TRT/MT: Agropecuária indenizará vigia por referências negativas

A decisão também afasta multa por má-fé que havia sido aplicada ao trabalhador e ao seu advogado na sentença, que havia considerado a prova ilegítima.


Em razão de referências negativas que poderiam prejudicar a recolocação do trabalhador no mercado de trabalho, uma agropecuária foi condenada a pagar R$ 15 mil de indenização por danos morais. A decisão da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT), tomada de forma unânime pelos desembargadores, também afastou a multa por litigância de má-fé, imposta ao trabalhador na Vara do Trabalho de Campo Novo do Parecis.

O julgamento da 1ª Turma reformou a sentença, que havia rejeitado o pedido de indenização por entender que a única prova apresentada – uma gravação telefônica feita a pedido do ex-empregado, em que um colega se passava por potencial empregador – era moralmente ilegítima.

O vigia recorreu ao TRT alegando que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconhece a licitude de gravações feitas por um dos interlocutores, mesmo sem consentimento do outro. Segundo ele, a empresa não foi induzida, entretanto as respostas ao pedido de referência comprovaram as informações negativas dadas por seu antigo supervisor.

O trabalhador relatou ter sido contratado em março de 2022 e, após a dispensa, enfrentado dificuldades para se recolocar no mercado. “Fiquei sabendo por terceiros que a empresa dava referências negativas sobre mim, a fim de denegrir minha imagem profissional”, afirmou. Ele sustentou que a gravação obtida revelou comentários graves sobre sua conduta no emprego anterior.

A agropecuária contestou a validade da prova, argumentando que não era possível identificar os interlocutores e que a gravação teria sido obtida de forma simulada. Afirmou tratar-se de uma “armação” entre o ex-empregado e seu colega, que já havia ajuizado outra ação contra a empresa utilizando o mesmo material. Alegou ainda inexistir prejuízo ao trabalhador, já que não havia oferta de vaga em curso.

Em audiência, o trabalhador admitiu ter pedido ao colega que realizasse a ligação para a empresa e a testemunha afirmou que não fingiu ser dono de empresa, apenas simulou interesse na contratação de ex-vigias para verificar se as dificuldades relatadas tinham fundamento.

Ao julgar o caso, o relator, desembargador Paulo Barrionuevo, lembrou que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a gravação de conversa pelo próprio interlocutor, ainda que sem o consentimento do outro, é prova lícita e serve como meio válido de demonstração dos fatos alegados. “Ainda que o autor não tenha participado do diálogo, tal fato não macula a prova produzida, na medida em que não restou demonstrado que a ré tenha sido induzida a proferir declarações desabonadoras”, afirmou.

No áudio, confirmado pela própria empresa, o supervisor relatou que o trabalhador e outro colega foram demitidos por justa causa e acrescentou que “o problema dos dois é que tem que ficar cutucando eles para trabalhar” e que “se der uma brechinha, começam a usar de má-fé”. Em outro trecho, disse ainda que “os caras não foram verdadeiros com você”.

Para o relator, tais referências, mesmo sem prova de perda concreta de emprego, “certamente dificultam a reinserção do trabalhador no mercado e a obtenção de meios para sustento próprio e de sua família, o que basta para a caracterização do dano moral”. Considerando os parâmetros de proporcionalidade e razoabilidade, o valor da indenização foi fixado em R$ 15 mil.

Má-fé afastada

A 1ª Turma também afastou a condenação por litigância de má-fé dada inicialmente ao vigia e seu advogado. Para os desembargadores, não houve intenção deliberada do ex-vigia de manipular os fatos. “Apenas buscou meios de provar a situação alegada, tendo, inclusive, obtido êxito em razão da gravação feita”, registraram.

Com a decisão, foi assegurada a indenização por dano moral e a exclusão da multa.

PJe 0000722-88.2024.5.23.0111

TJ/MA: Estado é condenado a pagar diferenças salariais a profissionais de enfermagem

Em sentença proferida na Vara de Interesses Difusos e Coletivos da Comarca da Ilha, a Justiça acolheu o pedido formulado pelo Sindicato dos Técnicos e Auxiliares de Enfermagem do Estado do Maranhão (SINTAEMA), e condenou o Estado do Maranhão a pagar, com juros e correção monetária, as diferenças salariais entre o valor recebido mensalmente pelos substituídos e o piso salarial previsto em lei, referente às parcelas retroativas que deveriam ser repassadas no período de maio a setembro de 2023. Esse pagamento refere-se aos profissionais técnicos e auxiliares em enfermagem da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP). Em caso de descumprimento, o Judiciário estabeleceu multa diária no valor de R$ 1.000,00, a ser revertida ao Fundo Estadual de Direitos Difusos.

A sentença é resultado de uma Ação Civil Pública movida pelo Sindicato dos Técnicos e Auxiliares de Enfermagem do Estado do Maranhão (SINTAEMA), tendo como demandado o Estado do Maranhão, com o objetivo de obrigar o réu ao pagamento das diferenças salariais relativas ao piso salarial de enfermagem previsto em lei, notadamente das parcelas retroativas referentes ao período de maio a setembro de 2023. O autor alegou que a Lei nº 14.434/2022 instituiu o piso salarial nacional para enfermeiras, técnicas em enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras.

Citou, ainda, que o Congresso Nacional disponibilizou o valor de 7, 3 bilhões para viabilizar o pagamento do Piso da Enfermagem para todos os profissionais da categoria no setor público, sendo tal pagamento feito em nove parcelas, de modo que os profissionais ligados ao Ministério da Saúde, bem como aos estados, municípios e Distrito Federal deveriam receber. No entanto, afirmou que os profissionais técnicos e auxiliares em enfermagem da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (SEAP), desde o início do referido pagamento, enfrentam dificuldades para o recebimento da verba. Argumentou que o Estado do Maranhão deixou de informar corretamente os dados de centenas de profissionais que deixaram de receber a parcela retroativa devida, os quais perceberam apenas os valores referentes às parcelas do mês de setembro em diante.

Ao contestar a ação, o réu alegou, entre outras coisas, que o direito ao recebimento do piso por meio da Assistência Financeira Complementar da União só alcança aqueles que estiverem vinculados a entes elegíveis e que atenderem aos requisitos definidos pela regulamentação. A Justiça promoveu uma audiência de conciliação, oportunidade na qual as partes formularam acordo no qual o Estado do Maranhão pagasse as parcelas retroativas de maio a agosto de 2023, referente à lista atualizada dos técnicos e auxiliares de enfermagem que atuaram no Estado do Maranhão e têm direito a essas parcelas, cujos valores foram repassados pelo Ministério da Saúde e cujos dados devem ser atualizados no sistema InvestSUS. Ficou acordado, também, que a Secretaria de Estado da Saúde – SES consolidasse as informações apresentadas em audiência no e informasse ao Procurador do Estado presente, para que este desse seguimento ao governador do Estado para a formalização do acordo.

PISO SALARIAL

Posteriormente, em audiência de saneamento em cooperação com as partes, o Estado do Maranhão reconheceu a obrigação de realizar o pagamento retroativo do piso salarial aos substituídos, referente ao período de maio a setembro de 2023, informando algumas pendências. Por sua vez, o Sindicato comprometeu-se a realizar uma assembleia para deliberar sobre a dispensa do pagamento de juros e correção monetária, com o objetivo de alcançar uma solução consensual. “A controvérsia da presente ação diz respeito à ausência de pagamento, pelo Estado do Maranhão, das parcelas retroativas do piso salarial nacional da enfermagem, referentes ao período de maio a setembro de 2023, aos técnicos e auxiliares de enfermagem lotados na Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (…) O direito ao piso salarial profissional é uma garantia fundamental dos trabalhadores, prevista na Constituição Federal” observou o juiz Douglas Martins.

O juiz citou que, para os profissionais da enfermagem, essa garantia foi concretizada pela Emenda Constitucional nº 124/2022. Em cumprimento a esse mandamento constitucional, foi editada a Lei nº 14.434/2022, que estabeleceu o piso salarial nacional dos enfermeiro, bem como fixou os pisos para técnicos de enfermagem em 70% do valor do piso de enfermeiro, e para os auxiliares de enfermagem, 50%. O Supremo Tribunal Federal decidiu que o piso salarial nacional da enfermagem deve ser pago pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, na medida dos repasses dos recursos federais.

“No caso, restou clara a ausência de pagamento do Estado do Maranhão aos profissionais da SEAP nos meses de maio a setembro de 2023 (…) O Estado do Maranhão, alegou que o não pagamento decorreu de inconsistências nos dados cadastrais dos profissionais (…) Porém, deve-se observar que os mesmos profissionais, cujos cadastros supostamente continham erros, passaram a receber o complemento salarial regularmente a partir de setembro de 2023”, pontuou o juiz, decidindo pelo acolhimento do pedido.

STJ: Contribuinte individual não cooperado exposto a agentes nocivos tem direito a aposentadoria especial

Sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.291), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o contribuinte individual não cooperado tem direito ao reconhecimento de tempo de atividade especial exercido após a edição da Lei 9.032/1995, desde que comprove a exposição a agentes nocivos.

O colegiado também definiu que a comprovação dessa condição não precisa ser feita por meio de formulário emitido por empresa.

“O argumento de que apenas uma ‘empresa’ pode emitir o formulário necessário à comprovação da atividade especial ignora a realidade de diversos trabalhadores, contribuintes individuais, que são os responsáveis por sua própria exposição a agentes nocivos. Essa interpretação também vai de encontro ao princípio da proteção ao trabalhador, que é um dos fundamentos do direito previdenciário”, destacou o relator do repetitivo, ministro Gurgel de Faria.

Com a tese firmada por unanimidade, os processos que estavam suspensos à espera do precedente qualificado poderão voltar a tramitar. O entendimento passa a orientar os tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes.

Dispositivos legais não podem ser interpretados isoladamente
Em um dos recursos representativos da controvérsia (REsp 2.163.429), o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) alegou que o contribuinte individual não cooperado não teria direito à aposentadoria especial após a edição da Lei 9.032/1995, a qual exigiu a comprovação da efetiva nocividade da atividade realizada de forma permanente para a concessão do benefício. A autarquia apontou ainda violação do artigo 58, parágrafo 1º, da Lei 8.213/1991, que trata dos planos de benefícios da previdência social.

Gurgel de Faria observou que o dispositivo citado realmente prevê a exigência de um formulário emitido pela empresa para comprovar a exposição do trabalhador a agentes nocivos. Conforme explicado, porém, as normas não excluem o benefício para o segurado contribuinte individual não cooperado, desde que ele cumpra a carência exigida e demonstre a exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física.

“A legislação previdenciária não pode ser interpretada de forma isolada. Ao contrário, a interpretação deve ser sistemática, levando em conta os demais dispositivos legais, que evidenciam que o legislador, podendo, não excluiu do contribuinte individual não cooperado o direito à aposentadoria especial”, ponderou o ministro.

Contribuinte segue tendo que comprovar atividade sob condição especial
O relator acrescentou que os contribuintes individuais não cooperados, por sua natureza, trabalham de forma autônoma, sem vínculo empregatício formal com uma empresa que possa emitir o formulário. “Em razão disso, esses trabalhadores estariam fora do amparo da lei, mesmo exercendo atividades idênticas às de um contribuinte individual cooperado?”, questionou.

Segundo Gurgel de Faria, o entendimento firmado no repetitivo não representa um salvo conduto para o contribuinte individual não cooperado, pois ele deverá comprovar, de fato, a atividade sob condições especiais, nos termos exigidos pela legislação previdenciária.

Por fim, o INSS sustentou que o artigo 64 do Decreto 3.048/1999, o qual aprovou o Regulamento da Previdência Social, excluiria essa categoria de segurados do direito à aposentadoria especial.

No entanto, para o ministro, “a limitação de aposentadoria especial imposta pelo artigo 64 do Decreto 3.048/1999 somente aos segurados empregado, trabalhador avulso e contribuinte individual cooperado excede a finalidade regulamentar do diploma legal, sendo forçoso reconhecer a ilegalidade de tal comando”.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2163429 e REsp 2163998

TJ/MT reconhece que amputação foi consequência da diabetes e não de erro hospitalar

A Justiça de Mato Grosso negou pedido de indenização de um paciente que teve dois dedos do pé amputados após complicações da diabetes, reconhecendo que a causa do problema foi a falta de tratamento adequado da doença, e não falha no atendimento médico prestado por hospitais de Nova Olímpia e Cuiabá.

O caso começou quando o homem sofreu um acidente de trabalho e feriu o pé esquerdo. Cinco dias depois, procurou atendimento médico em Nova Olímpia, onde recebeu curativos e medicamentos, inclusive antibióticos. Exames posteriores revelaram que ele era portador de diabetes descompensada e sem tratamento. Uma semana após o primeiro atendimento, surgiram sinais de necrose, e o paciente foi encaminhado ao Pronto Atendimento de Cuiabá.

Diante do risco de infecção generalizada (sepse), os médicos recomendaram a amputação do 4º e 5º dedos do pé esquerdo. Inconformado, o trabalhador acionou a Justiça alegando negligência dos hospitais e pediu indenização por danos morais e materiais.

A Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), porém, concluiu que não houve erro médico. O relator, desembargador Mário Roberto Kono de Oliveira, destacou que os profissionais de saúde agiram corretamente e que o procedimento cirúrgico foi necessário para preservar a vida do paciente.

“Não restou demonstrado o nexo causal entre a atuação dos profissionais de saúde dos municípios réus e o dano sofrido pelo apelante”, afirmou o magistrado em seu voto. A decisão foi unânime e manteve a sentença da 2ª Vara Cível de Barra do Bugres, que já havia rejeitado o pedido de indenização.

Processo nº 0009316-30.2016.8.11.0055

TJ/RJ: Justiça barra uso do nome “Ivo Pitanguy” por serviço de cirurgia plástica da Santa Casa

O Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Misericórdia, que buscava obter uma decisão judicial favorável que reconhecesse a sua legalidade para uso do nome do cirurgião plástico Ivo Pitanguy – falecido em 2016 –, não poderá utilizar o nome do renomado médico. A decisão é do juiz titular da 8ª Vara Cível da Capital, Paulo Roberto Correa. Os autores da ação alegavam que, após o falecimento do médico Ivo Pitanguy, a inventariante do seu espólio passou a adotar medidas que os constrangiam quanto ao uso do nome do professor, mesmo estando, de acordo com eles, dentro da legalidade.

Já os representantes do cirurgião plástico argumentavam que o objetivo da outra parte era se valer do nome e da credibilidade do renomado médico para conferir legitimidade a projetos que não têm a ver com ele ou sua família, bem como angariar recursos em seu nome. Sustentavam que o objetivo não era usar o nome/marca “Ivo Pitanguy” de forma informativa, mas, sim, com claros fins comerciais.

Nos documentos juntados aos autos, verificou-se que, em abril de 2016, o professor Ivo Pitanguy autorizou, para fins de pesquisa científica, que o Instituto Ivo Pitanguy tivesse, sempre que necessário, livre acesso ao acervo dos prontuários médicos da Clínica Ivo Pitanguy, subdivididos em vídeos, slides, livros, periódicos, monografias e fotografias. Além disso, foi autorizado o uso dos acervos fotográficos e audiovisuais para fins didáticos.

“Em outubro de 2017, os herdeiros do espólio concederam autorização temporária para que o Instituto Ivo Pitanguy continuasse utilizando o nome/marca ‘Ivo Pitanguy’, desde que associado ao termo ‘Instituto’, formando a expressão ‘Instituto Ivo Pitanguy’, e que tal uso seja restrito a fins exclusivamente acadêmicos, o que se coaduna com a autorização dada pelo próprio professor, acima mencionada”, pontuou a decisão.

No processo, a parte ré também comprovou que a Clínica Ivo Pitanguy – controlada pelos herdeiros de Ivo Pitanguy – é titular dos registros das marcas “Instituto Ivo Pitanguy”, “Ivo Pitanguy”, e “Pitanguy”, na Classe 44, que abrange serviços médicos em geral. Nessa condição, os herdeiros se insurgiram contra o uso da marca “Instituto Ivo Pitanguy” para identificar páginas nas redes sociais Facebook e Instagram, por meio das quais são divulgados os serviços médicos prestados pelo Serviço de Cirurgia Plástica da Santa Casa de Misericórdia.

“Não há, nos autos, qualquer autorização que comprove a legitimidade da utilização do nome/marca ‘Ivo Pitanguy’ associada aos serviços médicos oferecidos pelo referido serviço de cirurgia plástica, contrariando a tese sustentada pela parte autora. Situação semelhante ocorreu com o convite para evento beneficente idealizado pela Dra. Liane Mazzarone, igualmente desacompanhado de autorização. Isto é, tanto no ‘Convite do Coquetel Beneficente’, quanto nas publicações feitas nas redes sociais do Instituto Ivo Pitanguy, os parâmetros definidos pela autorização para uso do nome e marca foram infringidos. Além disso, o art. 130 da Lei nº 9.279/96 dispõe que ao titular da marca ou ao depositante é assegurado o direito de zelar pela sua integridade material ou reputação, o que reforça a proteção conferida à marca contra usos indevidos que possam comprometer seu valor ou prestígio no mercado”, destacou o magistrado.

Processo: 0323218-49.2018.8.19.0001/RJ

TRT/RS: Cuidadora que pagava pessoa para cobrir folgas não tem vínculo de emprego com clínica geriátrica

Resumo:

  • Cuidadora não obtém reconhecimento de vínculo de emprego com residencial geriátrico, por ausência de pessoalidade, um dos requisitos da relação.
  • Durante os oito meses de prestação de serviços, ela pagou, cerca de 80 vezes, para que outra colega a substituísse quando precisava tirar folgas.
  • 2ª Turma confirmou a sentença de primeiro grau quanto à inexistência de relação de emprego.
    Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 2º, 3º e 818; CPC, art. 373, II.

Uma cuidadora de idosos que pagava outras pessoas para poder tirar folgas não obteve o reconhecimento do vínculo de emprego com um residencial geriátrico. A decisão unânime da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) confirmou, no aspecto, a sentença do juiz Giani Gabriel Cardozo, da 2ª Vara do Trabalho de Novo Hamburgo.

Após trabalhar durante oito meses no local, a trabalhadora buscou o registro do contrato em CTPS e a rescisão indireta, com o pagamento de verbas salariais e rescisórias. Cobrou, ainda, o ressarcimento de R$ 10 mil que ela pagou a outra pessoa para que ficasse em seu lugar em dias de folga. O valor correspondeu a aproximadamente 10 dias de substituição em cada mês de trabalho.

Na defesa, a clínica confirmou que a trabalhadora fazia dois turnos “para complementar a renda com outro trabalho” e que acertava com uma ex-colega o valor de R$ 120 por plantão, quando se ausentava.

O juiz Giani entendeu que o requisito da pessoalidade não existia na relação, razão pela qual o pedido foi julgado improcedente.

“Considerando que não há divergência entre as partes quanto à possibilidade de a reclamante negociar com outra pessoa para trabalhar em seu lugar, verifico que não havia pessoalidade na relação entre as partes, um dos requisitos para a formação do vínculo empregatício nos termos do artigo 3º da CLT”, afirmou.

De acordo com o art. 3º da CLT, empregado é toda pessoa física que, mediante o pagamento de salário, prestar serviços não eventuais a empregador, sob a sua dependência. O art. 2º da CLT, por sua vez, considera empregador “a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço”.

A cuidadora recorreu ao TRT-RS, mas a decisão foi mantida quanto ao não reconhecimento do vínculo de emprego. O relator do acórdão, desembargador Gilberto Souza dos Santos, explicou que a ausência de um dos elementos essenciais da relação empregatícia previstos nos artigos 2º e 3º da CLT inviabiliza a formação do vínculo de emprego, ainda que os demais estejam presentes.

“A possibilidade de substituição habitual da trabalhadora por terceiros, mediante custeio próprio e com anuência da contratante, afasta o requisito da pessoalidade e impede o reconhecimento de vínculo de emprego”, concluiu.

Acompanharam o voto do relator os desembargadores Marçal Henri dos Santos Figueiredo e Cleusa Regina Halfen. Cabe recurso da decisão.

STJ: Acesso à herança digital protegida por senha exige incidente processual próprio

Caso o falecido não tenha compartilhado senhas com os herdeiros, a busca por informações patrimoniais e bens digitais em seus aparelhos eletrônicos poderá ser feita por meio de um incidente processual a ser instaurado paralelamente ao processo de inventário, com o apoio de profissional especializado – o inventariante digital.

A decisão foi tomada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento de recurso relacionado ao inventário das vítimas de um acidente de helicóptero ocorrido em São Paulo, em 2016.

Como não há previsão legal sobre o acesso aos bens digitais deixados por uma pessoa falecida, o colegiado entendeu que o caminho mais adequado para tais situações, pelo menos até a aprovação de legislação específica, é a instauração de um incidente próprio, associado à aba do inventário – chamado pela relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, de “incidente de identificação, classificação e avaliação de bens digitais”.

Acesso ao conteúdo dos aparelhos será feito por profissional especializado
De acordo com a solução proposta, o incidente, apensado ao processo (associado à aba) de inventário, deverá ser conduzido pelo próprio juiz do inventário, e o acesso aos aparelhos eletrônicos será feito por intermédio de um profissional especializado, que identificará e classificará os ativos transmissíveis, preservando tudo o que possa violar os direitos de personalidade do autor da herança.

O caso chegou ao STJ depois que uma das inventariantes tentou conseguir acesso ao conteúdo dos aparelhos mediante ofício à Apple. No entanto, de acordo com a ministra Nancy Andrighi, autorizar a empresa a abrir um equipamento eletrônico de pessoa falecida poderia violar sua intimidade.

Solução está amparada em analogia com outros institutos jurídicos
A relatora afirmou que o direito sucessório deve assegurar que a impossibilidade de acesso aos bens digitais, devido à existência de senhas não compartilhadas com os herdeiros, não cause prejuízo à transmissão do patrimônio. Contudo, ela apontou que nem todos os bens digitais são transmissíveis: aqueles que possam violar direitos de personalidade, como a intimidade e a vida privada do falecido ou de terceiros, devem ser preservados.

Assim – prosseguiu a ministra –, o juiz deve equilibrar o direito dos herdeiros a receber todos os bens do falecido, em consonância com o artigo 5º, inciso XXX, da Constituição Federal, com a proteção dos direitos de personalidade, especialmente a intimidade do falecido e de terceiros.

“Diante de vácuo legislativo a respeito do acesso aos bens digitais de propriedade da pessoa falecida que não deixa senha nem administrador dos seus bens digitais, a proposta de que o acesso se dê mediante incidente processual não caracteriza ativismo judicial e está alicerçada em interpretação analógica com outros institutos processuais”, declarou Nancy Andrighi, ao determinar o retorno do processo ao primeiro grau para a instauração do mencionado incidente.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2124424

STJ: Condição análoga à de escravo não exige restrição à liberdade de locomoção para se configurar

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou a jurisprudência segundo a qual a configuração do delito de redução à condição análoga à de escravo, previsto no artigo 149 do Código Penal, não exige que os trabalhadores sejam privados de sua liberdade de ir e vir, bastando que estejam submetidos a condições degradantes.

Com esse entendimento, o colegiado deu provimento a recurso do Ministério Público Federal para reconhecer a tipicidade da conduta dos responsáveis por uma fazenda na qual a fiscalização do Ministério do Trabalho identificou 13 trabalhadores submetidos a condições degradantes de trabalho. Eles foram contratados em 2008 para prestar serviços em propriedade localizada nas zonas rurais dos municípios de Correntina e São Desidério (BA).

O relatório de fiscalização apontou que os trabalhadores estavam alojados no meio do mato, dividindo-se entre os que dormiam em um ônibus velho e os que dormiam em um barraco de plástico preto, sem piso e sem energia elétrica; a água estava armazenada em caminhão pipa velho e enferrujado, estacionado sob o sol, e era consumida sem tratamento; não havia instalações sanitárias nem local adequado para banho, e as refeições eram preparadas ao lado do ônibus, em fogão improvisado no chão.

Os acusados foram absolvidos em primeiro grau e no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que, apesar de reconhecer a precariedade do local e a violação dos direitos trabalhistas, entendeu não estar caracterizada a condição análoga à de escravo, pois os trabalhadores não teriam restrição à sua liberdade de locomoção.

Crime ocorre quando se verifica qualquer das condutas previstas na lei
Para o relator do recurso no STJ, ministro Sebastião Reis Júnior, os fatos demonstrados no processo – condições degradantes de trabalho, ausência de instalações sanitárias, alojamento inadequado e falta de equipamentos de proteção individual – são suficientes, conforme a jurisprudência, para caracterizar o delito.

Segundo o ministro, o artigo 149 do Código Penal estabelece tipo misto alternativo, que se configura mediante a submissão de alguém a trabalhos forçados, jornada exaustiva, condições degradantes de trabalho ou restrição da liberdade de locomoção. “Trata-se de crime plurissubsistente, cuja tipicidade se aperfeiçoa com a verificação de qualquer das condutas previstas, independentemente da ofensa ao bem jurídico liberdade de locomoção”, explicou.

Na avaliação do relator, as circunstâncias do caso em análise configuram condições degradantes de trabalho, caracterizando o delito previsto no artigo 149. “Trata-se de pessoas em situação de extrema vulnerabilidade social, aliciadas em contexto de miserabilidade e, consequentemente, propensas à submissão a condições desumanas que objetivam tão somente a redução máxima dos custos da atividade empresarial”, afirmou, ressaltando que os acusados “tinham pleno conhecimento das condições a que submetiam os empregados”.

Sebastião Reis Júnior concluiu que o acórdão do TRF1, ao exigir demonstração de cerceamento da liberdade de ir e vir para configuração do crime, aplicou incorretamente o artigo 149 do Código Penal, contrariando a jurisprudência consolidada do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2204503

TJ/MG: Justiça revoga prisão civil de pai idoso por falta de pagamento de pensão

Filha é adulta, trabalha e mora no exterior; pai é pessoa idosa.


A 4ª Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) revogou, em agravo de instrumento, prisão civil de uma pessoa idosa, pela falta de pagamento de pensão alimentícia à filha, que tem mais de 21 anos. A decisão modificou determinação da Comarca de Belo Horizonte.

O pai, que já tem mais de 70 anos, ajuizou o pedido argumentando que a filha é maior de idade, mora nos Estados Unidos e é financeiramente independente, de forma que sua subsistência não está ameaçada. Ele obteve, em caráter liminar, a tutela antecipada recursal, que deferiu o pedido de revogação.

A desembargadora Ana Paula Caixeta, que analisou o recurso, afirmou que o fato de a alimentanda ter atingido a maioridade e a independência financeira retiram a necessidade da prisão civil, pois não há perigo iminente de ela ter sua sobrevivência comprometida.

A relatora ponderou, ainda, que o expressivo valor do débito e o histórico de encarceramento do pai demonstram que a medida não se prestou a assegurar o cumprimento da obrigação alimentar.

Nesse contexto, a manutenção da prisão civil teria antes o caráter de punição, o que não é admissível, pois fere o princípio da dignidade, já que se trata de pessoa com capacidade de trabalho limitada pela idade e pelas condições de saúde.

A magistrada afirmou, por fim, que a jovem pode buscar outros meios de assegurar o recebimento de valores, como a expropriação de bens.

Os desembargadores Alice Birchal e Roberto Apolinário de Castro acompanharam a relatora.

O agravo de instrumento transitou em julgado. O processo tramita em segredo de Justiça.

TJ/MG: Justiça garante nome africano em registro de bebê, mas barra nome composto por considerar sobrenome

A Justiça autorizou que uma recém-nascida na Capital mineira seja registrada com nome vinculado à herança cultural africana. A decisão é da juíza Daniela Bertolini Rosa Coelho, da Vara de Registros Públicos da Comarca de Belo Horizonte, nesta terça-feira (30/9). Os pais da criança entraram com solicitação judicial para autorização do registro ao ter o pedido negado em cartórios de BH. Na decisão, a juíza autorizou a emissão da certidão de nascimento com o primeiro nome sugerido pelos pais, mas negou o registro de um nome composto.

“No contexto das comunidades africanas e afro-brasileiras, o nome é um dos pilares dessa identidade, carregando significados que vão além de uma simples designação, sendo um símbolo de resistência e de pertencimento a uma história muitas vezes silenciada, sendo certo que ao reconhecer e respeitar a escolha de nomes que refletem essa herança cultural, estamos não apenas afirmando a individualidade de cada ser humano, mas também combatendo o racismo estrutural que tenta apagar a diversidade cultural em prol de um modelo homogêneo e eurocêntrico”, ressaltou a magistrada.

Ela argumentou ainda que o primeiro nome escolhido pelos pais da criança não afronta a moral, os bons costumes ou a segurança jurídica, tratando-se de expressão linguística de origem cultural reconhecida e significa “fama”, “renome” ou “prestígio”, em línguas de matriz africana.

“Embora pouco convencional, e exclusivamente em relação ao primeiro nome, registro que este não se afigura apto a trazer constrangimentos para a criança, razão pela qual a pretensão merece acolhimento em parte”, disse a juíza Daniela Bertolini Coelho.

Nome composto

A decisão, no entanto, aponta que existem elementos que geram dúvidas em relação ao nome composto, como a fonética, que apresenta peculiaridades que podem dificultar sua pronúncia no contexto brasileiro, ocasionando problemas administrativos e de identificação.

“O nome composto não deixa claro se se trata de um prenome ou de sobrenome, o que gera confusão, considerando a estrutura tradicional de nomes adotada em nosso ordenamento jurídico, apresentando, ainda, uma ambiguidade que não pode ser simplesmente ignorada”, afirmou a magistrada.

A Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) preveem a proteção integral de crianças e adolescentes, por isto a identificação não será divulgada.


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