TJ/AM: Eletronorte pagará R$ 4,6 milhões de indenização por poluição sonora provocada por usina

Sentença proferida pelo juiz Moacir Batista, titular da Vara Especializada do Meio Ambiente, julgou procedente Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado do Amazonas, em razão de situação que, conforme a ACP, perdurou por quase três anos ( 2013 a julho/2016).


A Vara Especializada do Meio Ambiente (Vema) da Comarca de Manaus condenou a Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. Eletronorte a realizar, no prazo de 90 dias (úteis), as adaptações necessárias na Usina de Aparecida, a fim de reduzir definitivamente, aos limites admitidos pela legislação, os ruídos provocados pela atividade daquela termelétrica, localizada na Rua Wilkens de Matos, bairro Aparecida, zona Sul da capital. Na mesma sentença, o juiz Moacir Pereira Batista, titular da Vema, condenou a empresa ao pagamento de indenizações a 46 moradores da área, totalizando R$ 4,6 milhões, a título de danos morais compensatórios e punitivos por danos individuais, sofridos no período de 2013 a julho/2016.

Proferida no último dia 27 de julho, nos autos de Ação Civil Pública (ACP) proposta pelo Ministério Público do Estado do Amazonas (n.º 0651967-20.2018.8.04.0001), a sentença registra que houve o dano às pessoas devido à emissão de ruído fora dos níveis permitidos pelos estudos técnicos e pela legislação brasileira, sendo “público e notório que os ruídos e vibrações produzidos, principalmente durante a noite, período mais importante para o descanso, impossibilita por via de consequência, qualquer possibilidade de relaxamento, tornando o simples ato de se deitar na cama um tormento sem fim”.

Conforme consta dos autos, antes do ajuizamento da ação pelo Ministério Público, em 2018, os moradores da área de vizinhança da UTE Aparecida diretamente afetados pela poluição sonora gerado pela usina a partir do barulho proveniente da caldeira e da cascata da caldeira, em funcionamento 24 horas, chegaram a procurar os prepostos da empresa para buscar uma solução amigável e extrajudicial para o problema. Como não obtiveram êxito, coube ao MPE/AM propor a Ação Civil Pública, após reiteradas tentativas de resolver a situação extrajudicialmente, com notificações e perícias do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), bem como de reiterados prazos para buscar uma solução, conforme informou o próprio órgão ministerial na petição inicial.

Em trecho da sentença, o juiz Moacir destaca que a Lei n.º 6.938/81 – que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente – interliga o conceito de poluição com o que represente degradação da qualidade ambiental, ou seja, a alteração adversa das características do meio ambiente. “Depreende-se disso, que são fontes de poluição as atividades que, direta ou indiretamente: prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; afetem desfavoravelmente a biota; afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”.

Em seu art. 4.º, inciso VII, a Lei n.º 6.93/81 prevê expressamente o dever do poluidor ou predador de recuperar e/ou indenizar os danos causados, além de possibilitar o reconhecimento da responsabilidade objetiva do poluidor em indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente ou aos terceiros afetados por sua atividade, independentemente da existência de culpa. “Assim, considerando a prova de poluição sonora, nos autos, é inconteste a necessidade de realizar adaptações na UTE Aparecida, para o enquadramento até o limite da NBR 10.151 de acordo com a área (em que a usina está instalada)”.

Indenizações

Ao tratar do pedido de indenização aos moradores da área (referente ao período de 2013 a 2016) formulado pelo MPE/AM, o juiz afirmou possuir este fundamento legal no inciso III, parágrafo único do art. 81 do Código de Defesa do Consumidor, citando ainda jurisprudência nesse sentido.

“Na presente sentença, identifico lesão a direito do meio ambiente ecologicamente equilibrado devido à poluição sonora e os danos causados pela requerida aos moradores que passaram no mínimo três anos convivendo com barulho ensurdecedor e noites em claro. (…) Compreendo que os danos individuais homogêneos são os danos morais de natureza compensatória (e não indenizatória), que desde já fixo no importe de R$100.000,00 (cem mil reais) para cada indivíduo devidamente identificado do abaixo-assinado, de fls. 102/105 (dos autos). Sem prejuízo de ingresso de outras demandas individuais para ressarcimento e indenização de outras naturezas”, registra trecho da sentença.

Recursos

Na contestação apresentada no decorrer do processo, a Centrais Elétricas do Norte do Brasil S.A. Eletronorte informou e apresentou provas de adaptações feitas na UTE de Aparecida visando à solução do problema que motivou a Ação Civil Pública. Posteriormente, opôs Embargos de Declaração, um deles solicitando a realização de produção de prova pericial. O recurso foi negado pelo juiz: “(…) entendo pela desnecessidade da prova pericial, pois mesmo que se comprove que a empresa não emite mais ruídos fora dos limites estabelecidos para a área, não poderá provar circunstância à época dos fatos da exordial, qual seja, nos anos de 2013 a 2016 e como alguns anos após o ajuizamento (da ação)”.

Da sentença proferida na data de 27 de julho, ainda cabe recurso.

TJ/SC: Justiça multará plano de saúde caso não autorize e custeie procedimento em criança

O juízo da 2ª Vara Cível da comarca de Joinville determinou que uma operadora de plano de saúde autorize e custeie procedimento para desobstrução das glândulas salivares de uma criança. O descumprimento pode acarretar multa diária arbitrada em R$ 100, limitada a R$ 10 mil.

Consta nos autos que o bebê, logo após o nascimento, foi submetido a uma frenotomia lingual para remoção do freio labial. A cicatrização, porém, resultou em bloqueio salivar abaixo da língua, situação prejudicial à função regular da glândula submandibular. Para reversão do quadro, a profissional responsável pelo acompanhamento prescreveu uma sialoendoscopia (endoscopia de glândula salivar).

Tal procedimento, no entanto, teve seu custeio negado pela operadora de plano de saúde, sob a argumentação de que a intervenção não está inserida no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS. Diante dessa situação, o autor, representado legalmente por seus pais, recorreu à Justiça.

Em análise do feito, a magistrada observou que, após longa divergência jurisprudencial sobre a natureza do referido rol (se taxativo ou exemplificativo), o Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de se tratar, em regra, de rol taxativo, mas que admite exceções.

Entretanto, explicou a juíza, “a pacificação do tema no âmbito jurídico provocou imediata atuação do Congresso Nacional, o que resultou na aprovação da Lei n. 14.454/2022, que entrou em vigor em 21/9/2022, na qual se retomou, de certo modo, o caráter exemplificativo do rol de procedimentos da ANS, porém com alguns requisitos, em evidente reação conhecida e conceituada na doutrina como ‘efeito backlash’ […]. Como visto, a promulgação da Lei n. 14.454/2022 garantiu a autorização de procedimentos não previstos no rol da ANS, desde que exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico (nova redação do art. 10, § 13º, I, da Lei n. 9.656/1998)”.

Dito isso, pontuou a julgadora que, conforme o parecer da médica otorrinolaringologista responsável pelo acompanhamento da saúde do autor, diante dos resultados dos exames a que foi submetido, o procedimento de sialoendoscopia revelou-se o único tratamento disponível para recuperação da função glandular, “imprescindível ao restabelecimento por completo da sua saúde como melhor técnica da medicina baseada em evidências”.

Outra alternativa, pontuaram especialistas, seria a remoção da glândula, o que acarretaria risco cirúrgico muito maior – risco importante de lesão em nervo lingual, nervo mandibular marginal do nervo facial e estruturas profundas do assoalho da boca e pescoço -, além da remoção de uma glândula que tem sua função ativa.

À vista dessas conclusões médicas, a sentença considerou abusiva a negativa, acolheu os pedidos do autor e determinou à operadora de plano de saúde ré a autorização e o custeio do procedimento, sob pena de multa diária. Ainda cabe recurso da decisão.

STJ: Prisão do devedor de alimentos por até três meses prevalece sobre regra anterior

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou legal a prisão civil do devedor de alimentos pelo prazo máximo de três meses previsto no artigo 528, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Para o órgão julgador, essa regra revogou tacitamente o limite de 60 dias estabelecido no artigo 19, caput, da Lei 5.478/1968 (Lei de Alimentos).

Ao não conhecer do pedido de habeas corpus de um devedor de pensão, o ministro relator, Marco Aurélio Bellizze, explicou que a regra da Lei de Alimentos, de 1968, foi revogada tacitamente pelo atual CPC, em observância ao critério cronológico para a solução de conflito aparente de normas previsto no parágrafo 1º do artigo 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

“Verifica-se que o critério da especialidade suscitado pela parte impetrante não é o que melhor soluciona o conflito legal em exame, pois, considerando que ambas as leis regulamentam a mesma questão específica de modo incompatível, deve prevalecer a lei nova, sobressaindo, portanto, o critério cronológico em face da especialidade”, afirmou o ministro.

Prisão de 60 dias foi prorrogada por mais 30
No caso analisado pelo colegiado, devido à falta de pagamento da pensão alimentícia, um homem teve a prisão civil decretada pelo prazo de 60 dias, o qual foi prorrogado pelo juízo da execução por mais 30, totalizando 90 dias.

No pedido de habeas corpus, a defesa alegou que a prorrogação da ordem de prisão original extrapolou o limite da Lei 5.478/1968, o que evidenciaria a ilegalidade da medida.

O ministro Marco Aurélio Bellizze comentou que um precedente do STJ, referente ao CPC de 1973, admitiu a possibilidade da prisão civil pelo prazo de três meses, porém o julgamento não enfrentou em detalhes o questionamento sobre a prevalência de normas.

O relator apontou que parte expressiva da doutrina reconhece a possibilidade da prisão pelo prazo estipulado no atual CPC, pois não há qualquer justificativa para condicionar a duração da medida à regra da Lei de Alimentos, que é de 1968. Segundo Bellizze, não há ilegalidade no caso analisado, sendo justificada a prisão por 90 dias proveniente do cumprimento de sentença de prestação alimentícia, definitiva ou provisória, em respeito ao critério cronológico da LINDB.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

TJ/PB: Construtora é condenada a indenizar por atraso na entrega de imóvel

Uma construtora foi condenada a pagar indenização, por danos morais, no valor de R$ 10 mil, em virtude do atraso na entrega de um imóvel. A decisão é da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba no julgamento da Apelação Cível nº 0849987-96.2017.8.15.2001, oriunda da 8ª Vara Cível da Comarca da Capital.

Segundo a parte autora, houve atraso, além do prazo de tolerância de 180 dias, na entrega do imóvel.

Para o relator do processo, desembargador Marcos Cavalcanti, “restou incontroverso nos autos que a construtora atrasou o empreendimento e a entrega do imóvel da autora, extrapolando além do prazo de tolerância de 180 dias”.

O desembargador acrescentou que o fato de ter sido poucos dias após o prazo de tolerância, não influencia o dano causado.

“Passado o prazo ordinário estipulado pelo vendedor, já começa a criar expectativas no consumidor que espera por sua moradia por tanto tempo, não se justificando extrapolar, ainda que um dia o prazo de tolerância de 180 dias além do que fora previsto para entrega de forma ordinária”, frisou o relator.

Da decisão cabe recurso.

Apelação Cível nº 0849987-96.2017.8.15.2001

STJ: Plano de saúde deve custear criopreservação de óvulos de paciente com câncer até o fim da quimioterapia

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que as operadoras de planos de saúde têm a obrigação de custear o procedimento de criopreservação dos óvulos de pacientes com câncer, como medida preventiva diante do risco de infertilidade, até a alta do tratamento de quimioterapia.

Segundo o colegiado, se a operadora cobre a quimioterapia para tratar o câncer, também deve fazê-lo com relação à prevenção dos efeitos adversos e previsíveis dela decorrentes – como a infertilidade –, de modo a possibilitar a plena reabilitação da beneficiária ao final do tratamento, quando então se considerará que o serviço foi devidamente prestado.

No caso dos autos, uma mulher com câncer de mama ajuizou ação para obrigar a operadora de seu plano de saúde a custear o procedimento de criopreservação de óvulos, necessário para preservação de sua capacidade reprodutiva após a realização da quimioterapia. As instâncias ordinárias concordaram com o pedido e condenaram a operadora a reembolsar à autora o valor aproximado de R$ 18 mil.

No recurso ao STJ, a operadora alegou que o contrato exclui expressamente técnicas de fertilização in vitro, inseminação artificial e quaisquer outros métodos de reprodução assistida.

Prevenir o dano evitável resultante do tratamento médico
A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou que o ordenamento jurídico considera de formas distintas o tratamento da infertilidade – que, segundo a jurisprudência, não é de cobertura obrigatória pelo plano – e a prevenção da infertilidade como possível efeito adverso da quimioterapia coberta pela operadora.

Com base no artigo 10, inciso III, da Lei 9.656/1998 e no artigo 17, parágrafo único, inciso III, da Resolução Normativa 465/2021 da Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS), a ministra explicou que a coleta dos gametas é uma das etapas do procedimento de reprodução assistida, cuja exclusão assistencial é permitida. Por outro lado, ela ressaltou que o artigo 35-F da Lei 9.656/1998 impõe às operadoras de planos de saúde a obrigação de prevenir doenças – como, no caso dos autos, a infertilidade.

De acordo com a relatora, do princípio primum, non nocere (primeiro, não prejudicar) também se extrai o dever de prevenir, sempre que possível, o dano previsível e evitável resultante do tratamento médico prescrito. “Partindo dessa premissa, verifica-se, no particular, que a infertilidade é um efeito adverso da quimioterapia, previsível e evitável, e que, portanto, pode – e, quando possível, deve – ser prevenido”, concluiu.

Solução deve atender expectativas da consumidora e da operadora
“Se a obrigação de prestação de assistência médica assumida pela operadora de plano de saúde impõe a cobertura do tratamento prescrito para o câncer de mama, a ele se vincula a obrigação de custear a criopreservação dos óvulos”, declarou Nancy Andrighi.

A ministra ponderou ainda que é necessário encontrar uma solução que atenda à expectativa da consumidora, de prevenção da infertilidade, sem impor à operadora obrigação desnecessária ou desarrazoada.

Com essa finalidade, ela considerou que a obrigação de custear a criopreservação dos óvulos, para a operadora, deve ser limitada à data da alta do tratamento de quimioterapia, cabendo à beneficiária, a partir daí, arcar com os custos do serviço.

Processo: REsp 1962984

TJ/DFT: Homem transgênero tem direito a medidas protetivas da Lei Maria da Penha

O Juiz do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Águas Claras/DF., reconheceu a legitimidade de homem transgênero, vítima de violência doméstica, ser beneficiado por medidas protetivas de urgência, previstas na Lei 11.340/2006, a Lei Maria da Penha.

No caso, foram expedidas medidas de afastamento do lar em que a vítima e o réu residiam e proibição de frequentar a mesma igreja, nos dias e horários em que o autor frequenta. Por sua vez, o réu afirma que, por documentos, a vítima se identifica como pertencente ao gênero masculino.

Ao decidir, o magistrado esclareceu que o Brasil se comprometeu com o combate a todas as formas de discriminação de gênero ao ratificar acordos e convenções internacionais. Por sua vez, a Lei Maria da Penha criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, no âmbito das relações domésticas e familiares. “A partir da interpretação literal das normas citadas, pode-se concluir que a legislação pátria somente protege as mulheres cisgêneras contra a violência praticada no âmbito familiar e Doméstico. No entanto, os Tribunais brasileiros vêm entendendo que a Lei 11.340/06 pode e deve ser aplicada a mulheres transgêneras, mesmo que não tenha havido alteração em seus registros civis”, observou.

O julgador destacou que, em decisões recentes, a mulher transgênera tem sido abarcada na proteção da Lei Maria da Penha, entre outros motivos, por sua dupla vulnerabilidade e pelo preconceito contra corpos estranhos na visão heteronormativa, espécies de violências de gênero também sofridas por homens transgêneros. “O patriarcado permeia toda a sociedade brasileira e a violência de gênero é mecanismo de reforço da ideia de dominância do homem cisgênero”, explicou.

De acordo com o Juiz, as experiências vividas por homens transgêneros não são muito diferentes daquelas vividas por mulheres transgêneras, estando os dois grupos de pessoas sujeitas à dupla vulnerabilidade e às violências de gênero. “Um homem transgênero (uma pessoa que foi designada como do sexo feminino no nascimento, mas que se identifica como do gênero masculino), pode ser lido e tratado socialmente e no âmbito familiar e doméstico como mulher e, por isso, sofre violências baseadas em gênero feminino – mesmo que sua performance de gênero seja predominantemente masculina. Da mesma forma, uma pessoa que foi designada como do sexo feminino no nascimento, mas que se identifica como não-binária, pode ser lida socialmente e no âmbito familiar e doméstico como mulher e, por isso, também pode sofrer violências baseadas em gênero feminino”.

Diante disso, o magistrado concluiu que a utilização restrita do critério da autodeclaração como mulher para aplicabilidade da lei se revela desproporcional, porque gera exclusão entre pessoas que sofrem as diversas formas de violência de gênero (feminino) no âmbito doméstico e familiar. “O critério utilizado, embora importante, é insuficiente para atingir o objetivo constitucional de coibir e prevenir a violência de gênero no ambiente doméstico. Isso porque o critério restrito de autodeclaração (mulher) exclui pessoas que sofrem das mesmas violências e opressões baseadas no tratamento que a sociedade patriarcal reserva a pessoas designadas como do sexo feminino no nascimento e cujas identidades transgridem a determinação social de gênero, de forma que a estrutura social patriarcal permanece intacta”, pondera.

O julgador avalia que “resta a essas pessoas a revitimização de se autodeclararem mulheres para acessar direitos e proteções, ou situação de ostracismo legislativo e jurídico, em que não conseguem acessar os mecanismos legais de proteção, muito embora no dia a dia sejam vítimas de violências baseadas em gênero”. Logo, na análise do magistrado, a interpretação que atribui maior eficácia à norma constitucional ao se aplicar a Lei 11.340/06 é aquela que toma como base a presença ou não da violência doméstica e familiar baseada no gênero feminino, seja por autodeclaração de gênero (mulher) da vítima, ou por constatação de que, por ter sido designada como do sexo feminino no nascimento, a pessoa está sujeita à violência de gênero socialmente praticada contra pessoas do gênero feminino.

Cabe recurso da decisão.

TRT/RS: Companheira deve receber verbas rescisórias de trabalhador falecido e nega pagamento a ex-esposa que não comprovou dependência

A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) negou provimento ao recurso interposto pela ex-esposa de um trabalhador falecido, por meio do qual ela postulava receber verbas rescisórias depositadas em ação de consignação em pagamento. No entendimento dos desembargadores, a ex-esposa não poderia receber os valores, já que não estava no rol de dependentes habilitados perante o INSS, e tampouco fez qualquer prova da dependência econômica em relação ao ex-marido. A decisão unânime da Turma confirmou a sentença da juíza Ana Júlia Fazenda Nunes, da 3ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul.

A ação de consignação em pagamento foi ajuizada pela empregadora em face da sucessão do trabalhador falecido, para que fossem corretamente destinadas as verbas rescisórias devidas ao empregado. A juíza de primeiro grau julgou procedente a ação, determinando que as parcelas fossem pagas à companheira do de cujus, única dependente habilitada perante o INSS, na forma do artigo 1º da Lei 6.858/1980. A magistrada ressaltou que a ex-esposa alegou ser dependente financeira do empregado falecido, porém não produziu qualquer prova neste sentido, “sendo este, inclusive, o motivo do indeferimento do pagamento da pensão por morte pelo INSS”, concluiu a julgadora.

Desta decisão, a ex-esposa do empregado interpôs recurso ordinário perante o TRT-4, argumentando que também seria legítima destinatária do valor consignado. Ela afirmou que teve o benefício de pensão por morte negado e ingressou com recurso administrativo, ainda pendente de julgamento. Por tal motivo, alegou que o processo deveria ter sido suspenso até o julgamento do recurso.

A relatora do caso na 6ª Turma, desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira, manteve a decisão de primeiro grau, por entender que a companheira, única dependente habilitada perante a autarquia previdenciária, é a legítima credora para o recebimento das verbas rescisórias. “Consoante referido, a recorrente não produziu o mínimo de prova acerca da sua dependência econômica em relação ao de cujus (falecido)”, afirmou a magistrada. O pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso também foi negado pela Turma, por não estarem presentes os requisitos específicos do fumus boni iuris (presunção da existência do direito) e do periculum in mora (risco de irreversibilidade do dano caso a medida não seja concedida).

A decisão transitou em julgado sem interposição de recurso. Também participaram do julgamento as desembargadoras Simone Maria Nunes e Beatriz Renck.

TJ/GO: Empresa de Vigilância é condenada a indenizar em R$ 350 mil uma mãe que teve sua filha assassinada pelo ex-namorado com revólver da empresa

Com base no Estatuto do Desarmamento e Código de Processo Civil, a juíza Karine Unes Spinelli, da 1ª Vara Cível, Infância e Juventude da comarca de Aparecida de Goiânia, condenou uma empresa de vigilância e transporte de valores a pagar indenização por danos morais de R$ 350 mil reais à mãe de uma moça, vítima de feminicídio praticado por seu ex-namorado e vigilante dessa unidade, que utilizou um revolver calibre 38 do estabelecimento para praticar o assassinato e também seu suicídio, em seguida.

A autora da Ação de Reparação/Indenização por Danos Morais relatou que no dia 17 de junho de 2022, por volta das 21 horas, a sua filha foi vítima de feminicídio praticado pelo ex-marido, por disparo de arma de fogo de propriedade da empresa. Ressaltou a responsabilidade da firma de vigilância, pela guarda das armas de fogo utilizadas pelos seus empregados, destacando que não foi observada a obrigação de fiscalizar e conferir as armas e munições, conforme dispõe o Estatuto do Desarmamento. Ela pediu R$ 500 mil, pelo óbito da filha e por depender financeiramente de sua ajuda.

A empresa de vigilância e transporte de valores defendeu que a contratação do homem ocorreu de acordo com as disposições legais vigentes. Alegou a ausência de culpa ou responsabilidade, sob o argumento de que cumpriu todas as suas obrigações e que o funcionário estava fora do horário de trabalho quando cometeu o crime, transgredindo o dever de manter a arma no cofre da agência bancária onde trabalhava.

A juíza Karine Unes Spinelli ressaltou que apesar de o feminicídio ter sido cometido quando o vigilante estava de folga, fora do ambiente de trabalho, por razões alheias ao exercício de sua atividade, a arma utilizada no crime era de propriedade da empresa de vigilância. “Considerando que o revólver é de propriedade da empresa de segurança privada, há responsabilidade da empresa de segurança privada pela violação do dever de vigilância, controle e guarda das armas de fogo, o que permitiu com que o vigilante portasse o objeto fora do ambiente e do horário de trabalho, utilizando-a para a prática de crime”, afirmou.

A magistrada observou, ainda, que embora o artigo 6°, VIII do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003) autoriza o porte de arma por empresas de segurança privada e de transporte de valores, esta autorização legal não contempla o porte fora do horário de serviço. “Ademais, a referida lei é clara ao dispor que as empresas de segurança privada são responsáveis pelas armas utilizadas por seus vigilantes, devendo estas observar as condições de uso e armazenamento estabelecidos pelo órgão competente”, pontuou a juíza da 1ª Vara Cível, Infância e Juventude da comarca de Aparecida de Goiânia.

“Assim, inafastável reconhecer a responsabilidade da empresa por falta do dever legal de cuidado, permitindo que o vigilante, seu empregado, saísse do prédio onde trabalhava portando, indevidamente, a arma que deveria utilizar apenas durante a prestação do serviço”, concluiu a juíza.

Processo nº 5025985-92.2023.8.09.0149

TJ/AC: Justiça condena ente público por morte de bebê em razão de demora para intervenção cirúrgica

Caso ocorreu em Xapuri; magistrado determinou pagamento por danos morais e existenciais e pagamento de pensão por morte ao casal pela morte prematura do bebê.


O Juízo da Comarca de Xapuri condenou o Estado do Acre a pagamento por danos morais e existenciais e pagamento de pensão por morte a um casal pela morte prematura do bebê em consequência de falha na prestação do serviço médico.

Na sentença, divulgada na segunda-feira, 14, no Diário da Justiça, o juiz de Direito Luís Pinto estipula pagamento de danos morais ao ente público no valor de R$ 50 mil, danos existenciais no valor de R$ 50 mil e o pagamento de pensão por morte ao casal equivalente a 2/3 do salário mínimo, desde os 14 até os 25 anos de idade e, partir disso, reduzido para 1/3 até a data em que o menor completaria 73,3 anos de idade, a ser pago em parcela única.

Entenda o caso

Conforme os autos, no dia 25 de dezembro de 2021, aproximadamente às 23h, o casal se direcionou ao Hospital Epaminondas Jácome na cidade de Xapuri, em razão das grandes dores que a mulher estava sentindo. No hospital, ela passou por exame e, passadas algumas horas, já na madrugada, o casal foi informado que precisava se dirigir ao hospital de Brasiléia, sob a alegação de que o parto normal não poderia ser realizado no hospital Epaminondas Jacome, em Xapuri. Todavia, mesmo havendo ambulância no local, o médico plantonista não teria autorizado a saída da ambulância para realizar a transferência da gestante para outro município. Os requerentes não possuem veículo próprio e necessitaram ligar para taxistas, mas devido o horário, não conseguiram ir durante a madrugada.

No dia seguinte, por volta das 7h30, chegaram ao Hospital de Clínicas Raimundo Chaar, em Brasiléia, onde foram informados da necessidade de realização do procedimento cirúrgico cesariana, mas que esse não poderia ser realizado por não haver médico habilitado na unidade.

Ainda de acordo com a alegação do casal, o procedimento cirúrgico de cesariana foi iniciado por voltadas 10h e que o médico informou que havia passado da hora para a realização do parto. A criança nasceu e foi levada de imediato para a Unidade de Terapia Intensiva, porém veio a óbito poucas horas depois. Os autores foram informados que devido à demora, havia início de infecção no umbigo e que se demorasse mais 30 minutos a genitora também teria ido a óbito.

Citado, o Estado do Acre, alegou que a autora não ficou desassistida em momento algum, teve acompanhamento médico desde que compareceu à rede pública de saúde e após o parto, e que o óbito do nascituro se deu em razão da má formação congênita.

Sentença

Ao analisar os autos, o magistrado verificou que restou sobejamente comprovados não só o ilícito praticado pelo médico durante o primeiro atendimento a autora, mas também o nexo de causalidade entre a sequência de atos ilícitos e o dano sofrido.

“E, dos elementos constantes dos autos, deduz-se a ocorrência dos requisitos a ensejar a responsabilidade do Estado por omissão (negligência, imprudência ou imperícia), a configurar a culpa, presentes na conduta negligente do atendimento médico prestado à parturiente”, diz trecho da sentença.

O magistrado destacou ainda que se deve indenizar não é o resultado, mas a perda de uma oportunidade (de ser mãe), que poderia ter evitado o óbito.

“Portanto, o nexo de causalidade entre a conduta médica realizada e a perda da chance de evitar-se a morte do filho dos autores restou evidente.

STJ: Menor sob guarda judicial do titular de plano de saúde deve ser equiparado a filho natural

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o entendimento de que o menor sob guarda judicial do titular de um plano de saúde deve ser equiparado a filho natural, impondo-se à operadora a obrigação de inscrevê-lo na condição de dependente natural, e não de agregado.

O colegiado deu provimento ao recurso especial para determinar a inscrição de uma criança sob a guarda da avó em seu plano de saúde, na condição de dependente natural, sem os custos adicionais do dependente inscrito como agregado.

“A jurisprudência desta corte se consolidou no sentido de que o menor sob guarda é tido como dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários, consoante estabelece o parágrafo terceiro do artigo 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)”, afirmou a relatora, ministra Nancy Andrighi.

Na origem do caso, a criança – representada pela avó detentora da guarda – acionou a Justiça para garantir sua inclusão no plano de saúde como dependente natural. O pedido foi negado em primeira e segunda instâncias. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) entendeu que a operadora não poderia ser obrigada a oferecer serviços sem a respectiva contrapartida financeira e que não houve violação aos direitos da criança com a negativa.

Menor sob guarda é dependente, inclusive para fins previdenciários
De acordo com a ministra Nancy Andrighi, a decisão do tribunal estadual destoa do entendimento do STJ. Ela explicou que o conceito de dependente para todos os fins já foi firmado pelo tribunal, inclusive, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 732).

“Sob essa perspectiva, a Terceira Turma, ao analisar situação análoga à dos autos, equiparou o menor sob guarda judicial ao filho natural, impondo à operadora, por conseguinte, a obrigação de inscrevê-lo como dependente natural – e não como agregado – do guardião, titular do plano de saúde”, afirmou.

Leia também: Criança sob guarda é equiparada a dependente natural em plano de saúde, decide Terceira Turma
“Infere-se, portanto, que o TJMS, ao concluir que ‘a apelante não pode se enquadrar como dependente natural, mas agregada (situação na qual já se encontra)’, destoou dessa orientação da Terceira Turma, à qual passo a aderir, merecendo, por conseguinte, ser reformado o acórdão recorrido”, concluiu Nancy Andrighi.

Veja o acórdão.
DProcesso: REsp 2026425


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