TJ/MT: Justiça reconhece validade de citação em condomínio e rejeita recurso fora do prazo

A Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve uma decisão que encerrou um processo, uma vez que o pedido foi feito fora do prazo.

Os desembargadores entenderam que é válida a citação (a comunicação formal sobre o processo) enviada pelos Correios para um endereço dentro de condomínio, mesmo que quem tenha recebido a correspondência não seja o próprio destinatário. Isso está previsto no Código de Processo Civil, que considera válida a entrega feita ao funcionário responsável pelo recebimento no local.

O recurso questionava que o aviso de recebimento foi assinado por outra pessoa e, por isso, a citação seria inválida. No entanto, o relator, desembargador Rubens de Oliveira Santos Filho, explicou que não foram apresentadas provas suficientes para anular essa presunção de validade.

Ele também lembrou que o prazo para apresentar embargos à execução (um tipo de defesa) é de 15 dias a partir da citação. No caso, o documento foi entregue em janeiro, mas o recurso só foi protocolado em junho, muito depois do prazo legal.

“O respeito aos prazos processuais não é um formalismo excessivo. Pelo contrário, é essencial para garantir previsibilidade, estabilidade e efetividade ao processo judicial”, afirmou o magistrado.

De acordo com o processo, a citação foi feita em janeiro, mas a defesa só foi apresentada em junho, depois do prazo permitido. Por unanimidade, os desembargadores decidiram rejeitar o recurso e manter a decisão que encerrou o caso sem analisar o conteúdo do pedido.

Processo nº 1057663-07.2025.8.11.0041

TRT/PR: Indústria de alimentos é condenada por transferir risco do negócio à trabalhadora

Uma indústria de alimentos de Colombo, cidade na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), foi condenada a restituir os valores de comissões que não foram pagos a uma ex-funcionária. A empresa deixava de repassar as comissões da vendedora sempre que o negócio era cancelado, trocado ou quando o comprador deixava de pagar pela compra. O caso foi ajuizado em julho de 2024 e julgado em junho deste ano pela 7ª Turma de desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR), que confirmou a decisão da 2ª Vara do Trabalho (VT) da cidade. O processo foi considerado um caso de tentativa de repassar o risco empresarial à trabalhadora.

O valor total não foi definido no acórdão, mas será calculado na fase de execução com base nas planilhas de controle de comissão da empresa. A vendedora solicitou ainda pagamento de horas extras, mas as decisões de primeira e segunda instância reconheceram como válido o sistema de compensação por banco de horas da empregadora.

Segundo a trabalhadora, cerca de R$ 1 mil de seus ganhos eram frutos das comissões de 1% sobre as vendas que fazia. Porém, ela alegou que em algumas vezes essa comissão era cancelada por motivos que não eram de sua responsabilidade, como desistência da compra por falta de estoque, troca por outros produtos ou por inadimplemento dos compradores. A empresa afirmou, em sua defesa dentro do processo, que as comissões foram todas pagas no momento da rescisão, de acordo com a política interna e em respeito a legislação e as regras do próprio contrato de trabalho.

No entanto, a sentença da 2ª VT de Colombo ressaltou que a própria representante da empresa declarou que quando a venda era cancelada antes do pagamento, a vendedora não recebia as comissões e que “às vezes havia cancelamento das vendas por falta de produtos nos estoques”. Diante das provas, o juízo de primeiro grau concluiu que, embora os relatórios das vendas fossem válidos (prova documental), também ficou incontroverso que a empresa cancelava as comissões da então funcionária de forma indevida, por conta das provas orais colhidas em depoimentos.

A empresa entrou com recurso, distribuído para a 7ª Turma. Como argumento, a indústria de alimentos alegou que a ex-funcionária foi devidamente informada na contratação quanto à política de comissionamento. De modo genérico, a empresa também declarou que não houve ofensa a qualquer regra, já que a vendedora não era “comissionista pura”. O relator do processo, desembargador Luiz Eduardo Gunther, manteve a sentença da 2ª VT de Colombo e declarou que a legislação veda qualquer tipo de repasse dos riscos empresariais ao colaborador. O desembargador observou que a legislação permite ao empregador o prazo de dez dias para recusar alguma venda, e que depois considera-se o negócio fechado. O magistrado também destacou que a única hipótese prevista em lei para cancelamento de comissões é no caso de insolvência do comprador (Lei 3.207/1957, que regulamenta atividades de vendedores, viajantes e pracistas). “Interpretação de forma diversa importaria em admitir a transferência dos riscos da atividade econômica ao trabalhador, em flagrante afronta ao artigo 2º da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas)”, concluiu o magistrado no acórdão.

TJ/SP: Mulher que deu à luz antes de assumir cargo temporário tem direito à licença maternidade

Licença gestante é direito constitucionalmente garantido.


A 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a Fazenda Municipal de Araçatuba pague licença maternidade à mulher convocada temporariamente ao Conselho Tutelar que deu à luz antes de assumir o cargo.

Conforme os autos, a autora figurava na lista de suplentes à posição de Conselheira Tutelar do Município e foi convocada em 14/01/2025 para assumir temporariamente a função no período compreendido entre 20/01/2025 e 19/04/2025. No entanto, em razão de complicações na gestação, a autora foi submetida em 17/01/25 a um parto prematuro, com atestado médico lhe conferindo licença maternidade por 120 dias. Porém, a Administração comunicou que ela não poderia ser contemplada com o afastamento remunerado pois não tinha tomado posse da função.

O relator do recurso, desembargador Osvaldo Magalhães, destacou que o fato de “a autora encontrar-se impedida de iniciar o exercício do cargo em razão do cumprimento do direito à licença gestante, por si só, não lhe retira o direito ao exercício da função”, uma vez que a licença gestante é direito constitucionalmente garantido. O magistrado ainda pontuou que a convocação para investidura provisória em nada interfere o direito da autora e que eventual restrição da participação de candidatas gestantes ou puérperas importaria em violação aos princípios constitucionais da isonomia e da razoabilidade e proporcionalidade e aos direitos à proteção da maternidade e infância e licença gestante.

Participaram do julgamento, de votação unânime, os desembargadores Ana Liarte e Paulo Barcellos Gatti.

Apelação nº 1500430-05.2025.8.26.0032

STJ Autoriza prefeito de São Bernardo do Campo (SP) a retornar ao cargo

O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca autorizou, nesta sexta-feira (10), que o prefeito afastado de São Bernardo do Campo (SP), Marcelo de Lima Fernandes, retorne ao cargo. Ele havia sido suspenso da função pública em agosto deste ano, no contexto da Operação Estafeta, que apurou os crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro na gestão do município.

Acolhendo parecer do Ministério Público Federal (MPF), o relator considerou que os fundamentos que justificaram o afastamento – especialmente a necessidade de garantir a efetividade das investigações – não existem mais, tendo em vista que já houve o cumprimento das medidas de busca e apreensão, a reunião das provas iniciais e o oferecimento e o recebimento da denúncia.

Além de permitir o retorno ao cargo de prefeito, o ministro confirmou sua decisão anterior que havia revogado a imposição de recolhimento domiciliar noturno, nos fins de semana e nos feriados, e flexibilizado a proibição de sair da comarca de São Bernardo do Campo, autorizando o político a circular livremente no estado de São Paulo por até sete dias sem prévia comunicação ao juízo.

Leia também: Relator flexibiliza cautelares contra prefeito de São Bernardo do Campo (SP), mas mantém afastamento

TJSP não indicou motivos atuais para manutenção do afastamento
Reynaldo Soares da Fonseca lembrou que as medidas cautelares devem permanecer válidas apenas enquanto forem indispensáveis para eliminar riscos concretos ao processo, à ordem pública ou à futura aplicação da lei penal.

Em relação ao afastamento do cargo de prefeito, o ministro esclareceu que solicitou ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) a reavaliação da necessidade de manutenção da medida, porém a corte estadual confirmou a decisão com base em argumentos genéricos e desatualizados, além de não indicar a relação dos fatos apurados com o exercício da função de chefe do Executivo municipal.

“Assim, embora tenha formalmente respondido à determinação do STJ, materialmente não atendeu à exigência de fundamentação nova e contemporânea, convertendo o reexame em mera reprodução de argumentos pretéritos, desprovidos de base fática atual”, comentou.

Sem fundamentação, afastamento representa “sanção política antecipada”
O ministro avaliou que o afastamento de um agente político eleito configura “medida de extrema gravidade”, pois representa intervenção direta na vontade popular manifestada nas urnas. Mesmo que haja demonstração concreta da necessidade da medida, o magistrado destacou que a jurisprudência do STJ prevê um limite de 180 dias para o afastamento, prazo prorrogável apenas excepcionalmente e de maneira fundamentada.

“Se, de um lado, há prazo máximo claramente definido pela jurisprudência, justamente para evitar afastamentos prolongados e sem reavaliação periódica, de outro, não há prazo mínimo para a sua duração. Essa ausência de prazo mínimo reflete o caráter instrumental da medida, que deve perdurar apenas enquanto subsistirem os motivos que a justificam. Assim, uma vez ausentes risco atual ou fundamentação concreta que demonstre a indispensabilidade da restrição, não há qualquer razão legítima para a manutenção do afastamento”, apontou.

Ainda segundo o relator, o prolongamento injustificado do afastamento, somado à falta de fundamentação contemporânea e à ausência de demonstração de risco concreto, transformou a medida cautelar contra o prefeito em “verdadeira sanção política antecipada”.

“Ao determinar de plano a medida por prazo alongado – um ano, tempo que representa um quarto do período de governo municipal –, o tribunal de origem acabou por criar uma espécie de ‘cassação judicial temporária’ do mandato eletivo, sem condenação e sem previsão legal, o que é manifestamente incompatível com o Estado Democrático de Direito”, concluiu.

Processo: HC 1037262

STJ: Fabricante indenizará vítima que perdeu braço aos três anos em acidente com máquina de lavar roupas

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou a empresa Electrolux do Brasil S.A. a indenizar uma vítima de acidente de consumo que, aos três anos de idade, teve o braço direito amputado ao tentar colocar sua sandália na máquina de lavar roupas em funcionamento, devido à falta de acionamento da trava de segurança da porta do eletrodoméstico.

Para o colegiado, não ficou caracterizada a alegada culpa exclusiva de terceiro, que seria capaz de romper o nexo causal da responsabilidade da fabricante pelo defeito do produto.

A ação de reparação de danos materiais, estéticos e morais contra a empresa foi ajuizada pelo menor, assistido pelo seu responsável, em 2009. De acordo com o processo, após a compra do produto, ele foi manuseado por um profissional não habilitado pela fábrica, que fez a montagem do dispositivo de segurança de forma equivocada, o que provocou sua inoperância parcial e resultou no acidente.

O caso chegou ao STJ após o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) negar os pedidos de indenização, sob o fundamento do rompimento do nexo de causalidade por culpa exclusiva de terceiro.

O recurso especial sustentou a responsabilidade objetiva da fabricante, diante da inoperância parcial do dispositivo de travamento, e questionou o fato de ter sido imposto ao consumidor o ônus de provar a relação do defeito do produto com o acidente, quando caberia à empresa provar o contrário. Por fim, foi alegada falha no dever de informação precisa e suficiente acerca dos possíveis riscos do produto.

Consumidor espera segurança dos produtos colocados no mercado
A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que o artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê que o fabricante deve responder, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos ou informações insuficientes sobre a utilização e os riscos do produto.

A ministra explicou que a reponsabilidade objetiva do fabricante está relacionada à proteção do consumidor, que espera que os produtos colocados no mercado não sejam perigosos ou nocivos a ponto de causar danos a quem os utiliza. Conforme ressaltou, o artigo 6º do CDC garante o direito à informação clara sobre o produto, além da proteção à vida, à saúde e à segurança.

Por outro lado, Nancy Andrighi destacou que o defeito deve ser verificado juntamente com os demais pressupostos da responsabilidade civil objetiva, e que é possível a demonstração do rompimento do nexo de causalidade entre a conduta do fornecedor e o dano sofrido pelo consumidor, nos termos do artigo 12, parágrafo 3º, do CDC.

Falta de informações essenciais comprometeu a segurança
No caso em julgamento, a relatora reconheceu que o fornecedor teve culpa, pois foi demonstrado em laudo pericial que o produto apresentava defeito de projeto, bem como não continha informações essenciais à segurança do consumidor.

A ministra enfatizou que o fato de a empresa ser responsabilizada pelos danos não impede que o terceiro que manipulou o eletrodoméstico também o seja, caso tenha contribuído para a ocorrência do acidente.

“É dever do fabricante informar expressamente sobre qualquer limitação ou condição de uso que possa comprometer a eficácia de mecanismo de segurança, capaz de ocasionar danos à saúde, à integridade física ou à vida do consumidor”, concluiu.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2190340

Crime, castigo e perdão: o instituto do perdão judicial na jurisprudência do STJ

Previsto em vários dispositivos legais, o perdão judicial é um instituto que permite à Justiça deixar de aplicar a pena ao réu, mesmo que a sua culpa seja constatada ao longo do processo. É uma das causas de extinção da punibilidade, de acordo com o artigo 107, parágrafo IX, do Código Penal (CP), mas sua aplicação só é possível em situações expressamente previstas na lei.

Para conceder o perdão, o juiz deverá considerar não apenas o sofrimento físico e psicológico enfrentado pelo acusado ou os vínculos familiares isolados, mas também as circunstâncias específicas de cada crime que admite esse benefício. Nesta matéria especial, são apresentados alguns casos em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se manifestou sobre o instituto.

Abalo emocional não pode ser presumido
Em 2020, a Quinta Turma manteve decisão das instâncias ordinárias de não aplicar o perdão judicial a um motorista que, após ingerir bebida alcoólica, perdeu o controle do veículo que dirigia em alta velocidade e colidiu com um poste, o que causou a morte do seu amigo que estava no banco do carona.

O relator do agravo regimental no REsp 1.854.277, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, lembrou que o perdão judicial é ato de clemência por parte do Estado, que deixa de aplicar a pena, afastando assim a punibilidade do infrator.

No entanto, o ministro explicou que a aplicação desse instituto requer a avaliação do magistrado para verificar se o autor foi suficientemente abalado em seu estado físico ou emocional. No caso – acrescentou –, para eventualmente chegar a uma conclusão diversa daquela adotada na instância de origem, o STJ precisaria reexaminar as provas do processo, o que é vedado pela Súmula 7.

Em outra ocasião, em 2025, o colegiado reafirmou o entendimento de que o perdão judicial não se aplica sem a comprovação de que o agente que praticou a conduta sofreu um abalo emocional significativo. Em contexto semelhante, um homem foi condenado por homicídio culposo na direção de veículo pela morte de seu primo.

No STJ, o relator do HC 953.524, ministro Messod Azulay Neto, apontou que o instituto do habeas corpus foi utilizado como substituto de recurso próprio e que não foi verificada coação ilegal patente que justificasse a concessão da ordem de ofício.

Ademais, o ministro salientou que o sofrimento insuportável do réu não pode ser presumido apenas pelo parentesco com a vítima, circunstância que, por si só, não indica a existência de um abalo emocional suficiente para justificar a aplicação do perdão judicial. O fato de o motorista ter dado carona à vítima, segundo Messod Azulay Neto, “também não comprova haver amizade íntima entre eles”.

Benefício foi concedido a indivíduo que matou irmão por engano
Por outro lado, no REsp 1.871.697, a Sexta Turma concedeu o perdão judicial e julgou extinta a punibilidade de um homem condenado por homicídio culposo depois de matar o próprio irmão enquanto tentava atingir um desafeto.

O tribunal de origem negou o benefício, por entender que a comprovação do parentesco e o relato de sofrimento no interrogatório não bastaram para demonstrar o abalo psicológico do acusado.

O relator no STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, lembrou que, em relação à interpretação do artigo 121, parágrafo 5º, do CP, a doutrina exige um vínculo prévio de conhecimento entre os envolvidos. Nessa situação – explicou –, “só sofre intensamente o réu que, de forma culposa, matou alguém conhecido e com quem mantinha laços afetivos”.

O ministro considerou que o fato de serem irmãos e a demonstração da conduta imprudente foram suficientes para justificar a incidência do benefício. “O que se pretende é conferir à lei interpretação mais razoável e humana, sem jamais perder de vista o desgaste emocional (talvez perene) que sofrerá o acusado dessa espécie de delito, uma vez que era irmão da vítima”, declarou.

Colaboração premiada não basta para autorizar o perdão
No AREsp 2.452.224, a Quinta Turma negou provimento ao agravo regimental interposto por um ex-funcionário público que buscava a concessão do perdão judicial diante de sua colaboração premiada.

O recurso chegou ao STJ após as instâncias ordinárias não concederem o perdão, limitando-se a aplicar a redução da pena em dois terços. A defesa sustentou, entre outras razões, que não haveria restrição legal para a concessão do benefício em decorrência de o infrator ter ocupado cargo público à época dos fatos.

Para o relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, é o magistrado que, na dosimetria da pena, deve avaliar se há ou não a presença dos requisitos legais para a concessão do perdão judicial. No caso em discussão, ele destacou que a decisão do tribunal de origem foi proporcional e fundamentada de forma suficiente.

O ministro ressaltou que, para a concessão do perdão, devem ser observadas não apenas a extensão e a qualidade da colaboração efetivada, mas também a personalidade do colaborador, a natureza, as circunstâncias, a gravidade e a repercussão social do fato criminoso, de acordo com o artigo 4º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013.

Concurso formal não estende perdão para todos os delitos
A Sexta Turma entendeu que, nos crimes cometidos em concurso formal, não pode haver a extensão dos efeitos do perdão judicial concedido a um deles para o outro. Na origem do caso, um indivíduo foi condenado por homicídio culposo de seu namorado e de um amigo, quando dirigia de forma imprudente.

O tribunal de segunda instância considerou não ter sido comprovada nos autos a existência de vínculo pessoal entre o infrator e o amigo capaz de justificar o perdão. Na opinião do relator do REsp 1.444.699, ministro Rogerio Schietti Cruz, entender pela desnecessidade da comprovação de tal vínculo serviria como argumento de defesa para todo e qualquer caso de delito de trânsito com vítima fatal.

O ministro observou que, embora o concurso formal tenha sido instituído na legislação com o objetivo de beneficiar o acusado, impondo-lhe a pena com base em apenas um dos crimes, não deixa de haver um acréscimo correspondente à punição pelos demais delitos. E, mesmo assim, de acordo com Schietti, não há previsão legal de extensão da absolvição, da extinção da punibilidade ou mesmo da redução da pena pela prática de um dos crimes em concurso formal.

“Tratando-se o perdão judicial de uma causa de extinção da punibilidade de índole excepcional, somente pode ser concedido quando presentes os seus requisitos, devendo-se analisar cada delito de per si”, disse.

Hipóteses de aplicação do perdão judicial não podem ser ampliadas
A Sexta Turma, no agravo regimental no AREsp 2.140.215, afirmou que o perdão não pode ter sua aplicação estendida a hipóteses diferentes daquelas expressas em lei, nos termos do artigo 107, inciso IX, do Código Penal.

A defesa requereu a aplicação do instituto alegando que o condenado, durante a prática do crime de roubo, foi atingido por um tiro disparado por um guarda municipal e, em consequência da lesão, ficou paraplégico.

De acordo com o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, tanto a doutrina quanto a jurisprudência do STJ entendem que as hipóteses que admitem a aplicação do perdão judicial são taxativas, geralmente relacionadas a crimes culposos. Conforme apontou, “sempre existe um dispositivo a sinalizar a intenção do legislador em beneficiar o acusado”.

O ministro reforçou que não há previsão legal para a concessão da medida em casos de roubo. Segundo esclareceu, a analogia, mesmo quando a favor do réu, pressupõe omissão na lei, o que não ocorre no caso, já que o Código Penal define expressamente quando o perdão judicial pode ser aplicado, não cabendo ao julgador decidir.

Não há concessão de perdão judicial na fase de admissibilidade
Em 2020, analisando processo em segredo de justiça, a Corte Especial entendeu que não há possibilidade de aplicação do perdão judicial na fase de admissibilidade de queixa-crime, pois, para a sua concessão, é necessária a análise do mérito.

A autora do voto que prevaleceu, ministra Maria Thereza de Assis Moura, lembrou que, nos crimes contra a honra, o perdão judicial está fundamentado no artigo 107, inciso IX, combinado com o artigo 140, parágrafo 1º, do CP. Segundo ela, antes de conceder esse benefício, o juiz precisa verificar determinadas circunstâncias, para só então deixar de aplicar a pena imposta.

Para a ministra, “o legislador deixou claro que a concessão do perdão judicial pressupõe a existência de uma decisão de mérito, fase que não se confunde com o juízo de admissibilidade da queixa-crime”.

Processos: REsp 1854277; HC 953524; REsp 1871697; AREsp 2452224; REsp 1.444.699 e AREsp 2140215

STJ: Prazo de dez dias corridos para consulta eletrônica de intimação é contado da data do seu envio

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu que o prazo de dez dias corridos para a consulta é contado da data do envio da intimação eletrônica, como previsto de forma expressa na lei, independentemente de feriados ou dias não úteis. Segundo o colegiado, a intimação eletrônica é considerada automaticamente realizada na data do término do prazo de consulta, conforme o artigo 5º, parágrafo 3º, da Lei 11.419/2006.

Com esse entendimento, os ministros mantiveram decisão do relator, ministro Messod Azulay Neto, que considerou intempestiva uma apelação apresentada pela Defensoria Pública do Distrito Federal e Territórios (DPDFT).

Segundo a DPDFT, a intimação ocorreu em 4 de abril de 2023, tendo o prazo de dez dias para consulta começado em 5 de abril, com ciência automática em 14 de abril. Assim, argumentou que o prazo recursal teria começado a fluir em 17 de abril – primeiro dia útil subsequente –, e finalizado em 26 de abril. Dessa forma, alegou que a apelação apresentada em 25 de abril seria tempestiva.

Prazo para consulta da intimação eletrônica é contínuo
O relator do recurso no STJ, ministro Messod Azulay Neto, explicou que o artigo 5º, parágrafo 3º, da Lei 11.419/2006 estabelece que a consulta eletrônica “deverá ser feita em até dez dias corridos contados da data do envio da intimação, sob pena de considerar-se a intimação automaticamente realizada na data do término desse prazo”.

De acordo com o ministro, o prazo de dez dias corridos para consulta – findo o qual se opera a intimação automática – é contado da data do envio da comunicação eletrônica por expressa disposição legal.

“Não há previsão legal para que o termo inicial da contagem desse prazo de consulta seja postergado para o dia útil subsequente. A natureza do prazo é expressa no texto legal – dias corridos –, não comportando a interpretação pretendida”, disse.

O ministro ainda destacou que a existência de feriado forense no período não altera essa sistemática, uma vez que o prazo para consulta é contínuo e sua natureza não se confunde com a dos prazos processuais penais propriamente ditos.

Assim, o relator verificou que, tendo a intimação eletrônica sido enviada em 4 de abril de 2023, o prazo de dez dias corridos para consulta acabou em 13 de abril, data em que se considerou realizada a intimação automática. A partir daí, iniciou-se o prazo recursal em dobro de dez dias (aplicável à Defensoria Pública), que se exauriu em 24 de abril, esse, sim, contado a partir do dia seguinte.

Veja o acórdão.
Processo: AREsp 2492606

TRF1 confirma pagamento retroativo de benefício assistencial e ajusta prazo final

A 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu parcialmente a favor do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em processo que trata do restabelecimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e manteve a condenação da autarquia ao pagamento dos valores retroativos ao beneficiário.

O relator do caso, desembargador federal Marcelo Albernaz, afastou o argumento de prescrição apresentado pela autarquia. Segundo ele, “configura violação ao direito fundamental ao benefício previdenciário fazer incidir os institutos da prescrição e da decadência nas hipóteses de indeferimento, cancelamento ou cessação de benefício previdenciário”.

O magistrado ressaltou que o novo pedido feito pelo autor não significa renúncia aos valores do benefício suspenso anteriormente. “A concessão posterior do benefício não afasta o direito aos valores retroativos referentes ao período em que o benefício anterior foi suspenso de forma arbitrária ou sem fundamentação técnica sob pena de configurar enriquecimento sem causa da Administração Pública”.

O relator, porém, atendeu em parte ao pedido do INSS e definiu um limite para o pagamento: “Considerando que o autor passou a receber novo benefício assistencial, assiste razão ao INSS ao requerer que o termo final da condenação seja fixado na data imediatamente anterior ao início do benefício ativo”.

Com isso, o INSS terá de pagar ao beneficiário as parcelas referentes ao período em que o benefício foi suspenso de forma irregular.

O voto foi acompanhado pelo Colegiado.

Processo: 1017105-75.2023.4.01.9999

TJ/PE: O desafio da leveza – Por que a adultização precoce é o risco do século?

Neste 12 de outubro, enquanto o país celebra a criança, vale fazer uma pausa. Parar mesmo. Olhar para a infância não como uma etapa que precisa ser vencida às pressas, mas como o tempo mais importante da vida. A Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ), por meio do núcleo de assessoramento em gestão e planejamento, escolheu um tema urgente para sua campanha do Dia das Crianças: o brincar versus a adultização precoce. A gente não percebe, mas é na brincadeira que a vida inteira se constrói.

O que é, afinal, o brincar? Não é um mero passatempo para preencher a agenda. O brincar é a mais alta corte de uma mente em formação, o laboratório onde se testa a realidade e se constrói o futuro. O parquinho é o primeiro palco, e a fantasia é a matéria-prima de uma mente criativa e capaz. É lá, no chão, entre super-heróis e panelinhas, que se forja a inteligência, a resiliência e a capacidade de ser um adulto inteiro no amanhã.

Adultizar é interromper – O grande perigo, hoje, não está apenas nas ameaças visíveis, mas na adultização precoce – um roubo sutil e socialmente aceito do tempo de ser criança. Transformar precocemente nossos filhos em pequenos adultos, sobrecarregados de responsabilidades, agendas lotadas e preocupações que ainda não lhes cabem, é gerar uma geração que carrega a ansiedade na mochila e que terá lacunas emocionais difíceis de preencher depois.

A CIJ é categórica: adultizar é roubar o tempo de ser criança. E as consequências são palpáveis: baixa criatividade, dificuldade em lidar com frustrações e o risco de um desenvolvimento socioemocional incompleto.

Essa discussão, aliás, ganha um olhar contemporâneo quando observamos os alertas trazidos por figuras como o influenciador Felca. Ao questionar a superexposição e o desempenho infantil nas plataformas digitais, ele acende uma luz sobre como a busca incessante por engajamento pode, de forma sutil, empurrar a criança para um papel performático. Exige-se dela uma maturidade emocional e uma consciência de imagem que, pela lei da vida, ela simplesmente ainda não possui. É um convite à reflexão: onde termina o lúdico e começa a exploração da infância?

A pedagoga da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (CEJA), Priscila Barcellos, sabe bem a importância do brincar e os perigos iminentes com a adultização. “O brincar é fundamental para o desenvolvimento infantil. Por meio da brincadeira a criança desenvolve habilidades motoras, cognitivas, afetivas, além de aprender a conviver, dividir e socializar. A visão da criança como adulto em miniatura, já superada pela ciência, tem retornado de maneira perigosa sob a forma da adultização precoce e com o risco ainda mais grave em nosso tempo, pois ignoramos o vasto conhecimento sobre desenvolvimento infantil e os sérios prejuízos psíquicos e emocionais que trazem para a criança”.

O Brincar é lei, não um favor. Nosso Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é a prova de que o brincar é um direito fundamental. O Artigo 16 não trata o lazer como um bônus. Ele garante a liberdade, a dignidade e, primordialmente, o lazer e o brincar (Inciso IV).

Primeira Infância

O TJPE desenvolve diversas iniciativas para a proteção das crianças para que elas vivam esse período com todos os direitos que lhe são fundamentais. Dentre os quais, um marco para a proteção de crianças de 0 a seis anos de idade foi o lançamento do Plano de Ação Estadual da Política Judiciária para a Primeira Infância 2024 – 2030 pelo Judiciário estadual pernambucano, por meio da CIJ, no dia 5 de agosto de 2024. O documento, que é uma das prioridades do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em todo o país, tem como objetivo investir no desenvolvimento de capacidades institucionais para a garantia integral e integrada dos direitos atinentes à Primeira Infância, direcionada a crianças de 0 a seis anos de idade.

Por meio da iniciativa são envidados esforços institucionais e coletivos para assegurar, com absoluta prioridade, a implementação dos direitos das crianças nessa faixa etária; intensificar a atuação ativa com esse objetivo mediante a integração operacional entre os segmentos do TJPE e os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente para o pleno cumprimento das ações estabelecidas no Plano.

Com esse registro histórico, o Tribunal de Justiça de Pernambuco consolidou o compromisso e a responsabilidade social de avançar com a efetivação do Marco Legal da Primeira Infância, seja na condição de parceiro – somando esforços junto a outros órgãos e instituições – seja na de protagonista em diversas frentes de atuação, voltadas à concretização de mudanças necessárias ao aperfeiçoamento do atendimento destinado à primeira infância, no âmbito da justiça estadual”, pontuou o coordenador da Infância e Juventude do TJPE, desembargador Élio Braz.

Declare Proteção à Infância

A campanha “Declare Proteção à Infância”, promovida pelo TJPE, impulsionou um crescimento expressivo nas doações ao Fundo da Criança e do Adolescente (FIA) via Imposto de Renda. Em 2025, o estado arrecadou R$ 8,49 milhões em destinações, o que representa um aumento de 33% em relação a 2024, quando foram registrados R$ 6,37 milhões.

Do total destinado, R$ 7,07 milhões foram efetivamente pagos por meio do Documento de Arrecadação da Receita Federal (DARF), valor superior aos R$ 6,32 milhões arrecadados no ano anterior. Isso representa um crescimento de 12%. A taxa de conversão do potencial de arrecadação para valores pagos também avançou, subindo de 3,40% para 3,52%.

Iniciada em 17 de março e encerrada no prazo final da entrega do IR, em 30 de maio, a campanha mobilizou diversas instituições públicas e privadas com o objetivo de conscientizar os contribuintes sobre a possibilidade de destinar até 3% do imposto devido a projetos sociais voltados à infância e adolescência. O engajamento de profissionais da contabilidade e de entidades da sociedade civil foi decisivo para o alcance dos resultados.

Os recursos captados pelo FIA são aplicados no financiamento de políticas públicas voltadas à proteção, educação e inclusão social de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. As verbas fortalecem programas estratégicos, viabilizam projetos de impacto direto nas comunidades e contribuem para a garantia de direitos fundamentais da infância no estado.

Pernambuco lidera número de adoções no Nordeste

Na área de adoção, Pernambuco também permanece em destaque, buscando viabilizar uma infância digna a milhares de crianças que são inseridas numa família. No Nordeste, Pernambuco está em primeiro lugar em número de adoções. Em 2024, foram realizadas pelo Sistema Nacional de Adoção (SNA), 230 adoções no estado das 5.381 promovidas no Brasil. No país, Pernambuco continua entre os estados que mais realizam adoções. Dentro do contexto dos 26 estados e do Distrito Federal, ocupa a sétima posição geral.

Para tentar tornar visível a história de crianças e adolescentes numa faixa etária mais elevada, buscando essa ponte entre pretendentes e crianças e adolescentes aptos à adoção, programas foram desenvolvidos no TJPE para dar voz e imagem para esses meninos e meninas que vivem em instituições de acolhimento.

Um dos projetos pioneiros, desenvolvido pelo coordenador da Infância e Juventude do TJPE, desembargador Élio Braz, quando era juiz titular da 2ª Vara da Infância e Juventude da Capital, foi a campanha “Adote um Pequeno Torcedor”, iniciada em 2015, desenvolvida em parceria com o Sport Club do Recife. Vídeos e desenhos das crianças eram veiculados no site do time, do TJPE, e nas partidas de futebol. A iniciativa inspirou vários clubes no país, que adotaram a mesma metodologia.

Hoje, em Pernambuco, a campanha “Adote um Pequeno Torcedor” não atua mais, mas a ação permanece ampliada com a prática da ferramenta Busca Ativa, reformulada em novembro de 2016 – por meio da veiculação de posts humanizados com perfis de cada menino e menina que vive em instituição de acolhimento – no Instagram e Facebook, promovendo, desde que foi criada, 400 adoções. Confira o perfil das crianças e adolescentes inseridos na busca ativa em nossas redes sociais: Instagram: @ceja_pe e Facebook: Ceja-PE.

Pela Busca Ativa, desenvolvida pela Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), o Senado Federal concedeu ao TJPE, em 20 de junho de 2023, o Prêmio Adoção Tardia – Gesto Redobrado de Cidadania. A proposta partiu da senadora Teresa Leitão. A juíza da Infância e Juventude Hélia Viegas, hoje também assessora especial da Corregedoria Geral da Justiça do TJPE, foi receber o prêmio em Brasília.

“O TJPE sempre se destacou no país pelas iniciativas de trabalhar com adoção de jovens com idade mais avançada, o que comumente se chama adoção tardia, um termo não muito próprio, mas que reflete a dificuldade das famílias em querer adotar crianças maiores. Quebramos o estigma e o preconceito de mostrar essas crianças mais velhas e jovens. Esses adolescentes têm personalidade, podem exercer o seu protagonismo, não precisam ficar escondidos. Hoje, eles podem falar, dizer o que querem, falar do desejo de encontrar uma família e ser feliz. Esse é o papel do Poder Judiciário, de colaborar no sentido de garantir uma família para todas as crianças e adolescentes que se encontram acolhidos e impossibilitados de voltar para sua família natural porque já passaram pelo processo de destituição familiar”, pontuou o desembargador Élio Braz.

Atualmente, a ferramenta está inserida no Programa Ciranda Conviver, que tem por principal objetivo assegurar o direito à convivência familiar e comunitária às crianças e aos adolescentes que vivem sob acolhimento institucional, partindo da premissa de que todos darão as mãos em favor dessas crianças “invisíveis” aos olhos de muitos. O Eixo Familiar, na “roda” Buscando Famílias, desenvolve a busca ativa de pretendentes à adoção para as crianças / adolescentes que não foram vinculados a alguma família pelo Sistema Nacional de Adoção, seja em razão da idade ou por questões de saúde.

TJ/DFT: Casamento infantil é proibido no Brasil: conheça impacto da prática ilegal na vida de crianças e meninas

No mês em que se celebra o Dia das Crianças e o Dia Internacional da Menina, instituído pela ONU, a Coordenação da Infância e da Juventude (CIJ) do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) reforça o impacto negativo do casamento precoce na vida de crianças e meninas. Apesar de ser proibido no país, a prática ilegal afeta 36% das meninas brasileiras menores de idade. O Brasil ocupa a sexta posição no ranking de países com maior número de casamentos infantis.

O que diz a legislação?
No Brasil, a idade mínima para casar é 16 anos. Segundo artigo 1.517 do Código Civil, o homem e a mulher com 16 anos podem se casar. No entanto, é exigida autorização de ambos os pais ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil, ou seja, 18 anos.

Os casamentos envolvendo menores de 16 anos não têm validade jurídica, ou seja, são nulos. Dessa forma, podem caracterizar crime de estupro de vulnerável, conforme o artigo 217-A do Código Penal, quando há relação sexual com menor de 14 anos, bem como violação de direitos da criança e do adolescente, sujeitando responsáveis e envolvidos a medidas de proteção e sanções previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

O Brasil é signatário de vários acordos internacionais, como a Convenção sobre os Direitos da Criança (ONU, 1989), a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), e a Agenda 2030 da ONU (ODS 5.3), que estabelece o compromisso de eliminar o casamento infantil, precoce e forçado até 2030.

A Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra Crianças e Adolescentes e o Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador também tratam o casamento infantil como uma prática a ser combatida por meio de educação, empoderamento e proteção social.

Impactos do casamento infantil
Para a servidora da CIJ do TJDFT, Deiza Carla Medeiros Leite, “o casamento precoce interrompe a infância e impõe responsabilidades e papéis sociais de adultos, violando a proteção integral e o direito à infância e ao desenvolvimento pleno da menina”.

Meninas em casamentos ou uniões precoces frequentemente abandonam os estudos devido à maternidade, pressões domésticas ou controle do parceiro, o que viola o artigo 53 do ECA, que garante o direito à educação e à igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. Dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a evasão escolar é significativamente mais alta entre meninas casadas antes dos 18 anos, o que perpetua o ciclo de pobreza e exclusão social.

A servidora da CIJ lembra que “o casamento infantil restringe a liberdade pessoal e a autonomia das meninas sobre suas decisões de vida e de corpo”. “Muitas vezes, essas uniões envolvem coerção, dependência econômica ou pressões familiares e culturais, configurando casamentos forçados, uma forma de violência de gênero reconhecida pela Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e pela Lei Maria da Penha”, afirma.

Além disso, o casamento infantil frequentemente leva à gravidez precoce, com sérios riscos à saúde física e mental da adolescente, com maior probabilidade de morte materna, complicações no parto e no desenvolvimento fetal, violência obstétrica e falta de acesso a cuidados adequados, além de sofrimento psicológico e isolamento social.

Deiza explica que o casamento precoce também favorece o rompimento do ciclo natural de amadurecimento emocional. Diante disso, expõe meninas a exploração sexual; violência física e psicológica; trabalho doméstico forçado; isolamento social; depressão e ansiedade; perda de vínculos com pares; e oportunidades de crescimento pessoal.

Por fim, a servidora lembra que a prática ilegal atinge desproporcionalmente meninas e reproduz estereótipos que as colocam em posição de subordinação e dependência. “O casamento infantil é também uma expressão de desigualdade de gênero”, finaliza.

Atuação do Judiciário
A Coordenação da Infância e da Juventude (CIJ) do TJDFT é responsável por implementar o Plano de Ação da Política Judiciária para a Primeira Infância no DF, conforme os 12 eixos da Resolução CNJ 470/2022. As ações, articuladas com o Sistema de Garantia de Direitos, envolvem tanto os tribunais quanto a rede de proteção.

No Eixo 7, voltado à segurança e enfrentamento da violência, destaca-se a campanha Maio Laranja, que capacitou 119 profissionais, principalmente da educação, para prevenir e lidar com casos de violência sexual contra crianças.

A CIJ também fortalece parcerias com programas de educação cidadã, voltados a meninas e jovens adultas em situação de vulnerabilidade, como o Rede Gol, com o Instituto Elas Transformam, e o Projeto Impulsiona, com o Sest Senat, que oferece capacitação, inserção profissional e apoio à saúde física e emocional.

Denuncie
O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania oferece o Disque 100, canal permanente para denúncias de violações de direitos humanos. As denúncias também podem ser feitas pelo Telegram, buscando “DireitosHumanosBrasil”, pelo WhatsApp, no número (61) 99611-0100, ou pelo link wa.me/5561996110100.

O enfrentamento ao casamento precoce exige ações integradas, sensibilização da sociedade e fortalecimento das políticas públicas voltadas à proteção da infância. Garantir que meninas tenham acesso à educação, saúde e oportunidades é essencial para romper ciclos de violência e promover o pleno exercício de seus direitos humanos.


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