Assédio Sexual: estudo da tipificação legal

Walter Gustavo da Silva Lemos

1. ASSÉDIO SEXUAL

Com o presente se pretende passar uma análise crítica sobre o delito trazido para o nosso ordenamento jurídico recentemente, abordando os temas relativos ao estudo analítico do delito, com as minúcias que formam este tipo penal.

1.1. Generalidades:

O homem sendo um animal sexuado, necessário foi que este instinto pela à ética e os costumes, precisando a legislação às vezes delinear tipos penais para que o homem exerça este instinto com liberdade, podendo livremente realizar as opções sobre quem e como se relacionar.

Com este intuito, a Lei n° 10.224, de 15 de março de 2001 trouxe uma inovação ao mundo jurídico brasileiro, alterando o Decreto-lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940, ao descrever como tipo penal o fato que conhecemos por ASSÉDIO SEXUAL.

Esta lei regulou este conduta, impondo a sua pena, bem como localizou o devido tipo penal no art. 216-A, Capítulo I do Título VI da Parte Especial do Código Penal.

O delito inovador veio confabular o rol dos crimes contra a liberdade sexual, estando localizado neste Código após o tipo descrito como Atentado ao pudor mediante fraude.

O assédio sexual já era um tipo que há muito era pedido pela população brasileira para que integrasse nosso arcabouço jurídico penal, vez que crescente era o uso do mesmo, posteriormente a revolução sexual feminina ocorrida após a década de 60.

O trabalho da mulher na sociedade ganhou grande proporção e com isto, aumentaram as moléstias que da relação de trabalho adviriam.

A lei em tela entrou em discussão no Legislativo brasileiro após a Constituição Federal de 05 de outubro de 1988, que declarou direitos iguais para os homens e mulheres.

A luta para que tal delito constasse de nosso Código Penal foi enorme, destacando a atuação das mulheres parlamentares que em muito contribuíram a tipificação deste fato.

Mas a jurisprudência pátria, através dos nossos tribunais, já vinha impondo penas neste tipo de ato, usando a analogia, a equidade e os princípios gerais do direito.

Estes tribunais usavam para a penalização dos infratores, analogicamente, os tipos descritos no art. 215 e 216 do Código Penal brasileiro, dependendo da conduta.

1.2. Conceito:

Assédio Sexual é o constrangimento sexual de alguém para outrem com o objetivo de obter conjunção carnal ou outro ato libidinoso, sendo que o agente utiliza o seu grau de superioridade para alcançar o seu objetivo.

A Lei n° 10.224/2001 a definiu o tipo como “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendências inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.

1.3. Objetividade jurídica:

O delito visa a proteção da liberdade sexual das pessoas de se relacionarem com quem deseje, resguardando a integridade física. Não necessitando sofrer constrangimento deste porte no seu local de trabalho.

Este tipo penal regulariza as relações que podem advir entre os patrões e empregados, ou entre superiores e os funcionários inferiores.

1.4. Sujeito ativo:

Neste ponto surge o grande ponto de controvérsia deste tipo penal, de que sexo poderia ser o sujeito ativo do assédio sexual?

A primeira vista, por uma análise mais simples, pensaríamos que somente o sexo masculino poderia ser passível do cometimento deste delito e, por conseguinte, o sexo feminino seria o sujeito passivo.

Mas se partirmos desta premissa estaremos excluindo que o assédio sexual poderia ser realizado por uma mulher em um homem, um homem em outro ou de uma mulher em outra.

Se olharmos por este ponto, veremos que as relações sexuais são dos mais variados tipos e com a criação deste delito, quis o legislador refutar os constrangimentos sexuais ocorrido sob ordem ou condição de trabalho, não delineando os sujeitos.

Desta forma, o sujeito ativo do delito de assédio sexual pode ser qualquer pessoa, independe de seu sexo.

Vencida a parte relacionada ao sexo de quem pratica, partamos para delinear sob quais poderes este deve estar rogado.

A lei enumerou que o crime deveria ocorrer “prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendências inerentes ao exercício de emprego, cargo e função”.

Neste sentido, somente pode praticar o delito de assédio quem é usa de sua condição de patrão, gerente, administrador, superior de função, entre outros, para tentar manter vantagem ou favorecimento sexual de seu funcionário, empregado, subalterno, etc.

Deve a pessoa, que é sujeito ativo do delito, exercer grau hierárquico superior, em cargo ou função pública, ou em relação empregatícia, que a vítima.

Desta forma, o delituoso usa de seu grau de superioridade para constranger a vítima. O delituoso usa de sua condição para conseguir a vantagem sexual que se lança.

Outro problema sobre o sujeito ativo do assédio sexual é o concurso de pessoas.

Vários são as condutas que descrevem este crime, mas o concurso de agentes se aplica ao delito?

A co-autoria é aquele que concorre com vários agentes para a prática de infração penal, como descreve o art. 25 do CP “quem de qualquer modo concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas”.

Para o delito em análise, a co-autoria é possível, vez que outras pessoas podem incidir no nexo causal do delito para ajudar o sujeito ativo do delito no seu intento.

Já a figura do partícipe não se aplica a este delito, pois não há possibilidade de a ocorrência de participação com atos lícitos no intuito do tipo que não seja o do próprio ato.

Neste sentido devemos lembrar que este delito é crime de mera conduta, ou seja, basta o constrangimento para que se configure o crime, fato que afasta a possibilidade de participação.

1.5.Sujeito passivo:

Ainda em relação ao sujeito passivo, devemos lembrar que este é a vítima do delito.

Para a figuração do sujeito passivo, devemos descrever os requisitos deste sujeito, sendo ele inferior hierárquico ao sujeito ativo (subordinação), que mantenha relação de trabalho com aquele e que seja constrangido com o intuito sexual.

Deste fato surge um ponto que gera discussão, a vítima deve ser subordinado ao sujeito ativo em relação empregatícia ou em cargo e função pública, ou também poderia ser trabalhador avulso, prestador de serviço ou de estágio legal?

De acordo com o texto legal, vemos que o legislador impôs descrição de “exercício de emprego, cargo ou função”, mas podemos interpretar extensivamente a norma para que as pessoas acima citadas sejam sujeito passivo deste tipo penal.

O trabalhador avulso, que é aquele que é contratado para trabalho certo, como define a Portaria n° 3107/71 do extinto MTPS, “entende-se como trabalhador avulso, no âmbito do Sistema Geral da Previdência Social, todo o trabalhador sem vínculo empregatício que, sindicalizado ou não, tenha a concessão de direitos de natureza trabalhista executada por intermédio da respectiva entidade de classe”.

Já a CLT o define no seu art. 4, alínea ‘e’ como “o que presta serviços a diversas empresas, agrupado, ou não, em sindicato, inclusive os estivadores, conferentes e assemelhados”.

Desta forma, se estiver em trabalho e sofrer o constrangimento de assédio sexual, estará portando-se como vítima, pois compreende relação de subordinação com o sujeito ativo.

Quanto o prestador de serviços, se contínuo, estará sujeito a mesma relação de constrangimento, até porque depende do contrato de serviço com o sujeito ativo, podendo se definir este ato como subordinação.

O estágio, ou seja, o serviço prestado por estagiário, que é definido pela Lei n° 6494/77, no qual a pessoa exerce o trabalho sem o vínculo empregatício, com a finalidade de aprendizagem, percebendo vantagem financeira, tendo acompanhamento da instituição de ensino, vemos também a ocorrência do tipo penal, ante a existência de subordinação.

Quanto ao sexo que da pessoa vítima, esta questão ficou bem mostrada no item do sujeito ativo, pois qualquer dos sexos pode ser sujeito ativo ou passivo.

1.6. Tipo objetivo

A conduta típica é a de constranger (apertar, coagir física ou moralmente, compelir) outrem com o objetivo de obter vantagem ou favorecimento sexual. O tipo penal visa a coibir o uso da situação de superior em emprego, cargo ou função pública para a obtenção de favores sexuais de seus subalternos.

1.7. Tipo subjetivo:

O delito em questão somente recepciona a conduta descrita como dolo, não admitindo a culpa. Este ato é de mera conduta, ou seja, a sua pratica já estabelece a ocorrência do delito.

1.8.Consumação e tentativa:

Consuma-se o delito com o constrangimento da vítima, independentemente de outra situação, sendo que a simples exposição da idéia ou expressão tácita da vontade já é a figura do delito.

Quanto à tentativa, esta não é vislumbrada no assédio sexual, pois o constrangimento, que é o ato delituoso expressamente, consubstancia com a expressão da vontade. Se o agente não a expressa por motivos alhures à sua vontade, não estará cometendo o delito.

1.9. Ação penal:

Seguindo a exegese do art. 225 do Código Penal, o delito de assédio sexual é apurado pela ação privada, pois este artigo descreveu que “nos crimes definidos nos capítulos anteriores, somente se procede mediante queixa”.

Como o delito figura no capítulo antecedente ao do art. 225, entende-se que a regra deve ser seguida.

Referência bibliográfica:

Bastos, Celso Ribeiro. Comentário à Constituição do Brasil. São Paulo, Ed. Saraiva, 1998, 19ª edição.

Consulex, Editora. Assédio Sexual nas relações do trabalho. Vários, Brasília, 2001, 1ª edição.

Jesus, Damásio Evangelista de. Direito Penal. São Paulo, Ed. Saraiva, 2001, vol.2.

Mirabete, Julio Fabbrini, Direito Penal. 10° ed., São Paulo, Atlas, 2000, vol. 2

Moraes, Leida. Assédio Sexual – sistema de dominação remanescente. Internet: http//www.secretariaonline.com.br/artigos/art12.htm, 1994.

Walter Gustavo da Silva Lemos é advogado.

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