TRT/SP: IFood é condenado por dispensa discriminatória de funcionária com espectro autista

Sentença oriunda da 5ª Vara do Trabalho de Osasco-SP reconheceu como discriminatória a dispensa de profissional de marketing com transtorno do espectro autista (TEA) pouco depois de seu diagnóstico chegar ao conhecimento dos superiores na iFood. A decisão condenou a empresa a pagar indenização em dobro dos salários referentes ao período desde a rescisão contratual até a publicação da sentença, além de R$ 30 mil por danos morais.

Ao saber da condição da trabalhadora, a companhia classificou a vaga da funcionária como pertencente à cota de pessoa com deficiência (PCD). Pouco depois de um mês, dispensou-a sem justa causa. Em juízo, alegou que a decisão se baseou em reestruturação da área de marketing da organização, que teria sido reduzida de 51 para 45 funcionários.

As provas nos autos, no entanto, demonstram que a trabalhadora foi a única de seis funcionários no setor a ser desligada. Segundo a juíza prolatora da sentença, Adriana de Cássia Oliveira, a justificativa apresentada para o desligamento, baseada em adequação cultural, é insuficiente para validar a tese defensiva de uma reestruturação ampla e impessoal. “A generalidade e a falta de especificidade na demonstração da necessidade de desligamento […] minam a credibilidade da tese”, afirmou.

A magistrada destaca que, em um dos depoimentos a favor da reclamada, os critérios apontados para a dispensa foram “nota em cultura”, colaboração, inovação, ambidestria e capacidade de resolução de problemas “do jeito iFood de Trabalhar”. “Esses critérios, por sua natureza subjetiva, são intrinsecamente passíveis de serem influenciados pelas limitações descritas no Laudo Caracterizador de Deficiência da reclamante, especialmente as relativas à socialização, interação em ambientes sensoriais e excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados”.

A decisão se baseia na Lei Antidiscriminação no Trabalho (Lei nº 9.029/95), que traz um rol exemplificativo de discriminações, e na Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (12.764/2012), que confirma a condição de PCD para pessoas com TEA. Menciona ainda o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que responsabiliza as empresas sobre acessibilidade e inclusão no ambiente de trabalho, e a Lei nº 8.213/91, que estabelece que a dispensa imotivada de PCD só pode ser realizada após contratação de outro trabalhador com deficiência ou beneficiário reabilitado da Previdência Social.

A juíza determinou ofícios ao Ministério Público do Trabalho e à Superintendência Regional do Trabalho e Emprego para conhecimento das irregularidades.

Cabe recurso.

TRT/MT: Justiça anula justa causa e condena agropecuária por assédio sexual praticado por supervisor

A empresa ignorou denúncias de assédio e não adotou medidas previstas na Lei da Cipa para prevenir assédio, descumprindo o dever de garantir ambiente seguro às mulheres.


Uma auxiliar de classificador de grãos que atuava na região de Sapezal teve reconhecido o direito à indenização por danos morais e à reversão da demissão por justa causa, após comprovar que foi vítima de assédio sexual e agressão física no ambiente de trabalho. A decisão é da Vara do Trabalho de Campo Novo do Parecis/MT, que reconheceu a negligência da empresa e fixou a indenização em R$ 30 mil.

A sentença concluiu que a dispensa foi injusta e ocorreu após a empregada denunciar o comportamento abusivo do supervisor. Ao julgar o caso, a juíza Graziele de Lima afirmou que o assédio sexual, agravado pela agressão física e pela demissão por justa causa, “gera evidente sofrimento e aflição psicológica com repercussão na intimidade, na vida privada e profissional, na honra e na imagem da trabalhadora”.

A empresa alegou que a dispensa ocorreu porque a funcionária mantinha um relacionamento amoroso com o agressor. Afirmou ainda que não houve assédio e que só tomou conhecimento da relação após a agressão. Segundo a defesa, a orientação da empresa é para que os empregados evitem intimidades no ambiente de trabalho, conforme previsto no regimento interno.

Contratada em janeiro de 2023, a auxiliar foi dispensada em março de 2024, dias após um episódio de agressão envolvendo seu superior. Em depoimento à Justiça, ela negou qualquer relacionamento amoroso com o supervisor. Contou que chegaram a sair juntos uma vez, como amigos, mas ao perceber comportamentos ciumentos e agressivos, recusou qualquer envolvimento afetivo.

A partir disso, passou a ser alvo de perseguições, “brincadeiras” com conotação sexual e tentativas de aproximação física, que a constrangiam. Segundo o relato, mesmo com as recusas, o supervisor — valendo-se da posição hierárquica — mantinha a trabalhadora sob vigilância constante e demonstrava ciúmes em relação aos demais colegas. Ela afirmou que chegou a relatar o assédio ao encarregado geral da empresa, mas nenhuma medida foi tomada.

A situação culminou em um episódio de agressão, em março de 2024. Enquanto auxiliava outros colegas em uma tarefa, a pedido de outro superior, foi abordada pelo supervisor, que demonstrou ciúmes ao vê-la próxima a outros empregados. Ao recusar um “abraço”, foi empurrada contra a parede e teve os braços segurados com força. O ataque foi registrado por câmeras e confirmado por exame de corpo de delito, que apontou hematomas. Pouco tempo depois, ela foi dispensada por justa causa.

A sentença concluiu que a dispensa foi injusta e ocorreu após a empregada denunciar o comportamento abusivo do supervisor. Ao julgar o caso, a juíza Graziele de Lima afirmou que o assédio sexual, agravado pela agressão física e pela demissão por justa causa, “gera evidente sofrimento e aflição psicológica com repercussão na intimidade, na vida privada e profissional, na honra e na imagem da trabalhadora”.

Para a magistrada, o vídeo e as demais provas confirmam a versão da trabalhadora, além de evidenciar a omissão da empresa diante das denúncias. Ela destacou que a agressão física ocorreu no contexto do assédio e que as provas demonstram que ela ocorreu em razão de ciúmes do supervisor.

Programa Emprega + Mulheres

Conforme ressaltou a juíza, é dever do empregador adotar medidas para assegurar um ambiente de trabalho seguro e saudável. Essa obrigação, prevista na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), foi reforçada pela Lei 14.457/2022, conhecida como Lei da CIPA, que instituiu o Programa Emprega + Mulheres. A norma determina a adoção de políticas de prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no trabalho, com o objetivo de promover a inserção e a permanência das mulheres no mercado.

A legislação estabelece uma série de ações voltadas à igualdade de gênero, incluindo a flexibilização de jornadas, criação de canais de denúncia, capacitação de equipes e divulgação de regras de conduta nas empresas. A decisão judicial ressalta que a empresa não comprovou o cumprimento de nenhuma dessas medidas, como exige a legislação.

A magistrada entendeu que a empresa agiu com negligência e deve ser responsabilizada. Ela lembrou que a responsabilidade também se estende de forma objetiva (independentemente de culpa) quando os atos são praticados por prepostos, conforme previsto no Código Civil. “Assim, sob qualquer prisma que se analise a questão, a reclamada é responsável pelos danos sofridos pela parte autora”, afirmou.

Com base no Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a magistrada aplicou a inversão do ônus da prova quanto à alegação de assédio sexual. No entanto, a empresa não apresentou comprovação do cumprimento das exigências da Lei da CIPA, tampouco demonstrou a existência do relacionamento amoroso que alegava justificar a demissão por justa causa.

A juíza também ponderou que as fotos anexadas ao processo não eram suficientes para provar um vínculo afetivo entre a trabalhadora e o supervisor. “As imagens retratam apenas um determinado momento, e o fato de a vítima eventualmente ceder às investidas do assediador não descaracteriza o assédio sexual”, destacou. Uma testemunha ouvida no processo reforçou esse entendimento ao afirmar que, “na empresa e para os demais funcionários, ninguém sabia se ambos tinham algum tipo de relacionamento”.

Reversão da Justa Causa

Diante das provas e da ausência de medidas preventivas por parte da empresa, a magistrada concluiu que não era possível justificar a demissão por justa causa com base em uma suposta relação afetiva. “Não tendo a empresa tomado medidas para evitar o assédio, tampouco para receber e apurar denúncias, não pode simplesmente demitir a autora sob alegação, sem provas robustas, de que mantinha relacionamento com o agressor”, finalizou.

A sentença condenou a agropecuária a pagar as verbas rescisórias à ex-empregada, incluindo aviso prévio, 13º salário e férias proporcionais, multa de 40% sobre o FGTS e a multa pelo atraso na quitação dessas verbas. Também determinou a expedição de guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego.

Por se tratar de decisão de primeiro grau, cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT/MT).

PJe 0000839-79.2024.5.23.0111

TRT/MS afasta responsabilidade de empresa por acidente de trabalho na cozinha

A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região reformou, por unanimidade, a decisão que havia reconhecido a responsabilidade de uma empresa pelo acidente de trabalho sofrido por uma oficial de cozinha e deferido indenização por dano moral e estético.

A trabalhadora foi contratada em julho de 2020 para preparar alimentos e bebidas, incluindo café, para cerca de 400 colaboradores. Em maio de 2022, ao coar café, a garrafa encheu além do limite e, ao puxá-la, o líquido quente derramou sobre seu antebraço direito, causando uma queimadura.

O relator do processo, Desembargador André Luís Moraes de Oliveira, concluiu que a atividade desempenhada pela empregada não apresentava risco acentuado e não exigia treinamento especial.
Além disso, destacou que o uso de luvas térmicas não evitaria o acidente, pois a queimadura foi provocada pelo ato de puxar a garrafa cheia e derramar o café fervente.

Dessa forma, o magistrado considerou que houve culpa exclusiva da vítima, afastando a responsabilidade da empresa e, consequentemente, o dever de indenizar.

Hora Extras e Adicional Noturno

A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região manteve a condenação da empresa ao pagamento de horas extras, adicional noturno e intervalo intrajornada. A decisão considerou o conjunto probatório dos autos consistente nos registros de ponto e no depoimento de testemunhas.

A trabalhadora alegou que exerceu suas funções de segunda a sábado, das 14h às 23h, sem intervalo para descanso e refeição, e que, a partir de janeiro de 2021, passou a trabalhar das 4h às 13h, também sem pausa intrajornada. Em sua defesa, a empresa apresentou cartões de ponto dos meses de setembro e outubro de 2022. O relator considerou os controles válidos, pois continham registros variáveis e foram confirmados por prova testemunhal. Com base nesses documentos, a jornada da reclamante foi fixada das 4h às 14h50, de segunda a sábado, durante todo o vínculo empregatício.

Quanto à supressão do intervalo, uma testemunha relatou que a trabalhadora não o usufruía para almoçar sentada no refeitório, à medida que fazia suas refeições de pé e enquanto lavava louça. Além disso, os poucos recibos de pagamento apresentados pela defesa não comprovaram a quitação das horas extras e do adicional noturno, mesmo havendo registros de trabalho à noite.

Diante disso, o Desembargador André Luís Moraes de Oliveira deu parcial provimento ao recurso da empresa, determinando que as horas extras fossem apuradas com base nos espelhos de ponto apresentados e, para os períodos, cujos registros são inexistentes, com base na jornada arbitrada.

Processo 0024053-05.2024.5.24.0101

TST reafirma tese que garante redução de horário de trabalho a empregados públicos pais e mães de crianças autistas

Tribunal rejeitou recurso da Caixa contra tese vinculante definida em maio.


O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou, na última segunda-feira (30), um recurso da Caixa Econômica Federal contra a fixação da tese jurídica de que o funcionário público com filho com transtorno do espectro autista (TEA) tem direito à redução de jornada sem alteração salarial.

A tese foi firmada em maio deste ano, num recurso repetitivo envolvendo a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). O entendimento já estava pacificado nas oito Turmas do TST, mas o grande número de recursos em razão de divergências entre os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) levou o presidente do Tribunal, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, a propor a utilização da sistemática das demandas repetitivas para aumentar a segurança jurídica e reduzir a litigiosidade. A proposta foi aprovada por unanimidade, e a tese aprovada, de observância obrigatória, foi a seguinte:

O funcionário público que possui filho com Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem direito à redução de jornada, sem acréscimo proporcional de salários e independentemente de compensação de horário, nas hipóteses dos §§ 2º e 3º do artigo 98 da Lei nº 8.112/1990, de aplicação analógica.

Contra a decisão, a Caixa Econômica Federal (CEF), na condição de terceiro interessado, apresentou embargos de declaração alegando omissão no julgamento. Segundo a empresa, a tese, nos moldes em que foi firmada, invalidaria seu acordo coletivo de trabalho (ACT) 2024/2026, que impõe limites para a redução da carga horária de empregado com filho autista.

O relator, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, porém, explicou que a discussão da tese se limitou às premissas fáticas delineadas no caso concreto julgado, que não envolvia questão jurídica relacionada à negociação coletiva. “Essa matéria deverá ser comprovada em caso concreto específico, o que não é possível nestes autos”, concluiu.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-0000594-13.2023.5.20.0006

TRF4: Caixa parará FGTS a trabalhadora demitida por não comprovar que ela optou por saque-aniversário

A 2ª Vara Federal de Passo Fundo (RS) condenou a Caixa Econômica Federal (CEF) a retificar o cadastro de uma trabalhadora no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e a levantar o saldo depositado em sua conta. A sentença, publicada no dia 30/6, é do juiz Moacir Camargo Baggio.

A autora narrou que foi contratada por uma empresa em setembro de 2009 e demitida sem justa causa em maio do ano passado. Afirmou que, ao tentar sacar o saldo do FGTS no valor de R$ 54.119,68, a CEF não permitiu sob a falsa alegação de que havia contratado a modalidade saque-aniversário. Sustentou que tentou resolver a questão na via administrativa, mas não teve êxito.

Ao analisar os autos, o magistrado pontuou que, com o advento da Lei nº 13.932/2019, que alterou a Lei nº 8.036/90, o trabalhador poderá optar por uma das sistemáticas de saque: saque-rescisão ou saque-aniversário. No primeiro caso, ele poderá receber o saldo de sua conta vinculada relativamente ao contrato de trabalho extinto. Já no segundo, ele poderá receber, anualmente, no mês do seu aniversário, parte do saldo do seu FGTS.

Segundo Baggio, a legislação define que “em caso de opção pela sistemática saque-aniversário, não é devida a movimentação da conta vinculada de FGTS na hipótese de despedida sem justa causa. Nesse caso, o trabalhador terá direito apenas à movimentação da multa rescisória”.

O juiz verificou, a partir dos elementos trazidos pela Caixa, que há fortes indícios de que a inclusão da autora na modalidade saque-aniversário ocorreu de forma automática e interna pela ré. Ele mencionou que o endereço do IP referente ao cadastro no FGTS encontra-se “possivelmente” na sede da própria CEF, na região central de Passo Fundo, enquanto o endereço da autora fica longe dessa área. O usuário cadastrado é “CAIXATEM”, além disso não há porta de acesso, e-mail registrado, id do dispositivo, telefone, certificação digital ou conteúdo de autenticação.

“Ou seja, todos os elementos que integram o cadastro da autora são genéricos, nada havendo de específico que possa comprovar que a demandante efetivamente tenha aderido à modalidade saque-aniversário”, destacou Baggio. Ele ainda ressaltou que cabia à CEF provar a ausência de defeito nos serviços, o que não aconteceu, sendo “forçoso reconhecer que a autora NÃO OPTOU pela modalidade de saque-aniversário”.

O juiz julgou parcialmente procedente a ação condenando a Caixa a realizar a retificação do cadastro da autora para a opção saque-rescisão e realizar o levantamento do valor de R$ 54.119,68, devidamente corrigido. Cabe recurso às Turmas Recursais.

TRT/RS: Trabalhador negro chamado de “macaco” por supervisor será indenizado

Resumo:

  • Um auxiliar de serviços gerais foi chamado de “macaco” por seu supervisor enquanto realizava limpeza, diante de outros empregados. Após o episódio, ele não retornou ao trabalho e pediu demissão.
  • A 5ª Vara do Trabalho de Canoas reconheceu a injúria racial e aplicou o Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial do CNJ, destacando o dever da magistratura de considerar o contexto de racismo estrutural.
  • A 8ª Turma do TRT-RS confirmou a condenação e elevou o valor da indenização de R$ 30 mil para R$ 60 mil, considerando o caráter compensatório, pedagógico e preventivo da medida.

Um auxiliar de serviços gerais que foi chamado de macaco pelo superior hierárquico deve receber uma indenização por danos morais. A reparação foi fixada em R$ 60 mil pela 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS).

A decisão unânime do colegiado manteve em parte a sentença do juiz Eliseu Cardozo Barcellos, da 5ª Vara do Trabalho de Canoas. A Turma apenas aumentou o valor da indenização, originalmente fixado em R$ 30 mil.

De acordo com o processo, o trabalhador realizava a limpeza de um ambiente e subiu em uma prateleira para alcançar uma área mais alta. Na presença de outros trabalhadores — inclusive homens negros —, o supervisor teria gritado: “Desce daí, macaco!”. Após o episódio, o trabalhador não retornou ao serviço e pedou demissão. A ofensa foi confirmada por uma testemunha ouvida no processo.

A sentença de primeiro grau destacou que a expressão “macaco” é reconhecida pela jurisprudência como insulto de cunho racial, com histórico discriminatório dirigido à população negra. Para o julgador, a prova testemunhal demonstrou a ocorrência de injúria racial, apta a gerar dever de indenizar por danos morais.

O magistrado aplicou ao caso o Protocolo de Julgamento com Perspectiva Racial do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Segundo o juiz, o Protocolo obriga a magistratura a adotar postura ativa e sensível ao contexto de racismo estrutural, inclusive no tocante à redistribuição do ônus da prova e reconhecimento de presunções fundadas em assimetrias sociais históricas.

Ambas as partes recorreram ao TRT-RS. O relator do caso na 8ª Turma, juiz convocado Frederico Russomano, confirmou a sentença. Nessa linha, o magistrado entendeu que o preposto dirigiu ao empregado um xingamento com conotação racista, configurando injúria racial passível de indenização por dano moral, sendo presumido o abalo psíquico sofrido pelo trabalhador.

A Turma entendeu razoável aumentar o valor da indenização, tendo em vista o caráter compensatório, pedagógico e preventivo, sem causar enriquecimento injustificado. Além do relator, participaram do julgamento o juiz convocado Edson Pecis Lerrer e o desembargador Marcelo José Ferlin D’Ambroso. Cabe recurso do acórdão para o Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Pedido de demissão

No mesmo processo, o autor buscou reverter o pedido de demissão para uma rescisão indireta do contrato por falta grave do empregador. Isso lhe daria direito às mesmas verbas rescisórias da despedida sem justa causa. No entanto, o pedido foi negado no primeiro grau, e ele não recorreu ao TRT-RS quanto a este item.

“Esclareço que, a despeito do reconhecimento de ato ilícito cometido por preposto presente no ambiente laboral, tal fato não é suficiente, por si só, para configurar o vício de vontade na assinatura do pedido de rescisão. Ao se sentir prejudicado, o trabalhador pode recorrer ao Judiciário para sanar os prejuízos decorrentes de eventuais irregularidades, como de fato assim procedeu o reclamante. Além disso, o reclamante declarou que o desligamento se deu “por motivos exclusivamente pessoais”, e não em razão do ato ilícito sofrido no ambiente de trabalho”, destacou o juiz Eliseu na sentença.

TRT/SP reconhece responsabilidade de empregadores por morte de trabalhador por agrotóxicos

A 11ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região reconheceu o nexo causal entre a atividade laboral e o óbito de um trabalhador rural de 23 anos, falecido em decorrência de contaminação por agrotóxicos. O Juízo da Vara do Trabalho de Capão Bonito/SP tinha julgado improcedentes os pedidos. A decisão colegiada, porém, reformou a sentença, e destacou falhas graves na proteção à saúde do trabalhador, inclusive pelo não fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados.

O laudo técnico pericial confirmou que a vítima exercia atividades na agricultura de tomate, com exposição habitual a substâncias químicas altamente tóxicas, como Malathion e Klorpan 480 EC. Também foi constatado que os empregadores não forneceram luvas nitrílicas e não realizaram a substituição periódica dos EPIs. A decisão colegiada destacou, ainda, que não houve apresentação do Programa de Gerenciamento de Riscos no Trabalho Rural (PGRTR) e não foi realizado o monitoramento da saúde ocupacional com exames específicos. Além disso, não há evidências de que o empregado tenha recebido treinamento adequado para o desempenho da função.

O falecimento do trabalhador ocorreu um dia após ter procurado atendimento médico, com sintomas compatíveis com intoxicação aguda. Embora o atestado de óbito não mencione especificamente intoxicação química, os sintomas clínicos foram considerados compatíveis com os efeitos dos produtos utilizados no ambiente de trabalho. “O desfecho fatal após atendimento médico no dia anterior, com sintomas que incluíam dores abdominais e tosses com secreção de sangue, reforça a conclusão de intoxicação aguda, com especial consideração à juventude e prévia boa saúde do trabalhador”, pontuou o relator do acórdão, desembargador João Batista Martins César.

Com esses fundamentos, a 11ª Câmara reconheceu o nexo causal entre o trabalho com exposição a agrotóxicos e o falecimento do empregado. A responsabilidade dos empregadores foi determinada pela violação do direito fundamental à vida, à saúde e ao meio ambiente de trabalho equilibrado. O acórdão fixou o pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais no valor de R$ 100 mil, a ser dividida em partes iguais entre a companheira do trabalhador e o filho menor do casal, que à época contava com apenas um ano de idade. Além disso, o colegiado deferiu o pedido de pagamento de pensão mensal ao filho, no valor de um salário mínimo, até que ele complete 18 anos.

A Câmara julgadora ressaltou, ainda, que a morte do trabalhador também configura hipótese de dano existencial, diante da ruptura abrupta do convívio entre pai e filho em fase crucial de desenvolvimento. Os magistrados orientaram sobre a importância de que a doutrina e a advocacia avance nesse novo instituto, como forma efetiva de proteção à criança.

Processo n. 0010107-46.2024.5.15.0123

TRT/MG afasta vínculo empregatício entre enfermeira e empresa de assistência domiciliar

Os julgadores da Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG) mantiveram sentença que não reconheceu o vínculo empregatício entre uma trabalhadora e uma empresa que oferece serviços de assistência de enfermagem domiciliar. Por unanimidade, foi acolhido o voto do relator, desembargador Marcelo Moura Ferreira, que negou provimento ao recurso da autora.

A reclamante prestava serviços de enfermeira/cuidadora a terceiros, por intermédio da empresa. Pretendeu o reconhecimento da relação de emprego, alegando que trabalhou para a ré de junho/2022 a outubro/2023, em escala de 12×36 horas, recebendo R$ 120 por plantão, acrescentando que a empresa exigia dela a apresentação de relatórios diários e assinatura de ponto. Mas, segundo o estabelecido na decisão, as provas apresentadas revelaram que a autora desenvolvia suas atividades como profissional autônoma, sem a presença dos pressupostos fático-jurídicos da relação de emprego.

O relator ressaltou que, para a configuração do vínculo de emprego, torna-se necessária a presença dos pressupostos previstos no artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), quais sejam: prestação de serviço por pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação jurídica.

Na análise do caso, foi considerado que a reclamante prestava serviços por meio da emissão de notas fiscais, sem qualquer objeção por parte dela, conforme provado por conversas em aplicativos de mensagens e documentos anexados aos autos. Além disso, pelas notas fiscais e comprovantes de pagamento, o relator verificou que os plantões não eram realizados de forma regular durante o mês, apontando, como exemplo, a realização de apenas cinco plantões em um mês e sete em outro, o que afastou a habitualidade necessária ao reconhecimento da relação de emprego.

Outro ponto destacado na decisão foi a ausência de subordinação jurídica, uma vez que a reclamante podia recusar plantões e tinha autonomia na execução dos serviços. Conversas via aplicativo WhatsApp demonstraram que a empresa oferecia oportunidades de trabalho, perguntando sobre a disponibilidade da enfermeira, sem impor ordens diretas ou diretrizes obrigatórias, que seriam próprias do poder diretivo do empregador. Inclusive, em uma oportunidade, em conversa mantida com a sócia da empresa, a reclamante recusou o plantão, o que, segundo o relator, revela a autonomia na prestação de serviços.

“Não havia, na relação ocorrida entre as partes, a subordinação jurídica necessária à configuração do vínculo de emprego”, concluiu o relator. Diante das circunstâncias apuradas, o colegiado negou provimento ao recurso da reclamante para manter a decisão de primeiro grau. Ao final, o juiz de primeiro grau homologou um acordo celebrado entre as partes.

Processo PJe: 0010200-83.2024.5.03.0174 (ROT)

TRT/RN reconhece rescisão indireta de trabalhadora por irregularidades nos depósitos do FGTS

A Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (RN) reconheceu a rescisão indireta de ex-empregada de empresa terceirizada que prestava serviços para uma distribuidora de alimentos.

Isso porque as empresas não cumpriram a obrigação de depositar regularmente o FGTS, tendo havido atrasos e ausência de depósitos em alguns meses.

No caso, a trabalhadora foi contratada em setembro de 2023 para prestar serviços à distribuidora, ocupando o cargo de auxiliar nos serviços de alimentação.

No seu voto, o relator do processo, desembargador José Barbosa Filho, utilizou a decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), de 24 de fevereiro deste ano, Tema 70 (RRAg- 1000063-90.2024.5.02.0032), enquadrada no rito dos recursos repetitivos.

No Tema 70, ficou definido que “a irregularidade no recolhimento dos depósitos de FGTS revela descumprimento de obrigação contratual, nos termos do art. 483, ‘d’, da CLT, de gravidade suficiente para configurar a rescisão indireta do contrato de trabalho”.

O relator ressaltou, ainda, que antes mesmo do Tema 70, o TST já havia sedimentado sua jurisprudência no sentido de que a irregularidade no recolhimento do FGTS possui gravidade suficiente a justificar a rescisão indireta. Ele apresentou também decisões de sua relatoria no mesmo sentido em outras ações.

Como prova das irregularidades nos depósitos do FGTS, passíveis de rescisão indireta, o desembargador destacou o extrato da conta vinculada da trabalhadora, revelando que houve atraso no recolhimento dos depósitos referentes aos meses de fevereiro e abril de 2024, além da ausência de recolhimento dos depósitos de junho e julho de 2024.

Além disso, as empresas não compareceram à audiência na Justiça do Trabalho, não justificaram a ausência e nem apresentaram defesa.

A rescisão indireta tem o efeito de uma dispensa sem justa causa feita pela empresa, garantindo ao empregado os mesmo direitos às verbas rescisórias de uma dispensa sem justa causa (parcelas de férias e 13º salário, seguro desemprego…).

A decisão da Segunda Turma do TRT-RN foi por unanimidade e manteve o julgamento original da 2ª Vara do Trabalho de Mossoró.

Processo nº 0000649-79.2024.5.21.0012

TRT/DF-TO mantém justa causa de motorista que abandonou ônibus em viagem interestadual

A Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) manteve a demissão por justa causa aplicada a um motorista de ônibus que interrompeu uma viagem interestadual, deixando os passageiros na estrada, após se recusar a cumprir o trajeto previsto. A decisão foi tomada na sessão de julgamentos realizada no último dia 2 de julho.

De acordo com o processo, o trabalhador foi demitido em agosto de 2023, após interromper por conta própria uma viagem de Brasília (DF) a São Paulo (SP). O condutor parou o veículo em Cristalina (GO), fora dos pontos de parada autorizados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), sob alegação de cansaço físico e falta de condições de trabalho. Ele comunicou aos passageiros que não continuaria a viagem, afirmou sentir vergonha de representar a empresa e incentivou a divulgação do protesto por meio de vídeo nas redes sociais. Outro motorista foi chamado às pressas para seguir com o trajeto.

O trabalhador recorreu ao TRT-10 contra decisão da 1ª Vara do Trabalho de Taguatinga (DF), que já havia reconhecido a validade da demissão por justa causa e, inclusive, o condenou ao pagamento de indenização por danos morais à empresa. No recurso, o ex-empregado alegou que agiu em legítima defesa da própria saúde e segurança dos passageiros, pois estaria exausto. Disse ainda que não abandonou o veículo, mas apenas aguardou a substituição por outro motorista. Defendeu que sua conduta foi motivada por um abuso do poder diretivo da empresa, que teria negado uma parada razoável para alimentação e descanso.

A empresa, por sua vez, sustentou que o motorista desrespeitou ordens superiores e violou o plano de viagem aprovado pela ANTT. Destacou que a parada solicitada pelo condutor não era autorizada e que a atitude comprometeu gravemente sua imagem institucional, gerando repercussão negativa na imprensa e nas redes sociais.

Para o relator do processo na Terceira Turma do Regional, desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, as provas do processo, inclusive vídeos gravados pelo próprio trabalhador e publicados nas redes sociais, demonstram que a conduta foi insubordinada e de grande gravidade. Segundo o magistrado, a interrupção precoce da viagem sem autorização e as críticas públicas à empresa configuraram mau procedimento, nos termos do artigo 482, alínea “b”, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o que justifica a justa causa.

“No caso, considero que a conduta do autor possui gravidade capaz de derrogar a fidúcia do empregador e dispensa a demonstração da aplicação de penalidades graduais. Decerto que o autor desenvolve atividade de risco e os encargos da profissão exigem que este atue sempre com muita responsabilidade para não afetar a segurança pessoal, dos passageiros e de terceiros. Assim, ao perceber sinais de sono, desconcentração, fraqueza ou qualquer outro sintoma de mal-estar súbito, o profissional deve, por precaução, parar o veículo de modo controlado em local seguro e comunicar o gestor da falta de condições de saúde para prosseguir a viagem e, se necessário, solicitar socorro médico. Sendo assim, eventual acidente gerado pelo esgotamento ou cansaço enseja a responsabilização civil do motorista que, portanto, deve adotar medidas preventivas de asseguramento de bens materiais e de vidas” assinalou o magistrado em voto.

O relator também rejeitou os argumentos de que a atitude do motorista se deu por motivo de saúde ou em exercício legítimo do direito do trabalhador de se opor a ordens abusivas. Conforme o entendimento do desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, o trabalhador não apresentou sinais de exaustão antes de assumir o turno nem buscou atendimento médico. “O quadro fático não revela que o autor deixou seu posto por motivos de saúde, mas sim por insatisfação pessoal, em desobediência ao plano de viagem estabelecido”, concluiu.

A Turma também negou os pedidos do trabalhador referentes ao pagamento de horas extras, alegando que os registros de ponto eram válidos e que ele não demonstrou claramente quais jornadas teriam sido extrapoladas sem compensação ou pagamento. Além disso, foi mantida a condenação do motorista ao pagamento de indenização por danos morais à empresa no valor de R$ 3 mil, por ter exposto publicamente a empregadora com acusações não comprovadas.

A decisão foi unânime.

Processo nº 0000942-79.2024.5.10.0101


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