TRT/RS: Pedido de vínculo de emprego entre pastor e igreja evangélica é indeferido

Um pastor evangélico não conseguiu na Justiça o reconhecimento do vínculo de emprego com a instituição religiosa na qual atuava. A decisão é da 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS). Para os desembargadores, não foi comprovada a presença dos requisitos essenciais para a configuração da relação de emprego, tratando-se, na realidade, de um trabalho voluntário. A decisão unânime da Turma confirmou a sentença proferida pelo juiz Maurício de Moura Peçanha, da Vara do Trabalho de Carazinho.

Ao ajuizar a ação, o pastor mencionou que prestou serviços para a igreja no período de maio de 2016 a abril de 2019, mediante salário de R$ 1,8 mil. Ele referiu que, além de celebrar o culto, era responsável pela gerência administrativa, tendo inclusive autonomia para decidir sobre questões procedimentais, saques e depósitos bancários, bem como pela administração financeira. O autor menciona que foi obrigado a casar-se e a residir em diferentes localidades para desenvolver seu trabalho, sendo exigido o acompanhamento da esposa em todas as atividades. Relata ter firmado um “Termo de Adesão de Prestação de Serviço Voluntário”, que na verdade tinha como objetivo mascarar o vínculo empregatício. Por fim, conta que as despesas de aluguel e moradia eram descontadas da arrecadação de dízimos e doações e que foi despedido por não ter atingido a meta quando atuava no Piauí e por pedir para voltar para o Rio Grande do Sul. Por outro lado, a igreja sustenta que o autor nunca foi empregado, apenas pastor evangélico, de forma voluntária, por vocação, convicção religiosa e profissão de fé.

Analisando o caso em primeira instância, o juiz Maurício Peçanha rejeitou a pretensão do reclamante, destacando, inicialmente, que os elementos constitutivos do vínculo de emprego são a prestação de trabalho por conta alheia, pessoal, não eventual, subordinada e onerosa. Por outro lado, o vínculo entre a igreja e o evangelista é de natureza voluntária, religiosa e vocacional, não se podendo confundir com vínculo de emprego. “Como houve oferecimento dos préstimos do reclamante com cunho altruísta, concluo que não houve animus contratandi, o que confirma o exercício da função clerical”, fundamentou o magistrado. A fim de reforçar seus argumentos, a sentença trouxe decisões do TRT-RS que confirmam o entendimento de que a relação entre pastor e instituição religiosa não é de natureza empregatícia, mas sim vocacional.

O autor recorreu ao TRT-RS. A relatora do caso na 6ª Turma, desembargadora Simone Maria Nunes, manifestou entendimento no sentido de que, embora presentes no caso alguns dos elementos caracterizadores da relação de emprego, como por exemplo a onerosidade, já que o autor recebia salário, nem todos os requisitos estão preenchidos. É o caso da subordinação, uma vez que o próprio pastor admite que tinha total autonomia administrativa, sendo a maior hierarquia dentro da instituição religiosa. “No caso dos autos, tendo o reclamante exercido sempre a função de Pastor, entendo que a atividade de difusão da fé e doutrina evangélica em prol da comunidade reveste-se de caráter vocacional e voluntário, o que afasta a aplicação da norma trabalhista”. Assim, segundo a julgadora, não se cogita reconhecer o vínculo de emprego entre o eclesiástico e sua instituição religiosa, em vista da natureza de sua ocupação. Nesses termos, a Turma acolheu os argumentos expostos na sentença e indeferiu o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício.

Também participaram do julgamento o desembargador Fernando Luiz de Moura Cassal e a desembargadora Beatriz Renck. Cabe recurso do acórdão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

STF anula audiência de custódia em que cadeirante foi mantido algemado

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu parcialmente liminar na Reclamação (RCL) 46125 para declarar a nulidade de audiência de custódia em que um cadeirante, autuado pelo suposto cometimento do crime de tráfico de drogas, foi mantido algemado, sem justificativa válida, durante todo o ato processual, além de não ter sido considerada sua condição de cadeirante. Com isso, o Núcleo de Audiência de Custódia do Distrito Federal (NAC-DF) deverá realizar, em até 24 horas, nova audiência em que seja analisada, de forma fundamentada, eventual conversão da prisão do investigado em medidas alternativas, em razão de sua condição de cadeirante.

Algemas

O aposentado H. B. V. foi preso em 19/2, e a audiência de custódia foi realizada no mesmo dia. De acordo com a defesa, ele é paraplégico e, embora não tenha praticado atos anteriores de resistência, tentativas de fuga ou que representassem perigo à integridade física própria ou de outros, foi mantido algemado durante a realização da audiência, em afronta à Súmula Vinculante 11, que somente considera lícito o uso de algemas naquelas três hipóteses. Por esse motivo, pedia a nulidade da prisão preventiva.

O relator, em 6/4, deferiu parcialmente a liminar para determinar a realização de nova audiência, mas manteve a prisão, por considerar que a falta de fundamentação para o uso das algemas não seria suficiente para decretar o seu relaxamento. Na ocasião, o relator determinou, ainda, que a condição de cadeirante fosse levada em conta no exame da possibilidade de concessão de medidas alternativas à prisão.

O NAC-DF informou que realizou nova audiência de custódia, por videoconferência, sem o uso de algemas, mas alegou que a competência para avaliar o pedido de substituição da prisão preventiva por medidas alternativas, pelo fato de o autor ser cadeirante, é do juízo da ação penal em tramitação.

Descumprimento

Para Barroso, não se sustenta o fundamento de que a competência para análise do pedido de revogação da prisão preventiva seria do juízo natural da ação penal. “A audiência de custódia, nesse caso, é para avaliar as condições do flagrante, a integridade física do autor e, eventualmente, converter, de forma fundamentada e de acordo com o caso concreto, a prisão em flagrante em prisão preventiva”, afirmou.

Segundo o relator, a medida cautelar não foi totalmente cumprida porque, na segunda audiência, nada foi mencionado sobre a condição de cadeirante do autor, e o juízo do núcleo de custódia apenas reiterou os argumentos genéricos da decisão anterior.

Veja a decisão.
Processo relacionado: Rcl 46125

STF: Inadimplência do usuário não afasta a incidência do ICMS sobre serviços de telecomunicações

Maioria do STF destacou caráter tributário da relação jurídica entre a prestadora do serviço de telecomunicações e o Fisco.


O Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que a inadimplência do consumidor não afasta a incidência do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nos serviços de telecomunicações. A decisão do Plenário foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1003758, com repercussão geral reconhecida (Tema 705), na sessão virtual encerrada em 14/5.

Histórico

Na instância de origem, a Global Village Telecom impetrou mandado de segurança contra o secretário de Finanças do Estado de Rondônia requerendo o reconhecimento do direito à compensação do ICMS recolhido sobre prestações de serviços em relação aos quais houve inadimplência do consumidor. A empresa argumentava que o ICMS perderia a característica de “imposto sobre o consumo” quando vedada a restituição, diante da impossibilidade de repasse.

O Tribunal de Justiça de Rondônia (TJ-RO) negou o mandado de segurança, o que levou a empresa a apresentar recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve o entendimento da corte estadual. Em seguida, a empresa interpôs o RE no Supremo alegando ofensa aos princípios constitucionais da não cumulatividade, da capacidade contributiva e do não-confisco.

Prestação do serviço

Em voto pelo desprovimento do recurso, o ministro Alexandre de Moraes lembrou que, com relação aos encargos tributários suportados pelas empresas em razão da inadimplência do consumidor final, o STF, no julgamento do RE 586482, com repercussão geral (Tema 87), fixou entendimento de que as vendas inadimplidas não podem ser excluídas da base de cálculo da contribuição do PIS e da Cofins, uma vez que integram a receita da pessoa jurídica.

Embora o precedente trate de tributo distinto, com base de cálculo diversa, , o ministro entendeu que o mesmo raciocínio se aplica ao caso dos autos, tendo em vista que a inadimplência do consumidor final não impede a ocorrência do fato gerador do tributo.

Ele explicou que existem duas relações jurídicas: uma de natureza civil, entre a empresa e o usuário e outra, de caráter estritamente tributário, entre a empresa e o Fisco. A satisfação do crédito decorrente do inadimplemento do usuário pode ser pleiteado pela prestadora tanto pela via administrativa quanto pela via judicial, mas mantendo-se a onerosidade dos serviços já prestados.

Segundo o ministro Alexandre, o que a empresa efetivamente pretende é repassar ao erário os riscos próprios de sua atividade econômica diante de eventual inadimplência do consumidor final. Essa pretensão, concluiu, não tem qualquer respaldo constitucional.

Acompanharam esse entendimento as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e os ministros Nunes Marques, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Luís Roberto Barroso.

Vencidos

Ficaram vencidos o relator, ministro Marco Aurélio, e o ministro Edson Fachin. Ao votar pelo provimento do recurso, o relator reconheceu o direito de o contribuinte aproveitar valores recolhidos a título de ICMS, pois a materialidade do tributo direciona à prestação onerosa do serviço, a ser remunerado pelo usuário.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “A inadimplência do usuário não afasta a incidência ou a exigibilidade do ICMS sobre serviços de telecomunicações”.

TJ/DFT: Empresa que presta assistência para produto adquirido no exterior se submete à legislação brasileira

A Apple Computer Brasil terá que substituir o telefone celular entregue em troca de um aparelho defeituoso adquirido no exterior. O aparelho recebido estava bloqueado para chip. Ao analisar o pedido, a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do DF destacou que, ao autorizar a troca do aparelho comprado no exterior, a ré concordou em se submeter às leis brasileiras.

O autor conta que comprou o celular da marca ré nos Estados Unidos. Após apresentar problemas no display, o aparelho foi levado à assistência técnica da Apple no Brasil, que realizou a substituição sem custo. O consumidor relata que, com 20 dias de uso, o novo aparelho passou a indicar que o chip instalado era inválido. Ao procurar a ré para solucionar o problema, foi informado de que se tratava de um bloqueio feito pela operadora de telefonia estrangeira, a quem caberia solucionar o problema. Diante disso, pediu a substituição do produto por outro novo, igual ou similar, além de indenizar por danos morais.

Decisão do Juizado Especial Cível do Guará condenou a Apple a entregar ao autor um Iphone XS MAX 512 GB novo, sob pena de conversão em perdas e danos pelo valor do aparelho. A ré recorreu sob o argumento de que não é parte legítima da ação, uma vez que o aparelho substituído não funciona por estar bloqueado para qualquer chip, defeito que seria de responsabilidade das operadoras de telefone.

Ao analisar o recurso, os magistrados observaram que apesar de a Súmula nº 8 da Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do Distrito Federal dispor que os produtos adquiridos no exterior não possuem a mesma proteção jurídica destinada aos negócios celebrados no Brasil, ao autorizar a troca, a ré concordou em se submeter às leis brasileiras.

“Em que pese a súmula afirmar que os produtos de consumo adquirido em país estrangeiro não gozam da mesma proteção jurídica conferida pelo CDC, no caso concreto, a ré autorizou a troca do aparelho do autor, o que foi realizado. Dessa forma, a ré tinha o dever de entregar um novo aparelho em perfeito funcionamento, implicitamente concordando em se submeter à jurisdição brasileira. Do contrário, deveria ter negado a garantia logo no primeiro momento”, explicaram.

Para os juízes da Turma, houve defeito na prestação do serviço, uma vez que o aparelho entregue ao consumidor não estava em perfeita condição de uso. “Observa-se que o aparelho foi substituído por autorizada situada no Brasil, inexistindo razão para o argumento de que o aparelho estaria bloqueado pela empresa estrangeira que forneceu o aparelho ao autor. Assim, comprovada a existência de vício/defeito, deve proceder à substituição do aparelho celular por outro com as mesmas características ou superiores, nos termos do art. 18 do CDC”, afirmaram.

Dessa forma, a Turma negou provimento ao recurso da Apple e manteve a sentença que a condenou a substituir o celular fornecido ao autor – em troca do aparelho defeituoso deixado na assistência técnica – por outro, de especificações iguais ou superiores, e em perfeitas condições de uso, sob pena de conversão em perdas e danos pelo valor do aparelho.

A decisão foi unânime.

PJe2: 0705011-57.2020.8.07.0014

TRT/CE: Empresa que fez “paredão de eliminação” entre empregados é condenada por dano moral

A Justiça do Trabalho do Ceará condenou uma empresa de turismo MVC Férias a pagar indenização por danos morais à consultora de vendas que foi demitida após votação pelos colegas de trabalho, em um procedimento tipo “paredão de eliminação do BBB”. A decisão do juiz Ney Fraga Filho foi publicada no início do mês de maio pela 16ª Vara do Trabalho de Fortaleza e determina o pagamento das verbas rescisórias, além dos danos morais. O valor total da condenação foi em torno de R$ 14 mil.

Em abril de 2020, a consultora de vendas ajuizou ação trabalhista contra as empresas Somos Case Gestão de Timeshare e Multipropriedade e MVC Férias e Empreendimentos Turísticos e Hotelaria. A empregada informou que foi contratada em julho de 2019 e laborou nas salas da MVC em diversos estabelecimentos de Fortaleza. Ela afirmou que foi demitida pouco mais de um mês após sua admissão, mas não recebeu as verbas trabalhistas a que teria direito.

Paredão BBB

A trabalhadora narrou que recebia tratamento constrangedor por parte de seu superior hierárquico. O gestor restringia as idas ao banheiro, além da alimentação dos empregados. Sua demissão foi concretizada através de um procedimento inspirado no “paredão de eliminação do BBB”, em referência ao popular programa de televisão Big Brother Brasil.

Na ocasião da “eliminação”, os funcionários foram coagidos a votar em um colega de trabalho e dizer o porquê este deveria ser dispensado. A consultora foi escolhida por meio desse “paredão”. Ela alega que ainda sofre com depressão e traumas psicológicos em decorrência dessa exposição.

Depoimento

Constou no registro de audiência de instrução que uma das testemunhas foi também desligada na mesma situação. “Depois de atender entre 5 e 6 clientes, o gestor reuniu todos e os levou para uma antessala, alegando que eles não haviam efetuado nenhuma venda e que eles só estavam preocupados em comer; informou que naquele exato momento ia fazer um “Big Brother” e mandou escolher um vendedor e um fechador para votar para sair da equipe; que naquele momento o depoente ficou constrangido e se recusou a votar”, registrou o magistrado na fundamentação da sentença.

Contestações

A empresa Somos Case Gestão de Timeshare e Multipropriedade Ltda, em sua contestação, negou o vínculo de emprego com a ex-funcionária, tampouco qualquer prestação de serviços a seu favor. Requereu pela improcedência total dos pedidos e condenação da reclamante na multa por litigância de má-fé.

Por sua vez, a ré MVC Férias e Empreendimentos Turísticos e Hotelaria alegou que não houve relação jurídica com a vendedora, sustentando que sua real empregadora era a outra empresa, negando a existência de grupo econômico.

Sentença

A decisão de primeiro grau julgou parte dos pedidos procedentes e condenou solidariamente as empresas, de forma que todos os devedores são responsáveis pela totalidade da obrigação.

Diante das provas documentais e testemunhais, o magistrado Ney Fraga reconheceu a ocorrência do assédio moral. “A hipótese de assédio pela chefia, ensejando dano moral indenizável, sem sombra de dúvidas restou provado nos autos. A prova foi sobeja em confirmar a dispensa da reclamante através de um paredão realizado pelo superior hierárquico, expondo a autora a uma situação extremamente vexatória e humilhante na presença dos demais empregados”, destacou o julgador.

A sentença determinou a anotação da carteira de trabalho, o pagamento de aviso-prévio, 13º salário, férias, horas extras, repouso semanal remunerado, multa, FGTS e indenização por danos morais.

O processo se encontra em fase recursal, em que as partes podem manejar recurso contestando a decisão.

Processo nº 0000308-70.2020.5.07.0016

STF valida forma de cálculo da contribuição previdenciária de empregados e trabalhadores avulsos

Em decisão unânime, o colegiado entendeu que a utilização da forma de cálculo prevista na lei é uma opção legislativa válida.


O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) validou regra da Lei de Custeio da Previdência Social (Lei 8.212/1990) que estabelece a técnica da progressividade simples na aplicação das alíquotas da contribuição previdenciária de empregados e trabalhadores avulsos. Por unanimidade, o colegiado entendeu que a expressão “de forma não cumulativa”, contida no artigo 20 da lei, é constitucional. A decisão ocorreu no Recurso Extraordinário (RE) 852796, com repercussão geral, julgado na sessão virtual encerrada em 14/5.

Tributação gradual

O RE foi interposto pela União contra decisão de Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Rio Grande do Sul que garantiu a um segurado o direito à aplicação das alíquotas previstas na lei de forma gradual, exclusivamente sobre a parcela dos rendimentos inseridos dentro das respectivas faixas de tributação. Segundo o acórdão, a sistemática de cálculo das contribuições previdenciárias mediante a aplicação de apenas uma alíquota à totalidade do salário de contribuição seria desproporcional e violaria o princípio da isonomia. Assim, incidentalmente, a Turma Recursal declarou a inconstitucionalidade da expressão “de forma não cumulativa”.

Atuação legislativa indevida

No RE, a União argumentou que a Turma Recursal, ao instituir nova fórmula de cálculo, cumulativo, para as contribuições sociais devidas pelos segurados empregados, domésticos e avulsos, semelhante à apuração do montante devido no Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), teria atuado como legislador, violando o princípio da separação dos Poderes (artigo 2º da Constituição Federal).

Opção legislativa

Em voto pelo provimento do recurso, o relator, ministro Dias Toffoli, observou que a expressão “de forma não cumulativa” prevista na lei foi uma opção do legislador pela progressividade simples, e não gradual, utilizada, por exemplo, nas tabelas do Imposto de Renda. Toffoli salientou que o texto constitucional não tem qualquer restrição ao uso dessa técnica de tributação em relação à contribuição previdenciária.

Segundo o relator, com a Emenda Constitucional 103/2019, o inciso II do artigo 195 da Constituição passou a prever, de maneira expressa, a possibilidade de as contribuições sociais devidas pelo trabalhador e pelos demais segurados da Previdência Social terem alíquotas progressivas de acordo com o salário de contribuição.

Aumento proporcional

O ministro também afastou a argumentação de que o aumento da tributação em razão da passagem de uma faixa de contribuição para outra seria desproporcional ou confiscatória. Segundo ele, como a transposição de alíquota ocorre em razão de aumento de salário, a elevação pode ser suportada pelo contribuinte, pois também houve aumento de sua capacidade contributiva.

O dispositivo validado pelo Supremo estabelece que as contribuições previdenciárias dos empregados e dos trabalhadores avulsos sejam calculadas mediante a aplicação, sobre a integralidade da base de cálculo, de uma das alíquotas fixadas para cada faixa de salário de contribuição (8%, 9% ou 11%).

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “É constitucional a expressão ‘de forma não cumulativa’ constante do caput do artigo 20 da Lei 8.212/1991”

TJ/SC: Criança gerada por inseminação caseira, diz juíza, também tem direito a registro civil

A juíza Elaine Cristina de Souza Freitas, titular da 1ª Vara Cível da comarca de Laguna, julgou procedente ação para registro de nascimento de criança com dupla maternidade, ainda que a gestação tenha sido resultado de autoinseminação caseira. Segundo os autos, as autoras mantêm união estável e compartilhavam do desejo de se tornarem mães, mas não tinham condições de realizar um procedimento de inseminação artificial. Porém, uma vez que o procedimento realizado foi caseiro, portanto não revestido das formalidades legais e médicas de uma inseminação assistida, as autoras não possuíam declaração de médico responsável para registro e emissão da certidão de nascimento.

A autoinseminação caseira teria acontecido por meio da inserção do sêmen de um doador anônimo e obteve êxito na segunda tentativa, de modo que uma das autoras gerava um bebê com seis meses de gestação. Em relação à outra requerente, como geneticamente não havia parentesco, isso a impediria, num primeiro momento, de registrar a criança como sua filha.

Em sua decisão, a magistrada ressaltou inicialmente que a família é tomada como base da sociedade, com direito à proteção do Estado, o que ocorre tanto no casamento quanto na união estável. Ela citou a Constituição Federal, que preceitua que “o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas”.

A sentença também detalha que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ao editar o Provimento n. 63/2017, regulamentou o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por reprodução assistida, porém com a indispensável apresentação de “declaração, com firma reconhecida, do diretor técnico da clínica, centro ou serviço de reprodução humana em que foi realizada a reprodução assistida, indicando que a criança foi gerada por reprodução assistida heteróloga, assim como o nome dos beneficiários”.

Como no caso em análise o referido documento inexistia, a magistrada entendeu haver uma lacuna do provimento na medida em que “este não prevê o procedimento a ser adotado em casos semelhantes ao aqui tratado, cabendo, portanto, ao Judiciário, mediante acionamento, utilizar dos métodos integrativos disponíveis no direito para chegar à solução do conflito”.

Por outro lado, de acordo com a sentença, sob a ótica do nascituro envolvido, é importante destacar que ele tem direito fundamental à identidade, consolidado na Declaração dos Direitos da Criança e na Constituição. “Além disso, pode-se ponderar que é do melhor interesse do nascituro ter sua ascendência registrada com o nome do casal requerente, visto que lhe proverá os cuidados necessários e lhe proverá afeto como genitores(as), independentemente do vínculo genético.” Nesse sentido, a magistrada citou o Código Civil, que resguarda os direitos dos nascituros: “Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”

A magistrada conclui que “não cabe ao Estado interferir no planejamento familiar, mas sim protegê-lo”. Outrossim, na medida em que se reconhece legalmente o vínculo de ascendência no caso de inseminação artificial heteróloga, não há porque não reconhecê-lo no presente caso, por se tratar de situação bastante semelhante, que só não preenche o requisito de acompanhamento/documentação médica.

Quanto ao doador do material genético, a juíza ressaltou que “restou esclarecido pelas autoras, em audiência realizada, que se trata de pessoa anônima residente em outro Estado e que teve plena ciência e anuência com o procedimento. Ademais, destaca-se que eventual direito à busca pelo ascendente biológico ou pela criança acerca da sua origem genética não será obstado, motivo pelo qual o deferimento da presente não causará nenhum prejuízo a estes.”

Desta forma, e em analogia aos arts. 16 e 17 do Provimento n. 63 do CNJ, a magistrada julgou procedente o pedido formulado para autorizar o registro da criança, independentemente da apresentação da documentação exigida, com determinação ao cartório de registro civil para que faça constar os nomes das autoras como ascendentes, sem distinção de ascendência paterna ou materna. O processo tramitou em segredo de justiça.

TJ/MA: Concessionária pode condicionar troca de titularidade de unidade consumidora a quitação de dívida

Uma concessionária de energia pode condicionar a troca de titularidade do contrato ao pagamento de débitos existentes. Assim decidiu o 7º Juizado Especial Cível e das Relações de Consumo, em ação movida por um homem tendo como parte demandada a Equatorial Maranhão. Na ação, o autor declara ser proprietário de um imóvel destinado à locação e que desde 2014 possuía como inquilino o homem M. J. G., sendo este o responsável titular pela Unidade Consumidora junto à requerida. Prossegue narrando que, posteriormente, o imóvel passou a ser locado para o outra pessoa.

O novo locatário teria sido surpreendido com a suspensão do fornecimento de energia elétrica e que ao entrar em contato com a requerida, foi informado que a unidade possuía um débito no valor de R$ 2.696,61 e que o titular da conta, no caso o locatário antigo, é que havia solicitado o desligamento da Unidade Consumidora. Sendo assim, realizou reclamação perante a ouvidoria da ré para que pudessem solucionar o problema, tendo o seu pedido sido indeferido. Ato contínuo foi informado que tanto a religação como a transferência de titularidade do contrato só poderia ser realizada após quitação da dívida.

Desta forma, tendo necessidade e urgência de solucionar o problema, haja vista que o inquilino estava sem energia, o proprietário do imóvel conseguiu arrecadar R$1.700,00 para o pagamento da dívida e o novo inquilino completou o valor de R$ 1.385,14, devendo este valor ser abatido dos alugueres subsequentes. Ele narra que foi feito, então, o pagamento do débito e a troca de titularidade para o nome do novo inquilino. Por esses motivos, ele pleiteou a declaração de inexistência de débitos discutidos no processo, além da condenação da ré em indenização por danos morais, no importe de R$ 13.000,00 (treze mil reais), bem como à devolução, em dobro, do valor que teria sido obrigado a pagar.

A demandada contestou, argumentando que a suposta suspensão do fornecimento de energia elétrica da Unidade Consumidora ocorreu a pedido titular da Unidade Consumidora à época, sendo portanto, legítima a atitude da concessionária. “Acrescenta que, se a parte autora realizou o pagamento dos débitos do antigo titular da sua UC, acabou assumindo a obrigação desta junto à recorrente, não podendo agora deixar de cumprir com suas responsabilidades (…) Por fim, quanto à troca de titularidade para o novo inquilino, esclarece foi realizada quando da apresentação de todos os documentos exigidos para tal, estando a Unidade Consumidora atualmente em nome do atual locatário”, destaca a sentença.

“Trata-se de relação de consumo, em que o Código de Defesa do Consumidor permite a inversão do ônus da prova em prol do consumidor. Pois bem. Analisando detidamente as provas juntada, entende-se que o pleito do autor não deve ser acolhido. Primeiramente, o corte ocorrido na unidade foi solicitado pelo antigo inquilino, e então titular da conta, não havendo aí qualquer ilegalidade. Note-se que em momento algum isto foi contestado pelo reclamante (…) Já em relação ao indeferimento do pedido de troca de titularidade, a reclamada trouxe aos autos documentos indicando que este ocorreu porque o contrato de locação encaminhado não era mais válido”, ponderou a Justiça.

“Ao que parece, toda a celeuma foi causada pelo antigo inquilino do autor, que segundo o demandante, teria abandonado o imóvel fugido (…) Nesses moldes, tem-se que para a configuração da responsabilidade basta que estejam presentes o dano e o nexo causal entre a conduta do agente e o referido dano (…) No caso em questão, os elementos indispensáveis à configuração da responsabilidade objetiva não se fazem presentes, ou seja, os instrumentos probatórios contidos nos autos não permitem a este Juízo concluir pela existência de qualquer dano a ser reparado”, finalizou, decidindo pela improcedência dos pedidos.

TRT/MT: Garis não podem ser transportados em carrocerias de caminhões

A empresa Locar Saneamento Ambiental Ltda., responsável pela limpeza urbana do Município de Cuiabá, não poderá mais transportar trabalhadores nos estribos, plataformas ou carrocerias dos caminhões de lixo ou nas partes externas dos veículos utilizados na coleta. A decisão é da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT-MT).

Ao decidir sobre o caso, o relator do processo, desembargador Paulo Barrionuevo, mencionou os inúmeros acidentes de trabalho ocorridos com empregados da empresa, bem como irregularidades na manutenção de um ambiente de trabalho seguro, saudável e higiênico.

A decisão foi dada em recurso do Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT).

Conforme o relator, a Justiça do Trabalho já foi provocada em algumas ocasiões para resolver conflitos de interesse semelhantes entre empresas de coleta de lixo urbano e o MPT e que “o resultado, em grande parte dos casos, é a favor da vida e integridade física dos coletores de lixo”.

Barrionuevo ponderou ainda que o trabalho do coletor de lixo é executado da mesma forma, independentemente do clima, inclusive quando extremamente chuvoso, e a despeito das condições do trânsito. Segundo o magistrado, as características da atividade potencializam os riscos de acidente. “Causa ainda fadiga extrema, pois é necessário recolher inúmeros sacos de lixos, correr, jogá-los rapidamente no caminhão, que continua em movimento, e pular no estribo para a sequência da viagem. Sendo válido ressaltar que há nos autos informações de outros acidentes relacionados a atropelamentos”.

O relator entende que o fato do transporte em estribos ser uma prática institucionalizada em quase todo território nacional, tolerada por órgãos de trânsito, não isenta que tal conduta seja declarada como ilegal pelo Judiciário, principalmente frente aos direitos fundamentais à vida e à segurança de que são titulares os empregados transportados em condições perigosas.

Ele cintou casos bem-sucedidos de cidades brasileiras que adotaram formas alternativas de coleta de lixo para poupar os trabalhadores do risco de acidentes. “Obviamente a adoção dos modelos de coleta acima citados [como de Guarapuava, Cascavel e Jundiaí] é uma decisão precipuamente política a ser tomada, mas, no que ora importa, evidencia que outras práticas mais modernas e seguras aos trabalhadores da coleta de lixo podem ser eleitas”.

Outras obrigações

Além das mudanças relacionadas com o transporte dos trabalhadores, a decisão do TRT determina ainda que seja cumprida uma série de obrigações pela empresa que detém a concessão do serviço de coleta em Cuiabá, como dotar as instalações sanitárias de iluminação adequada, bem como de portas, armários para todos os empregados, um lavatório e um chuveiro para cada 10 trabalhadores e material para limpeza. A Norma Regulamentadora que disciplina os ajustes ainda estabelece a necessidade de local adequado para as refeições, mesas e assentos.

Outros dois itens que a Locar se comprometeu a cumprir tratam de regras de segurança no trabalho relacionadas a máquinas e instalações e serviços com eletricidade. Dentre elas, manter proteção em sistemas de transmissão de força; dotar os veículos, inclusive os caminhões de coleta, de sinal sonoro de ré e manter as instalações elétricas em condições seguras. Em caso de descumprimento de quaisquer dessas exigências, foi fixada multa de 10 mil reais.

A empresa também terá que fornecer EPIs com certificado de aprovação válido e fiscalizar se estes estão sendo adequadamente usados, sob pena de pagamento de multa de 750 reais por trabalhador prejudicado.

Processo n° 0000711-56.2019.5.23.0007

STJ: No caso de duplicidade de intimações válidas, prevalece aquela realizada no portal eletrônico

​​​​​​​Em julgamento de embargos de divergência, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que, quando houver duplicidade das intimações eletrônicas previstas na Lei 11.419/2006 – especificamente pelo Diário da Justiça Eletrônico (DJe) e pelo portal eletrônico –, deve prevalecer, para efeitos de contagem de prazos processuais, a intimação que tiver sido realizada no portal eletrônico.

Com a decisão, fixada por maioria de votos, a corte pacificou entendimentos divergentes existentes no STJ sobre a prevalência do portal eletrônico, da publicação no DJe ou, ainda, da primeira intimação validamente efetuada.

“Partindo-se da premissa de que, diante de procedimento do próprio Poder Judiciário que cause dúvida – como no caso de duplicidade de intimações válidas –, não pode a parte ser prejudicada, considera-se que a melhor exegese é a que faz prevalecer a intimação no portal eletrônico, em detrimento da tradicional intimação por Diário da Justiça, ainda que atualmente esta também seja eletrônica” – afirmou o relator do recurso, ministro Raul Araújo.

Portal e DJe
O magistrado explicou que, de acordo com o artigo 4º, parágrafo 2º, da Lei 11.419/2006, a publicação realizada por meio do DJe substitui qualquer outro meio e publicação oficial para efeitos legais, exceto nos casos em que, por lei, é exigida intimação ou vista pessoal. Essa previsão, acrescentou, está relacionada com a transição das publicações impressas do antigo Diário da Justiça para as do DJe, o que trouxe agilidade ao processo e redução de custos.

Por outro lado, esclareceu, no caso da intimação pelo portal eletrônico, o advogado cadastrado no sistema acessa o processo judicial e é intimado. Caso consulte os autos dentro do prazo de dez dias, o ato judicial é considerado publicado no dia da consulta, dando-se início ao prazo no primeiro dia subsequente. Se o defensor não consultar o ato no período previsto, a intimação será automática, de maneira que o prazo processual será contado a partir do transcurso dos dez dias.

Ainda em relação às notificações via portal eletrônico, Raul Araújo apontou que o artigo 5º da Lei 11.419/2016 prevê que as intimações realizadas dessa forma dispensam a publicação no órgão oficial, inclusive por meio eletrônico.

Ferramentas complementares
Segundo o ministro, na esfera prática, os tribunais do país costumam adotar as duas formas de comunicação de atos processuais – em geral, utilizando o portal eletrônico para notificações direcionadas aos advogados cadastrados e o DJe para a publicidade geral do processo, inclusive para ciência de terceiros. Dessa forma, explicou, as ferramentas não são excludentes, pois atendem a propósitos distintos.

O relator enfatizou que, em respeito aos princípios da boa-fé processual, da confiança e da não surpresa, a legislação deve ser interpretada da forma mais favorável à parte, a fim de se evitar prejuízo na contagem dos prazos processuais. Nesse sentido, a forma privilegiada pela própria legislação é a intimação por meio do portal eletrônico.

“Se a própria Lei do Processo Eletrônico criou essa forma de intimação, dispensando qualquer outra, e tornou esse mecanismo hábil a promover, inclusive, as intimações pessoais dos entes que possuem tal prerrogativa, não há como afastar a conclusão de que ela regerá o prazo naturalmente em relação ao advogado que esteja cadastrado no sistema eletrônico”, afirmou o relator.

Opção
Em seu voto, Raul Araújo ressaltou que os tribunais não estão obrigados a adotar a intimação pelo portal eletrônico, criando uma plataforma para possibilitar, além da consulta processual e do peticionamento eletrônico, a intimação eletrônica específica de advogados cadastrados.

“Todavia, se o tribunal optar por possibilitar essa forma de intimação para os advogados devidamente cadastrados, não poderá se esquivar de considerá-la prevalecente, para fins de contagem dos prazos processuais, em detrimento ao meio comum e geral de intimação no Diário da Justiça Eletrônico. Isso porque, uma vez realizada a intimação, equivalente à intimação pessoal, no Portal, fica dispensada a intimação no órgão oficial”, concluiu o ministro.


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