TRT/GO: Auxiliar de estoque que ameaçou colega tem justa causa confirmada

A Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO) manteve a demissão por justa causa de um auxiliar de estoque da cidade de Formosa (GO), dispensado após um episódio de agressão verbal contra uma colega de trabalho. O trabalhador acionou a Justiça para pedir a reversão da penalidade, mas teve o pedido negado em duas instâncias.

O fato que motivou a demissão ocorreu durante o expediente. Além de xingar a colega, o auxiliar de estoque teria ameaçado “quebrar as pernas” dela, empurrando-a durante a discussão. A situação foi presenciada pelo gerente da loja, segundo consta no processo.

O reclamante alega que, no dia seguinte, os envolvidos foram chamados ao setor de Recursos Humanos da empresa e que ele se retratou, obteve desculpas da colega e, segundo ele, recebeu uma advertência formal. Para o trabalhador, isso encerraria o episódio. No entanto, a empresa optou por aplicar a penalidade máxima: a demissão por justa causa, por incontinência de conduta ou mau procedimento; e ato lesivo da honra ou da boa fama praticado contra qualquer pessoa no ambiente de trabalho, conforme o artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Inconformado com a demissão, o trabalhador ajuizou ação na Justiça do Trabalho alegando que o episódio foi isolado, que houve retratação aceita pela colega e que a punição foi desproporcional. Requereu a conversão da justa causa em dispensa imotivada, com o consequente pagamento das verbas rescisórias.

A empresa, por sua vez, sustentou que o comportamento do empregado foi grave e incompatível com o ambiente profissional, negando que tenha havido advertência formal ou retratação aceita.

O juízo da Vara do Trabalho de Formosa rejeitou o pedido do trabalhador. O magistrado entendeu que os fatos narrados configuram falta grave suficiente para justificar a dispensa por justa causa, ressaltando que não houve comprovação da advertência mencionada pelo reclamante.

Sentença mantida

No recurso, o trabalhador voltou a dizer que a punição foi exagerada e que não houve aplicação de penalidades de forma gradual. A Segunda Turma do TRT-GO, no entanto, manteve a sentença. O colegiado considerou que a ameaça séria a uma colega, com ofensas verbais, tem gravidade que dispensa penalidades anteriores.

Para o relator do recurso, desembargador Daniel Viana Júnior, a falta cometida pelo reclamante é grave o suficiente para que seja aplicada, de imediato, a penalidade máxima. “Anoto que a gravidade do ato não é atenuada pelo fato de ter havido retratação do autor posteriormente”, destacou. Quanto à suposta aplicação de penalidade mais branda (advertência), o relator aponta que o autor não comprovou sua tese.

“Não se evidencia, dessa maneira, qualquer conduta culposa da reclamada, apta a ensejar a reversão da justa causa outrora aplicada. Conclui-se, que o intuito do autor, na verdade, é de receber as verbas inerentes a uma dispensa sem justa causa, sem pagar o preço que a lei cobra por seus atos”, apontou o desembargador.

O acórdão também destacou que a empresa agiu com a devida imediatidade, uma vez que a apuração ocorreu no dia seguinte ao fato e a dispensa foi formalizada apenas dois dias após o ocorrido. Com a decisão, ficou mantida a dispensa por justa causa, sem o pagamento de verbas rescisórias.

Processo 0011338-54.2024.5.18.0211

TJ/GO: IRDR fixada tese de inexigibilidade de pagamento imediato de crédito tributário quando há liminar concedida em favor do devedor

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) seguiu voto do relator, desembargador Reinaldo Alves Ferreira, e aprovou Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) para pacificar entendimento, no âmbito do Poder Judiciário goiano, de que não é obrigatório o depósito judicial para que se suspenda a exigência de crédito tributário, independentemente do preenchimento dos requisitos legais para a concessão de tutela de urgência.

Em seu voto, o relator citou o capítulo III, inciso V, do Código Tributário Nacional que, entre outros critérios, permite a suspensão da exigência nos casos de concessão de liminar no processo. “Essas hipóteses de suspensão são fundamentais para as pessoas naturais, mas sobretudo para as pessoas jurídicas visando a manutenção das atividades empresariais, especialmente daquelas que necessitam de certidão negativa de débitos — ou positiva com efeitos de negativa — para participar de licitações e outros procedimentos administrativos” destacou o relator. Para ele, o inciso V da normativa permite, de forma clara, “a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, independentemente do depósito integral, tão somente na apreciação dos requisitos
para a concessão da tutela provisória”.

O desembargador Reinaldo Alves Ferreira citou doutrina, normas legais e jurisprudência para defender que o Código Tributário Nacional, nesse ítem (capítulo III, inciso V), torna “indubitável” que as decisões concessivas de tutelas provisórias de urgência ou evidência podem impedir a exigência do tributo em discussão, gerando, assim, o efeito suspensivo da exigibilidade. O desembargador pontuou, contudo, que tal medida não consiste na desconstituição da dívida tributária.

Ele destacou que o entendimento já pacificado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) é de que a concessão de liminar nesses casos suspende a exigência do pagamento imediato do crédito tributário discutido, “independentemente da existência ou não do depósito integral em dinheiro”.

Em decisão inédita, TRT-GO multa empresa e advogado por uso de jurisprudência fictícia

O juiz convocado Celso Moredo Garcia, do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO), multou uma empresa do ramo de limpeza com sede em Goiânia e seu advogado por litigância de má-fé. A sanção foi aplicada após a constatação de que precedentes jurisprudenciais citados em mandado de segurança apresentado pela empresa eram inexistentes, possivelmente criados com o uso de inteligência artificial.

A empresa entrou com mandado de segurança para tentar suspender os efeitos de uma decisão da 16ª Vara de Goiânia, que permitiu ao trabalhador alterar o pedido inicial mesmo após a apresentação da defesa. No entanto, o TRT-GO indeferiu o mandado de segurança em 23 de maio, por entender que esse tipo de decisão não pode ser contestada por mandado de segurança, mas, sim, por recurso ordinário. Além disso, a empresa tentou comprovar sua tese apresentando como justificativa decisões que, segundo o relator, eram fictícias e não existiam nos registros do TRT-GO e do TST.

Fundamentação

O ponto principal da decisão do juiz Celso Moredo foi a falta de comprovação da existência dos precedentes jurisprudenciais apresentados pela empresa no mandado de segurança. Após consulta aos portais do TRT-GO e ao Diário da Justiça Eletrônico, o magistrado não localizou os processos citados. Da mesma forma, o acórdão supostamente oriundo do TST também não foi encontrado.

Diante disso, o juiz convocado entendeu que houve má-fé processual do advogado, nos termos do artigo 80, inciso V, do Código de Processo Civil (CPC), por “tentativa deliberada de falsear o contexto jurídico da ação, ao basear sua pretensão em precedentes jurisprudenciais inexistentes”.

Ele enfatizou que partes e advogados devem atuar com lealdade e boa-fé no processo. “Ainda que se trate de informações geradas com o uso de novas tecnologias de inteligência artificial, é dever ético e legal do causídico checar tais informações, pois não se pode conceber que se utilize da máquina do Judiciário calcado em inverdades ou argumentos infundados”, destacou.

Para fundamentar sua decisão, o juiz Celso Moredo citou um caso recente do TST, no qual a 6ª Turma daquele tribunal condenou partes e advogados por apresentação de jurisprudência inexistente em recursos. O TST classificou tais condutas como dolosas e violadoras dos deveres éticos da advocacia, especialmente por usarem indevidamente os nomes dos ministros do TST para dar legitimidade aos argumentos. O relator desse caso explicou que o juiz forma sua convicção com base em estudo, formação e convencimento e que esse processo é prejudicado quando uma peça distorce um documento oficial ou um repositório oficial, transformando em nada a jurisprudência que deveria trazer segurança jurídica.

Multas e ofício à OAB/GO e MPF

Alinhado com o entendimento do TST, o juiz Celso Moredo Garcia aplicou multa de 10% à empresa e de 1% ao seu advogado sobre o valor arbitrado à causa (R$ 24.505,18). As multas serão revertidas em favor do autor da ação trabalhista na qual o mandado de segurança foi apresentado, um auxiliar de limpeza.

Além das multas, o juiz determinou a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/GO) e ao Ministério Público Federal (MPF), com cópia da decisão, para que avaliem a conduta dos profissionais e adotem as providências disciplinares que entenderem cabíveis. As custas processuais, no valor de R$ 490,10, ficaram a cargo da empresa de limpeza.

Processo: MSCiv-0000667-86.2025.5.18.0000


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TST condena advogados que inventaram jurisprudência em recursos

TRT/GO afasta penhora de veículo adaptado de devedora com deficiência

O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) concedeu, por unanimidade, mandado de segurança a uma senhora de 79 anos, determinando a suspensão definitiva da penhora de um veículo de sua propriedade. A decisão foi proferida em sessão plenária virtual realizada no início de maio.

A penhora havia sido determinada no curso de um processo trabalhista movido por um motorista da cidade de São Simão (GO) contra duas empresas do setor sucroenergético. A idosa figurava como devedora no processo e contestava decisão do Juízo da Vara do Trabalho de Quirinópolis, que ordenou a constrição de seu automóvel, registrado como “intransferível” por ter sido adquirido com isenção tributária destinada a pessoas com deficiência.

No processo, a mulher alegou que é portadora de artrose em estágio avançado no joelho, condição comprovada por laudos médicos e exames anexados. Sustentou ainda que, em razão dessa limitação, necessita de um veículo com adaptações específicas para locomoção, o que está registrado inclusive em sua Carteira Nacional de Habilitação.

A relatora do caso, desembargadora Kathia Maria Albuquerque, reconheceu que a senhora apresenta limitações físicas que justificam o uso de automóvel adaptado. “A aplicação se baseia nos princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal); da solidariedade (art. 3º, I); da proteção da pessoa com deficiência, bem como no dever estatal de promoção de inclusão e de acessibilidade plena ao portador de deficiência”, explicou a desembargadora.

O TRT-GO entendeu que, diante da situação específica, por tratar-se de pessoa idosa e com limitações físicas, o uso de veículo adaptado é essencial, tornando inaplicável a medida constritiva, ou seja, o bem não pode ser penhorado.

A decisão também levou em conta que a execução deve respeitar o princípio da menor onerosidade para o devedor, conforme previsto nos artigos 797 e 805 do Código de Processo Civil. O colegiado ressaltou que a expressão “todas as medidas” disponíveis para a execução deve ser interpretada de forma a evitar violações a garantias constitucionais e a adoção de medidas desproporcionais.

Ao conceder o mandado de segurança, o Tribunal frisou que, no caso analisado, a questão discutida não se limitava à titularidade do bem, mas envolvia diretamente a preservação de direitos fundamentais da parte executada, especialmente quanto à acessibilidade e ao uso de meio de locomoção indispensável à sua rotina.

O acórdão também seguiu entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que já reconheceu a possibilidade de afastamento de medidas constritivas em situações que envolvem veículos utilizados por pessoas com deficiência.

Com a decisão, a penhora do veículo foi cancelada, como havia sido pedido na ação.

Processo – MSCiv 0000155-06.2025.5.18.0000

TST: Advogada que fraudou registro na OAB perde direito à jornada especial de 4h

Ela foi condenada em processo criminal que sua inscrição se deu mediante fraude.


Resumo:

  • A advogada de uma construtora havia obtido o direito a horas extras com base no Estatuto da OAB, mas havia indícios de fraude no Exame da Ordem.
  • A decisão então foi anulada por violação manifesta à lei, afastando benefícios obtidos por meio da conduta ilícita.
  • A SDI-2 do TST confirmou a nulidade, ressaltando que não se aplica a jornada especial de advogada a quem exerce ilegalmente a profissão.

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho manteve a nulidade de uma decisão que havia reconhecido horas extras a uma trabalhadora com base na jornada especial prevista no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O motivo foi a fraude na obtenção de seu registro profissional. Para a ministra Morgana Richa, relatora do caso, não se pode aplicar a regra da jornada reduzida a quem exerce ilegalmente a advocacia.

Trabalhadora foi condenada em ação penal
A controvérsia girava em torno do direito à jornada de quatro horas diárias previsto no Estatuto da Advocacia. O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) havia deferido horas extras porque não havia contrato de dedicação exclusiva entre a suposta advogada e a Construtora Tenda S/A.

Após esgotadas as possibilidades de recurso, a empresa propôs ação rescisória em que sustentava que a trabalhadora nem mesmo poderia ser considerada advogada, pois fora condenada em processo criminal no qual confessou ter obtido a inscrição na OAB mediante fraude e falsidade documental. Segundo a construtora, ao se candidatar à vaga de advogada, ela já tinha ciência da investigação criminal e, ainda assim, ao ser demitida ajuizou a ação trabalhista para pedir as horas extras.

Exercício irregular da profissão anula efeitos do contrato
Para a ministra Morgana Richa, ficou claro que a profissional exercia ilegalmente a advocacia. Ela destacou que não se trata apenas de fraude pontual. “A ilegalidade se perpetua a cada dia de exercício irregular da profissão”, afirmou.

A decisão também ressaltou que reconhecer o direito à jornada especial implicaria legitimar uma conduta vedada pela lei e permitir que a autora do crime lucrasse com ele. “Não há fundamento jurídico para que quem cometeu fraude na obtenção do registro profissional possa receber vantagens decorrentes de uma condição que, na prática, nunca teve”, concluiu.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: ROT-10640-07.2021.5.18.0000

TRT/GO não admite substabelecimento assinado pelo GOV.BR e nega seguimento a recurso de empresa executada

A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO) não recebeu um agravo de petição interposto por empresa devedora do ramo de serviços devido à irregularidade na representação processual da advogada que assinou o recurso. O Colegiado considerou inexistente o substabelecimento digital apresentado pela advogada, por ter sido assinado pelo site GOV.BR, ou seja, sem o certificado digital exigido pela ICP-Brasil. A decisão, unânime, foi relatada pela desembargadora Rosa Nair Reis.

O recurso foi apresentado contra uma decisão da 1ª Vara do Trabalho de Goiânia que havia determinado a penhora de créditos da empresa junto ao Município de Goiânia. Para a Turma julgadora, o agravo foi apresentado sem procuração válida nos autos, pois o substabelecimento utilizado havia sido assinado por meio da plataforma GOV.BR, que oferece assinatura eletrônica avançada, mas diferente da assinatura digital qualificada exigida nos processos judiciais trabalhistas, conforme prevê a Lei 14.063/2020.

Assinatura digital
Rosa Nair explicou que a legislação brasileira classifica as assinaturas eletrônicas em três níveis: simples, avançada e qualificada. A simples é usada em situações de baixo risco, como cadastros em sites, e se baseia em informações básicas como e-mail e senha. A avançada, como a oferecida pelo portal GOV.BR, utiliza mecanismos mais sofisticados de autenticação, como biometria e validação em dois fatores, mas ainda não possui validade plena nos tribunais. Segundo a desembargadora, a assinatura qualificada é a única reconhecida na Justiça do Trabalho, pois exige certificado digital emitido pela ICP-Brasil e garante a autenticidade, integridade e validade jurídica dos documentos, sendo indispensável para atos processuais, como a outorga de poderes a advogados.

No caso dos autos, a desembargadora explicou que, como não se trata de irregularidade sanável, e sim de ausência de instrumento procuratório, não há possibilidade de concessão de prazo para regularização, conforme entendimento consolidado do Tribunal Superior do Trabalho (TST) na Súmula 383, item II. Ela mencionou que o advogado só poderia postular sem procuração nos casos de mandato tácito, defesa de causa própria ou atos excepcionais, conforme o art. 104 do CPC, “o que não é o caso dos autos”, afirmou.

Na decisão, a relatora mencionou diversos julgados do TST e de TRTs no mesmo sentido, destacando que, em recente julgamento, a 3ª Turma do TRT-GO reafirmou esse entendimento ao não reconhecer um substabelecimento assinado via GOV.BR, por não possuir os elementos de validação exigidos para documentos digitais aceitos judicialmente. Ao final, a Turma determinou a retirada do nome da advogada dos autos, uma vez que houve posterior renúncia ao mandato. Com a decisão, o processo prosseguirá o fluxo de execução contra a executada para o pagamento da dívida trabalhista.

Processo: 0011338-39.2023.5.18.0001

TJ/GO homologa partilha de bem imóvel, antes do pagamento de ITCMD, a herdeiros que concordam com valores da divisão

O juiz Eduardo Walmory Sanches, titular da 1ª Vara de Sucessões de Goiânia, homologou plano de partilha apresentado pelos herdeiros de falecido, cujo único bem deixado foi um imóvel, avaliado em R$ 224.951,96. Com isso, converteu o plano em arrolamento. Tal manobra judicial costuma ser aplicada em processos de inventário nos quais os herdeiros estão de acordo sobre a divisão dos bens e este é inferior ao limite de 1 mil salários-mínimos. É um instrumento que busca simplificar um procedimento eventualmente mais formal e complexo, a fim de possibilitar a tramitação mais rápida e menos burocrática da demanda.

“A legislação atual prioriza a agilidade da partilha amigável ao focar na simplificação e na flexibilização dos procedimentos, alinhada com a celeridade e a efetividade, e em harmonia com o princípio constitucional da razoável duração do processo”, observou no magistrado, que também citou ampla jurisprudência segundo a qual, nesses casos, a partilha não é condicionada ao prévio recolhimento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). Eduardo Walmory destacou que, no entanto, isso impede a incidência do imposto, “pois não se trata de isenção, mas apenas de postergar a apuração e o respectivo lançamento para momento posterior”

TJ/GO: Justiça concede medida protetiva a criança com autismo vítima de supostos maus-tratos

O juiz Fernando Augusto Chacha de Rezende, da vara criminal da comarca de Abadiânia/GO, determinou, na segunda-feira (6), a aplicação de medidas protetivas de urgência em favor de uma criança de seis anos diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA), supostamente vítima de maus-tratos praticados por sua madrasta. A decisão foi tomada após audiência de depoimento especial do menino, colhido com acompanhamento psicológico, e se baseia na Lei 14.344/2022, conhecida como Lei Henry Borel.

De acordo com os autos, a criança relatou ter sofrido agressões físicas e psicológicas durante o período em que esteve sob os cuidados da madrasta, quando teria sido agredida com chineladas na cabeça e forçada a ingerir alimentos que lhe causaram vômitos. Em um dos episódios mais graves relatados pelo menino, a madrasta teria esfregado a fralda suja de fezes em seu rosto. O menino relatou ainda que a mulher teria dado cerveja para ele beber.

Numa decisão que relata detalhadamente as condições de uma criança no espectro autista, o magistrado enfatizou a hipervulnerabilidade do menino, não apenas por se tratar de uma criança, mas por seu diagnóstico de autismo com necessidade de suporte substancial (nível 2, segundo o DSM-5). “Ficou bem asseverado que o menor tem predileção, como é próprio do TEA, por interesses restritos na alimentação, e a investigada teria forçado o consumo de alimentos fora do seu repertório, o que desencadeou crise emocional e vômitos”, observou o juiz.

A decisão destaca ainda que o simples contato com a madrasta causa à criança “intensa agitação emocional”, o que, segundo o juiz, reforça a urgência na adoção das medidas protetivas. “A vítima, hipervulnerável, detentora de situação peculiar, merece a máxima atenção do Judiciário para assegurar sua integridade física e psíquica”, afirmou Chacha.

Com base no artigo 20 da Lei Henry Borel, foram impostas à mulher, por prazo indeterminado, o afastamento do lar e de qualquer ambiente de convivência com a vítima; proibição de aproximação e contato, por qualquer meio, com a criança, seus familiares e testemunhas, e acompanhamento psicossocial. À vítima, foram concedidas medidas previstas no artigo 21 da mesma lei, incluindo a proibição de contato com a agressora e o afastamento dela da residência da madrasta.

A denúncia dos fatos partiu da mãe biológica do menino, após relato do menor logo após uma visita paterna. A madrasta será investigada pelo cometimento dos crimes previstos no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente (fornecimento de bebida alcoólica a menor) e, possivelmente, de tortura, conforme sustentado pela defesa do menor.

Veja a decisão.
Processo nº 5412844-60.2024.8.09.0001

TJ/GO reconhece competência da Vara das Fazendas Públicas para execução de sentenças dos Juizados Especiais das Fazendas Públicas

Os membros do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) seguiram à unanimidade voto do desembargador Luiz Eduardo de Sousa e julgaram procedente Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) para pacificar entendimento, no âmbito do Poder Judiciário goiano, de que a Vara das Fazendas Públicas é competente para processar e julgar ação de cobrança subsidiada em título judicial declaratório formado em decisão anterior que tenha tramitado nos Juizados Especiais das Fazendas Públicas e em demanda cujo valor pleiteado seja superior a 60 salários-mínimos.

Ao analisar o caso, Luiz Eduardo de Souza observou que, criados pela Lei nº 12.153/2009, os Juizados Especiais das Fazendas Públicas foram concebidos para simplificar e agilizar a resolução de demandas de menor complexidade envolvendo o poder público, a fim de promover economia processual e celeridade na prestação jurisdicional. Nesse sentido, destacou, a mesma normativa legal estabeleceu que eles tem competência para julgar causas cujo valor não excedam 60 salários-mínimos. “Essa limitação é um dos critérios que definem a ‘menor complexidade’, característica essencial para tramitação nesse rito especial”, ponderou.

Demandas distintas

O desembargador afirmou, ainda, que a ação declaratória e a ação de cobrança são instrumentos processuais distintos, cada uma com objetivos específicos e autônomos entre si. “A sentença declaratória tem como principal finalidade reconhecer a existência, inexistência ou modo de ser de uma relação jurídica ou a autenticidade ou falsidade de um documento”, frisou, para mais adiante complementar: “Já a sentença condenatória, prevista no artigo 497, do CPC, busca impor ao réu uma obrigação de cumprir uma prestação, seja ela de dar, fazer ou não fazer algo, com o objetivo de reparar ou atender o direito do autor”.

Amparado nessa análise e com ampla citação de jurisprudência, Luiz Eduardo Souza concluiu não haver empecilho legal para que as Varas das Fazendas Públicas sejam buscadas para executar sentenças oriundas do Juizado Especial. Ele também defendeu, em seu voto, que a decisão do Juizado Especial não se estende à fase de execução nos casos em que o valor pleiteado não ultrapassa 60 salários-mínimos, limitação que, no entanto, não afeta a validade ou eficácia da sentença declaratória, mas apenas restringe sua competência na fase executória. “Dessa forma, a remessa da execução para a Vara da Fazenda Pública não implica rediscussão do mérito nem afronta à coisa julgada. Trata-se de mera adequação da competência jurisdicional, sem interferência nos efeitos da decisão proferida no Juizado Especial”, finalizou.

IRDR é um procedimento introduzido pelo Código de Processo Civil de 2015 com o objetivo de uniformizar temas repetidos em diversos processos judiciais e sobre os quais haja conflito de entendimento pelos julgadores. A intenção é garantir a pacificação de posicionamento e também segurança jurídica.

TJ/GO: Uber é obrigada a pagar por danos morais a motorista que foi desativada da plataforma abruptamente

A 3ª Turma dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) seguiu à unanimidade voto do relator, juiz Mateus Milhomem de Sousa, e concedeu, parcialmente, recurso da motorista de aplicativo J.M.P para condenar a Uber do Brasil Tecnologia Ltda a pagá-la R$ 5 mil por danos morais em razão de ter suspendido a conta dela na plataforma, de forma abrupta e definitiva, sem comunicação prévia e sem que lhe fosse dada a oportunidade de se defender.

Nos autos consta que a motorista ingressou na plataforma da Uber em junho de 2016, atraída pela promessa de ganhos diários de aproximadamente R$ 200,00. Para exercer a atividade, fez investimentos, incluindo o financiamento de um veículo e a aquisição de um celular compatível com o aplicativo. Contudo, em dezembro de 2024, teve sua conta suspensa permanentemente sob alegação de que infringiu os termos de uso, sem mais explicações por parte da Uber.

Sem esclarecimento

De acordo com J.M.P, apesar de diversas tentativas de contato, não obteve esclarecimentos da empresa sobre o motivo do bloqueio, razão pela qual ingressou com ação judicial para que, além dos danos morais, o aplicativo de transportes fosse obrigado a reativar seu cadastro para que continuasse prestando o serviço.

A Uber, contudo, argumentou que o bloqueio da conta da motorista ocorreu de forma justa porque, descumprindo regras da plataforma, teria sido comprovado que ela proferiu palavras inadequadas de cunho sexual no chat interno da viagem. Alegou, ainda, que exerce sua liberdade contratual, conforme garantido pelo ordenamento jurídico, não havendo obrigatoriedade de manutenção da relação contratual. J.M.P alegou inexistência de provas do envio das mensagens inapropriadas.

Liberdade contratual

A sentença inicial julgou improcedentes os pedidos dela sob o entendimento de que não há relação de consumo entre as partes e que a adesão dos motoristas à plataforma é voluntária e sujeita às regras da empresa, sem obrigação de manutenção da parceria. Também acatou a tese da plataforma de que possui liberdade contratual e afastou também, assim, os danos morais.

Ao analisar o recurso, Mateus Milhomem de Sousa observou que havia, sim, provas nos autos, por meio de uma captura de tela, que a motorista, na condição de passageira, cometeu a infração ao enviar uma mensagem de conteúdo sexual e inapropriado a um motorista do aplicativo e, embora tais registros estejam armazenados apenas nos sistemas da plataforma eles tem presunção de veracidade, exceto se houver prova em contrário, o que não foi apresentado pela motorista.

“A Uber, como empresa privada, tem a prerrogativa de decidir com quem manterá relações contratuais em sua plataforma, especialmente em casos em que há justificado receio quanto à segurança dos serviços prestados”, ponderou, ao afastar a possibilidade de obrigar a empresa a reabrir a conta da motorista.

Consumidora x parceira

No entanto, destacou que o uso da Uber possui características jurídicas distintas: enquanto motorista, J.M.P atua como parceira comercial da plataforma, porém, como passageira, é tida como consumidora dos serviços e, nesse caso, essa relação é regida pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). “Se a infração foi cometida enquanto passageira, a sanção razoável e proporcional — caso prevista contratualmente — seria a desativação da conta de passageira, e não necessariamente da conta de motorista. Ainda que se aceite a ideia de confiabilidade geral do usuário, a sanção deve observar os princípios da legalidade contratual, tipicidade da infração e proporcionalidade da medida”, salientou o magistrado.

Dano moral

Mateus Milhomem ressaltou, ainda, que apesar da atitude reprovável, a motorista deveria ter tido a oportunidade de se defender. O magistrado afirmou, também, que a atitude da Uber, ao promover o afastamento repentino da motorista, sobretudo considerando que estava cadastrada e atuante havia oito anos, causou-se impacto econômico e social, afetando a dignidade de trabalhadora e sua estabilidade financeira e emocional. “O abalo moral mostra-se ainda mais evidente diante da ausência de transparência na desativação e da conduta omissiva da ré (Uber) em proporcionar um ambiente contratual minimamente seguro e respeitoso”, finalizou.


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