STJ: Mesmo com previsão no edital, arrematante não responde por dívida tributária anterior à alienação do imóvel

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, fixou a tese de que, “diante do disposto no artigo 130, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (CTN), é inválida a previsão em edital de leilão atribuindo responsabilidade ao arrematante pelos débitos tributários que já incidiam sobre o imóvel na data de sua alienação”.

Devido à mudança na jurisprudência do tribunal, o colegiado acompanhou a proposta do relator do Tema 1.134, ministro Teodoro Silva Santos, para modular os efeitos da decisão, determinando que a tese fixada só valerá para os leilões cujos editais sejam divulgados após a publicação da ata de julgamento do repetitivo, ressalvados pedidos administrativos e ações judiciais pendentes de apreciação, para os quais a tese se aplica de imediato.

Segundo o ministro, ainda que o parágrafo único do artigo 130 do CTN diga que, na alienação em hasta pública, o crédito tributário se sub-roga no preço, tornou-se praxe nos leilões realizados pelo Poder Judiciário a previsão editalícia atribuindo ao arrematante o ônus pela quitação das dívidas fiscais pendentes.

CTN diz que o arrematante recebe o imóvel livre de ônus
O ministro lembrou que a disciplina das normas gerais em matéria tributária está condensada no CTN, que foi recepcionado pela Constituição de 1988 com status de lei complementar. O código, explicou, estabelece normas que estruturam todo o sistema tributário nacional.

De acordo com o relator, nos casos de alienação comum, o artigo 130 do CTN prevê que o terceiro que adquire imóvel passa a ter responsabilidade pelo pagamento dos impostos, taxas ou contribuições de melhorias cujos fatos geradores tenham ocorrido antes da transmissão da propriedade. Contudo, o parágrafo único desse dispositivo excepciona a arrematação em hasta pública, hipótese em que a sub-rogação ocorre sobre o respectivo preço.

“Significa dizer que, quando a aquisição do imóvel ocorrer mediante alienação judicial, a sub-rogação se operará sobre o preço ofertado, e não sobre o arrematante, que receberá o bem livre de quaisquer ônus. Nesse específico caso, a aquisição da propriedade dar-se-á na sua forma originária, visto que não há relação de causalidade entre o antigo proprietário do bem e o seu adquirente”, afirmou.

Teodoro Silva Santos destacou que essa circunstância não deixa a dívida fiscal sem proteção, pois o crédito poderá ser satisfeito com o valor depositado em juízo pelo arrematante (sub-rogação da dívida no preço). Nessa situação, ressaltou o relator, o ente público concorrerá com outros credores, inclusive com titulares de créditos trabalhistas, que terão preferência. Na impossibilidade de satisfação integral da dívida, a Fazenda Pública deverá acionar o antigo proprietário para a recuperação do valor remanescente.

Edital não pode trazer regra diferente da prevista no CTN
O relator observou que a partir da previsão do artigo 686, inciso V, do Código de Processo Civil de 1973 e do artigo 886, inciso VI, do CPC/2015, foi adotada a tese de que a menção, no edital do leilão, dos ônus tributários que recaem sobre o imóvel afastaria o comando do artigo 130, parágrafo único, do CTN para permitir a responsabilização pessoal do arrematante pelo pagamento, dada sua prévia e inequívoca ciência da dívida.

No entanto, segundo o ministro, não é possível admitir que uma norma geral sobre responsabilidade tributária constante do próprio CTN – cujo status normativo é de lei complementar – seja afastada por simples previsão em sentido diverso no edital. Para ele, os dispositivos processuais que ampararam a orientação adotada pelo STJ não possuem esse alcance.

Teodoro Silva Santos comentou que são irrelevantes a ciência e a eventual concordância do participante do leilão em assumir o ônus pelo pagamento dos tributos sobre o imóvel arrematado. Em conclusão, alertou que é vedado exigir do arrematante, com base em previsão editalícia, o recolhimento dos créditos tributários incidentes sobre o bem arrematado cujos fatos geradores sejam anteriores à arrematação.

Veja o acórdão.
Processos: REsp 1914902; REsp 1944757 e REsp 1961835

STJ: Acordo para suspender execução não caracteriza desinteresse do credor no prosseguimento da ação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que não caracteriza perda do interesse de agir por parte do exequente a celebração de acordo, antes da citação, para suspender o trâmite da execução até que o devedor cumpra integralmente as condições ajustadas.

Com base nesse entendimento, o colegiado decidiu que o juízo de primeiro grau deve analisar os requisitos para a homologação do acordo e, em caso positivo, sobrestar o processamento da execução até o fim do prazo concedido pelo credor para que o executado cumpra a obrigação.

A execução de título extrajudicial foi ajuizada por um banco contra um tomador de crédito pessoal. Informado de que as partes, antes mesmo da citação, fecharam acordo no qual concordaram com a suspensão do processo até o pagamento integral da dívida, previsto para 2029, o juízo extinguiu o processo sem resolução de mérito, por entender que houve perda do interesse de agir.

O tribunal de segunda instância manteve a decisão, sob o fundamento de que a celebração do acordo extrajudicial se deu antes da citação do devedor, o que retrataria a falta de interesse do exequente no prosseguimento da execução.

No recurso ao STJ, o banco sustentou que a celebração do acordo no qual as partes concordam em suspender a execução até o cumprimento integral da obrigação evidencia o seu interesse processual. Acrescentou que não haveria necessidade da citação para a transação realizada, pois, não sendo cumpridos os termos do ajuste, a execução seria retomada.

É necessário negócio jurídico específico para caracterizar a suspensão
A relatora, ministra Nancy Andrighi, lembrou que a legislação processual permite às partes a celebração de negócio jurídico processual, o qual pode envolver alteração de prazos e até a suspensão do andamento do feito, de acordo com o artigo 922 do Código de Processo Civil (CPC). Para ela, a suspensão do processo exige negócio jurídico processual específico, “sendo irrelevante o fato de o acordo ter sido celebrado antes da citação do executado”.

A ministra ressaltou que é na data da última prestação ajustada que o processo deverá ser retomado pelo juízo, seja para declarar a sua extinção, diante do cumprimento do acordo, seja para a continuidade dos atos executórios, de acordo com o artigo 313, parágrafo 5º, e 922, parágrafo único, do CPC.

Em seu voto, a relatora destacou que o STJ entende que a necessidade do processo de execução não acaba com o acordo firmado entre as partes, que condicionaram a sua suspensão ao cumprimento integral da transação, sendo esse entendimento reiterado em hipótese de transação extrajudicial prévia à citação.

“O interesse de agir decorrente da celebração de negócio jurídico processual de suspensão de processo executivo está no incentivo ao cumprimento do acordo pela parte contra a qual a condição de retomada do curso da ação corre – isto é, o devedor e executado –, além da preservação do crédito exequendo no seu montante original e seus consectários decorrentes do restabelecimento da mora quanto ao título extrajudicial original”, afirmou Nancy Andrighi.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2165124

TST: Dano moral em ricochete – Relações de afeto ganham relevância em decisões na Justiça do Trabalho

Mortes em acidentes de trabalho têm gerado indenização a pessoas que não são da família nuclear, quando comprovado o afeto e o vínculo com a vítima.

Eles se conheciam desde a adolescência. Cresceram e viveram a vida toda na mesma cidade. Aos 15 anos “engataram o namoro”, e, 15 anos depois, no início de janeiro de 2019, noivos, foram juntos à Igreja Matriz de Brumadinho (MG) marcar o casamento. Contudo, cinco meses antes da cerimônia, uma lista emitida pela Vale S.A. na noite de 26 de janeiro indicava que Djener Paulo Las Casas Melo, o noivo, operador de máquinas, estava entre as 272 pessoas soterrados pela lama na tragédia do Córrego do Feijão. O sonho foi interrompido.

Essa história não é mais um caso de alguém que perdeu um ente querido na tragédia de Brumadinho. É diferente porque é única, em seus dramas, seus sofrimentos e sua luta. Essa noiva, Ketre Menezes de Paula, hoje microempresária, teve de juntar cartas de amor, fotografias e declaração da paróquia de Brumadinho para comprovar na Justiça seu direito à indenização pela morte do noivo – o chamado “dano moral em ricochete”.

Segundo a jurisprudência trabalhista, o dano em ricochete é presumido em relação ao núcleo familiar básico da pessoa falecida – cônjuge, companheiro ou companheira, filhos e pais. Recentemente, o TST reconheceu que o vínculo afetivo entre irmãos também dispensa a necessidade de prova do sofrimento. Quanto aos demais entes, familiares ou não, o laço afetivo ou a relação de proximidade devem ser devidamente comprovados nos autos. Ou seja, a afetividade passa a ter peso jurídico para resolução dos conflitos.

Provar afetividade é desafio doloroso.

Foi o caso de Ketre, em que o pedido foi feito com base no grau de afetividade, e não de parentesco. Essas situações enfrentam a barreira da ilegitimidade quando se propõe ação autônoma pelo dano em ricochete. São sogras, amigos, sobrinhas, namorados, enfim, pessoas que buscam o direito a uma reparação, mas que para isso têm de comprovar que tiveram com a vítima uma relação estreita de intimidade.

A microempresária explica que decidiu entrar com a ação porque as indenizações selecionadas por grau de parentesco pela empresa não incluíam noivas, apenas esposas. “Durante o processo, eles duvidaram da minha história com ele (o noivo) o tempo inteiro. Ficavam com um ar de que eu era uma oportunista e que estava me aproveitando da situação para me dar bem financeiramente. Essa foi a parte mais dolorosa do processo”, declarou.

Judicialmente, duvidar da história significa alegar que não há elementos suficientes para demonstrar a proximidade diária, constante e íntima, a ponto de gerar sentimento de perda passível de compensação financeira. À alegação segue a tese de que, se a reparação for estendida a todas as pessoas que, de algum modo, sentiram a dor da perda, corre-se o risco de banalizar o instituto do dano moral em ricochete, sobretudo quanto aos critérios de afetividade.

Para Wilson Paz, advogado da microempresária no processo, a alegação de banalização do dano moral em tragédias como a de Brumadinho soa como uma afronta à dignidade da Justiça. Segundo ele, a morte de alguém querido em decorrência da omissão ou de uma ação positiva do empregador deve ser punida de forma exemplar, para que o caráter pedagógico seja atingido, ou seja, para que a situação não se repita.

Em abril de 2022, a Vale perdeu seu último recurso no TST, e o direito à indenização por danos morais por ricochete foi reconhecido à microempresária pela morte do noivo em Brumadinho. Poucos meses depois, a sentença foi cumprida, e o caso foi arquivado.

Hoje, cinco anos e oito meses após a tragédia que impossibilitou a sonhada vida a dois, a microempresária disse que a cidade ainda é marcada pela sombra da injustiça e da saudade. Ela conta que refez a vida pela fé em Deus, o que não significa que apagou o que viveu. “Muito pelo contrário, cada passo traz uma lembrança, cada conquista traz um desafio: o desafio de ter que lidar com o passado, viver o presente e almejar o futuro com justiça feita”.

Novos arranjos familiares são considerados
Outra questão sensível que envolve casos de dano por ricochete por grau de afetividade é a compreensão de que as mudanças sociais das últimas décadas fizeram surgir novos arranjos familiares. Isso exige uma visão mais ampla do que vem a ser núcleo familiar (para além de pai, mãe e filhos) – tanto que, em 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união homoafetiva como núcleo familiar e as equiparou às uniões estáveis entre homens e mulheres.

No caso do dano em ricochete, cabe aos julgadores avaliar a legitimidade de quem pede reparação não só com base nos vínculos biológicos e matrimoniais, mas também no princípio da afetividade.

É o caso de um processo jem que o companheiro de um trabalhador, também vítima do acidente em Brumadinho, pediu reconhecimento do dano moral em ricochete. Ele anexou aos autos fotografias do casal, comprovantes de endereço, escritura pública declaratória e carta de concessão de benefício previdenciário para comprovar a união estável de mais de três anos.

A empresa, mais uma vez, rechaçou o direito pelo grau de afetividade. Alegou que os documentos careciam de fé pública e que o companheiro poderia facilmente os ter falsificado em programas de computador.

Contudo, as provas demonstraram a formação de laços estreitos de envolvimento emocional entre eles, e isso permitia concluir que a morte do trabalhador causou intenso sofrimento ao companheiro.

Agra Belmonte, ministro do Tribunal Superior do Trabalho, explica que a questão é de dano extrapatrimonial. “Estamos falando de sentimento, e o sentimento pode dizer respeito a qualquer pessoa de afinidade próxima”, observa. Segundo ele, isso envolve normalmente pessoas do convívio familiar, mas nada impede que se estenda a outras pessoas em relação às quais havia uma afinidade muito grande. “Você pode ter uma pessoa próxima a você, que não compõe o núcleo familiar, mas com quem tem um laço forte de afinidade. O critério é afinidade”.

Indenizações de Brumadinho já ultrapassam R$ 1 bi
De acordo com a Vale, na esfera trabalhista, as indenizações, por danos morais e materiais decorrentes do rompimento da barragem em Brumadinho chegam a mais de R$ 1,166 bilhões e foram destinadas a mais de 2,5 mil pessoas. Além disso, foram depositados R$ 400 milhões a título de dano moral coletivo, cuja destinação será definida por um Comitê Gestor composto pela Justiça do Trabalho, pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), pela Defensoria Pública da União (DPU) e por representantes das famílias atingidas.

A empresa não informou quanto desse montante foi destinado a pessoas que ajuizaram ação de dano moral em ricochete, além daqueles em que o dano afetivo foi reconhecido.

TST: Segurança de igreja não receberá adicional de periculosidade

Para a 8ª Turma, as condições do contrato não permitem enquadrar a atividade como perigosa.


Resumo:

  • Um agente de segurança da Igreja Universal do Reino de Deus pretendia receber o adicional de periculosidade, alegando que trabalhou por quase 20 anos em diversos templos no Rio de Janeiro, protegendo o patrimônio e os fiéis. –
  • O direito à parcela foi reconhecido pelo TRT da 1ª Região (RJ), que entendeu que ele trabalhava em situação de risco. –
  • Mas, para a 8ª Turma do TST, o agente não se enquadrava nas condições legais para receber o benefício, porque não trabalhava em empresa especializada nem protegia instalações públicas, como estações de metrô e rodoviárias.

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho isentou a Igreja Universal do Reino de Deus de pagar adicional de periculosidade a um agente de segurança que trabalhou 19 em diversos templos no Rio de Janeiro. Segundo o colegiado, o agente não se enquadra nas condições legais que obrigam o pagamento do adicional.

Protegendo a igreja e os fiéis, mas sem adicional
Na ação trabalhista, ajuizada em abril de 2019, o agente disse que, por quase 20 anos, protegeu o patrimônio da igreja e os fiéis sem receber adicional de periculosidade. Disse ter solicitado diversas vezes o benefício à Universal, mas apenas recebia respostas evasivas. Diante disso, pediu a condenação da igreja ao pagamento de adicional de 30% sobre os salários de todo período trabalhado, em valores que, na época, somavam R$ 98 mil.

Universal disse que agente nunca usou arma de fogo
Em contestação, a Universal afirmou que o agente nunca havia usado arma de fogo e não trabalhava para empresa prestadora de serviços de segurança privada.

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) concluiu que o trabalhador esteve exposto a risco e teve sua integridade física ameaçada. Essa situação gera o direito ao adicional de periculosidade, sendo irrelevantes o objeto social do empregador e a nomenclatura do cargo ocupado.

Lei prevê condições para ter direito ao benefício
A relatora do recurso da Universal, ministra Delaíde Miranda Arantes, explicou que a CLT prevê o pagamento da parcela a empregados sujeitos a roubo ou outros tipos de violência física nas atividades de segurança pessoal e patrimonial. Mas a concessão está condicionada aos requisitos previstos no Anexo 3 da Norma Regulamentadora (NR) 16.

A ministra lembrou que a igreja é pessoa jurídica de direito privado e que o agente não foi contratado por empresa registrada e autorizada pelo Ministério da Justiça. Ele também não trabalhava em instalações como ferroviárias ou rodoviárias ou bens públicos, contratado diretamente pela administração pública, como exige a norma.

Após a publicação da decisão, o agente de segurança opôs embargos de declaração, ainda sem julgamento.

Veja o acórdão.
Processo: RR-100547-28.2019.5.01.0067

TRF1: Gillette pagará mais de R$470 mil por não ter informado redução do número de lâminas de barbear em embalagem

Quando o fornecedor de um produto não apresenta informações claras e corretas sobre aquilo que está vendendo, ele pode ser responsabilizado por isso. Foi o que aconteceu a uma empresa que reduziu a quantidade de cartuchos de duas marcas de lâmina de barbear sem informar ao consumidor a redução. A instituição foi condenada, no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), a pagar a multa imposta em valor superior a R$ 470 mil.

Proteção da legítima confiança
Antes de parar na Justiça Federal, o caso foi discutido na então Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (antigo SDE), órgão que detinha as competências do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (o CADE, autarquia hoje responsável por zelar pela livre concorrência no Brasil).

Depois do processo administrativo na SDE, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor decidiu multar a empresa por ter reduzido a quantidade de cartuchos de quatro para três unidades sem esclarecer ao consumidor a mudança. A empresa procurou a Justiça Federal e em primeira instância conseguiu anular a multa. Entretanto, a Procuradoria Regional da União questionou, no TRF1, a retirada da sanção administrativa. A PRU obteve a reversão da decisão e a determinação para que a fornecedora fosse multada pela ausência de informação ao consumidor.

Para a relatora, juíza federal convocada Mara Lina Silva do Carmo, é a proteção da legítima confiança que está em julgamento quando o fornecedor não apresenta informações claras e corretas sobre o produto em circulação. “De fato”, observou a magistrada, ao analisar o caso, “nas embalagens não consta informação sobre redução da quantidade X para a quantidade Y; traz a informação sobre a quantidade de produto contida na embalagem, e não sobre a redução da quantidade de produto. A prova de ausência da informação é a própria embalagem sem a informação sobre tal redução”, concluiu.

Ainda de acordo com a relatora, acompanhada, por unanimidade, pela 6ª Turma do TRF1, com a inversão do ônus da prova (prevista no Código de Defesa do Consumidor) caberia ao fornecedor comprovar que a alteração não informada se devia a uma mudança de estratégia mundial de marketing, como havia alegado, sem que isso pudesse ser considerado “maquiagem de produto” – o que ofende o direito fundamental à informação previsto na Constituição e no Código de Defesa do Consumidor.

Processo: 0026342-24.2007.4.01.3400

TRF1: Candidata tem direito de participar do Enem mesmo após o pagamento atrasado da taxa de inscrição por motivo de saúde

A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença que garantiu a participação de uma candidata no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem 2021) mesmo após o pagamento atrasado da taxa de inscrição em decorrência de problemas de saúde.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) sustentou que os candidatos devem seguir as regras estabelecidas no edital afirmando que é responsabilidade do participante efetuar o pagamento da taxa de inscrição dentro do prazo estipulado.

Consta nos autos que a candidata apresentou relatório médico psiquiátrico com o diagnóstico de “Transtorno Afetivo Bipolar, Transtorno Obsessivo Compulsivo e Distúrbio Alimentar do tipo Anorexia Grave”, comprovando que o “pico do adoecimento” se deu no período destinado ao pagamento da taxa

Ao analisar o caso, o relator, juiz federal convocado Wilton Sobrinho da Silva, destacou o entendimento do TRF1 de que o pagamento tardio da taxa de inscrição por motivo alheio à vontade do candidato não deve ser motivo de o INEP impedir a participação do candidato no exame em respeito ao princípio da razoabilidade, especialmente na ausência de qualquer prejuízo para a Administração.

O relator citou caso análogo a este, no qual o Tribunal já decidiu que “não é razoável impedir a participação do aluno no exame tendo em vista não ser razoável que o aluno, menor de idade, seja prejudicado por motivo ao qual não deu causa” (AC 1006492-51.2018.4.01.3700, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, TRF1 – QUINTA TURMA, PJe 13/08/2021 PAG.)

Desse modo, o Colegiado, por unanimidade, negou provimento à apelação nos termos do voto do relator.

Processo: 1081228-62.2021.4.01.3400

TRF1 mantém eliminação de candidato a soldado da Polícia Militar na fase de investigação social

A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) considerou legal o ato administrativo que eliminou um candidato do concurso de Soldado Militar do Estado de Mato Grosso na fase de investigação social diante da existência de registros criminais e do inadimplemento de obrigações fiscais em seu nome.

Inconformado com a decisão do Juízo Federal da 3ª Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso que negou o pedido para anular o ato de eliminação que considerou ilegal, o autor recorreu ao Tribunal.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Rafael Paulo, explicou que “é forçoso reconhecer a legitimidade da exigência de idoneidade moral, e de procedimentos irrepreensíveis, ao candidato que visa a ocupar cargo público, mormente quando se pretende carreira ligada à segurança pública”.

Para o magistrado, a exclusão do candidato está revestida de legalidade, pois foi praticada dentro das regras previstas nas normas de regência do edital, visto que a banca avaliadora do certame verificou existência de condutas reprováveis, puníveis, não toleradas em relação a candidatos de carreiras específicas como a carreira policial, a que o autor concorre.

A decisão do Colegiado foi unânime.

Processo: 1026862-21.2022.4.01.3600

TJ/RN: Detran deve reconhecer direito de pessoa com deficiência a ter CNH especial

A Justiça determinou que o Departamento Estadual de Trânsito do Rio Grande do Norte (Detran) reconheça o direito de uma Pessoa com Deficiência (PcD) em ter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) especial. A decisão é dos desembargadores da 3ª Câmara Cível do TJRN que, à unanimidade de votos, reformaram a sentença e reconheceram a condição da autora da ação.

Ela interpôs apelação cível em virtude de o Detran-RN ter negado o reconhecimento da sua condição de portadora de deficiência física e, em consequência, impedindo-a de requerer os benefícios fiscais pertinentes.

A mulher sustenta que o laudo oficial concluiu pela ausência de deficiência, e foi realizado pelo “simples olhar”, sem qualquer exame aprofundado. A autora da ação alega que possui patologias que a identificam como PcD, quais sejam, encurtamento de membros e malformações, bem como próteses internas e externas no quadril.

Conclusão do seu ortopedista particular comprova a gravidade de sua condição de saúde ainda em progressão, cujas sequelas acarretam dificuldade e dores para dirigir veículo sem câmbio automático e resultaram em sua aposentadoria especial por invalidez.

A mulher apresentou laudo médico realizado por seu ortopedista particular, atestando ser portadora de coxartrose bilateral por doença congênita, possuidora de prótese metálica em ambos os fêmures, desnivelamento da bacia e com comprometimento artrósico dos joelhos em progressão, concluindo pela sua deficiência física.

Anexou aos autos, ainda, exame de escanometria, comprovando possuir uma diferença em seus membros inferiores de 1,1 cm e uma carta concessiva de Aposentadoria por Invalidez do Instituto de Previdência Dos Servidores Estaduais (IPERN).

Decisão
O relator do processo, desembargador Vivaldo Pinheiro, destacou em seu voto que “se para a aposentadoria por invalidez, o IPERN entendeu que a patologia que acomete a servidora era suficiente para a considerar incapacitada para laborar, muito mais deve ser considerado para exigir um veículo com câmbio automático para ela dirigir, haja vista o comprovado desnivelamento dos seus membros inferiores, prótese bilateral na bacia e dor devido a essa condição”.

Além do mais, o magistrado de segunda instância ressaltou que o médico particular da requerente se trata de um especialista em ortopedia, enquanto os médicos que assinaram o laudo constante do recurso administrativo junto ao Detran se tratam de dois oftalmologistas. Por isso, votou pela concessão do direito da cidadã, na condição de Pessoa com Deficiência (PCD), em ter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) especial.

TRT/SP: Trabalhador que perdeu parte do dedo e se desligou da empresa por medo de novo acidente obtém rescisão indireta

Sentença prolatada na 4ª Vara do Trabalho de Osasco-SP reconheceu a rescisão indireta em favor de um trabalhador que teve o dedo decepado em acidente ocorrido durante sua atividade profissional em um supermercado. O reclamante pediu demissão à época do desligamento, mas declarou em juízo que o fez por medo e por não ter condições psicológicas de continuar na função.

Segundo os autos, o empregado sofreu amputação do terceiro dedo da mão esquerda enquanto operava uma máquina de corte de carnes, embora tenha avisado previamente ao seu supervisor hierárquico sobre um defeito que a máquina apresentava na serra. Uma testemunha relatou que teve o dedo amputado antes do reclamante, no mesmo equipamento, reforçando a responsabilidade do empregador. Com isso, foi afastada a tese proposta pela empresa de culpa exclusiva ou concorrente do trabalhador.

Segundo a juíza Tatiane Pastorelli Dutra, o trabalhador se demitiu em estado de perigo, previsto no artigo 156 do Código Civil. O cenário, segundo o dispositivo legal, se estabelece quando alguém assume obrigação excessivamente onerosa, no intuito de salvar-se. “Trazendo o conceito do instituto para o processo trabalhista, tem-se que o reclamante só pediu demissão, assumindo as consequências dessa decisão onerosa (recebimento de haveres rescisórios em valor muito inferior ao devido), por entender que se encontrava em estado de perigo, premido da necessidade de salvar sua integridade física de outro grave dano”, afirmou.

Levando em conta também a omissão do supermercado em estabelecer melhores situações de segurança após o primeiro acidente, a interpretação da magistrada levou à declaração de nulidade do ato e à rescisão indireta, determinando assim que o supermercado pague todas as verbas rescisórias a que o empregado teria direito em caso de dispensa sem justa causa.

A empresa foi condenada ainda a indenizar o trabalhador em R$ 50 mil por danos morais e em R$ 30 mil por danos estéticos, ambos em decorrência do acidente de trabalho. A juíza também oficiou o Ministério Público do Trabalho para que o órgão promova a autuação da empresa, providenciando diligências e investigações, diante dos indícios de lesão coletiva.

TRT/GO: Justiça do Trabalho reconhece “etarismo recreativo” e condena empresa a indenizar funcionária discriminada por idade

Uma empresa de serviços terceirizados de Anápolis terá de indenizar uma porteira que sofreu discriminação no trabalho por sua idade. A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO) concluiu que houve a prática do chamado “etarismo recreativo”, termo usado para descrever atitudes preconceituosas contra uma pessoa idosa disfarçadas de “brincadeira”.

Conforme o processo, um colega de trabalho chamava a porteira de “velha” e comentava que “a empresa precisava contratar pessoas mais novas”. As manifestações discriminatórias eram conhecidas por um representante da empresa, que não tomou providências para interromper o comportamento. Na decisão inicial, a 3ª Vara do Trabalho de Anápolis havia considerado o etarismo uma forma de assédio moral, entendendo que a conduta reiterada teria partido do superior hierárquico e teria causado humilhação à funcionária. A empresa recorreu, argumentando que eram apenas “brincadeiras” entre colegas, sem intenção maliciosa ou perseguição.

Na análise do recurso, o relator do caso, desembargador Marcelo Pedra, afirmou que não foi constatado o assédio propriamente dito, pois o depoimento testemunhal confirmou que as supostas “brincadeiras” partiram não de superior hierárquico, mas de um colega de mesmo nível hierárquico da porteira. Ele entendeu que, nesse caso, foi caracterizado o “etarismo”, conduta discriminatória em razão da idade. “O sancionamento, portanto, se mostra impositivo, inclusive para fins de, pedagogicamente, rechaçar a tentativa de naturalização de tal modalidade de tratamento sob a camuflagem do “humor”, destacou.

Responsabilidade do empregador
O relator afirmou que a culpa da empresa consistiu em permitir a continuidade do tratamento discriminatório, mesmo com o alerta feito ao representante da empresa, deixando de proporcionar à autora um ambiente de trabalho psiquicamente saudável. Segundo o relator, ocorreu uma violação direta ao Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), que proíbe qualquer forma de discriminação, negligência ou violência contra pessoas idosas. Ele também mencionou que, em tese, esse tipo de ação pode ser configurada prática criminosa.

O desembargador concluiu que, ainda que as manifestações degradantes não tenham partido de superior hierárquico, permanece sendo da empresa a responsabilidade pelos atos dos seus empregados, independentemente de culpa, conforme os artigos 932 e 933 do Código Civil. Ao final, a indenização fixada na primeira instância em R$ 5 mil foi ajustada para R$ 3 mil, considerando os precedentes da Turma julgadora e os critérios do art. 223-G da CLT.

Na mesma decisão, a 3ª Turma negou o recurso da porteira para converter seu pedido de demissão em dispensa sem justa causa. Foi mantido o entendimento da primeira instância de que a falta grave da empresa não é suficiente para concluir que o pedido de demissão tenha sido feito sob coação, considerando que a trabalhadora não apresentou provas de que tenha sido coagida a pedir demissão. A decisão foi unânime.

Processo: 0010530-38.2024.5.18.0053


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