TRT/SP: Justa causa para empacotador de supermercado que agrediu cliente acusado de furto

A 4ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região manteve a justa causa aplicada pelo Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Bauru a um funcionário de supermercado que agrediu um cliente, com ajuda de outros colegas, sob a alegação de que se tratava de um “meliante” que havia tentado um furto.

O trabalhador atuava como empacotador desde 6/4/2022, até ser dispensado em 8/6/2023. Ele não concordou e recorreu. Sem negar a agressão cometida, ele alegou, entre outros, primeiro que não se tratava de um cliente, mas sim de um “meliante, que havia subtraído mercadorias”. Ao constatar que “o sujeito não iria pagar pela mercadoria subtraída”, e cumprindo, segundo ele, norma da empresa, “junto com outros empregados, conduziu o sujeito para a área de entrada dos funcionários”. Ele afirma que nesse trajeto, foi atingido pelo acusado com uma cotovelada. Na sala reservada, o funcionário disse que aguardou a chegada da polícia, “que demorou cerca de 40 minutos para chegar”, e devido à agressão sofrida e aos insultos praticados pelo “elemento que aparentava estar sob efeito de drogas”, ele “acabou revidando a agressão na proporção das agressões sofridas”. O empacotador insistiu que “não agrediu um cliente, mas sim um meliante/furtador”, e que “as vias de fato não foram praticadas na presença de clientes do supermercado, mas sim em local reservado do público, conforme demonstram todas as imagens”. Ele defendeu, dessa maneira, que “a abordagem perante os clientes se deu de forma totalmente regular, não trazendo qualquer dano à imagem da reclamada, que por sua vez deixou vazar as imagens de seu circuito interno”.

A relatora do acórdão, desembargadora Rita de Cássia Penkal Bernardino de Souza, entendeu que, no caso, o supermercado provou, “de forma robusta, que o reclamante praticou falta grave a justificar a dispensa por justa causa”, o que ficou comprovado pelos links de vídeos das câmeras de segurança disponibilizados, que registram as agressões físicas praticadas contra um cliente da loja. Em sua defesa, a empresa afirmou que o funcionário, “no exercício de suas funções, excedeu-se na abordagem de um indivíduo no estabelecimento comercial, agredindo-o em conjunto com outros funcionários, que também foram dispensados em razão do episódio”, e que, “ao contrário do narrado, o reclamante não agiu em conformidade com as normas da empresa”. Além disso, os atos praticados pelo reclamante causaram graves prejuízos à imagem do supermercado, “na medida em que houve grande repercussão na mídia local”, destacou.

A relatora afirmou que as imagens captadas pelas câmeras internas de segurança “chegam a chocar perante tamanha agressividade por parte de alguns fiscais e, em especial, do reclamante que se mostrava bastante alterado e com ânimo de agredir fisicamente o cliente”. Os vídeos deixam claro que, “durante todo o percurso em que os fiscais percorreram com o cliente dentro do supermercado, aqueles desferiram golpes neste último”. Apesar de as imagens mostrarem que o cliente “apresentou resistência enquanto era levado (empurrado) pelos fiscais”, ele não os agrediu, “pelo contrário, o que se vê é um fiscal desferir o golpe ‘mata leão’ apenas porque o cliente apresentava resistência no caminhar”, e “a forma como o cliente foi tratado causou espanto em todos os clientes que presenciaram as cenas”, destacou o acórdão.

O colegiado também salientou “as cenas mais fortes de 7 fiscais dentro da sala com o cliente que foi agredido várias vezes”, e a que registra o empacotador “adentrando a sala e, já alterado, parte para cima do cliente com o chinelo deste na mão, desferindo tapas, socos e, posteriormente, quando o cliente cai no chão, desfere chutes”, porém não se viu nenhuma “agressão anterior ao reclamante que, instantes depois dos primeiros golpes, e após o cliente apanhar de outro fiscal, continua batendo na vítima”.

Para o colegiado, “independentemente da suspeita que recaía sobre o cliente ter furtado objetos do supermercado, não cabe ao reclamante fazer qualquer julgamento de valor a respeito da moral do cliente, não lhe sendo dado o poder ou direito de agir como agiu, ainda que tivesse ocorrido o furto, sendo exagerada e desproporcional a agressividade do reclamante e dos demais fiscais”, e sobre a alegação do funcionário de que “não agrediu um cliente, mas sim um ‘meliante/furtador’ é totalmente descabida”, concluiu.

A única testemunha ouvida a convite do autor, e que também atuou na empresa como fiscal de prevenção de perdas, mas que não participou da abordagem, reforçou as alegações do colega, de que este só reagiu à agressão do cliente, e que “a empresa divulgou indevidamente as imagens na mídia, o que prejudicou muito os envolvidos na abordagem, inclusive para arrumarem um novo emprego”. O colegiado entendeu que a testemunha descreveu os fatos de uma forma que, “claramente, favorece o reclamante, colocando-o numa situação de vítima, contudo, não é o que se vê ao assistir todos os vídeos, existindo nos autos elementos suficientes que comprovam a tese da reclamada”.

O acórdão concluiu, assim, que foram comprovadas as alegações da empresa de que “tais atos, dada sua gravidade, são suficientes a abalar a fidúcia entre empregado e empregador, e que justifica a aplicação imediata da pena mais grave, a demissão por justa causa”, e ainda que ela “observou a imediatidade necessária para efetuar a dispensa, tendo em vista os trâmites necessários para averiguar com precisão o ocorrido, não havendo prova em sentido contrário”, e por isso manteve a sentença que indeferiu as verbas consectárias e, por consequência, a indenização por danos morais.

Processo 0010998-06.2023.5.15.0090

TJ/SP nega posse virtual de vereador eleito

Político não compareceu em razão de mandado de prisão.


A 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 2ª Vara Cível de São Sebastião que negou mandado de segurança impetrado por vereador eleito para tomar posse virtualmente.

De acordo com os autos, o requerente foi eleito vereador de São Sebastião em 2024 e diplomado para o exercício da função. Porém, em razão de mandado de prisão preventiva expedido contra ele, o político não compareceu à posse solene ao cargo. Ele protocolou pedido de posse virtual ao presidente da Câmara Municipal de São Sebastião, que foi negado.

“Consoante os preceitos estabelecidos na Lei Orgânica e no Regimento Interno da Câmara dos Vereadores do Município de São Sebastião, inexiste amparo legal para a investidura no cargo senão mediante comparecimento pessoal do eleito no primeiro dia do mês de janeiro do ano inaugural de cada legislatura, ou, alternativamente, no decurso do prazo improrrogável de quinze dias subsequentes à solenidade de posse, ressalvadas as hipóteses de impedimento legítimo reconhecido e referendado pelo órgão colegiado municipal”, apontou o relator do recurso, Márcio Kammer de Lima, ao manter sentença proferida pelo juiz Guilherme Kirschner. Para o magistrado, apesar de o impetrante ter protocolado justificativa de sua ausência, a fundamentação aduzida por ele “não se afigura como escusa legítima ou revestida de probidade suficiente para o exonerar da obrigação do comparecimento presencial ao ato solene de investidura, tampouco para postular modalidade de posse não presencial desprovida de expressa previsão no ordenamento jurídico municipal”.

Por fim, Márcio Kammer de Lima destacou que mesmo que a diplomação pela Justiça Eleitoral constitua ateste a regularidade tanto da candidatura quanto do pleito, o exercício do múnus público pressupõe o adimplemento dos deveres cívicos e legais, dentre os quais se insere a submissão às determinações do Poder Judiciário, como é o caso da ordem de prisão.

Apelação nº 1000109-11.2025.8.26.0587

TJ/RN: Estado e Município devem custear cirurgia de paciente que sofreu acidente de moto

O 4º Juizado Especial da Fazenda Pública de Mossoró determinou que o Estado do Rio Grande do Norte (RN) e o Município de Mossoró são responsáveis pelo custeio da cirurgia de vítima de acidente de moto que causou fratura na clavícula direita. De acordo com o processo, o motociclista foi inicialmente atendido no Hospital Regional Tarcísio Maia, onde recebeu imobilização e orientação para retorno em duas semanas, sem a realização de exames complementares.

Consta ainda que, dias depois, outro médico constatou a necessidade urgente de cirurgia, mas informou que o procedimento dependeria da fila do SUS, sem previsão de data. Diante do risco de agravamento do quadro, o paciente pediu indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil e solicitou o tratamento.

Ao acionar a Justiça processando o médico, o RN e o Município de Mossoró, foi concedida liminar obrigando o poder público a custear integralmente a cirurgia. Como a ordem não foi cumprida, houve bloqueio de R$ 26 mil em verbas públicas para viabilizar o procedimento. Tanto o Estado quanto o Município alegaram que foram acionados na ação judicial sem terem qualquer relação jurídica com o objeto da disputa.

Entretanto, ao analisar o caso, o juiz Paulo Luciano Maia Marques confirmou a decisão liminar e rejeitou os argumentos do Estado do RN e do Município de que não seriam responsáveis pelo caso, destacando que a Constituição Federal estabelece responsabilidade solidária entre os entes na garantia do direito à saúde.

Já em relação ao médico que atendeu o paciente no hospital, a alegação de falta de legitimidade para responder à ação foi acolhida, pois ele atuava em serviço público. Nesses casos, a responsabilidade direta recai sobre o ente estatal, e não sobre o servidor individualmente.

“Nos termos do art. 196 da Constituição Federal, a saúde é direito de todos e dever do Estado. A organização do SUS estabelece a responsabilidade solidária entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios na prestação das ações e serviços de saúde, entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal”, destacou o magistrado.

No entanto, o pedido de indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil foi negado. Segundo a sentença, a liberação judicial dos recursos garantiu a realização da cirurgia em tempo hábil, não configurando dano moral indenizável.

TRT/SP: Justiça condena a Coca Cola por permitir racismo na empresa

A 15ª Turma do TRT da 2ª Região confirmou sentença que condenou empresa fabricante de bebidas por dano moral em virtude de racismo praticado contra empregado em suas dependências. O montante de R$ 50 mil estabelecido na origem foi mantido em 2º grau.

De acordo com testemunha autoral, o chefe dizia frases como “esses negros não servem para nada” e usava expressões como “preto safado” para se referir ao reclamante e a outros(as) empregados(as). Contou, ainda, que o superior barrou promoções e dispensou trabalhadores(as) por questões de raça e orientação sexual.

Em defesa, a Spal Indústria Brasileira de Bebidas S/A, fabricante da Coca-Cola, alegou não haver atos discriminatórios de cunho racial em suas instalações e apresentou documentos buscando comprovar a cultura da diversidade e inclusão na companhia. No entender do juízo, no entanto, a advogada patronal reconheceu que o racismo era algo conhecido dos(as) empregados(as), portanto existia no ambiente. Além disso, denúncias feitas ao RH não levaram a providências que impedissem essa atitude.

“O empregador foi extremamente negligente e insensível com a situação […] levada ao seu conhecimento, olvidando-se que todas as formas de racismo devem ser duramente combatidas”, pontuou a juíza Elisa Maria de Barros Pena, relatora do acórdão. Segundo a magistrada, ainda que a ré tenha citado a existência de materiais e programas de adequação voltados à equipe, tais iniciativas não impediram a prática da conduta contra o reclamante.

No julgamento, o colegiado levou em consideração provas orais e documentais apresentadas no processo, assim como em ações semelhantes nas quais ficou comprovada a má conduta da empresa, e concluiu que o autor sofreu discriminação racial de forma reiterada no local de trabalho. Assim, a Turma considerou adequado e proporcional o valor da indenização definido na sentença.

Dia da Consciência Negra

Em 20 de novembro, celebra-se o Dia Nacional de Zumbi e o Dia da Consciência Negra no Brasil. A data foi instituída pela Lei nº 12.510/2011 como símbolo de luta contra o racismo no país e remete ao dia de morte de Zumbi dos Palmares, então líder do Quilombo dos Palmares, em 1695.

Estabelecido inicialmente como feriado municipal, a Lei nº 14.759/2023 tornou o 20 de novembro feriado nacional a partir de 2024. Na data, realizam-se manifestações como marchas, protestos, palestras e outros atos para promover a igualdade e celebrar a cultura afro-brasileira.

Segundo o Censo de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população negra (pretos e pardos) representa a maioria da população brasileira, somando cerca de 55,5%. A composição racial no país é predominantemente parda (45,3% da população total), enquanto os pretos somam 10,2%.

A desigualdade racial ainda persiste no mercado de trabalho brasileiro, com alta taxa de desemprego entre a população negra, especialmente as mulheres. Também se verifica parcela significativa desses(as) trabalhadores(as) em atividades precarizadas e até atuando em condições análogas à escravidão.

TRT/MG: Racismo recreativo – Juíza mantém justa causa e usa protocolo do CNJ para derrubar “piadas” de grupo do WhatsApp

A Justiça do Trabalho manteve a dispensa por justa causa aplicada a uma profissional de educação física, em Belo Horizonte, envolvida em um caso de injúria racial contra um colega. Em decisão que marca o Dia Nacional da Consciência Negra, a juíza que atuou na 48ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, Jéssica Grazielle Andrade Martins, manteve a penalidade máxima trabalhista ao enquadrar o caso como racismo recreativo, prática que usa piadas e apelidos para ofender.

A profissional participava de um grupo de WhatsApp que criava uma “tabela de pontuação negativa” para os colegas em que a cor da pele negra era um “defeito” a ser penalizado. A sentença observou as diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), reforçando que o empregador agiu corretamente ao punir as ofensas feitas em um grupo de WhatsApp, garantindo um ambiente de trabalho livre de discriminação e relações tóxicas.

Entenda o caso
A ex-empregada propôs ação trabalhista pretendendo a reversão da justa causa. Sustentou que “sempre executou as atividades com todo empenho possível, com respeito e assiduidade”. Negou a alegação de que teria praticado qualquer ato desrespeitoso ou lesivo contra clientes ou colegas de trabalho. Afirmou ainda que não teve oportunidade de defesa e que não foram observados os princípios da gradação da pena e da imediatidade (rapidez) na punição.

Ela foi admitida em 3/5/2021, como profissional de educação física na academia de ginástica, tendo sido encerrado o contrato de trabalho em 27/1/2025. A dispensa foi motivada por denúncia de injúria racial, feita por um colega de trabalho no canal de atendimento.

A academia explicou na defesa que recebeu a denúncia do empregado, que também era profissional de educação física. Sustentou que houve montagens em fotos e comentários racistas: “a vítima anexou na denúncia os prints do WhatsApp e a transcrição das mensagens, com comentários racistas e postagens de figurinha com o rosto dela no corpo de um macaco”.

Foi verificado ainda que a ex-empregada participava ativamente do grupo, enviando fotografias da vítima e ridicularizando-a. A empresa explicou que, em momento algum, ela negou os fatos ou demonstrou arrependimento ao ser comunicada da justa causa.

Segundo a vítima, o grupo de WhatsApp foi criado em fevereiro de 2024. “(…) desde então, usam esse aplicativo para proferirem ofensas sobre a minha cor; falaram até em colocar chumbinho no meu café. Fizeram figurinhas colocando minha foto em um corpo de macaco, referiram a mim como Zumbi dos Palmares , frango de macumba, Tizumba, Kunta Kinte, ave fênix depois de cair no piche, preto velho, Sherek torrado, Demônio, (…) tirando fotos minhas, sem permissão, para criarem figurinhas racistas”, disse o trabalhador.

Decisão
Na sentença, a juíza considerou que o cunho racista das mensagens trocadas no grupo é evidente e absurdo. “Chegou-se ao ponto de estabelecer-se uma tabela de pontuação negativa quanto às características dos colaboradores, dentre elas, a cor de pele, referindo-se à pele negra como ‘queimada’ e atribuindo a tal característica conotação negativa”, destacou.

Segundo a julgadora, a denúncia é gravíssima. “Apesar de não ter criado a tabela racista, a autora contribuiu ativamente no grupo, utilizando expressões de injúria racial contra o colega (“Cirilo”, “Tizumba”, “demônio”) e endossando o conteúdo preconceituoso”, pontuou.

No entendimento da magistrada, a atividade do grupo enquadra-se no conceito de racismo recreativo contido no Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial do CNJ. “Importante ressaltar que o fato de ser um grupo criado entre ‘pessoas com afinidade’ não afasta a responsabilidade pela conduta”, ponderou.

A julgadora considerou a dispensa por justa causa proporcional e válida com base no Protocolo do CNJ e nas normas de ética profissional, devido à gravidade da conduta. Ela rejeitou ainda a justificativa da autora de que seria imune à acusação por também ser negra, classificando o argumento como um “artifício” que tenta banalizar o racismo estrutural. A juíza ressaltou também na decisão que é dever do empregador proteger a saúde e a segurança do trabalhador, nos termos do disposto no artigo 7º, XXII, da Constituição.

Quanto à ausência de imediatidade (rapidez), a julgadora entendeu como razoável o tempo que a empregadora levou para a tomada de decisão. Entre o recebimento da denúncia (14/1/2025) e da dispensa (27/1/2025), houve intervalo de apenas 13 dias.

A juíza ressaltou ainda que, diante da gravidade do episódio, não há de se falar em necessidade de aplicação progressiva de medidas disciplinares. Diante das provas, ela considerou válida a dispensa, indeferindo o pedido de reversão da justa causa.

O pedido de indenização por dano moral da autora foi julgado também improcedente. A julgadora considerou plausível a proibição da ex-empregada de atuar como personal trainer nas academias da rede após a dispensa por justa causa, pois o impedimento se deu pelo seu comportamento racista, uma vez que a empresa tem a prerrogativa de estabelecer requisitos de acesso às suas instalações.

Recurso
Inconformada, a ex-empregada interpôs recurso, porém, os julgadores da Terceira Turma do TRT de Minas negaram provimento ao apelo, mantendo a sentença por seus próprios fundamentos expressos, nos termos do artigo 895, parágrafo 1º, inciso IV, da CLT, em sessão ordinária realizada em 2 de julho de 2025. O processo foi remetido ao TST para exame do recurso de revista.

A luta por justiça: o significado do Dia da Consciência Negra
Amanhã, 20 de novembro, celebraremos o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. É um momento de reflexão profunda sobre a resistência, a história e as conquistas da população negra no Brasil. A data faz referência à morte de Zumbi dos Palmares, o líder do Quilombo dos Palmares, que se tornou um símbolo de luta contra a escravidão e a opressão.

O 20 de novembro reforça o compromisso de toda a sociedade e, especialmente, do Poder Judiciário em combater o racismo e promover a igualdade racial. Casos como o dessa decisão judicial demonstram a urgência em transformar as leis em ações concretas, garantindo que o direito à dignidade, historicamente negado, seja efetivado em todos os ambientes, incluindo o de trabalho.

TJ/RN: Mulher é condenada por lesão corporal causada após discussão sobre sumiço de dinheiro

O Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Assú/RN condenou uma mulher a três meses de detenção, em regime aberto, por lesão corporal leve. A sentença, da juíza Aline Daniele Belém Cordeiro Lucas, analisou uma briga ocorrida entre duas mulheres por causa de dinheiro que desapareceu de uma conta bancária.

Segundo o processo, a acusada pediu que a vítima, que era sua conhecida, guardasse a quantia de R$ 10 mil em sua conta bancária, pois ela própria não tinha conta habilitada para transferências via Pix. Dias depois, o valor sumiu da conta da vítima, que alegou ter sido vítima de golpe eletrônico. Inconformada, a acusada foi até a casa da mulher para cobrar explicações. Mas, durante a discussão, ela teria chamado a vítima de “ladrona”, arremessado o celular em sua direção e partido para agressões físicas, com socos e puxões de cabelo.

Denúncia e defesa
A vítima apresentou laudo pericial confirmando lesões no rosto, mãos e nariz, compatíveis com as agressões relatadas, denunciando a mulher pelos crimes de lesão corporal e ameaça. Em sua defesa, a acusada negou as agressões e afirmou que houve apenas uma discussão verbal, motivada pela desconfiança em relação ao desaparecimento do dinheiro.

A acusada disse também que não teve intenção de machucar a vítima e que apenas tentou esclarecer o ocorrido. A defesa sustentou ainda que não havia provas suficientes para confirmar a versão da vítima e pediu a absolvição por falta de materialidade e dolo, argumentando que o episódio se tratava de um mal-entendido entre conhecidas.

Sentença condenatória
Ao analisar o caso, a magistrada aplicou as diretrizes do artigo 59 do Código Penal, que orienta a avaliação das circunstâncias judiciais do crime, como a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato. Na sentença, a juíza ressaltou que os motivos do crime, uma desavença de natureza patrimonial, não justificam o uso da violência.

A magistrada destacou, ainda, que as circunstâncias agravaram a conduta da acusada, uma vez que a agressão ocorreu dentro da residência da vítima, “local que deveria representar segurança e refúgio”. Conforme os depoimentos e o laudo pericial, as agressões foram comprovadas, as quais evidenciaram que a acusada agiu com a intenção de ofender a integridade física da vítima. “A ré agiu de forma livre e consciente, praticando as agressões de modo deliberado, no contexto de uma discussão acalorada sobre questão patrimonial”, pontuou a juíza.

Assim, à luz do Código Penal, que tipifica o crime de lesão corporal no artigo 129, “ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem”, a pena foi fixada em três meses de detenção em regime aberto, sem possibilidade de substituição por penas restritivas de direitos, em razão da natureza violenta da infração. Por fim, a juíza indeferiu os pedidos de indenização por danos morais e materiais, por entender que não foram formulados no momento processual adequado.

TRT/MT: Família consegue na Justiça cobertura de cirurgia urgente negada pela Unimed

Uma criança portadora de osteonecrose e osteoartrose bilateral de quadril conseguiu uma decisão favorável no Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) para que a operadora de saúde arque integralmente com a cirurgia de artroplastia total de quadril e todos os materiais prescritos por seu médico assistente. A decisão é da Primeira Câmara de Direito Privado, que reconheceu a obrigatoriedade de cobertura.

O caso envolve uma paciente menor de idade, representada pela mãe, que sofre com dores intensas e limitação de movimentos em decorrência de anemia falciforme. O médico responsável indicou a necessidade urgente da cirurgia, com uso de materiais específicos, mas a operadora de saúde negou a cobertura integral, amparando-se em parecer de uma junta médica que discordou da prescrição.

Ao analisar o recurso, o relator, desembargador Márcio Aparecido Guedes, destacou que, segundo o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula 608), aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de planos de saúde e deve prevalecer a indicação do médico assistente, que acompanha o quadro clínico do paciente e conhece suas reais necessidades.

Para o magistrado, a negativa de cobertura foi indevida, pois a junta médica não pode se sobrepor ao profissional que acompanha a paciente. “É abusiva a negativa de cobertura de procedimento e materiais indicados pelo médico assistente, prevalecendo sua prescrição sobre a junta médica”, afirmou no voto.

No entanto, o colegiado afastou a indenização por danos morais. A Câmara entendeu que, embora a recusa do plano de saúde tenha sido equivocada, não ficou demonstrado que a conduta da empresa tenha agravado o quadro de saúde da paciente ou colocado sua integridade física em risco.

Processo nº 1002811-37.2024.8.11.0051


Veja a publicação:

Diário de Justiça Eletrônico Nacional – CNJ – MT
Data de Disponibilização: 05/11/2025
Data de Publicação: 05/11/2025
Região:
Página: 3564
Número do Processo: 1002811-37.2024.8.11.0051

TJ/MT – TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MATO GROSSO – DJEN
Processo: 1002811 – 37.2024.8.11.0051 Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Data de disponibilização: 04/11/2025 Classe: APELAÇÃO CÍVEL Tipo de comunicação: Intimação Meio: Diário de Justiça Eletrônico Nacional Parte(s): UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO Advogado(s): JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY OAB 6735-O MT Conteúdo: ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002811 – 37.2024.8.11.0051 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar] Relator: Des(a). MÁRCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MÁRCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIÃO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [J. V. O. D. S. – CPF: 052.976.771-65 (APELANTE), DEMÉRCIO LUIZ GUENO – CPF: 824.498.139-34 (ADVOGADO), ELLEN PEREIRA OLANDA – CPF: 043.912.871-45 (APELANTE), UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO – CNPJ: 03.533.726/0001-88 (APELADO), JORGE LUIZ MIRAGLIA JAUDY – CPF: 794.524.851-91 (ADVOGADO), ELLEN PEREIRA OLANDA – CPF: 043.912.871-45 (REPRESENTANTE/NOTICIANTE), MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO – CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)]

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

E M E N T A

Ementa: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. PACIENTE MENOR PORTADORA DE OSTEONECROSE E OSTEOARTROSE BILATERAL DE QUADRIL. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO (ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL) E MATERIAIS PRESCRITOS PELO MÉDICO ASSISTENTE. DIVERGÊNCIA COM JUNTA MÉDICA. PREVALÊNCIA DA INDICAÇÃO DO MÉDICO ASSISTENTE. COBERTURA OBRIGATÓRIA. DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

Caso em exame: apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, proposta em face de operadora de plano de saúde que negara cobertura integral para procedimento de artroplastia total de quadril.

As questões em discussão consistem em: (i) definir se a operadora está obrigada a custear integralmente o procedimento cirúrgico e os materiais prescritos pelo médico assistente, apesar da divergência da junta médica; e (ii) verificar se a negativa inicial de cobertura configura ato ilícito ensejador de indenização por danos morais.

Aplica-se ao caso o CDC (Súmula 608/STJ), prevalecendo a indicação do médico assistente sobre a avaliação de junta médica, por deter maior conhecimento do quadro clínico.

A recusa inicial, embora indevida, fundamentou-se em dúvida jurídica razoável, não se caracterizando ato ilícito apto a gerar dano moral, à míngua de demonstração de agravamento do quadro clínico ou risco à integridade física da paciente.

Recurso parcialmente provido para determinar a cobertura integral do procedimento cirúrgico e dos materiais prescritos pelo médico assistente, afastada a indenização por danos morais.

Tese de julgamento: “1. É abusiva a negativa de cobertura de procedimento e materiais indicados pelo médico assistente, prevalecendo sua prescrição sobre a junta médica. 2. O mero inadimplemento contratual, sem agravamento do quadro clínico ou risco à integridade do paciente, não gera dano moral indenizável.”

R E L A T Ó R I O

Cuida-se de Recursos de APELAÇÃO CÍVEL interpostos por JÚLIA VICTÓRIA OLANDA DA SILVA, menor de idade representada por sua genitora ELLEN PEREIRA OLANDA, contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Campo Verde/MT, que nos autos da ação de “Obrigação de Fazer” (Proc. nº 1002811 – 37.2024.8.11.0051), ajuizada contra UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO, julgou improcedentes os pedidos iniciais; custas e honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil (Id. nº 311484447).

Em suas razões recursais, a apelante defende que o laudo médico e o laudo radiológico comprovam a urgência do procedimento cirúrgico de artroplastia total de quadril, evidenciando que a paciente é portadora de osteoartrose importante de quadril bilateral em decorrência de anemia falciforme e osteonecrose, quadro que a submete a intensa dor e limitação funcional.

Defende a existência de ato ilícito a justificar a condenação por danos morais.

Argumenta ainda que se aplicam ao caso o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto da Criança e do Adolescente, que garantem prioridade absoluta à saúde e integridade da menor.

Pede, pois, o provimento do recurso, para que seja julgado procedente o pedido inicial, a fim de determinar que a apelada custeie o procedimento cirúrgico de artroplastia total de quadril e materiais correlatos prescritos pelo médico assistente, bem como indenização por danos morais (Id. nº 311484850).

Nas contrarrazões, a parte apelada refuta os argumentos recursais e pugna pelo desprovimento do Apelo (cf. Id. nº 311484852).

A douta Procuradoria de Justiça opina pelo provimento parcial do presente recurso, apenas para o fim de determinar que a operadora do plano de saúde custeie integralmente o procedimento solicitado pelo médico assistente, afastado o dano moral (Id. 314720373).

É o relatório.

Cuiabá, data registrada no sistema.

MÁRCIO APARECIDO GUEDES
Relator

V O T O R E L A T O R

Conforme exposto no relatório, trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação de obrigação de fazer.

A controvérsia cinge-se à análise da obrigatoriedade de a operadora de plano de saúde custear integralmente o procedimento cirúrgico de artroplastia total de quadril e materiais correlatos prescritos pelo médico assistente da apelante, bem como à existência de danos morais indenizáveis decorrentes da negativa parcial de cobertura.

Inicialmente, cumpre destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento consolidado na Súmula 608 do STJ: “aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão”.

No que tange à obrigação de fazer, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que cabe ao médico assistente, e não à operadora do plano de saúde, a escolha do tratamento mais adequado ao paciente.

Nesse sentido:

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. (…) 4. A recusa indevida/injustificada pela operadora de plano de saúde em autorizar a cobertura financeira de tratamento médico a que esteja legal ou contratualmente obrigada enseja reparação a título de dano moral por agravar a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do beneficiário. Precedentes. (…)” (AgInt no REsp 2100362/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/02/2024, DJe 28/02/2024)

Da análise dos autos, verifica-se que a apelante é portadora de osteoartrose importante de quadril bilateral em decorrência de anemia falciforme e osteonecrose, quadro que a submete a intensa dor e limitação funcional, conforme atestado pelo médico ortopedista que a acompanha, Dr. Miguel Alito – CRM-MT 3730 (Id. 311484416).

A apelante, por sua vez, submeteu o caso à junta médica, que divergiu da indicação do médico assistente, especialmente quanto aos materiais a serem utilizados.

Vejamos:

“Concluindo que: Paciente com relatório médico com osteoartrose importante de quadril à esquerda e à direita, por anemia falciforme e osteonecrose, limitadas funções pela dor e limitação articular, dificuldade de locomoção, claudicação, dismetria.

Em radiografia de bacia é evidenciada osteoartrose avançada de quadril à esquerda e à direita, sem espaço articular, e deformidade das cabeças femorais, com vários osteófitos à esquerda e à direita.

Sinais de osteonecrose das cabeças femorais.
Osteopenia regional metafisária importante.
Esclerose de bordas articulares e irregularidade delas.

Conforme o artigo 7º, inciso I, da RN n.º 424/2017, que dispôs sobre a realização de junta médica ou odontológica para dirimir divergência técnico-assistencial sobre procedimento ou evento em saúde a ser coberto pelas operadoras de planos de saúde, estipula que cabe ao profissional assistente a prerrogativa de determinar as características (tipo, matéria-prima e dimensões) das OPME necessários à execução dos procedimentos contidos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde.

Já o inciso II do mesmo dispositivo institui que o profissional requisitante deve, quando assim solicitado pela operadora, justificar clinicamente a sua indicação e oferecer pelo menos TRÊS MARCAS de produtos de fabricantes diferentes, quando disponíveis, dentre aquelas regularizadas junto à ANVISA, que atendam às características especificadas.

NÃO existe a necessidade do uso dos materiais e/ou fabricantes e/ou distribuidores exclusivamente solicitados pelo médico assistente.

A Operadora fica autorizada a fornecer os materiais definidos por esta junta, independentemente de marca/fabricante/fornecedor, desde que registrados na ANVISA e observadas as características (tipo, matéria-prima e dimensões) indicadas pelo desempatador, uma vez que é vedado ao médico assistente requisitante exigir fornecedor ou marca comercial exclusivo (art. 4º, da RESOLUÇÃO CFM Nº 2.318/2022).

Este é o parecer, em atendimento ao estabelecido na RN 424/2017 da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS.” (Id. 311484413)

O laudo médico acostado aos autos evidencia que a paciente foi diagnosticada com “osteoartrose importante de quadril à esquerda e à direita, por anemia falciforme e osteonecrose; geodos acetabulares, osteófitos peri-acetabulares limitando funções pela dor e limitação articular; dificuldade de locomoção; claudicação; dismetria. necessita de artroplastia total de quadril. necessita de curetagem em geodos acetabulares e enxertia óssea autóloga e associada com enxertia em biovidro devido má qualidade óssea em fundo acetabular, além de osteotomia periacetabular devido osteófitos marginais (impacto tipo pincer). é necessário esta osteotomia para evitar o impacto da prótese femoral ao acetábulo, o que aumenta o risco de luxação protética. tenotomia do glúteo médio e mínimo e retensionamento dos mesmos após artroplastia. bloqueio de nervos periféricos regionais para analgesia pós-operatória (nervos glúteo superior, obturatório, cutâneo lateral, femoral e isquiático) e início precoce da marcha, com melhora da dor e alta hospitalar mais precoce.” (Id. 311484416)

Embora a Resolução Normativa nº 424/2017 da ANS preveja a possibilidade de instauração de junta médica para dirimir divergências técnico-assistenciais, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que, em caso de divergência, deve prevalecer a indicação do médico que acompanha o paciente, por ter melhor conhecimento do quadro clínico e das necessidades específicas do tratamento.

Nesse sentido:

“RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROCEDÊNCIA – PLANO DE SAÚDE – NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO E MATERIAIS – DIVERGÊNCIA ENTRE MÉDICO ASSISTENTE E JUNTA MÉDICA – PREVALÊNCIA DA INDICAÇÃO DO MÉDICO QUE ACOMPANHA O PACIENTE – DANOS MORAIS – NÃO CONFIGURAÇÃO – MERO INADIMPLEMENTO CONTRATUAL – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

  1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, conforme Súmula 608 do STJ, sem prejuízo da incidência da Lei 9.656/98, que regula especificamente os planos e seguros privados de assistência à saúde.
  2. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que cabe ao médico assistente, e não à operadora do plano de saúde, a escolha do tratamento mais adequado ao paciente, sendo abusiva a negativa de cobertura de procedimento e materiais indicados pelo profissional que acompanha o caso.
  3. A negativa de cobertura baseada em parecer técnico de junta médica, instaurada em conformidade com as normas contratuais e regulamentares aplicáveis, embora equivocada à luz da jurisprudência que privilegia a indicação do médico assistente, não configura ato ilícito capaz de gerar dano moral indenizável, quando não há evidência de má-fé ou intuito de causar prejuízo ao beneficiário.
  4. O mero inadimplemento contratual não enseja condenação por danos morais, sendo necessária a demonstração de agravamento da condição de saúde ou abalo psicológico excepcional que ultrapasse o mero aborrecimento.

Dano moral afastado.

  1. Recurso parcialmente provido.” (N.U 1025566-56.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/09/2025, Publicado no DJE 09/09/2025)

“DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA PARCIAL DE COBERTURA. MATERIAL CIRÚRGICO PRESCRITO PELO MÉDICO ASSISTENTE. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. DANO MORAL AFASTADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

CASO EM EXAME Apelação interposta por UNIMED CUIABÁ COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO contra sentença que, nos autos de ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais ajuizada por KATIA REGINA VIANA, beneficiária de plano de saúde, julgou procedentes os pedidos para determinar o fornecimento integral do procedimento cirúrgico prescrito por seu médico assistente e condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00, com correção monetária pelo IPCA a partir do arbitramento e juros de mora pela Selic desde a citação.

QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há seis questões em discussão: (i) definir se se aplica o Código de Defesa do Consumidor às relações entre beneficiária e operadora de plano de saúde; (ii) estabelecer se é legítima a negativa parcial de cobertura quanto ao material cirúrgico, com base em parecer de junta médica; (iii) determinar se deve prevalecer o parecer do médico assistente da paciente ou da junta médica da operadora; (iv) verificar se a negativa parcial de cobertura configura ato ilícito passível de indenização por danos morais; (v) avaliar a adequação do valor fixado a título de danos morais; e (vi) analisar a correção dos critérios de atualização monetária e juros aplicados, à luz da Lei nº 14.905/2024.

RAZÕES DE DECIDIR Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações contratuais entre beneficiários e operadoras de planos de saúde, conforme Súmula 608 do STJ, excetuadas apenas as entidades de autogestão, o que não é o caso da cooperativa recorrente.

A negativa parcial de cobertura, fundada em parecer de junta médica, é ilegítima quando contraria a indicação do médico assistente que acompanha a paciente há mais de 20 anos e conhece sua condição clínica em profundidade.

A jurisprudência do STJ afirma que cabe ao médico assistente, e não à operadora, a escolha do tratamento mais adequado ao paciente, sendo abusiva a recusa de custeio de materiais cirúrgicos essenciais à efetividade do procedimento prescrito.

A Resolução Normativa nº 424/2017 da ANS não pode ser utilizada para afastar direitos do consumidor ou sobrepor-se à indicação médica personalizada, especialmente em hipóteses de doenças graves e histórico clínico extenso.

Não configurado o dano moral, pois a negativa parcial de cobertura amparou-se em parecer técnico e seguiu procedimento previsto em norma da ANS, inexistindo má-fé, agravamento do quadro clínico ou abalo excepcional à dignidade da paciente.

A recente alteração legislativa promovida pela Lei nº 14.905/2024 impõe a aplicação de juros de mora com base na taxa Selic, deduzido o IPCA, para evitar bis in idem na atualização do valor da condenação.

DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido.

Tese de julgamento: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações entre beneficiários e operadoras de planos de saúde, salvo nos casos de autogestão.

É abusiva a negativa parcial de cobertura de material cirúrgico prescrito pelo médico assistente, ainda que respaldada por junta médica da operadora.

O parecer do médico que acompanha o paciente deve prevalecer sobre o da junta médica da operadora, especialmente em casos de enfermidades graves.

A negativa parcial de cobertura amparada em divergência técnica não configura, por si só, dano moral indenizável.

A taxa de juros moratórios deve observar o disposto no art. 406, § 1º, do CC, com aplicação da Selic deduzido o índice inflacionário IPCA, conforme a Lei nº 14.905/2024.” (N.U 1018108-51.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 29/08/2025, Publicado no DJE 29/08/2025)

Logo, no que se refere à obrigação de fazer, a sentença merece reforma, para determinar que a operadora de plano de saúde autorize e custeie o tratamento completo da apelante, incluindo os materiais solicitados pelo médico assistente.

Quanto aos danos morais, Carlos Alberto Bittar leciona que “qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos das personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)” (Reparação civil por danos morais, n.º 7, p. 41, in CAHALI, Yussef Said).

Pablo Stolze Gagliano em Novo curso de direito civil, 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2004, vol. III, p. 85, pondera que: “Superadas, portanto, todas as objeções quanto à reparabilidade do dano moral, é sempre importante lembrar, porém, a advertência brilhante de Antônio Chaves, para quem ‘propugnar pela mais ampla ressarcibilidade do dano moral não implica no reconhecimento de todo e qualquer melindre, toda suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor próprio, pretensamente ferido, à mais suave sombra, ao mais ligeiro roçar de asas de uma borboleta, mimos, escrúpulos, delicadeza excessivas, ilusões insignificantes desfeitas, possibilitem sejam extraídas da caixa de pandora do Direito centenas de milhares de cruzeiros”.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem reiteradamente decidido que a recusa de cobertura, quando fundada em interpretação razoável do contrato e da legislação aplicável, não configura ato ilícito apto a ensejar reparação por danos morais, ressalvadas as hipóteses de grave risco à saúde ou à vida do usuário.

Nesse sentido, conforme decidido no AgInt no REsp 1.904.488/PR, “a recusa de cobertura, quando fundada na interpretação do contrato de plano de saúde, não é apta a ensejar reparação por dano extrapatrimonial, ressalvadas as hipóteses de grave risco à saúde ou à vida do usuário”. (AgInt no REsp n. 1.904.488/PR, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 27/6/2022, DJe de 29/6/2022)

E ainda:

“AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PLANO DE SAÚDE. AUTISMO. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. CUSTEIO. RECUSA INDEVIDA. DANOS MORAIS PRESUMIDOS. IN RE IPSA. INEXISTÊNCIA.

  1. Discute-se nos autos acerca da caracterização dos danos morais decorrentes da negativa de cobertura pelo plano de saúde de tratamento a paciente diagnosticado com transtorno de espectro autista.
  2. Não configurados os danos morais in re ipsa, sendo fundamental que a indenização esteja lastreada no sério agravamento no quadro clínico do paciente ocasionado pela recusa, com risco à sua incolumidade física.
  3. Agravo interno não provido.” (AgInt no REsp n. 2.165.667/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 11/11/2024, DJe de 14/11/2024)

No caso em análise, não restou demonstrado nos autos que a negativa inicial tenha causado agravamento do quadro clínico da paciente ou risco à sua incolumidade física, elementos essenciais para a configuração de danos morais em casos de negativa de cobertura por planos de saúde.

Destarte, embora seja inquestionável a necessidade do tratamento e a obrigatoriedade atual de sua cobertura, a negativa inicial baseou-se em dúvida jurídica razoável quanto à interpretação da legislação então vigente, não caracterizando conduta ilícita capaz de gerar o dever de indenizar por danos morais.

Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso apenas para determinar que a apelada autorize e custeie o procedimento cirúrgico da apelante, incluindo os materiais solicitados pelo médico assistente.

Julgada parcialmente procedente a demanda, devem ser readequados os ônus sucumbenciais, na proporção de 50% para cada parte, respeitada eventual gratuidade judiciária.

É como voto.

Data da sessão: Cuiabá-MT, 30/10/2025

TJ/MG: Criança que sofreu acidente em escola será indenizada

Estudante de 8 anos foi atingido no rosto por telha em Santa Luzia.


Um estudante deve ser indenizado pelo Município de Santa Luzia por ter se acidentado em uma obra dentro da escola. A decisão, unânime, é da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que manteve decisão da Comarca de Santa Luzia.

O acidente foi registrado em julho de 2022. Segundo o processo, o garoto, de 8 anos, entrou na área sinalizada de obra, escorou em um tapume e foi atingido no rosto por uma telha de zinco. Ele sofreu diversos ferimentos e, como resultado, recebeu vários pontos e ficou com cicatriz permanente no rosto.

Representado pela mãe, o menino acionou o município na Justiça. Em 1ª Instância, o juízo condenou o Município de Santa Luzia a pagar R$ 30 mil em danos estéticos, R$ 20 mil em danos morais e R$ 345,99 em danos materiais.

O município recorreu argumentando que prestou todo o socorro necessário e que a culpa pelo acidente foi exclusiva da criança, que entrou em área isolada para manutenção e encostou em materiais da obra. Também apontou desproporcionalidade nos valores.

Negligência

O relator do recurso, desembargador Maurício Soares, manteve a decisão por considerar que houve negligência do poder público em supervisionar as crianças sob sua responsabilidade na escola:

“Resta comprovada a negligência do ente público, já que o aluno estava lanchando próximo à área da obra e conseguiu acessá-la sem que fosse impedido por qualquer responsável, ou seja, ocorreu falha da supervisão escolar, pelo que deve o município responder pelos danos.”

O magistrado destacou que, embora os depoimentos relatem que o estudante entrou em área sinalizada para obra, este fato “não afasta a responsabilidade do apelante, já que eventual comportamento inadequado possivelmente seria evitado caso os alunos estivessem sendo devidamente monitorados”.

A desembargadora Luzia Peixôto e o desembargador Jair Varão acompanharam o voto do relator.

TJ/RN: Estado é condenado a indenizar casal por falha em atendimento médico que resultou em óbito fetal

A 6ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal condenou o Estado do Rio Grande do Norte ao pagamento de indenização por danos morais devido a falhas em relação ao atendimento médico prestado durante a gestação de uma mulher. De acordo com as informações presentes no processo, as falhas culminaram no falecimento do filho esperado por um casal. A sentença é do juiz Francisco Seráphico da Nóbrega.

Segundo os autos, a mulher recebeu acompanhamento pré-natal na rede municipal, porém, no dia 23 de março de 2020, ela se sentiu mal e buscou atendimento no Hospital e Maternidade Presidente Café Filho, que fica em Extremoz. Após procedimentos na unidade hospitalar, a gestante foi orientada a ir até o Hospital Regional Alfredo Mesquita Filho, em Macaíba.

Foi relatado que se passaram horas até a mulher ser atendida, mesmo afirmando que estava sentindo dor. Ela foi medicada e recebeu alta no dia seguinte, ainda alegando desconforto. No dia 26 de março, a gestante voltou ao hospital localizado em Macaíba com dores e sangramento. Chegando lá, ficou constatado o óbito do feto, que foi confirmado após a realização de parto cesáreo.

Por sua vez, o Estado do Rio Grande do Norte alegou que não ficou comprovado o nexo causal entre a conduta médica e o falecimento do feto. A defesa afirmou que a mulher apresentava quadro de infecção urinária. Além disso, argumentou que quando a paciente voltou pela segunda vez ao hospital, o feto já estava sem vida.

No entanto, por meio da execução de um laudo pericial, ficou destacado a existência da demora de cerca de 58 horas entre a primeira admissão em unidade hospitalar e a realização da cesariana. Também ficou destacado que foi prescrito para a mulher um medicamento inadequado para o estágio gestacional. A perícia observou, ainda, a ausência de registros médicos que justificassem a não realização do parto cirúrgico já na primeira internação.

Para o magistrado responsável pelo caso, ainda que a causa exata do óbito não tenha sido determinada, “mesmo ausente a clareza quanto aos diagnósticos obtidos pelo médico, em decorrência da divergência com relação à constatação da necessidade de realização do parto cesáreo no relatado dos promoventes, a demora de prestação do atendimento, somada à prescrição de tratamento inadequado, assenta o dano moral sofrido pelos demandantes”, destacou.

Com isso, a Justiça reconheceu a responsabilidade civil objetiva do Estado e fixou a indenização por danos morais em R$ 40 mil para cada um dos autores.

TJ/PE: Cuidadora que ignorou criança por 12 minutos enquanto mexia no celular é condenada a 10 anos por morte

A Justiça de Pernambuco condenou a coordenadora do Hotelzinho Menino Jesus, em Belo Jardim, Agreste do Estado de Pernambuco, a dez anos de prisão pelo crime de abandono de incapaz qualificado pela morte, em razão do afogamento do menino Davi Carvalho Cavalcanti Melo, de três anos, ocorrido em 20 de maio de 2022. A decisão, assinada pelo juiz Leonardo Costa de Brito, descreve que a criança permaneceu por cerca de doze minutos sem supervisão adequada, tempo em que conseguiu ultrapassar uma grade metálica que separava a área interna do hotelzinho da piscina, caiu na água e se debateu até perder os sentidos, sem que a responsável percebesse o que acontecia.

Segundo o processo, momentos antes do acidente, uma das funcionárias havia levado Davi até a coordenadora, avisando que ele precisava ser observado. Mesmo assim, a ré continuou deitada em uma cama elástica, usando o celular, enquanto outra criança permanecia junto a ela. As imagens analisadas pela Polícia Civil mostraram que, durante todo o período em que Davi retirou a grade, caminhou até a área externa, aproximou-se da piscina, subiu na escada e caiu na água, a coordenadora permaneceu deitada, sem notar a movimentação. Um laudo da Polícia Científica confirmou que a grade instalada, comprada pela própria acusada, era improvisada, frágil e incapaz de impedir a passagem de crianças, funcionando, segundo o juiz, muito mais como uma sensação ilusória de segurança do que como barreira efetiva.

Na sentença, o magistrado rejeitou o pedido do Ministério Público para desclassificar o caso para homicídio culposo. Ele destacou que, ao assumir voluntariamente a função de coordenadora e permanecer no mesmo ambiente das crianças, a ré ocupava posição de garantidora — ou seja, tinha o dever legal e direto de vigilância e cuidado. Para o juiz, o abandono não exige que a pessoa se afaste fisicamente, bastando que ela deixe de exercer a vigilância mínima sobre quem está sob sua responsabilidade, o que ficou comprovado pelas imagens e pelos depoimentos colhidos. O juiz também ressaltou que a acusada tinha conhecimento prévio do risco, já que dias antes outra cuidadora havia impedido que o mesmo menino chegasse à área da piscina. Mesmo ciente disso, manteve a porta aberta para ventilação e continuou utilizando o celular, ignorando o perigo evidente.

Além da pena de prisão em regime inicial fechado, a coordenadora foi condenada a pagar R$ 100 mil de indenização mínima por danos morais aos pais da vítima, sendo R$ 50 mil para cada um, com correção monetária e juros. O juiz afirmou que a perda de um filho nessas circunstâncias configura dano moral evidente, que dispensa qualquer comprovação adicional. A acusada poderá recorrer em liberdade, já que respondeu solta a todo o processo e o magistrado não identificou motivos para decretar prisão preventiva no momento.

A sentença também determinou que o Ministério Público de Arcoverde seja comunicado, porque a ré afirmou, em interrogatório, ser proprietária de outro hotelzinho naquele município, que estaria funcionando sem licença. Para o juiz, essa informação aponta possível risco à segurança de outras crianças, justificando fiscalização imediata. Após o trânsito em julgado, será expedido mandado de prisão e a pena deverá ser cumprida na Colônia Penal Feminina de Buíque.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento
Init code Huggy.chat