TJ/DFT: Casamento infantil é proibido no Brasil: conheça impacto da prática ilegal na vida de crianças e meninas

No mês em que se celebra o Dia das Crianças e o Dia Internacional da Menina, instituído pela ONU, a Coordenação da Infância e da Juventude (CIJ) do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) reforça o impacto negativo do casamento precoce na vida de crianças e meninas. Apesar de ser proibido no país, a prática ilegal afeta 36% das meninas brasileiras menores de idade. O Brasil ocupa a sexta posição no ranking de países com maior número de casamentos infantis.

O que diz a legislação?
No Brasil, a idade mínima para casar é 16 anos. Segundo artigo 1.517 do Código Civil, o homem e a mulher com 16 anos podem se casar. No entanto, é exigida autorização de ambos os pais ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil, ou seja, 18 anos.

Os casamentos envolvendo menores de 16 anos não têm validade jurídica, ou seja, são nulos. Dessa forma, podem caracterizar crime de estupro de vulnerável, conforme o artigo 217-A do Código Penal, quando há relação sexual com menor de 14 anos, bem como violação de direitos da criança e do adolescente, sujeitando responsáveis e envolvidos a medidas de proteção e sanções previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O Brasil é signatário de vários acordos internacionais, como a Convenção sobre os Direitos da Criança (ONU, 1989), a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), e a Agenda 2030 da ONU (ODS 5.3), que estabelece o compromisso de eliminar o casamento infantil, precoce e forçado até 2030.

A Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes e o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador também tratam o casamento infantil como uma prática a ser combatida por meio de educação, empoderamento e proteção social.

Impactos do casamento infantil
Para a servidora da CIJ do TJDFT, Deiza Carla Medeiros Leite, “o casamento precoce interrompe a infância e impõe responsabilidades e papéis sociais de adultos, violando a proteção integral e o direito à infância e ao desenvolvimento pleno da menina”.

Meninas em casamentos ou uniões precoces frequentemente abandonam os estudos devido à maternidade, pressões domésticas ou controle do parceiro, o que viola o artigo 53 do ECA, que garante o direito à educação e à igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. Dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a evasão escolar é significativamente mais alta entre meninas casadas antes dos 18 anos, o que perpetua o ciclo de pobreza e exclusão social.

A servidora da CIJ lembra que “o casamento infantil restringe a liberdade pessoal e a autonomia das meninas sobre suas decisões de vida e de corpo”. “Muitas vezes, essas uniões envolvem coerção, dependência econômica ou pressões familiares e culturais, configurando casamentos forçados, uma forma de violência de gênero reconhecida pela Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e pela Lei Maria da Penha”, afirma.

Além disso, o casamento infantil frequentemente leva à gravidez precoce, com sérios riscos à saúde física e mental da adolescente, com maior probabilidade de morte materna, complicações no parto e no desenvolvimento fetal, violência obstétrica e falta de acesso a cuidados adequados, além de sofrimento psicológico e isolamento social.

Deiza explica que o casamento precoce também favorece o rompimento do ciclo natural de amadurecimento emocional. Diante disso, expõe meninas a exploração sexual; violência física e psicológica; trabalho doméstico forçado; isolamento social; depressão e ansiedade; perda de vínculos com pares; e oportunidades de crescimento pessoal.

Por fim, a servidora lembra que a prática ilegal atinge desproporcionalmente meninas e reproduz estereótipos que as colocam em posição de subordinação e dependência. “O casamento infantil é também uma expressão de desigualdade de gênero”, finaliza.

Atuação do Judiciário
A Coordenação da Infância e da Juventude (CIJ) do TJDFT é responsável por implementar o Plano de Ação da Política Judiciária para a Primeira Infância no DF, conforme os 12 eixos da Resolução CNJ 470/2022. As ações, articuladas com o Sistema de Garantia de Direitos, envolvem tanto os tribunais quanto a rede de proteção.

No Eixo 7, voltado à segurança e enfrentamento da violência, destaca-se a campanha Maio Laranja, que capacitou 119 profissionais, principalmente da educação, para prevenir e lidar com casos de violência sexual contra crianças.

A CIJ também fortalece parcerias com programas de educação cidadã, voltados a meninas e jovens adultas em situação de vulnerabilidade, como o Rede Gol, com o Instituto Elas Transformam, e o Projeto Impulsiona, com o Sest Senat, que oferece capacitação, inserção profissional e apoio à saúde física e emocional.

Denuncie
O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania oferece o Disque 100, canal permanente para denúncias de violações de direitos humanos. As denúncias também podem ser feitas pelo Telegram, buscando “DireitosHumanosBrasil”, pelo WhatsApp, no número (61) 99611-0100, ou pelo link wa.me/5561996110100.

O enfrentamento ao casamento precoce exige ações integradas, sensibilização da sociedade e fortalecimento das políticas públicas voltadas à proteção da infância. Garantir que meninas tenham acesso à educação, saúde e oportunidades é essencial para romper ciclos de violência e promover o pleno exercício de seus direitos humanos.

TRT/AM-RR: Produção de conteúdo por crianças e adolescentes nas redes sociais pode ser considerada trabalho infantil pela Justiça

Metas financeiras e exposição excessiva nas redes podem transformar criação digital em forma de exploração.


O trabalho infantil é toda atividade realizada por crianças e adolescentes com menos de 16 anos. A Constituição brasileira proíbe esse tipo de trabalho, e essa regra é respaldada por todo o ordenamento jurídico do país e reforçada pelas Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A única exceção é o trabalho na condição de aprendiz, permitido a partir dos 14 anos, desde que respeitadas as exigências legais definidas pela Justiça do Trabalho, que asseguram a formação educacional e o desenvolvimento integral do adolescente.

Mesmo quando acontece na internet, o que crianças e adolescentes fazem online pode estar sujeito ao controle da Justiça. Isso porque, em determinadas situações, pode configurar trabalho infantil, prática proibida por lei. Essa presença de menores em plataformas digitais pode deixar de ser apenas recreativa e ser caracterizada como trabalho infantil quando envolve monetização de conteúdo, produção frequente de vídeos, incentivo à profissionalização de canais e cumprimento de metas financeiras. A dinâmica pode inserir os menores em uma lógica de competição própria do mercado de trabalho, reforçada por rotinas intensas de criação de conteúdo, pela existência de hierarquias e pela busca constante por retorno econômico.

Segundo o juiz do Trabalho André Luiz Marques Cunha Junior, membro do Comitê de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR), com o avanço da tecnologia e a popularização das redes sociais como fonte de renda, a Justiça do Trabalho enfrenta um novo desafio: reconhecer que a produção de conteúdo com finalidade econômica pode ser enquadrada como atividade econômica. E, como qualquer forma de trabalho, está sujeita às limitações impostas pela legislação brasileira, especialmente no que diz respeito à proteção da infância.

Nesse contexto, ele ressalta que a proibição do trabalho infantil visa “assegurar que a pessoa vivencie a infância com atividades próprias do seu desenvolvimento, buscando estimular a criatividade e o convívio fraterno. Ademais, visa proteger contra atentados que porventura sejam praticados por terceiros, de sorte que o trabalho nas redes sociais viola a proteção à infância”.

Trabalho infantil

Diante desse cenário, instituições como a Justiça do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), por meio do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem, atuam para combater a exploração econômica de crianças e adolescentes no ambiente digital. Essas entidades divulgaram, em setembro deste ano, uma nota de posicionamento alertando sobre os impactos da exposição de menores em ambientes virtuais e redes sociais, reforçando a necessidade de proteger seus direitos.

No documento, o coordenador nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem da Justiça do Trabalho, ministro Evandro Valadão, destacou que entidades públicas e da sociedade civil devem reafirmar seu compromisso firme com a erradicação de todas as formas de trabalho infantil. “Não podemos permitir que a modernidade e a inovação tecnológica se tornem novas ferramentas de exploração. É nosso dever, não só como instituições, mas, como adultos, garantir que a infância seja um tempo de afeto, educação e desenvolvimento, não de trabalho.”

Adultização

As instituições da Justiça também alertam que o uso indiscriminado das redes sociais expõe crianças e adolescentes a um fluxo contínuo de informações, imagens e vídeos muitas vezes inadequados à sua faixa etária. Em nota, publicada no contexto das discussões sobre adultização e da promulgação do novo “ECA Digital” (Lei nº 15.211/2025), cuja vigência está prevista para março de 2026, os órgãos reforçam a importância de proteger a infância.

O documento destaca que a adultização, caracterizada pela reprodução precoce de comportamentos, padrões estéticos e papéis sociais próprios da vida adulta, tem sido intensificada pela lógica das plataformas digitais, que promovem visibilidade e engajamento. Essa dinâmica pode antecipar experiências para as quais os menores ainda não têm maturidade, além de inseri-los em uma lógica de competição e desempenho que compromete o tempo destinado ao estudo, ao lazer, à convivência familiar e ao desenvolvimento saudável.

O juiz do Trabalho André Marques, do TRT-11, reforça que o envolvimento familiar na produção de conteúdo digital por menores pode contribuir para a naturalização dessa prática. “Em muitos casos, essa atividade é realizada com o próprio apoio da família, o que traz o risco de que ela seja vista como algo comum. No entanto, a criança que utiliza uma rede social de amplo acesso está exposta a riscos pela divulgação da imagem, além da possibilidade de interação com terceiros que podem praticar algum tipo de violência”, conclui.

Casos de trabalho infantil

Os números oficiais revelam que o Amazonas e Roraima apresentam dados significativos de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc) de 2024, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Amazonas contabiliza 50,9 mil pessoas entre 5 e 17 anos em atividades de forma irregular. A taxa alcança 4,9% da população amazonense, acima da média nacional de 4,3%. O levantamento também aponta concentração nas piores formas de exploração, como mendicância, trabalho de rua, exploração sexual e trabalho doméstico.

Já em Roraima, o número de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil mais que dobrou em 2024. Segundo o Diagnóstico Ligeiro do Trabalho Infantil — Brasil, elaborado com base nos dados da PNAD Contínua 2024 do IBGE, o estado registrou 4,7 mil menores entre 5 e 17 anos em atividades. Isso representa um aumento de 120% em relação a 2023, quando haviam sido identificados 2,1 mil casos.

 

 

TJ/TO: Entre telas e brincadeiras, o papel da Justiça na proteção dos direitos das crianças

Num mundo em que a infância disputa espaço com as telas e o imediatismo, proteger o direito de ser criança tornou-se um ato de amor e de justiça. A infância é o tempo de aprender a ser, sem pressa, sem máscaras, sem filtros, e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reconhece esse direito como um dos pilares de uma vida plena, baseada na liberdade, no respeito e na integridade, mas, em meio a telas, algoritmos e buscas por engajamento, o fenômeno silencioso da adultização infantil tem roubado o protagonismo dessa fase.

Meninas e meninos passaram a reproduzir comportamentos, discursos e aparências típicos do universo adulto, seja pela moda, pela linguagem, pela exposição nas redes ou pela lógica da performance.

Para muitos, pode parecer uma tendência; para o olhar da Justiça, é um alerta social e jurídico. Afinal, toda vez que uma criança é conduzida a um papel que não lhe cabe, um direito é violado.

Às vésperas do Dia das Crianças (12/10), o Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) lança um olhar atento sobre o tema por meio de entrevistas com o juiz Adriano Gomes, titular do Juizado Especial da Infância e Juventude de Palmas, e a psicóloga Arlene Antunes, do Núcleo de Acolhimento e Acompanhamento Psicossocial (NAPsi). A conversa aborda os impactos da adultização infantil e o papel da Justiça na preservação do tempo da infância.

Infância em risco
A adultização é a antecipação de papéis, comportamentos e responsabilidades que não condizem com a idade nem com a maturidade emocional de uma criança.

Nos últimos anos, com o avanço das redes sociais, essa exposição se intensificou, impulsionada por algoritmos que premiam a visibilidade, mas ignoram a vulnerabilidade.

A nova Lei nº 15.211/2025, conhecida como ECA Digital, surgiu como resposta a esse cenário, obrigando plataformas a criarem mecanismos de proteção e alinhando o Brasil às legislações internacionais de defesa da infância no ambiente virtual.

Para o juiz Adriano Gomes, o aumento dessa exposição reflete transformações sociais e culturais que exigem regulação e vigilância. “Há uma evolução da sociedade no sentido de alteração dos costumes. O diálogo da comunidade passou a se dar muito mais através das redes sociais. Naturalmente, os mais jovens começam a participar”, comenta.

Essa participação, contudo, nem sempre ocorre de forma segura. Antes sem regulamentação, o ambiente digital tornou-se fértil para a exposição precoce. “Com a nova lei, passamos a ter mecanismos para regular essa situação da exposição das crianças. Era previsível que elas ingressassem nesse espaço, mas essa previsibilidade não significa naturalidade. E justamente por haver equívocos, surgiu a necessidade de controle”, explica o magistrado.

Quando o entretenimento dá lugar à exposição
O juiz chama atenção para a diferença entre uma simples postagem e a exploração disfarçada de conteúdo infantil. “A ciência recomenda a partir de que idade a criança deve usar aparelhos celulares, ter acesso a redes sociais e qual o limite de tempo. É preciso observar caso a caso para saber quando uma publicação deixa de ser apenas uma lembrança e passa a ter objetivo econômico.”

Segundo ele, a Lei 15.211/2025 ajuda a identificar situações em que há vantagem financeira ou busca de engajamento em detrimento do bem-estar infantil. “Essa exploração pode ocorrer por meio de empresas, mas também dentro da própria família. Pais acabam explorando a imagem da criança, seja para obter lucro, likes ou seguidores. Tudo isso pode caracterizar, ainda que de forma sutil, uma forma de exploração.”

A importância do alvará
Quando há interesse em que crianças participem de produções artísticas, campanhas publicitárias ou conteúdos digitais, é necessária autorização judicial. “Primeiro, é preciso ver se aquele trabalho segue os critérios da moralidade e os parâmetros previstos no ECA e na Lei 15.211. A documentação deve ser apresentada para que se analise se a imagem da criança será preservada, principalmente quando há objetivo econômico”, pontua o magistrado.

Segundo Gomes, o alvará já é disciplinado há décadas, mesmo antes da internet. “É feito um requerimento ao juiz, ouvido o Ministério Público, e analisada toda a documentação para garantir que a carga horária não interfira na educação, nas atividades de lazer e que não haja exploração da criança.”

A autorização também considera o conteúdo e o ambiente da produção. “É analisado se a carga horária preserva o direito de estudar, fazer as tarefas e brincar. Tem que ser algo pequeno. O conteúdo e o ambiente podem influenciar, e isso também é avaliado.”

Nos casos com indícios de exploração, o juiz reforça que o Judiciário atua junto às forças de segurança e ao Ministério Público. “Havendo notícia, a delegacia especializada ou a geral, conforme o porte da cidade, deve investigar e comunicar o fato ao Ministério Público. Com elementos suficientes, o promotor propõe ação para responsabilizar redes sociais, pais ou demais envolvidos e adotar medidas de proteção à criança.”

O papel das famílias e a prioridade da infância
A proteção, enfatiza o juiz, é um dever coletivo. “A Constituição estabelece a prioridade absoluta e a proteção integral às crianças. É dever do Estado, da sociedade, da família, de todos nós.”

Ele recomenda que pais e responsáveis busquem orientação antes de permitir qualquer exposição online. “Devem procurar informações junto às autoridades competentes, na área judiciária, psicológica ou da saúde, para avaliar se aquela exposição é adequada. Devem controlar o celular, observar o conteúdo e, na dúvida, procurar ajuda.”

Impactos da exposição precoce e a importância de preservar a infância na era digital
A psicóloga Arlene Antunes, do NAPsi, lembra o conceito descrito pela juíza Paula Afoncina Barros Ramalho (TJDFT), que trata a adultização infantil como a “exposição de crianças e adolescentes a responsabilidades, comportamentos, conteúdos e hábitos inapropriados para a idade.”

Segundo Arlene, não é um fenômeno novo, contudo o acesso às redes sociais por crianças potencializou este fenômeno de forma exponencial tornando-a um dos fenômenos mais preocupantes da sociedade contemporânea.

Para ela, a era digital trouxe novas manifestações desse processo, como a chamada adultização digital, que inclui a superexposição da imagem infantil, a monetização de conteúdo produzido por crianças e a pressão por desempenho e validação nas redes. “O brincar passou a ser filmado, avaliado e monetizado. A espontaneidade foi substituída pela performance”, observa.

Conforme a psicóloga, as consequências da adultização precoce podem ser devastadoras para o desenvolvimento emocional e cognitivo das crianças. “Algumas pesquisas científicas recentes revelam que a constante exposição às redes sociais ativa o circuito de recompensa do cérebro, provocando uma enxurrada de dopamina, neurotransmissor ligado ao bem-estar. Em crianças e adolescentes, cujo sistema nervoso ainda está em desenvolvimento, esta estimulação excessiva pode comprometer o amadurecimento neurológico natural.”

A psicóloga destaca que os sinais de alerta podem ser sutis, mas perceptíveis. “É importante que pais e/ou responsáveis fiquem alertas a sinais como desinteresse por brincar, irritabilidade constante, isolamento, dificuldade de concentração, alterações no sono, dificuldades de aprendizagem, ansiedade excessiva, e preocupação desproporcional com aparência”, pontua ela, que reforça que é preciso ficar alerta com repertório inadequado para a idade sobre temas adultos, como sexualização precoce, uso indevido de maquiagem, moda adulta, desejo de ser influenciador. “As fontes destes interesses devem ser investigadas”, ressalta.

Infância como espaço de proteção e descoberta
Para a especialista, a atividade lúdica é o coração da infância, e quando ela é transformada em exibição, perde seu valor de descoberta e prazer. “O brincar espontâneo é descomprometido de likes, monetização e exposição a conteúdos indevidos, seja como autora ou consumidora de conteúdo.”

Arlene alerta também para o chamado sharenting (compartilhamento de conteúdo sobre filhos), que pode evoluir para exploração comercial da vulnerabilidade infantil.

A prevenção começa dentro de casa. Segundo Arlene, os pais e responsáveis devem reconhecer a gravidade do problema e adotar práticas simples, mas consistentes como: estabelecer limites digitais, promover o diálogo aberto, valorizar o brincar e oferecer uma educação sexual adequada à idade.

Ela reforça que as escolas também desempenham papel essencial ao identificar sinais precoces de adultização. “Programas de educação digital e cidadania online, capacitação de educadores para identificação de sinais de alerta, implementação de protocolos de proteção, e parcerias com famílias para ações preventivas”, explica.

A psicóloga destaca ainda que a sociedade precisa cobrar maior responsabilização das plataformas digitais e fortalecer os canais de denúncia, como o Disque 100 e os Conselhos Tutelares.

Parceria pela infância
Arlene ressalta a importância do olhar integrado entre o sistema de Justiça e a Psicologia na defesa dos direitos da criança. “Há uma urgência em compreender os mecanismos psicológicos, sociais e jurídicos envolvidos na adultização, bem como suas implicações para a formação da personalidade e o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes. Além disso, é fundamental analisar os impactos negativos para aqueles que consomem esse tipo de conteúdo nas redes sociais, criando um ciclo vicioso de normalização da exploração infantil.”

Segundo a psicóloga, o ordenamento jurídico brasileiro possui instrumentos robustos para proteção da infância e adolescência, mas ainda precisa se adaptar às novas dinâmicas digitais.

Ela cita o artigo 227 da Constituição Federal, que estabelece a prioridade absoluta da infância e da adolescência, e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que garante proteção integral. Mas diz que o desafio é fazer com que as garantias acompanhem a velocidade das redes.

“A adultização das crianças rouba seu direito fundamental à infância. Cabe a todos, pais, escola, sociedade, contribuir para garantir que este direito seja respeitado, protegido e promovido, para que cada criança possa crescer em ambiente seguro, amoroso e adequado ao seu desenvolvimento integral”, enfatiza Arlene.

A psicóloga reforça que, em casa, deve-se conversar com as crianças e adolescentes mantendo diálogo aberto sobre a proteção corporal e comportamentos adequados à idade.

TJ/DFT condena por cobrança vexatória de aluguel com ameaças e corte irregular de energia elétrica

Proprietária de imóvel terá que indenizar inquilina que sofreu ameaças, xingamentos, injúrias raciais e corte irregular de energia elétrica e água devido a atraso no pagamento de aluguel. Ao analisar o caso, a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal aumentou de R$ 1 mil para R$ 3 mil o valor da indenização por danos morais.

A inquilina conta que residiu no imóvel por três anos e atrasou o pagamento completo do aluguel de R$ 550,00 apenas em uma ocasião. Diz que, após o atraso, a proprietária proferiu diversos xingamentos, ofensas e injúrias, inclusive de cunho racial, além de ameaças de arrombamento da residência. A proprietária também desligou a energia elétrica e subtraiu o registro de água do imóvel como forma de cobrança. A autora acrescenta que precisou registrar boletim de ocorrência e, mesmo após deixar o local, continuou a sofrer ameaças e xingamentos da proprietária. Diante dos fatos, ajuizou ação de reparação por danos morais.

O Juizado Especial Cível e Criminal e Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Itapoã reconheceu a ocorrência dos danos morais e condenou a proprietária ao pagamento de R$ 1 mil. Insatisfeita com o valor, a inquilina recorreu e pediu a majoração da indenização para R$ 10 mil.

Ao analisar o recurso, a relatora do processo destacou que “tem a locadora o direito de cobrar pelo imóvel locado, não podendo fazê-lo de modo vexatório ou mediante ameaça”. O colegiado ressaltou que as ameaças e xingamentos se voltaram até mesmo ao filho menor da autora e seus familiares, além da ameaça de invasão de domicílio e do corte irregular de energia elétrica. Para a Turma, a situação revelou alta reprovabilidade da conduta da proprietária.

Na fixação do novo valor indenizatório, os julgadores consideraram a gravidade do dano, o nível de reprovação do ato, as condições pessoais e econômicas das partes e a função pedagógico-reparadora da medida, apta a desestimular novos comportamentos semelhantes. A quantia de R$ 3 mil foi considerada razoável e suficiente à reparação.

A decisão foi por maioria.

Processo: 0704054-93.2024.8.07.0021

TJ/SC: Falta de quitação integral do imóvel impede transferência de apartamento

TJSC reforça: em contratos imobiliários, a última parcela é indispensável para escritura definitiva.


A 7ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) reformou sentença que havia determinado a adjudicação compulsória de um apartamento em construção em Itajaí. O tribunal entendeu que, embora o comprador tenha quitado mais de 97% do valor contratado, a ausência de pagamento integral impede a transferência da propriedade.

A controvérsia surgiu a partir da correção monetária aplicada à última parcela do contrato de promessa de compra e venda. O comprador utilizou índice diferente do previsto, o que gerou uma diferença de pouco mais de R$ 6 mil. Em primeiro grau, o juiz considerou que o pagamento quase total configuraria “adimplemento substancial” — teoria segundo a qual o contrato pode ser considerado cumprido mesmo sem a quitação completa. A instância superior afastou essa interpretação.

Segundo o desembargador relator, a teoria do adimplemento substancial não se aplica às ações de adjudicação compulsória, pois esse tipo de ação exige a quitação total do preço como condição para a escritura definitiva. O entendimento acompanha precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reforçam a natureza objetiva da obrigação contratual nesses casos. “Um dos requisitos para a adjudicação compulsória corresponde à quitação integral do valor avençado. Sem ele, a pretensão mostra-se inviável, ainda que tenha ocorrido a prescrição das parcelas que perfazem o saldo devedor”, registra o voto.

O recurso do comprador também não foi admitido porque não houve o pagamento das custas processuais após o indeferimento do pedido de gratuidade da justiça, fato que configura deserção. Assim, manteve-se a condenação ao pagamento da diferença contratual e houve inversão dos ônus da sucumbência, incluindo honorários advocatícios.

A decisão reforça que, em contratos de compra e venda de imóveis, é indispensável cumprir integralmente o que foi ajustado. O pagamento quase total, mas sem a última parcela devida, inviabiliza a transferência do bem. A decisão foi unânime

Apelação n. 50002528520258240069

 

TJ/SP: Município deverá fornecer cirurgia reparadora pós-bariátrica a paciente

Procedimento foi considerado questão de saúde, e não estética.


A 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 1ª Vara de Andradina que determinou que o Município realize, no prazo de 60 dias, cirurgia reparadora pós-bariátrica, denominada “dermolipectomia abdominal”, em paciente, nos termos da sentença do juiz Paulo Victor Alvares Gonçalves.

Segundos os autos, a autora foi diagnosticada com obesidade mórbida e submetida a cirurgia bariátrica por indicação médica. Em razão da perda de massa corporal, a sobra de pele tem causado dores e aparecimento de micoses, tornando necessária a realização de cirurgia reparadora para a retirada do excesso de tecido.

No acórdão, o relator do recurso, desembargador Paulo Galizia, apontou o direito à saúde previsto na Constituição Federal, mediante políticas públicas e acesso a tratamentos. “É certo que a apelada foi submetida à perícia médica realizada pelo Imesc, ocasião em que o perito confirmou a necessidade da realização de cirurgia plástica reparadora, analisando que a autora apresentou relatórios médicos indicando e justificando a necessidade da realização do procedimento denominado ‘dermolipectomia abdominal’”, escreveu. Para ele, não se trata de procedimento estético, mas sim de preservação da saúde da paciente. “Desse modo, tem-se que a cirurgia perde seu caráter de procedimento eletivo e passa a possuir caráter de urgência, motivo pelo qual a prestação positiva do Estado necessita ser ágil, por dever constitucional”, acrescentou.

Os desembargadores Marcelo Semer e Antonio Carlos Villen completaram a turma de julgamento. A votação foi unânime.

Apelação nº 1008059-82.2023.8.26.0024

TJ/SC mantém exclusão de candidato a delegado por condutas incompatíveis com o cargo

Investigação social apontou antecedentes profissionais e pessoais que pesaram contra o candidato.


A 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a exclusão de um candidato de concurso para delegado de polícia. O colegiado negou provimento à apelação e confirmou a sentença que já havia denegado mandado de segurança impetrado pelo candidato.

O impetrante alegava que sua eliminação violava o Tema 22 do Supremo Tribunal Federal (STF), que proíbe exclusão automática em razão de processos ou investigações em andamento, além de apontar afronta ao princípio da presunção de inocência e ausência de critérios objetivos no edital.

No entanto, o tribunal entendeu que o caso concreto apresenta especificidades que permitem a aplicação da técnica do “distinguish”, com o afastamento da tese geral do STF. Para a câmara, a investigação social vai além da análise de antecedentes criminais, pois alcança aspectos sociais, familiares e profissionais da vida pregressa do candidato.

No processo, ficou registrado que o candidato já atuava como investigador de polícia em outro estado e foi alvo de investigações internas e sindicâncias por suspeita de abuso de autoridade. Embora prescritos, esses episódios foram considerados relevantes para avaliar sua conduta.

A decisão também levou em conta que o candidato havia sido denunciado por suposta prática de concussão (quando um servidor exige vantagem indevida). Apesar da absolvição por falta de provas, os elementos do processo levantaram dúvidas sobre sua conduta ética. Conflitos com colegas, alegações de ameaças contra terceiros e um termo circunstanciado por possível violência doméstica também pesaram na decisão.

Para o colegiado, esses fatores justificam a exclusão, já que a função de delegado exige elevado padrão de moralidade, responsabilidade e conduta ilibada. O órgão julgador reforçou que a medida não constitui punição, mas exercício do poder de autotutela administrativa, que busca selecionar servidores alinhados aos valores institucionais.

O tribunal destacou ainda que a exclusão não viola o princípio constitucional que proíbe penas de caráter perpétuo, pois não configura sanção penal, mas critério legítimo de avaliação da administração pública para funções de alta relevância. Com isso, em decisão unânime, a sentença que havia denegado a segurança foi mantida e o recurso foi desprovido.

Apelação n. 5017653-65.2024.8.24.0091

TJ/AC: Servidora pública tem direito a remoção para cuidar de irmã com Transtorno do Espectro Autista

Na decisão da 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais de Rio Branco, foi considerado o relatório emitido pela assistencial social que confirma a dependência da jovem a irmã, servidora pública e a necessidade de acessar terapias e suportes na capital.


A 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais da Comarca de Rio Branco/AC garantiu o direito de servidora pública ser removida para cuidar de irmã com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Dessa forma, foi mantida a sentença, e a policial civil poderá vir do interior para capital, onde terá mais acesso as terapias e suportes necessários à irmã.

O caso já tinha sido julgado pelo Juizado Especial da Fazenda Pública, que reconheceu a dependência psicológica, emocional e prática da irmã. Contudo, o órgão público entrou com recurso argumentando que não houve comprovação dessa dependência e alegando desproporcionalidade do valor da multa, por não cumprimento da ordem.

Conforme é relatado nos autos pela policial, a irmã é autista com nível 2 de suporte, tem quadros de ansiedade e depressão que se agravou com o falecimento da mãe da jovem em 2023.

Em voto, a relatora do recurso, juíza Adamarcia Machado, apontou o relatório favorável a servidora da assistência social do ente público. A magistrada também lembrou a Lei Complementar Estadual n.°39 de 1993, que prevê esse direito de remoção por motivo de saúde de marido, companheiro ou dependente.

Adamarcia ainda explicou que o conceito de dependência não pode ser limitado a questões econômicas, mas proteção à saúde e promoção da dignidade. “Quanto ao conceito de dependência, não se pode restringi-lo à dimensão estritamente econômica, sob pena de esvaziar a proteção constitucional à saúde (art. 6º e 196 da CF), à família (art. 226 da CF) e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF). A interpretação teleológica do dispositivo legal deve harmonizar-se com tais valores”, escreveu Machado.

Processo n. 0700924-76.2025.8.01.0070

TJ/MS: Justiça declara nulas leis que aumentaram salários de agentes políticos de município e condena réus a custas processuais

A Vara Cível da comarca de Rio Brilhante/MS julgou procedente uma ação popular que questionava a legalidade de duas leis municipais que fixaram os subsídios do prefeito, vice-prefeito, secretários municipais e vereadores para a legislatura de 2017 a 2020. A decisão, proferida pelo juiz Cezar Fidel Volpi, declarou a nulidade dos atos normativos e determinou que os agentes políticos beneficiados devolvam aos cofres públicos os valores recebidos indevidamente.

De acordo com os autos, a ação foi proposta com o argumento de que as leis foram sancionadas em 15 de setembro de 2016, dentro dos 180 dias anteriores ao término do mandato da gestão 2013-2016, o que configura violação ao artigo 21 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A norma proíbe a criação de despesas com pessoal nesse período, justamente para evitar que um governo em fim de mandato comprometa as finanças da administração seguinte.

Além do vício formal, o autor também apontou a desproporcionalidade dos reajustes, que chegaram a 45% para o prefeito e vice-prefeito e 43% para os secretários, percentuais muito superiores à inflação acumulada na época. Segundo a sentença, o impacto financeiro dessas majorações causou prejuízo estimado em mais de R$ 2 milhões ao erário municipal.

A defesa dos réus sustentou que as leis foram aprovadas regularmente e que os efeitos financeiros só ocorreram na legislatura seguinte, razão pela qual não haveria afronta à LRF.

O juiz destacou que o argumento de defesa, de que o aumento só produziria efeitos na legislatura seguinte, não se sustenta, uma vez que a vedação da LRF recai sobre a edição do ato, e não apenas sobre o início de seus efeitos financeiros. “Admitir o contrário seria esvaziar o sentido da norma, permitindo que a gestão futura seja onerada por decisões tomadas no apagar das luzes da administração anterior”, assinalou o magistrado.

A sentença também ressaltou que os subsídios de agentes políticos integram o conceito de despesa com pessoal, e que o reajuste aplicado violou não apenas os princípios da legalidade e moralidade administrativa, mas também os da razoabilidade e proporcionalidade, ao impor aumentos excessivos sem respaldo econômico.

Com base nessas considerações, o juiz declarou nulas as Leis Municipais nº 1.967/2016 e nº 1.974/2016 e determinou que todos os beneficiários, incluindo prefeito, vice-prefeito, secretários e vereadores da legislatura 2017-2020, ressarçam ao erário os valores excedentes recebidos, devidamente atualizados e acrescidos de juros de mora.

Os réus também foram condenados, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 20 mil.

TJ/MT assegura tratamento imediato a criança com Guillain-Barré fora da rede credenciada

Uma decisão da Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) manteve a obrigação de uma operadora de plano de saúde custear tratamento de fisioterapia neurofuncional intensiva para uma criança diagnosticada com Síndrome de Guillain-Barré. O tratamento deverá ser realizado em clínica não credenciada, diante da alegação de inexistência de profissionais habilitados na rede própria da operadora.

A família ingressou na Justiça alegando que, apesar das solicitações administrativas, não houve resposta efetiva da empresa para viabilizar o tratamento indicado por prescrição médica. Diante da urgência, o atendimento foi iniciado em clínica particular, com despesas já superiores a R$ 42 mil.

Na decisão de Primeira Grau, o juiz determinou que a operadora autorizasse e custeasse integralmente o tratamento em clínica especializada, sob pena de multa diária de R$ 500 em caso de descumprimento, e limitou a coparticipação a duas vezes o valor da mensalidade do plano.

A operadora recorreu, argumentando que não houve negativa de cobertura e que o contrato estaria restrito ao rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o qual não prevê esse tipo de terapia fora da rede credenciada.

No entanto, o relator do recurso, desembargador Sebastião Barbosa Farias, considerou que a prescrição médica comprova a necessidade urgente do tratamento e que a demora poderia acarretar sequelas irreversíveis na mobilidade e na capacidade respiratória da paciente. Para o magistrado, a relação entre consumidor e operadora é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, sendo vedado ao plano questionar a indicação médica em situações graves.

“Estão presentes a probabilidade do direito e o perigo de dano, razão pela qual deve ser mantida a decisão que garante o tratamento imediato em rede não credenciada”, destacou o relator.

Processo nº 1023473-44.2025.8.11.0000


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