TJ/AM: Juiz considera insuficiente exame de DNA negativo e rejeita pedido de indenização por danos morais e material

No entendimento do magistrado, o autor da ação não conseguiu comprovar que foi enganado ou coagido a assumir paternidade de criança.


O juiz de direito Manuel Amaro de Lima, titular da 3.ª Vara Cível da Comarca de Manaus, julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais e materiais feito por um homem que comprovou não ser pai biológico de criança registrada durante união estável informal. O magistrado considerou que o autor da ação não conseguiu reunir provas (documentais ou testemunhais) que configurassem os danos alegados de que a mãe da criança o enganou ou o forçou a assumir a paternidade.

Conforme informado na sentença, proferida nos autos 051XXXX-XX.2024.8.04.0001 no último dia 25 de junho, o homem manteve união estável informal com a mulher por 19 anos, durante a qual registrou quatro filhos. Ao fim do relacionamento, no entanto, alegando estar desconfiado de que fora traído pela mulher, decidiu fazer o teste de paternidade em relação à criança mais nova. O exame de DNA comprovou a falta de vínculo biológico.

Representada pela Defensoria Pública, a ré apresentou contestação e relatou que conviveu em união estável informal com o autor, que este registrou voluntariamente os filhos e abandonou a família. A defesa sustentou a inexistência de ato ilícito, a proteção do vínculo socioafetivo e a ausência de prova de dano.

Na decisão, o juiz Manuel Amaro aplicou, por analogia, o entendimento firmado no REsp 1814330/SP, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, no qual se discutia a possibilidade de declarar nulidade do registro de nascimento do menor em razão de alegada ocorrência de erro e de ausência de vínculo biológico com o registrado. Na ocasião, ressalta o magistrado, o Superior Tribunal de Justiça definiu que, para tanto, seria necessário “prova robusta no sentido de que o pai foi de fato induzido a erro, ou ainda, que tenha sido coagido a tanto”.

“Nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil, incubia ao autor comprovar a materialidade da conduta imputada à Ré, o dano e o nexo causal. Contudo, nenhum documento ou testemunho foi colacionado que evidencie intenção fraudulenta da Ré; o exame de DNA apenas confirma a inexistência de vínculo biológico, sem demonstrar a ocorrência de conduta dolosa ou omissiva. A inexistência de prova mínima afasta a presumida veracidade das alegações, impondo o ônus da improcedência (dos pedidos)”, registra trecho da sentença.

O juiz considerou, ainda, que o autor da ação reconhece que que conviveu com a Ré por quase duas décadas, registrou voluntariamente as crianças e manteve relação socioafetiva com todas elas por mais de doze anos, “circunstâncias que corroboram a ausência de qualquer fraude deliberada”.

Sobre o pedido de ressarcimento a título de dano material, em valor que o autor da ação alega ter suportado com despesas familiares, o juiz Manuel Amaro destacou que a jurisprudência pacífica do STJ estabelece que danos materiais exigem efetiva comprovação, não se admitindo indenização de valores hipotéticos ou presumidos e que, “ausente prova documental idônea, o pleito não encontra amparo fático-jurídico”.

STJ: Imóvel doado em programa habitacional, mesmo em nome de um só cônjuge, é bem comum

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, definiu que o imóvel doado pelo poder público no contexto de programa habitacional, ainda que registrado em nome de apenas um dos cônjuges, deve ser considerado patrimônio comum quando destinado à moradia da família, mesmo que o regime de bens seja a comunhão parcial. Para o colegiado, nessas hipóteses, o bem deve ser partilhado em caso de dissolução da união.

As partes do processo em julgamento se casaram em comunhão parcial e, durante a convivência, receberam do governo do Tocantins um imóvel destinado à moradia da família, por meio de doação vinculada a um programa de regularização de assentamentos estaduais. Dezessete anos após a separação de fato, a mulher ajuizou ação de divórcio, pedindo a dissolução do casamento e a partilha igualitária do imóvel.

O juízo de primeira instância decretou o divórcio e autorizou a mudança do nome da mulher, mas negou a partilha do imóvel, por entender que a doação gratuita, feita apenas a um dos cônjuges, tornaria o bem incomunicável, nos termos do artigo 1.659, inciso I, do Código Civil.

O Tribunal de Justiça do Tocantins manteve a sentença, considerando que o imóvel foi doado por ato gratuito, com caráter intuitu personae, o que afastaria sua divisão entre os cônjuges casados em regime de comunhão parcial. A mulher recorreu ao STJ.

Renda familiar foi elemento essencial para a doação
A ministra Nancy Andrighi, relatora, afirmou que os imóveis de programas habitacionais assistenciais, voltados a pessoas em situação de vulnerabilidade, são doados à entidade familiar, visando garantir o direito social à moradia (artigo 6º da Constituição Federal); assim, mesmo quando o imóvel é registrado em nome de apenas um cônjuge, o caráter familiar da concessão deve ser preservado.

Ao justificar a possibilidade de partilha, a ministra afirmou que, se é juridicamente aceitável que o programa Minha Casa Minha Vida favoreça a mulher com uma exceção à regra da comunicabilidade dos bens (artigo 10, parágrafo 2º, da Lei 14.620/2023), também é válida a situação oposta. Segundo ela, “sendo o imóvel doado a um dos cônjuges em sede de programa habitacional, no curso da união, é possível que, por ocasião do divórcio, haja a partilha igualitária do bem, para proveito de ambos”.

Nancy Andrighi também lembrou que o STJ já reconheceu a possibilidade de partilha de direito de uso de imóvel concedido gratuitamente por ente público, mesmo quando a concessão é formalizada em nome de apenas um dos membros do casal.

De acordo com a relatora, no caso em julgamento, a renda familiar e o número de dependentes foram elementos essenciais para a concessão do imóvel, evidenciando esforço comum. Por isso – acrescentou –, o bem não se submete à regra de incomunicabilidade do artigo 1.659, I, do Código Civil. Como as partes se casaram no regime da comunhão parcial de bens, a turma julgadora decidiu que o imóvel deverá ser partilhado igualmente entre ambas.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2204798

TST: Empresário tem passaporte retido por não pagar dívida com vigilante enquanto “ostentava Ferraris”

TST negou habeas corpus diante de indícios de ocultação patrimonial.


Resumo:

  • O TST manteve a retenção do passaporte do dono de uma empresa de segurança que tem uma dívida trabalhista de R$ 41 mil.
  • O credor, um vigilante, apresentou imagens do devedor ostentando luxo em torneios de golfe, reforçando suspeitas de blindagem patrimonial.
  • Para o colegiado, o argumento do empresário de que a retenção do passaporte o impedia de cuidar de sua filha nos EUA contradiz sua alegação de falta de recursos para quitar a dívida.

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do TST negou, por unanimidade, a liberação do passaporte de um empresário com dívida trabalhista de R$ 41 mil. O credor, um vigilante, provas de que o devedor participa de torneios de golfe, consome champanhe e ostenta carros de luxo, apesar de alegar insolvência.

Dívida vem sendo cobrada desde 2018
O vigilante ajuizou a ação contra a Empresa Brasileira de Segurança e Vigilância Ltda. (Embrase) e a Associação dos Moradores da Rua Iucatã, em São Paulo, e a empresa foi condenada a pagar as parcelas pedidas. Desde 2018, contudo, as tentativas de encontrar bens da empresa e de seus sócios foram infrutíferas. O vigilante, então, requereu, uma medida executiva atípica: a apreensão de passaporte e carteira de habilitação do empresário.

Bebendo champanhe e ostentando Ferraris”, mas sem R$ 1 em conta
No pedido, ele anexou imagens e disse que, consultando o Google, constatou que o empresário há pouco tempo realizava torneios de golf no Golf Club de São Paulo com a participação de locutores conhecidos, “bebendo champanhe e ostentando Ferraris, mas curiosamente não possui ‘1 real’ em sua conta bancária passível de bloqueio”. A medida foi deferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.

Empresário alegou restrição à liberdade de locomoção
No habeas corpus, o devedor alegou que a retenção do passaporte comprometia seu direito de ir e vir, especialmente por ter uma filha menor que vive e estuda nos Estados Unidos.

O relator, ministro Vieira de Melo Filho, reconheceu o cabimento do habeas corpus para discutir a medida, por envolver restrição à locomoção, mas manteve a apreensão. Para Vieira de Mello, a execução deve atender ao interesse do credor, inclusive por meio de medidas não previstas expressamente na lei. Essas medidas, no entanto, exigem o esgotamento dos meios ordinários de cobrança, o que foi confirmado no processo.

Ostentação é incompatível com alegada insolvência
Na avaliação do relator, há elementos suficientes que indicam blindagem e ocultação patrimonial, considerando o estilo de vida luxuoso do devedor. A alegação de que mantém a filha estudando no exterior apenas reforça a suspeita de que ele dispõe de recursos.

A medida de reter o passaporte foi considerada proporcional e adequada à finalidade de compelir o pagamento da dívida trabalhista. “Não houve qualquer restrição arbitrária à liberdade de locomoção física do empresário, como prisão ou impedimento de trânsito interno”, afirmou o relator.

A decisão foi unânime.

Processo: HCCiv-1000603-94.2024.5.00.0000

TRT/RS reconhece vínculo de emprego de motorista com a plataforma Uber

Resumo:

  • A 3ª Turma do TRT-RS reconheceu, por unanimidade, relação de emprego entre um motorista e a plataforma Uber;
  • O período a ser registrado em carteira é de quatro anos e meio, com salário mensal de R$ 4,5 mil;
  • Foram identificadas, na relação, a subordinação jurídica, a pessoalidade, habitualidade e a onerosidade.

A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reconheceu o vínculo de emprego entre um motorista e a plataforma de transportes Uber do Brasil. Em decisão unânime, os desembargadores reformaram a sentença do juízo da Vara de Trabalho de Viamão. O valor provisório da condenação é estimado em R$ 100 mil.

A empresa deverá anotar a Carteira de Trabalho do motorista no período de abril de 2019 a setembro de 2023, com salário mensal de R$ 4,5 mil. Em decorrência da relação de emprego, devem ser pagas férias vencidas e proporcionais, décimos terceiros salários e aviso prévio, entre outros. Também são devidos os depósitos de FGTS e o seguro-desemprego.

Combinadas as disposições contidas nos artigos 2º e 3º da CLT, empregado é a pessoa física que, pessoalmente, presta serviços de natureza não eventual, de forma subordinada e mediante remuneração, a quem (pessoa física ou jurídica), assumindo os riscos da atividade, dirige, fiscaliza e remunera a prestação de serviços. A ausência de um dos requisitos, por si só, afasta a caracterização.

O motorista alegou que havia onerosidade, pois o pagamento era realizado via plataforma; pessoalidade, uma vez que prestava os serviços, sem possibilidade de se fazer substituir, e subordinação, exercida por meio do aplicativo. As corridas, que não foram contestadas, confirmavam a habitualidade.

Conforme o trabalhador, os motoristas não possuem liberdade, pois, caso decidam não trabalhar, as mensagens se acumulam na tela do celular e as corridas são redirecionadas como forma de punição, além de estarem sujeitos ao desligamento da plataforma, que equivale a uma dispensa.

Entre outros argumentos, a empresa contestou os pedidos alegando que a relação é comercial e que não há subordinação ou mesmo onerosidade, sendo os usuários os responsáveis pelo pagamento do serviço.

A tese da empresa foi acolhida no primeiro grau.

O autor da ação apresentou recurso ao TRT-RS, que reformou a sentença. Para o relator do acórdão, desembargador Clóvis Fernando Schuch Santos, foram comprovados os requisitos da relação de emprego.

Sem ignorar os debates que ainda existem sobre as diferentes posições do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), o magistrado afirmou que a situação se insere no previsto pela CLT quanto à relação de emprego, ainda que as partes não tivessem a intenção original do vínculo.

“Existe a subordinação da parte autora aos ditames da empresa, que fornece o aplicativo e arregimenta os motoristas; o motorista laborava quase diariamente com o uso do aplicativo da parte ré; não se fazia substituir por outro trabalhador, já que era ele quem estava credenciado para realizar as corridas, e era remunerado a cada corrida realizada. Logo, o vínculo empregatício se forma”, concluiu o relator.

Pedidos complementares do motorista, como a obrigação de a plataforma reativar a conta, indenização por desgaste do veículo, adicional noturno e intervalos não concedidos, não foram reconhecidos.

Os desembargadores Francisco Rossal de Araújo e Ricardo Carvalho Fraga acompanharam o relator. Cabe recurso da decisão.

TRT/BA: Clínica de Emagrecimento indenizará biomédica chamada de gorda

A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) condenou a Clínica de Emagrecimento Lúcia Cruz LTDA a pagar uma indenização de R$ 10 mil por danos morais a uma biomédica que trabalhou na empresa. Os desembargadores decidiram manter a sentença da 26ª Vara do Trabalho de Salvador, que reconheceu que a trabalhadora foi coagida a pedir demissão após sofrer repetidos episódios de assédio moral e discriminação estética. Ainda cabe recurso.

Entenda o caso
Segundo a biomédica, ela era humilhada na frente de colegas e clientes. A trabalhadora relatou que a sócia da clínica e a nora faziam comentários sobre seu corpo, dizendo que ela prejudicava a imagem da empresa. Era chamada de “gorda” de forma pejorativa e obrigada a vestir roupas pretas para parecer mais magra, enquanto as outras funcionárias usavam uniforme branco. Além disso, era constantemente pressionada a emagrecer, o que afetou sua autoestima e imagem profissional.

Diante da pressão, sentiu-se forçada a pedir demissão. Em busca de seus direitos, entrou com um processo na Justiça do Trabalho, pedindo a anulação do pedido de demissão e uma indenização pelo assédio sofrido.

Mesmo devidamente notificada, a empresa não compareceu à audiência, o que resultou na aplicação da revelia – situação em que os fatos apresentados pela trabalhadora são considerados verdadeiros na ausência de defesa. A juíza da 26ª Vara do Trabalho de Salvador determinou o pagamento da indenização e considerou o pedido de demissão nulo, reconhecendo como uma dispensa sem justa causa.

Inconformada, a clínica recorreu da decisão. No entanto, o desembargador Renato Simões, relator do caso, entendeu que a sentença deveria ser mantida. O entendimento foi acompanhado, de forma unânime, pelos desembargadores Esequias de Oliveira e Maria de Lourdes Linhares.

Processo: 0000791-22.2023.5.05.0026

STJ: Foro estrangeiro em contrato de adesão pode ser nulo se comprometer acesso do consumidor à Justiça

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que a cláusula de eleição de foro estrangeiro em contratos de adesão pode ser considerada nula quando representa obstáculo ao acesso do consumidor brasileiro à Justiça. Segundo o colegiado, obrigar o consumidor a buscar seus direitos em tribunais estrangeiros representaria um ônus desproporcional, diante da distância geográfica, das barreiras linguísticas, das diferenças procedimentais e dos custos elevados.

O caso analisado pela turma julgadora teve início em ação ajuizada por consumidora brasileira contra empresa estrangeira de apostas online. O juízo de primeira instância declarou a nulidade da cláusula de eleição de foro, decisão mantida pelo Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE). Para o tribunal, além de se tratar de um contrato de adesão, a cláusula que estipulava o foro de Gibraltar, na Península Ibérica, para resolução de qualquer pendência entre as partes tornaria inviável o acesso da autora ao Judiciário.

Ao recorrer ao STJ, a empresa de apostas alegou que a Justiça brasileira não teria competência para julgar o caso, já que, segundo os termos contratuais, qualquer disputa deveria ser resolvida em Gibraltar, onde ela está sediada. Argumentou ainda não possuir domicílio, agência ou filial no Brasil, e que a cláusula de eleição de foro deveria prevalecer, conforme os artigos 25 e 63, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil (CPC), que visam proteger o réu e evitar abusos processuais.

Cláusula que elegeu o foro foi imposta unilateralmente pela empresa
O relator do recurso, ministro Antonio Carlos Ferreira, destacou que, embora o artigo 25 do CPC admita, em regra, a validade da cláusula de eleição de foro estrangeiro em contratos internacionais, o parágrafo 2º desse dispositivo impõe a observância do artigo 63, parágrafos 1º a 4º, que permite ao juiz declarar de ofício a ineficácia da cláusula abusiva.

O ministro Antonio Carlos Ferreira ressaltou que, à luz do princípio da vulnerabilidade previsto no artigo 4º, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), o consumidor deve ser reconhecido como a parte mais fraca da relação jurídica, o que impõe que seja protegido contra práticas que restrinjam ou inviabilizem o exercício de seus direitos. O relator enfatizou que essa vulnerabilidade se revela de maneira ainda mais acentuada nas relações de consumo transnacionais realizadas em ambiente digital.

Nesse contexto, o ministro apontou que, para se declarar a nulidade de cláusula de eleição de foro estrangeiro, é necessário que o contrato seja de adesão, que o consumidor seja hipossuficiente e que haja efetiva dificuldade de acesso à Justiça. Segundo o relator, todos esses critérios foram devidamente reconhecidos no caso em análise, justificando a invalidação da cláusula, a qual “não foi objeto de negociação específica, tendo sido imposta unilateralmente pela empresa provedora do serviço”.

Empresa de apostas direcionava seus serviços ao público brasileiro
Antonio Carlos Ferreira destacou que a empresa direcionava seus serviços especificamente ao público brasileiro, o que se evidencia diante da disponibilização do site em língua portuguesa, do suporte técnico no Brasil e da possibilidade de apostas em moeda nacional. Para o relator, tudo isso configura vínculo jurídico substancial com o território brasileiro, suficiente para justificar a incidência das normas processuais nacionais e a competência da Justiça brasileira, pouco importando a localização da sede da empresa.

Processo: REsp 2210341

TRF3: INSS deve conceder aposentadoria por incapacidade permanente a motorista de aplicativo que tem epilepsia

Segurado também terá direito a acréscimo de valor no benefício por depender de assistência contínua de terceiro.


A Justiça Federal determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conceda aposentadoria por incapacidade permanente a um motorista de aplicativo com epilepsia. A sentença, do juiz Luis Antonio Zanluca, proferida no âmbito da Rede de Apoio 4.0 do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), estabeleceu que o valor da aposentadoria tenha o acréscimo de 25%.

O magistrado considerou que o laudo pericial foi inequívoco ao apontar a incapacidade total e permanente do autor e a necessidade de cuidados constantes a ser realizado por outra pessoa, fazendo jus, ao acréscimo estabelecido pelo art. 45 da Lei n. 8.213/91.

“Convém observar que a comprovada incapacidade enseja a concessão do benefício solicitado e não a existência da doença”, analisou.

De acordo com a decisão, o autor estava vinculado ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) na época em que efetuou o pedido administrativo do benefício.

“A condição de segurado ao RGPS e o cumprimento da carência legal de acordo com o art. 25, I, da Lei n. 8.213/91 foram devidamente comprovados”, frisou o magistrado.

A perícia solicitada pelo juízo demonstrou a data de início da incapacidade do segurado, setembro de 2022. Nesse período, ele começou a trabalhar dirigindo carro de aplicativo e se envolveu em dois acidentes, devido às crises convulsivas (epilepsia e síndromes epilépticas idiopáticas), circunstâncias em que precisou de cuidados hospitalares.

A Rede de Apoio 4.0 é uma iniciativa do Programa Justiça 4.0, no âmbito da Justiça Federal do 3ª Região, para auxílio dos Juizados Especiais Federais com o objetivo de conferir maior celeridade à tramitação dos processos.

Os atos processuais no âmbito da Justiça 4.0 são praticados exclusivamente por meio eletrônico e remoto, em conformidade com o programa “Juízo 100% Digital”.

Processo nº 5002368-81.2024.4.03.6321

TJ/SC proíbe câmeras em salas de aula por violação à liberdade de ensinar e aprender

Órgão Especial julgou inconstitucional lei de município do oeste de SC sobre vigilância na escola.


O Órgão Especial do Tribunal de Justiça declarou inconstitucional a instalação de câmeras de vigilância dentro de salas de aula e salas de professores nas escolas públicas de um município do oeste do Estado. A decisão se baseou no entendimento de que a medida restringe, de forma desproporcional, direitos fundamentais ligados à liberdade de ensinar, aprender e preservar a imagem.

O Ministério Público do Estado propôs a ação com fundamento na Constituição Estadual e na Constituição Federal. A norma questionada obrigava a instalação de câmeras em todas as áreas das escolas, inclusive dentro das salas de aula e dos professores. A justificativa era a segurança de alunos e professores.

A prefeitura defendeu a legalidade da norma ao alegar que o sistema de vigilância atenderia à prioridade constitucional da integridade física e moral dos envolvidos. Citou ainda episódio em que imagens gravadas em sala de aula teriam sido úteis em um processo disciplinar. O argumento não foi acolhido.

Ao votar pela inconstitucionalidade da lei, o desembargador relator destacou que a proteção à segurança deve ser equilibrada com outros direitos igualmente constitucionais. “A instalação de câmeras nos espaços de ensino impõe uma restrição sensível aos direitos à liberdade de cátedra e à privacidade, e essa restrição não foi acompanhada de justificativas concretas, nem de garantias mínimas quanto à utilização das imagens”, afirmou.

O relator citou jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e apontou que o direito à educação é indissociável da liberdade pedagógica, do pluralismo de ideias e do respeito à dignidade dos envolvidos no processo de aprendizagem. Segundo ele, medidas como essa devem ser analisadas à luz do princípio da proporcionalidade, que exige a adoção do meio menos gravoso possível para atingir determinado fim.

Uma das críticas centrais do voto foi à redação da própria lei. De acordo com o relator, o texto legal é vago ao determinar que o conteúdo gravado será armazenado “por período especificado no regulamento” e que o controle das câmeras ficará sob responsabilidade da direção da escola. “O caráter vago da normativa apresentada vulnera a intimidade e a imagem, questão relevante para os servidores e docentes, mas especialmente para crianças e adolescentes”, escreveu.

Segundo ele, a falta de clareza sobre o uso, o acesso e a destinação das imagens captadas impede qualquer juízo de proporcionalidade em favor da norma. “Todos — professores, servidores, crianças e adolescentes — têm direito à preservação da imagem e da identidade. E esse direito não pode ser relativizado sem justificativa concreta e rigorosa”, frisou.

No voto, o relator reconhece que a instalação de câmeras nas áreas comuns das escolas, como pátios e refeitórios, pode ser considerada proporcional ao objetivo de garantir segurança. No entanto, a inclusão das salas de aula e de professores no monitoramento rompe esse equilíbrio. “Nesses espaços específicos, devem prevalecer os direitos fundamentais ligados à educação e ao ensino”, concluiu. A maioria dos desembargadores acompanhou o entendimento do relator.

Processo: 5027887-88.2024.8.24.0000/SC

TJ/RN: É possível levantar interdição e revogar curatela de homem que recuperou faculdades mentais

O juiz titular da 1ª Vara da Comarca de Ceará-Mirim/RN, José Herval Sampaio Júnior, julgou procedente o pedido de levantamento da interdição de um técnico de enfermagem e revogou a curatela instituída judicialmente. O magistrado reconheceu a plena capacidade civil do homem para todos os atos da vida civil, bem como a excepcionalidade do caso analisado.

No caso analisado, o autor alega ter sido interditado por iniciativa da cônjuge, em razão de grave enfermidade sofrida durante o período da pandemia, que lhe acarretou severos comprometimentos físicos e psíquicos, inclusive com laudos apontando distúrbios mentais. Relata, contudo, que, após submeter-se a procedimento cirúrgico pulmonar, houve restabelecimento integral de suas faculdades mentais, passando a conduzir com plena autonomia todos os atos da vida civil.

Ele anexou aos autos do processo farta documentação médica comprobatória dessa evolução, e requereu, ao final, o levantamento da interdição. No curso do processo, foi determinada a curatela provisória, diante da evidência clínica apresentada, e designada audiência de entrevista, oportunidade em que foram ouvidos o requerente e sua esposa, tendo ambos confirmado a superação do quadro clínico que motivou a interdição.

O juiz levou em consideração, também, a manifestação favorável do Ministério Público, ouvido em audiência, ao levantamento da curatela, destacando o caráter excepcional do caso, visto que a maioria das interdições tem caráter definitivo. Da mesma forma, considerou a alegação da defesa do requerente, que ratificou os argumentos e documentos constantes dos autos.

“É notório que a interdição, embora possa ser total ou parcial, deve sempre estar amparada na persistência da condição que a justifica. Ausente essa condição, impõe-se a cessação da medida, por representar restrição aos direitos fundamentais da pessoa humana, especialmente ao princípio da dignidade da pessoa humana e à autodeterminação, previstos, inclusive, na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência”, comentou José Herval.

No caso concreto, o magistrado considerou que “os autos evidenciam, de forma clara e segura, que o requerente recuperou plenamente suas capacidades mentais, fato atestado por laudos médicos e confirmado pela perícia psiquiátrica e psicológica judicial, bem como demonstrado em audiência, onde apresentou comportamento lúcido, orientado e articulado, além de estar inserido em atividades educacionais e de concurso público”.

Por fim, Herval Sampaio esclareceu que “não houve qualquer impugnação quanto à sua capacidade, seja pelo Ministério Público, seja pela até então curadora, que, ao contrário, expressaram alegria e reconhecimento da plena autonomia do requerente”.

STJ: Teoria do adimplemento substancial não respalda adjudicação compulsória

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a teoria do adimplemento substancial – a qual busca o equilíbrio de interesses das partes em caso de descumprimento parcial do contrato – é inaplicável à adjudicação compulsória (transferência forçada da propriedade para o nome do comprador). Para o colegiado, a efetivação dessa medida legal depende da quitação integral do valor pactuado, ainda que tenha ocorrido a prescrição das parcelas que completariam o saldo devedor.

A partir desse entendimento, a turma julgadora negou provimento ao recurso especial de um casal que pediu em juízo o reconhecimento da prescrição do saldo devedor de um imóvel comprado em 2007 e, em consequência, a expedição de mandado de adjudicação compulsória.

“Os efeitos da aplicação da teoria do adimplemento substancial à adjudicação compulsória podem ser nefastos: produzir-se-ia um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, na medida em que, por meio dela, o promitente comprador poderia obter a regularização da situação do imóvel sem a quitação do preço. Essa possibilidade é evidentemente incompatível com a boa-fé contratual”, afirmou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi.

Saldo devedor não foi pago nem cobrado
O casal comprou o imóvel de forma parcelada e passou a residir no local. Foram pagos cerca de 80% do preço total combinado, com exceção das últimas parcelas, que venceram sem que a incorporadora tenha feito qualquer cobrança ao longo dos anos seguintes.

Os compradores ajuizaram ação declaratória de prescrição cumulada com pedido de adjudicação compulsória, no que foram atendidos pelo juízo de primeiro grau. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a sentença quanto à prescrição, mas avaliou que a quitação do contrato é requisito para a adjudicação compulsória, o que levou o casal a recorrer ao STJ.

Adjudicação compulsória tem como requisito a quitação de saldo devedor
Nancy Andrighi disse que o exercício do direito à adjudicação compulsória pelo comprador, de fato, é condicionado ao pagamento integral do preço. Segundo ela, na venda de um imóvel em prestações, é possível que ocorra, por inércia do vendedor diante da falta de pagamento por parte do comprador, a prescrição de parcelas do saldo devedor.

Em tal hipótese – prosseguiu –, também é plausível que grande parte do débito tenha sido paga. “Nenhuma dessas situações, contudo, implica a quitação do preço, tampouco se mostra suficiente para a adjudicação compulsória pelo promitente comprador”, comentou a relatora.

Em relação à teoria do adimplemento substancial, a ministra explicou que ela decorre do princípio da boa-fé objetiva e busca assegurar a preservação do contrato nos casos em que a parcela não paga é ínfima em comparação com o que já foi quitado.

Ao confirmar a impossibilidade de adjudicação compulsória, Nancy Andrighi concluiu que o casal recorrente dispõe de dois caminhos para regularizar o imóvel: a celebração de acordo com a parte vendedora ou o ajuizamento de ação de usucapião, se estiverem presentes os requisitos para o reconhecimento da prescrição aquisitiva.

Leia também: Adimplemento substancial: a preponderância da função social do contrato e do princípio da boa-fé objetiva

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2207433


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