TRF3 desobriga Latam de assistência a imigrantes no aeroporto de Guarulhos

União é declarada responsável por atender às necessidades de estrangeiros enquanto aguardam apreciação de pedido de refúgio no Brasil.


A 1ª Vara Federal de Guarulhos/SP desobrigou a empresa Latam Airlines de prestar assistência a imigrantes que solicitam refúgio ao governo brasileiro quando desembarcam no Aeroporto Internacional de São Paulo/Guarulhos e declarou a União responsável por atendê-los, em necessidades básicas, enquanto aguardam a apreciação do pedido. A sentença é do juiz federal Roberto Lima Campelo.

O magistrado já havia concedido liminar à Latam, suspendendo quaisquer providências relativas à permanência de estrangeiros em situação de trânsito no aeroporto.

“O dever de tutelar, cuidar e proteger a situação jurídica do estrangeiro, seja legal ou ilegal, recai primariamente sobre o Estado do país onde ele se encontra, conforme a Constituição Federal Brasileira, princípios do Direito Internacional dos Direitos Humanos e do Direito Migratório”, afirmou na sentença.

A Latam moveu ação narrando que a União, por intermédio da Polícia Federal e do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), vinha impondo à companhia aérea o dever de prestar assistência e custear despesas de saúde, alimentação e outras necessidades dos imigrantes. Segundo a empresa, eles embarcam na aeronave de forma regular, mas formulam o pedido refúgio ao chegarem em Guarulhos, ainda que este não seja o destino final.

“A responsabilidade da companhia aérea em relação ao estrangeiro que deliberadamente rompe o contrato de transporte, ou seja, não embarca no voo de destino final é limitada, pois a obrigação primária de controle migratório e acolhimento de estrangeiros recai sobre o Estado (Polícia Federal e demais órgãos competentes)”, segundo o juiz federal.

Conforme a sentença, as obrigações da companhia aérea com assistência a imigrantes estão limitadas a casos de atraso ou cancelamento de voos e situações em que houver ordem de repatriação que não possa ser cumprida de imediato.

O juiz federal condenou a União a ressarcir a Latam por todas as despesas com estrangeiros mantidos no aeroporto de Guarulhos. O valor será apurado na fase de cumprimento da sentença.

Nota Técnica do Ministério da Justiça, citada na decisão judicial, mostra o crescimento no número de pedidos de refúgio protocolados no aeroporto de Guarulhos nos últimos anos: de 69 em 2013, para 4.239 em 2023 e 9.082 até 15 de julho de 2024.

Conforme o Ministério da Justiça, há evidências de que grande parte desses migrantes segue em direção ao Acre para, a partir dali, acessar o Peru em direção à América Central até chegar à fronteira Sul dos Estados Unidos.

Processo nº 5007022-38.2024.4.03.6119

 

STJ: Preso tem direito de receber visita de pessoa que cumpre pena em regime aberto

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.274), estabeleceu que o preso pode receber visitas de quem está cumprindo pena em regime aberto ou em gozo de livramento condicional. Para o colegiado, eventuais restrições a esse direito só podem ocorrer de forma excepcional e com base em fundamentação adequada.

A questão levada a julgamento gerou a seguinte tese: “O fato de o visitante cumprir pena privativa de liberdade em regime aberto ou em livramento condicional não impede, por si só, o direito à visita em estabelecimento prisional”.

O desembargador convocado Otávio de Almeida Toledo, relator do tema repetitivo, observou que as turmas criminais do STJ já se posicionaram no sentido de que o preso pode ser visitado por pessoa que cumpre pena em regime aberto ou está em livramento condicional. Esse entendimento – prosseguiu – considera a função ressocializadora da pena e o fato de que os efeitos da pena privativa de liberdade não devem atingir outros direitos individuais.

Convenção internacional e legislação brasileira protegem direito à visitação
Em relação à função ressocializadora da pena, o desembargador convocado lembrou que ela está prevista na Convenção Americana de Direitos Humanos e, segundo a interpretação adotada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, engloba o contato com a família e o mundo exterior, efetivado no direito da pessoa presa a receber visitas. Esse direito, por sua vez, está descrito nas Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos (“Regras de Mandela”) e no artigo 41, inciso X, da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal).

“No plano normativo federal, é ressaltado que o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda de liberdade (artigo 38 do Código Penal) ou, em outras palavras, pela sentença ou pela lei (artigo 3º da Lei de Execução Penal). E não há normativa vedando, em abstrato, o exercício da visitação nessas circunstâncias”, continuou o magistrado.

Otávio de Almeida Toledo alertou ainda que cada caso pode conter contornos específicos que indiquem a necessidade de restrição excepcional ao direito de visitas. Nessa linha, em suas palavras, a limitação às visitações deve ser “adequada, necessária e proporcional”.

“Diante de tal quadro, não se considera devidamente fundamentada a decisão que restringe a visitação por pessoa cumprindo pena em regime aberto ou em gozo de livramento condicional quando baseada, de forma genérica, em tais circunstâncias”, destacou o relator.

Caso concreto trouxe argumentos genéricos para impedir visita a irmão preso
Em um dos recursos representativos da controvérsia, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) impediu o ingresso de uma pessoa em estabelecimento prisional para visitar seu irmão, em razão de estar cumprindo pena no regime aberto.

De acordo com Otávio de Almeida Toledo, o acórdão não apresentou elementos concretos para justificar a medida, apenas se amparando em portaria do juízo de execução que proibia, de forma abstrata, a visitação por pessoas que se encontrasse no cumprimento de pena em regime aberto ou em livramento condicional – o que contrariava a jurisprudência do STJ.

“À míngua de motivação em concreto que seja adequada, necessária e proporcional em sua correlação com as circunstâncias específicas do caso, não se verifica fundamentação suficiente na decisão colegiada para a restrição imposta ao direito de visitação, a qual, portanto, deve ser afastada”, concluiu o magistrado.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2119556

TST: Revezamento de ida ao banheiro em linha de produção de chocolates não caracteriza dano moral

Postos não podem ficar vazios, e quem vai ao banheiro tem de ser substituído.


Resumo:

  • Um operador de produção da fábrica de chocolates Garoto em Vila Velha (ES) entrou com pedido de indenização, alegando que seu direito de ir ao banheiro era restringido pela empresa.
  • Ficou constatado no processo que não havia proibição, mas apenas a necessidade de substituição de pessoas na linha de produção, sempre que alguém precisava se ausentar.
  • Para a 4ª Turma do TST, essa exigência não compromete o equilíbrio emocional do trabalhador nem justifica a indenização.

A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame do recurso de um operador de produção da Chocolates Garoto S.A., de Vila Velha (ES), que pretendia ser indenizado sob a alegação de restrição do uso do banheiro. Segundo o colegiado, o que havia era um revezamento, em que o trabalhador tinha de ser substituído por outro para se ausentar na linha de produção, situação que não envolve ofensa à dignidade.

Idas ao banheiro exigiam substituição
Na reclamação trabalhista, o operador disse que só podia ir ao banheiro nos intervalos para refeição e, por isso, tinha de “prender a urina” ou ser substituído.

A Garoto, em sua defesa, argumentou que não havia nem proibição nem restrição ao uso do banheiro. Para tanto, bastava o trabalhador pedir que um colega o substituísse na linha de produção, e sempre havia auxiliares em cada setor disponíveis para essa substituição em caso de qualquer tipo de necessidade de ausência.

Depoimentos de testemunhas confirmaram essa versão. Uma delas afirmou que, por se tratar de uma fábrica de alimentos, não poderia ter sanitários perto da linha de produção e, por isso, os banheiros ficavam a cerca de cinco minutos do local. Também foi relatado que, na linha de produção, operadores e auxiliares fazem revezamento, porque as máquinas não podem parar.

Revezamento não compromete equilíbrio psicológico do trabalhador
O pedido de indenização foi rejeitado pelo juízo de primeiro grau e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, que entenderam que a situação não era ilícita nem anormal a ponto de comprometer o equilíbrio psicológico do operador.

O trabalhador tentou recorrer ao TST a fim de reverter esse entendimento. Mas o relator, ministro Alexandre Ramos, observou que o caso não tem transcendência econômica, política, social ou jurídica, um dos requisitos para a admissão do recurso.

Ele lembrou que a Quarta Turma já firmou entendimento de que o revezamento para ida ao banheiro, caracterizado pela substituição daquele que irá se ausentar da linha de produção, não representa ofensa à dignidade do trabalhador, sobretudo por não ter sido comprovada a proibição ou o impedimento de se ausentar do posto de trabalho para essa finalidade.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: Ag-AIRR-936-55.2021.5.17.0013

TJ/MA: Concessionária de energia deve devolver, em dobro, valores cobrados de forma ilegal na pandemia

Entidades questionaram o descumprimento da Lei Estadual nº 11.280/2020.


Uma concessionária de energia foi condenada a devolver, em dobro, os valores excedentes pagos pelos consumidores, como juros e multa, durante o período de vigência da Lei Estadual nº 11.280/2020 – o Plano de Contingência do Novo Coronavírus, durante a pandemia.

A devolução deverá ser efetuada com juros de 1% desde a citação e correção monetária, a contar do desembolso realizado, nas faturas de energia de cada consumidor, referentes ao período de vigência da Lei Estadual nº 11.280/2020.

Além disso, a concessionária deverá pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 500 mil ao Fundo Estadual de Direitos Difusos.

PLANO DE CONTINGÊNCIA DO NOVO CORONAVÍRUS

A decisão judicial resultou do julgamento da Ação Civil foi ajuizada pelo Instituto de Comunicação e Educação em Defesa dos Consumidores e Investidores (ICDESCA) e pela Associação dos Moradores de Aurizona, contra a concessionária de energia no Maranhão

As entidades alegaram, na ação, o descumprimento da Lei Estadual nº 11.280/2020, que proibiu a cobrança de juros e multa por atrasos no pagamento de faturas durante a vigência do Plano de Contingência do Novo Coronavírus no Maranhão.

A concessionária, em sua defesa, alegou a inconstitucionalidade da Lei Estadual nº 11.280/2020 e não ser possível devolver os valores cobrados indevidamente.

PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR

O juiz Douglas de Melo Martins, titular da Vara de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís, autor da sentença, considerou que a Constituição Federal estabelece que a ordem econômica busca garantir a todos uma existência digna, em acordo com os princípios da justiça social, observando a proteção ao consumidor.

Neste contexto, diz a decisão, a Lei Estadual nº 11.280/2020 proibiu a interrupção de serviços essenciais (água e esgoto, gás e energia elétrica), suspendeu a cobrança de multas e juros por atraso de pagamento das faturas pelas concessionárias de serviços públicos, por falta de pagamento, e estabeleceu o parcelamento do débito pelo consumidor.

Segundo o texto legal, o débito consolidado durante as medidas restritivas, não poderão ensejar a interrupção do serviço, devendo ser cobrado pelas vias próprias, sendo vedadas a cobrança de juros e multa.(…). Ficam suspensos a incidência de multas e juros por atraso de pagamento das faturas de serviços públicos concedidos enquanto perdurar o Plano de Contingência da Secretaria de Estado de Saúde”.

SAÚDE COLETIVA

O juiz citou posição do Supremo Tribunal Federal no sentido de que as normas estaduais que proíbem a suspensão do fornecimento de serviço essencial são consideradas constitucionais, durante o período de vigência do plano de contingência relacionado à pandemia de Covid-19, tendo em vista que essas normas estão relacionadas à defesa e proteção dos direitos do consumidor e da saúde pública.

“O propósito da legislação em comento é garantir a preservação da saúde coletiva, mesmo que isso implique sacrificar o direito de crédito do Estado, das concessionárias/permissionárias de serviço público e dos empreendedores. O objetivo é assegurar que os cidadãos tenham acesso contínuo aos serviços públicos essenciais, incluindo o fornecimento de energia elétrica e de água”, declarou o juiz.

A sentença conclui que a concessionária não cumpriu com sua obrigação de provar que deixou de realizar as cobranças de multas e juros nas faturas de consumo dos consumidores durante a pandemia de Covid-19, sendo, portanto, inquestionável o direito dos consumidores à devolução dos valores cobrados e pagos de forma indevida, incluindo a devolução em dobro, conforme a Lei nº 8.078/90.

TRT/SP mantém justa causa de trabalhador que atirou café quente em colega durante discussão em serviço

A 7ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região manteve a justa causa aplicada a um trabalhador demitido por atirar café quente no colega, durante uma discussão. Em primeiro grau, o Juízo do Posto Avançado de São João da Boa Vista em Espírito Santo do Pinhal havia afastado a justa causa, condenando a empresa ao pagamento das verbas rescisórias e honorários advocatícios.

A empresa, uma fábrica de autopeças e acessórios, recorreu, pedindo a reforma da sentença para que a justa causa fosse mantida, afastando as condenações pecuniárias impostas. Em suas alegações, afirmou que “o fato de o reclamante lançar café quente em outro funcionário foi desproporcional e não pode ser considerado defesa legítima”. Segundo ela, o incidente, ocorrido após uma discussão e agressão mútua entre dois funcionários, “abalou a necessária fidúcia presente no vínculo de emprego, levando à rescisão do contrato por justa causa, com base no art. 482, alínea “j”, da CLT”. A empresa também realizou uma apuração dos fatos e concluiu que ambos os envolvidos agiram de forma inaceitável no ambiente de trabalho e por isso foram dispensados.

Segundo constou dos autos, no dia 8/8/2023, dois funcionários desentenderam-se numa conversa de corredor, e acabaram trocando agressões físicas, com tapas em um e soco nas costas no outro, e este arremessou no colega o café quente que trazia num copo plástico. Ele alegou que o ato foi em legítima defesa.

Para o relator do acórdão, desembargador Marcelo Magalhães Rufino, “o arremesso de café em outra pessoa não induz à conclusão de que se trate de legítima defesa, mas sim de uma agressão´”. Além disso, a conduta “extrapola os limites do bom senso e da convivência em ambiente de trabalho”.
O colegiado reconheceu que o trabalhador que atirou o café reagiu a uma agressão inicial do colega de trabalho, mas considerou a atitude “claramente desproporcional”, podendo causar sérias lesões, e lembrou que a defesa legítima, nos termos do art. 188, I, do Código Civil, “exige que a ocorrência seja moderada e proporcional à agressão sofrida”. Ele não conseguiu provar que o mencionado ato praticado se deu em legítima defesa mas, ao contrário, “a prova dos autos evidencia que o reclamante reagiu de maneira excessiva e desarrazoada, o que afastou a justificativa” e “o conjunto probatório indica que a conduta do autor possui gravidade suficiente a ensejar o rompimento do contrato de trabalho por justa causa”, ressaltou o acórdão, que também designou a conduta como “faltosa típica, revestida de gravidade suficiente para justificar a justa causa, haja vista a óbvia quebra de fidúcia (confiança) que deve permear a relação de emprego”.

Até mesmo o fato de o trabalhador nunca ter sido punido “não afasta a gravidade do ato praticado e quebra da fidúcia”, afirmou o colegiado, e porque a justa causa para a rescisão foi aplicada tão logo os fatos foram verificados configurando a imediatidade, “os pedidos de pagamento das verbas rescisórias próprias da demissão sem justa causa merecem ser afastados”, concluiu.

Processo 0010223-28.2024.5.15.0034

STJ: Selic deve ser aplicada como juros moratórios se sentença não determinar outra taxa

​A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou o entendimento de que a Selic deve ser aplicada como juros moratórios quando não houver determinação específica de outra taxa na sentença, vedada sua acumulação com qualquer índice de atualização monetária.

Para o colegiado, quando não houver cumulação de encargos (juros mais correção monetária), deve ser aplicada a taxa Selic no período de incidência dos juros de mora, deduzido o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ainda que as obrigações tenham sido constituídas antes da Lei 14.905/2024.

O recurso julgado teve origem na fase de liquidação de ação indenizatória movida por uma empresa contra uma seguradora. O juízo de primeiro grau nomeou perito para apurar o montante devido, calculado em mais de R$ 10 milhões em 2020.

Ao STJ, a seguradora alegou, entre outros pontos, que até a prolação da decisão de liquidação não havia sido fixada nenhuma taxa ou índice de atualização do valor da condenação nem de compensação da mora, tendo o tribunal estadual – em vez de usar a Selic – acompanhado o laudo pericial, que aplicou o IPCA para correção monetária e juros de 1% ao mês.

Quando não há determinação de índices específicos, deve ser usada a Selic
O relator do caso, ministro Antonio Carlos Ferreira, verificou que a perícia judicial utilizou o IPCA como critério de atualização monetária, acrescido de juros moratórios, para determinação do valor a ser pago. Após a homologação do laudo e a adoção de suas conclusões – observou o relator –, determinou-se que a liquidante apresentasse a planilha atualizada do débito “com os acréscimos legais estabelecidos no título judicial e a inclusão dos honorários de sucumbência”.

No entanto, o ministro destacou que, embora o tribunal local tenha fixado os períodos de incidência de juros de mora e de atualização monetária, não determinou quais seriam os índices aplicáveis. Nesses casos, disse, a jurisprudência do STJ aplica a Selic – posição recentemente reafirmada no julgamento do REsp 1.795.982.

Selic contempla correção monetária e juros de mora
Na hipótese em análise, o relator ressaltou que há datas diferentes para início da fluência da atualização monetária e dos juros moratórios: respectivamente, 18 de setembro 2009 (correção monetária a partir da data do trânsito em julgado) e 18 de outubro de 2002 (juros desde a citação).

Segundo explicou Antonio Carlos Ferreira, no período em que incidiram apenas juros de mora – entre a citação e o trânsito em julgado da sentença –, não é possível aplicar a Selic de forma integral, sob pena de enriquecimento sem causa do credor, pois a taxa contempla correção monetária e juros.

“Para a solução desse tipo de questão, notadamente a partir do julgamento do REsp 1.795.982 pela Corte Especial – que reafirmou a interpretação conferida à matéria pelo STJ desde a edição do Código Civil de 2002 –, a Lei 14.905/2024 determinou a aplicação da Selic com o temperamento no sentido de que, quando no período não incidirem os encargos cumulativamente, deve ser deduzido o IPCA”, declarou.

O ministro esclareceu ainda que, após a edição da lei, a Selic deve ser aplicada sempre no período de incidência dos juros, excluído o IPCA; quando, contudo, houver cumulação dos encargos, aplica-se a Selic, isoladamente. Essa orientação, afirmou, deve ser seguida mesmo nos casos anteriores à edição da lei, por ser uma interpretação que o STJ adotou com o objetivo de impedir o enriquecimento sem causa do credor.

Veja o acórdão.
Processo: AREsp 2059743

TST: Empresa não é obrigada a custear assistência odontológica fornecida por sindicato

Para 7ª Turma, custeio previsto em norma coletiva viola princípio da autonomia sindical.


Resumo:

  • A G4F Soluções Corporativas, de Brasília (DF), não terá de repassar os valores referentes à assistência odontológica prestada pelo sindicato que representa seus empregados.
  • O repasse estava previsto na norma coletiva da categoria.
  • Para a 7ª Turma do TST, a cobrança compulsória de contribuição patronal pelo sindicato fere a autonomia e a livre associação sindical.

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho indeferiu pedido de um sindicato do Distrito Federal para que a G4F Soluções Corporativas Ltda. fosse obrigada a repassar contribuições referentes a cada empregado para a assistência odontológica prestada por ele, conforme previa norma coletiva. Segundo o colegiado, a entidade sindical, ao instituir uma cobrança compulsória de contribuição patronal em seu favor, contraria os princípios da autonomia e da livre associação sindical.

Assistência odontológica era administrada pelo sindicato
Na ação, o Sindicato dos Empregados de Empresa de Asseio, Conservação, Trabalho Temporário, Prestação Serviços e Serviços Terceirizáveis do DF (Sindiservicos/DF) alegou que, conforme previsto nas Convenções Coletivas de Trabalho, a empregadora deveria repassar-lhe uma contribuição por trabalhador, sindicalizado ou não, e sem custo para o empregado. Segundo a entidade, a G4F não havia cumprido essa obrigação em diversos meses, entre 2015 e 2017.

O pedido do sindicato foi recusado pelo juízo de primeiro grau, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) condenou a empresa a repassar os valores e a pagar a multa por descumprimento prevista convenção coletiva.

No recurso ao TST, a G4F argumentou que a obrigação desvirtua as atribuições sindicais, porque a empresa funcionaria como mantenedora do sindicato.

Medida viola liberdade sindical
O relator, ministro Evandro Valadão, explicou que a Seção de Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do TST considera inválida a cláusula convencional que estabelece o pagamento de contribuição pela empresa para o sindicato profissional. O motivo é que isso abre a possibilidade de ingerência da categoria econômica na categoria profissional, o que violaria a liberdade e a autonomia sindical.

Segundo o ministro, esse entendimento vale mesmo que os recursos se destinem a programas de assistência social ou a finalidades sociais, porque seu objetivo é coibir qualquer prática que possa afetar a liberdade e a autonomia sindical, garantidas na Constituição da República e na Convenção 98 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil (Decreto Legislativo 49/1952).

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: RR-807-52.2019.5.10.0001

TJ/PR: Filho é condenado por surrar a mãe e a irmã com vara

A convivência e o vínculo familiar entre as partes tornaram imperativa a incidência da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), que protege a mulher em contexto de violência doméstica e familiar, em julgamento de apelação criminal de um caso ocorrido em Tapejara, na comarca de Cruzeiro do Oeste (PR). O filho agrediu a mãe e a irmã com galhos de árvores que provocaram lesões, equimoses e escoriações nas mulheres. Condenado a seis meses em regime aberto, o réu recorreu pedindo afastamento da Lei Maria da Penha, mas o recurso foi negado pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR).

Com a aplicação da Lei Maria da Penha, o caso é categorizado como violência doméstica. Se a Justiça aceitasse o recurso, ocorreria a desclassificação do delito e o réu responderia apenas por lesão corporal leve. A sentença em primeiro grau seguiu o § 9º do artigo 129 do Código Penal, configurando lesão corporal qualificada contra ascendente e irmão, e foi confirmada pela 1ª Câmara Criminal.

A tese do julgamento foi que a aplicação da lei é necessária em casos de “lesão corporal qualificada praticada contra ascendente e irmão, independentemente da demonstração específica da subjugação feminina, considerando a vulnerabilidade inerente ao contexto de violência doméstica e familiar”. Os dispositivos relevantes citados na decisão foram: CP, art. 129, § 9º; Lei nº 11.340/2006, art. 5º. Jurisprudência relevante citada: TJPR, AgRg no REsp n. 1.931.918/GO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 28.09.2021; TJPR, APELAÇÃO CRIME 0001377-25.2021.8.16.0074, Rel. Substituta Elizabeth de Fatima Nogueira Calmon de Passos, 1ª Câmara Criminal, j. 25.05.2024

Jurisprudência de aplicação da Lei Maria da Penha

Segundo o artigo 5º da Lei nº 11.340/2006, “configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: (…) II- no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa (…)”.

E conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é “presumida, pela Lei nº. 11.340/2006, a hipossuficiência e a vulnerabilidade da mulher em contexto de violência doméstica e familiar. É desnecessária, portanto, a demonstração específica da subjugação feminina para que seja aplicado o sistema protetivo da Lei Maria da Penha. Isso porque a organização social brasileira ainda é fundada em um sistema hierárquico de poder baseado no gênero, situação que o referido diploma legal busca coibir.” (AgRg no REsp n. 1.931.918/GO, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 28/9/2021, DJe de 30/9/2021).

Processo nº 0004915-05.2021.8.16.0077

TRT/SP: Filho de idosa responde por direitos trabalhistas de cuidadora mesmo sem morar com a mãe

A 6ª Turma do TRT da 2ª Região confirmou sentença que reconheceu vínculo empregatício a cuidadora dispensada após falecimento de paciente idosa. A decisão condenou o filho da beneficiada a arcar com as obrigações trabalhistas, apesar de ele não residir com a mãe.

A trabalhadora contou que atuou na casa da idosa, sem registro em carteira, de fevereiro de 2018 a abril de 2021, tendo sido dispensada após o falecimento da mulher, aos 90 anos. O contratante, filho da senhora em questão, alegou que pagava pelos serviços sem se beneficiar deles porque não morava na mesma residência que a mãe. Disse, ainda, que não anotou a carteira de trabalho da cuidadora porque ela própria era contra o registro.

A sentença ressaltou que o artigo 229 da Constituição Federal prevê que “os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. E o acórdão pontuou que ficou comprovada a pessoalidade na direção da prestação dos serviços quando o contratante mencionou a tentativa de anotar o registro da profissional na carteira.

No acórdão, o juiz convocado relator Wilson Ricardo Buquetti Pirotta destacou: “O fato de o reclamado não residir no local da prestação de serviços […] não é suficiente para afastar o vínculo empregatício, já que os serviços de cuidadora prestados pela reclamante eram destinados ao núcleo familiar”. Determinou, assim, a anotação do registro em carteira e o pagamento dos direitos previstos na modalidade de dispensa imotivada.

Cabe recurso.

STF determina que Congresso assegure a indígenas participação em resultados de hidrelétricas em suas terras

Em decisão liminar, ministro Flávio Dino garantiu que comunidades indígenas afetadas pela usina de Belo Monte participem dos resultados do empreendimento.


O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), reconheceu a omissão do Congresso Nacional em assegurar aos povos indígenas o direito de reparação por danos decorrentes de empreendimentos hidrelétricos em seus territórios. Ele deu prazo de 24 meses para que o Legislativo regulamente artigos da Constituição Federal que lhes garantem a participação nos resultados da exploração de recursos em seus territórios.

A liminar foi concedida no Mandado de Injunção (MI) 7490. Esse tipo de ação visa garantir direitos e liberdades constitucionais na falta de norma regulamentadora que torne inviável seu exercício. A decisão será submetida a referendo do Plenário na sessão virtual de 21 a 28/03/2025.

Em relação ao caso específico das comunidades indígenas afetadas com a implementação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (UHBM), no Pará, Dino definiu que elas têm direito de participação nos resultados do empreendimento até que a omissão legislativa seja sanada. Ainda segundo a decisão, a medida deve ser aplicada a outros empreendimentos em que haja aproveitamento dos potenciais energéticos de recursos hídricos.

Omissão
A ação foi proposta por associações de povos indígenas da região do Médio Xingu, no Pará. As entidades afirmam que a construção e a operação da UHBM geraram mudanças significativas em seu modo de vida, além de problemas sociais, sanitários e ambientais.

De acordo com as associações, não há norma que regulamente os dispositivos da Constituição Federal que preveem que os recursos hídricos em terras indígenas, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais, só pode ser aproveitados se as comunidades afetadas forem ouvidas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados. Segundo elas, enquanto o empreendimento hidrelétrico passa a gerar lucros, “os donos do rio estão sem rio e vivendo em situação de miserabilidade, sem que haja qualquer repasse dos lucros bilionários auferidos pela Norte Energia S.A., consórcio responsável pela UHBM”.

Participação nos resultados da exploração
Na decisão, Dino afirmou que, de acordo com a Constituição Federal e normas internacionais, os povos indígenas são titulares do direito à participação nos resultados da exploração de recursos hídricos e da lavra de minerais em suas terras. Ocorre que não há nenhuma norma jurídica que discipline a matéria, que, no caso de Belo Monte, se refere aos recursos hídricos.

Dino constatou que, apesar de alguns projetos de lei em trâmite sobre o tema, há uma omissão legislativa de quase 37 anos de inércia para editar normas que disciplinem os artigos 176, parágrafo 1º, e 231 da Constituição de 1988. Assim, o escopo de sua decisão é suprir essas lacunas e omissões, “fixando as condições de participação dos povos indígenas em atividades atingindo suas terras, de modo a que eles deixem de ser apenas vítimas e passem à condição de beneficiários”

Belo Monte
No caso de Belo Monte, até que a matéria seja regulamentada, Dino determinou que 100% do valor repassado à União a título de Compensação Financeira pela Utilização dos Recursos Hídricos (CFURH) deve ser repassado aos indígenas. Ainda de acordo com a decisão, as condições específicas para aproveitamento dos recursos hídricos em outras terras indígenas e a forma de pagamento da participação nos resultados da atividade devem seguir a mesma lógica.

Lavra
Por fim, Dino explicou que a decisão não alcança a lavra legal de minerais. Contudo, o ministro destacou que a falta de regulamentação desse ponto favorece o garimpo ilegal, o “narcogarimpo” e a crescente atuação de organizações criminosas, sobretudo na Amazônia. “Tais organizações criminosas, vinculadas ou não a poderes locais, operam o financiamento, a logística e a lavagem de dinheiro no garimpo ilegal, pressionando os territórios indígenas permanentemente”, enfatizou.

Veja a decisão.
Mandado de Injunção nº 7.490/DF

 


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