tentou colocar a bolinha de papel em sua boca por três vezes, conforme imagens apresentadas ao processo. Em seguida, sem manifestar qualquer arrependimento de sua conduta, saiu da sala de aula e os alunos lá permaneceram, assustados. O pai do aluno registrou boletim de ocorrência junto à Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária e o caso ganhou repercussão em jornais e sites da região.

O Estado de Goiás reconheceu o ato do professor. Contudo, salientou que houve culpa da vítima, uma vez que possuía diversas fichas disciplinares nas quais constam o seu comportamento inadequado no ambiente escolar.

Para a magistrada, o professor “possuía o dever de promover o acesso à educação aos seus alunos e, se necessário, promover as devidas repreensões dentro dos limites pedagógicos inerentes à profissão, o que não ocorreu nos autos”. Ela ressaltou que a situação vivenciada pelo aluno configura humilhação pública e promove, sem maiores esforços interpretativos, inquestionável dano moral. Também observou que é evidente que a conduta agressiva perpetrada pelo professor, agente estatal, ao aluno, ocasionou o dano extrapatrimonial sofrido, estando configurado, igualmente, o nexo causal entre a conduta praticada e o resultado final danoso.

A juíza destacou ainda que o conjunto probatório demonstra que, de fato, as atitudes perpetradas pelo professor causaram ao autor dano moral passível de indenização, tendo sido necessária, inclusive, a tomada de providências pela instituição de ensino, tais como a comunicação do ocorrido à Subsecretaria de Educação, ao pai do aluno e afastamento do professor, fato que inclusive acarretou na exclusão de seu contrato temporário.

A juíza Patrícia Passoli Ghedin ponderou que a atividade de professor é estressante e, muitas vezes, mal recompensada, notadamente pelo grau de importância que a educação tem (ou ao menos deveria ter) na evolução da sociedade. “Não obstante a previsão legal, faltam meios para implementação de um sistema global de atendimento, que permite o encaminhamento de alunos com dificuldades específicas, desestruturação familiar ou pura disciplina para um acompanhamento especializado que permita o seu desenvolvimento sadio”, pontuou a magistrada.

Contudo, estas considerações, para ela, “não tem o condão de autorizar que o educador faça (a sua) justiça literalmente com as próprias mãos, agredindo alunos em razão do mau comportamento, seja pelo arremesso da bola de papel, seja por supostas agressões verbais homofóbicas por ele proferidas. O comportamento deve ser repreendido pelas vias legais e não pela agressão”.

A magistrada ressaltou não defender que a escola deva ser uma algazarra em que o aluno tem sempre razão. Pelo contrário, para ela “a escola é o atual centro de crescimento e socialização de crianças, tendo papel fundamental no desenvolvimento desses seres humanos em formação. Disciplinar faz parte do ato de educar, sendo necessário estabelecer limites e padrões de comportamento dentro da sala de aula. Ocorre, porém, que sob nenhum aspecto violentar está compreendido do conceito de educação”.

Para ela, não há que se falar em existência de culpa concorrente do autor, ou qualquer outra causa atenuante, vez que a postura adotada pelo professor fora totalmente incompatível com a que se espera de um educador.

Processo nº 5004986-65.2019.8.09.0018.

TJ/RN: Bradesco deve restituir descontos indevidos em dobro e pagar danos morais a cliente

A Segunda Câmara Cível do TJRN decidiu que o Banco Bradesco, por ter realizado descontos indevidos, de tarifas na conta de uma de suas clientes, deverá restituí-los em dobro e realizar o pagamento de danos morais no valor de R$ 2.500,00. A sentença originária da Vara Única de Almino Afonso havia determinado a restituição simples dos valores retirados, mas no julgamento do recurso, o acórdão em segunda instância estendeu os efeitos da decisão inicial.

Conforme consta no processo, o banco demandado debitou ao longo de vários anos, mensalmente, tarifas no benefício recebido pela demandada, no valor de R$ 28,00 com a rubrica de “Cesta B. Expresso 2”, alegando que tais valores seriam decorrentes de serviços bancários como talão de cheques, cartão de crédito e limites de crédito. Entretanto, a demandante nunca utilizou tais serviços, nem os solicitou ao banco demandado.

Ao analisar os autos, o desembargador Ibanez Monteiro, relator do acórdão em segundo grau, fez referência às normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC) para solucionar a questão e considerou que “a simples alegação da existência de contrato”, sem a juntada de qualquer documento comprobatório “não é suficiente para conferir validade ao negócio jurídico”. E ressaltou que o pedido da autora tem procedência, estando fundamentado em dois argumentos: primeiro, pelo fato de o banco não ter juntado “o contrato objeto de discussão”; e segundo, por não ter comprovado que a autora foi beneficiária das operações e serviços financeiros alegadas.

Dessa forma, o magistrado destacou que houve defeito na prestação de serviços por parte do banco recorrido, visto que “caberia a este último os cuidados necessários na realização de débitos não autorizados pela recorrida”. E acrescentou que o CDC, em seu artigo 14, prevê responsabilidade “pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas”. Além disso, a devolução em dobro de quantias indevidamente debitadas está prevista no artigo 42 do CDC.

Quanto aos danos morais, o relator apontou que estes ocorrem quando uma pessoa é submetida injustamente a “dor, constrangimento, incômodo, tristeza, angústia”, sendo necessário em tais casos “compensar a vítima pelo dano sofrido, bem como punir e educar o causador do dano, para que novas condutas lesivas sejam evitadas”. E dessa maneira foi fixado o valor de R$ 2500,00 na condenação à instituição privada demandada.

Processo: 0800338-29.2020.8.20.5135.

STF nega recurso de defensora dativa que cobrou honorários de beneficiário da justiça gratuita

Condenada pelo crime de corrupção passiva, ela alegava que a pena aplicada era desproporcional e pedia sua revisão.


O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou recurso em que a advogada e defensora dativa S.A.L. pedia a revisão da dosimetria da pena a que foi condenada pelo crime de corrupção passiva, em razão de ter exigido o pagamento de honorários advocatícios de um beneficiário de assistência judiciária gratuita que era assistido por ela. A decisão do ministro foi tomada no Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 187362.

Nota promissória

A advogada foi nomeada como defensora dativa para uma cidadã em uma ação de separação de corpos. Os defensores dativos são advogados pagos pelo Estado para defender cidadãos sem condições financeiras de arcar com os custos de um processo. Conforme os autos, a advogada solicitou que a pessoa defendida assinasse uma nota promissória no valor de R$ 415 como pagamento pelos serviços prestados. Como a dívida não foi quitada, ela executou a nota promissória.

Culpabilidade

Diante disso, a advogada foi condenada pela Comarca de Descanso (SC) a dois anos de reclusão em regime aberto, com a conversão da pena para prestação de serviços comunitários e pagamento de 10 salários mínimos. O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJ-SC) aumentou a pena em ⅙, em razão da culpabilidade. A decisão levou em conta o fato de se tratar de advogada experiente, com anos de serviços prestados na comarca de origem, além de ser cadastrada para atuar como defensora dativa e ter maior empatia com os desassistidos. Com a majoração, a pena chegou a 2 anos e 6 meses e 12 dias-multa, mantida a substituição por prestação de serviços comunitários.

Desproporcionalidade

No recurso ao STF, interposto contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que rejeitou HC lá impetrado, a defesa da advogada sustentava que o fato de ela ter executado a nota promissória proveniente, em tese, de cobrança de vantagem indevida não denota reprovabilidade acentuada a ponto de possibilitar o aumento da pena-base. Também argumentava a desproporcionalidade da pena imposta.

Via inadequada

Para o ministro Ricardo Lewandowski, no entanto, o caso não é de revisão da dosimetria da pena e não há qualquer ilegalidade nos critérios utilizados pelo TJ-SC para a majoração. Segundo o ministro, o Supremo consolidou entendimento de que o habeas corpus é um instrumento processual restrito e não permite a ponderação e o reexame das circunstâncias judiciais que demandem exame minucioso de fatos e provas.

Para Lewandowski, no RHC é possível apenas o controle da legalidade dos critérios utilizados, com a correção de eventuais arbitrariedades que, segundo o ministro, não se verificam no caso.


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