STF suspende regra federal que mudava base de cálculo de ICMS sobre energia elétrica

Em análise preliminar, o ministro Luiz Fux observou a possibilidade de que a União tenha invadido a competência tributária dos estados.


O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu dispositivo legal que havia retirado da base de cálculo do ICMS as tarifas dos serviços de transmissão e distribuição de energia elétrica e encargos setoriais vinculados às operações com energia. A liminar foi concedida no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7195 e será submetida a referendo do Plenário.

Na ação, governadores de 11 estados e o do Distrito Federal questionam alterações promovidas pela Lei Complementar federal 194/2022, que classifica combustíveis, gás natural, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo como bens e serviços essenciais, o que impede a fixação de alíquotas acima da estabelecida para as operações em geral. Entre outros pontos, a norma modificou o inciso X do artigo 3° da Lei Kandir (Lei Complementar 87/1996) e retirou da base de cálculo do imposto estadual os valores em questão.

Competência tributária
Na análise preliminar da matéria, o ministro observou a possibilidade de que a União, ao definir os elementos que compõem a base de cálculo do tributo, tenha invadido a competência dos estados relativamente ao ICMS. “Não se afigura legítima a definição dos parâmetros para a incidência do ICMS em norma editada pelo Legislativo federal, ainda que veiculada por meio de lei complementar”, ressaltou.

De acordo com Fux, a discussão sobre a base de cálculo adequada na tributação da energia elétrica (se o valor da energia consumida ou o da operação, que incluiria os encargos tarifários objeto da ADI) ainda está pendente de julgamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sob o regime de recurso especial repetitivo. Contudo, ele considerou urgente a concessão da medida cautelar, especialmente em razão de possíveis prejuízos bilionários pelos estados decorrentes da norma questionada. Segundo estimativa trazida aos autos, a cada seis meses, os estados deixam de arrecadar, aproximadamente, R$ 16 bilhões, o que também poderá repercutir na arrecadação dos municípios.

Acordo
O ministro observou, ainda, que o objeto de sua decisão não está abarcado no acordo firmado entre os entes federativos no âmbito da ADI 7191 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 984, que diz respeito ao ICMS sobre combustíveis.

Veja a decisão.
Processo relacionado: ADI 7195

STJ Anula decisão que determinou encaminhamento imediato de crianças venezuelanas para adoção

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, concedeu habeas corpus para permitir que um casal venezuelano visite seus filhos em instituição de acolhimento e suspender os efeitos de uma sentença no ponto em que determinava o encaminhamento imediato das crianças para adoção.

O Ministério Público de Santa Catarina ajuizou ação de destituição do poder familiar cumulada com acolhimento institucional dos dois filhos de um casal de imigrantes venezuelanos. O órgão indicou que, apesar do acompanhamento dos serviços da rede de proteção, havia sinais de agressividade dos pais e de negligência com relação às crianças.

Após a realização de estudos por equipe profissional multidisciplinar, o juízo de primeiro grau julgou procedente a ação para destituir o casal do poder familiar e ordenar o acolhimento institucional dos menores, determinando que fossem encaminhados à adoção e que lhes fosse assegurado o acesso ao ensino público.

Para o TJSC, condição de vida dos pais deve ser verificada novamente
Antes de decidir sobre a apelação dos pais, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) considerou que as provas não eram suficientes, sobretudo em razão do tempo decorrido desde o parecer da equipe multidisciplinar, e determinou a verificação das atuais condições de vida dos interessados.

A Defensoria Pública de Santa Catarina impetrou habeas corpus no STJ, apontando a ilegalidade do encaminhamento dos menores para adoção. Afirmou que o novo estudo social não tem prazo para ser concluído e que os pais já estão há sete meses sem poder visitar as crianças na instituição onde elas se encontram.

Decisão pode levar crianças a uma situação de insegurança afetiva
O relator do habeas corpus, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que o tribunal estadual, mesmo reconhecendo a necessidade de complementação de provas, permitiu o cumprimento da sentença quanto ao imediato encaminhamento das crianças para uma família substituta.

Para o ministro, esse comando da sentença não contribui para a segurança jurídica nem para os interesses prioritários das crianças, pois a sua inserção imediata em processo de adoção é capaz de levar à criação de vínculos afetivos com terceiros, os quais poderão ser rompidos a qualquer tempo, tendo em vista a precariedade da decisão de primeiro grau, ainda sujeita à apreciação do TJSC.

Bellizze destacou que o artigo 199-B do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – ao impedir, em regra, que o recurso de apelação contra a sentença de destituição do poder familiar tenha efeito suspensivo – não permite o retorno imediato do menor ao lar, mas não obriga que ele seja imediata e automaticamente encaminhado para adoção.

Impedir contato com os pais contraria interesse das crianças
O relator ressaltou também que, mesmo que o acolhimento institucional tenha sido deferido com a intenção de proteger as crianças – não propriamente de atos dos genitores contra elas, mas da “situação de rua” então vivenciada pela família e, depois, das condições precárias de moradia –, a proibição de contato com os pais contraria seus interesses prioritários.

Segundo o ministro, o relato de que o casal teria sido agressivo com serventuários da Justiça, integrantes da equipe multidisciplinar e até com policiais, sobretudo quando os mandados de busca e apreensão das crianças foram cumpridos, “não se relaciona propriamente com o tratamento dado às crianças e revela, por outro lado, manifesta irresignação de uma mãe e de um pai com a retirada de seus filhos” – razão pela qual não poderia servir de fundamento para mantê-los separados.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

STJ: Para evitar penhora, cabe ao executado comprovar que a pequena propriedade rural é explorada pela família

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é ônus da parte devedora a comprovação, para efeitos de impenhorabilidade (artigo 833, inciso VII, do Código de Processo Civil – CPC), de que sua propriedade rural, além de pequena, é trabalhada pela família para a própria subsistência. Com a decisão, fixada por maioria de votos, o colegiado resolveu divergência sobre se caberia ao devedor – como entendia a Terceira Turma – ou ao credor – conforme julgamentos da Quarta Turma – fazer prova da situação do imóvel rural com o objetivo de confirmar ou afastar a impenhorabilidade.

“Sob a ótica da aptidão para produzir essa prova, ao menos abstratamente, é certo que é mais fácil para o devedor demonstrar a veracidade do fato alegado, pois ele é o proprietário do imóvel e, então, pode acessá-lo a qualquer tempo. Demais disso, ninguém melhor do que ele para saber quais atividades rurícolas são desenvolvidas no local”, afirmou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

No julgamento, o colegiado também ratificou a jurisprudência segundo a qual a impenhorabilidade é mantida mesmo nos casos em que o imóvel foi dado em garantia hipotecária pelo proprietário.

Após a declaração de impenhorabilidade de um imóvel rural em ação de execução, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou a decisão por considerar que os devedores não apresentaram documentos capazes de provar que a família produzia no local e dali tirava o seu sustento.

Para devedores, exploração familiar deveria ser presumida
No recurso especial, os devedores alegaram que, em se tratando de uma pequena propriedade rural, seria presumida a sua exploração em caráter familiar e para a própria subsistência. Assim, para os recorrentes, seria ônus do exequente fazer prova de que a propriedade não era trabalhada pela família.

A ministra Nancy Andrighi explicou que, apesar de o artigo 833, inciso VII, do CPC garantir a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, a legislação não esclareceu o que seria a pequena propriedade para esse fim. Em razão dessa lacuna, apontou, a jurisprudência tem utilizado o conceito trazido pela Lei 8.629/1993, segundo a qual a pequena propriedade corresponde àquela de até quatro módulos fiscais (o módulo fiscal é definido por município).

Segundo a ministra, é pacífico no STJ o entendimento de que incumbe ao devedor demonstrar que a propriedade penhorada não ultrapassa quatro módulos fiscais.

Já em relação à utilização do bem para a economia familiar, a relatora lembrou que cabe ao autor da ação o ônus de provar o fato constitutivo de seu direito e, em contraposição, é dever do réu demonstrar o fato extintivo, impeditivo ou modificativo desse direito, nos termos do artigo 373 do CPC. Desse modo – concluiu a magistrada –, é sobre o executado que recai o encargo de comprovar os requisitos para o reconhecimento da impenhorabilidade.

Lei 8.009/1990 não obriga dono a provar que imóvel seja único para moradia
Em seu voto, Nancy Andrighi destacou que a Quarta Turma, ao reconhecer uma presunção relativa de que a pequena propriedade é trabalhada pela família, equiparou a impenhorabilidade do pequeno imóvel rural à impenhorabilidade do bem de família. Entretanto, a ministra lembrou que, apenas no caso do bem de família, não é necessária a demonstração de que o imóvel é único e destinado para moradia familiar, porque esse não é um requisito previsto pela Lei 8.009/1990.

“De forma diversa, o artigo 833, inciso VIII, do CPC/2015 é expresso ao condicionar o reconhecimento da impenhorabilidade da pequena propriedade rural à sua exploração familiar. Isentar o devedor de comprovar a efetiva satisfação desse requisito legal e transferir a prova negativa ao credor importaria em desconsiderar o propósito que orientou a criação dessa norma, o qual, repise-se, consiste em assegurar os meios para a manutenção da subsistência do executado e de sua família”, concluiu a ministra ao manter o acórdão do TJSP.

Processo: REsp 1913234

STJ absolve mulher condenada injustamente a 60 anos de prisão

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), absolveu uma mulher que havia sido condenada a 60 anos de reclusão pelo crime de latrocínio contra um casal de idosos. Apesar de não conhecer do habeas corpus impetrado pela defesa, por ser substitutivo de recurso próprio, o magistrado concedeu a ordem de ofício, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (CPP).

De acordo com o processo, ainda na fase do inquérito policial, um dos autores do crime confessou e apontou o envolvimento da mulher como coautora. Presa em flagrante em 2016, ela foi condenada em 2018. Na sentença, o juiz afirmou que, como já vinha respondendo presa, a ré não poderia recorrer em liberdade. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a condenação em 2019.

No habeas corpus submetido ao STJ, a defesa argumentou que a condenação fundamentada exclusivamente em depoimento tomado no inquérito contraria o devido processo legal, conforme o artigo 155 do CPP.

Corréu se retratou na fase judicial
Em decisão monocrática, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca destacou ter ficado comprovado nos autos que a condenação da mulher teve como base apenas o depoimento extrajudicial do corréu, o qual, inclusive, se retratou em juízo.

O ministro apontou que os policiais, quando ouvidos na fase judicial, apenas repetiram a versão do corréu colhida na delegacia, dando a aparência de prova judicializada, mas sem nada agregar à prova produzida no inquérito.

Reynaldo Soares da Fonseca também observou que, na sentença condenatória, não consta nenhum outro elemento de convicção acerca da suposta participação da mulher no crime.

“O juiz pode se utilizar da prova extrajudicial para reforçar seu convencimento, desde que corroborada por provas produzidas durante a instrução processual ou desde que essas provas sejam repetidas em juízo, o que não se verificou na hipótese”, concluiu.

Veja a decisão.
Processo: HC 793011

TST: Empresa de saúde é condenada por ausência de pessoas negras em guia de padronização visual

A falta de diversidade foi considerada discriminatória.


A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação de uma empresa de saúde de São Paulo (SP) ao pagamento de indenização a uma empregada negra. O colegiado rejeitou o exame de recurso de embargos contra decisão da Segunda Turma do TST, que havia concluído que o fato de o manual de padronização visual da empresa não ter contemplado pessoas negras caracteriza discriminação racial

Padrão visual
Na reclamação trabalhista, uma operadora de atendimento disse que uma das exigências era de que cabelos compridos abaixo dos ombros deveriam ficar sempre presos, e não era permitido o uso de franja. Os cabelos curtos, acima dos ombros e desde que não tivessem franjas, poderiam ser utilizados soltos. Segundo ela, porém, o material do treinamento de padronização visual não fazia referência à cútis ou ao cabelo de pessoas negras e, durante seu treinamento, fora determinado que usasse o seu preso, embora fosse curto e sem franja.

Ainda de acordo com seu relato, sua supervisora/coordenadora a advertira que seu cabelo não estava “suficientemente amarrado”, e a não observância da padronização poderia ter como consequência até mesmo a demissão por justa causa.

Material ilustrativo
Em sua defesa, a empresa sustentou que a empregada já usava o cabelo no estilo black power quando fora contratada e que o material de treinamento era meramente ilustrativo, composto de desenhos e regras a serem observadas.

Discriminação institucional
O pedido de indenização foi indeferido pelo juízo de primeiro grau e pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP). Mas a Segunda Turma do TST condenou a empresa a pagar R$ 10 mil por danos morais. Para esse colegiado, a falta de diversidade racial no guia de padronização visual da empresa é uma forma de discriminação, ainda que indireta, e fere a dignidade e a integridade psíquica das pessoas negras, que não se sentem representadas em seu ambiente laboral.

De acordo com a Turma, toda a forma de discriminação deve ser combatida, notadamente a mais sutil de ser detectada, como a institucional ou estrutural, praticada por instituições privadas ou públicas, de forma intencional ou não, com o poder de afetar negativamente determinado grupo racial.

Condenação mantida
Nos embargos à SDI-1, a empresa alegou que não há dispositivo legal que a obrigue a representar todas as cores e etnias em seus documentos internos.

Contudo, o relator, ministro Hugo Carlos Scheuermann, assinalou que os julgados juntados pela defesa para combater a decisão tratam de matérias não analisadas pela Segunda Turma. Nesse sentido, não foi possível apreciar o recurso, conforme impedimento previsto na Súmula 296, item I, do TST.

TRF1: Caixa Seguradora é condenada a indenizar companheira de segurado que faleceu em acidente com motocicleta conduzida sem habilitação

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em julgamento na 5ª Turma, não acatou o recurso da Caixa Seguradora S/A contra a sentença do Juízo Federal da Subseção Judiciária de Uberlândia/MG que condenou a instituição ao pagamento de indenização para quitação de financiamento habitacional.

A requerente da ação tinha união estável com o segurado. Eles adquiriram imóvel financiado pela Caixa Econômica Federal (CEF), tendo arcado com todas as prestações e demais cobranças referentes ao bem. Após o falecimento do seu companheiro, decorrente de acidente de motocicleta, a autora solicitou a abertura do sinistro junto à seguradora. No entanto, a seguradora negou-se a quitar o financiamento (apesar da cobertura securitária) alegando que o mutuário não possuía Carteira Nacional de Habilitação para condução de motocicletas. Diante disso, a CEF informou à parte autora que o imóvel seria retomado.

O relator, desembargador federal Souza Prudente, ao analisar o processo, explicou que os fundamentos que ampararam a sentença foram acertados considerando a jurisprudência dos tribunais no sentido de que “a exoneração do dever da seguradora de pagamento da indenização do seguro de vida somente ocorrerá se a conduta direta do segurado configurar efetivo agravamento (culposo ou doloso) do risco objeto da cobertura contratada, consubstanciando causa determinante para a ocorrência do sinistro” e de que “a ausência de habilitação do segurado para dirigir veículo (infração administrativa tipificada no artigo 162 do Código Brasileiro de Trânsito) não configura, por si só, o agravamento intencional do risco do contrato de seguro de vida, apto a afastar a obrigação de indenizar da seguradora .

Assim, esclareceu o magistrado, como não ficou demonstrado que a ausência de habilitação legal, por parte do segurado, para condução do veículo envolvido no sinistro de que resultou a sua morte, afigura-se cabível a cobertura securitária e consequente quitação integral do saldo devedor do contrato de financiamento celebrado com as promovidas Caixa Econômica Federal e Caixa Seguradora S/A.

Processo: 1006337-30.2018.4.01.3803

TRT/MT: Liminar garante redução de 50% na jornada de trabalho de mãe de dois filhos com deficiência

Uma técnica de enfermagem que atua em um hospital público, em Cuiabá, terá a jornada de trabalho reduzida em 50% para acompanhar o tratamento de dois filhos menores de idade, ambas pessoas com deficiência.

A decisão foi dada em caráter liminar pelo juiz Fábio Pacheco, em atuação em uma das varas da Capital, e atende pedido da trabalhadora, que atualmente cumpre jornada semanal de 30 horas.

Ao requerer a redução, a trabalhadora apresentou relatórios médicos que comprovam o quadro clínico e tratamento a ser seguido pelas crianças, uma delas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), e a outra, com Transtorno do Déficit de Atenção com hiperatividade (TDH). A rotina familiar impõe cuidados especiais e uma dedicação extra da mãe trabalhadora. No primeiro caso, o tratamento inclui rotineiramente terapia ocupacional, sessões de fonoaudiologia e psicologia comportamental duas vezes por semana cada uma, todas elas essenciais para o desenvolvimento das capacidades cognitiva e de interação social. Já o outro filho, necessita de acompanhamento interdisciplinar e terapia ocupacional.

Ao decidir, o juiz lembrou que a harmonia familiar e o equilíbrio das relações de trabalho se complementam e o nexo entre eles, mesmo que aparentemente dissociados, estão entrelaçados quando se analisa uma situação em que há necessidade de disposição de tempo para atender um membro que requer maior atenção, como é o caso das pessoas com deficiência. “A necessidade especial requer doação de outro ser humano, que geralmente se concentra na pessoa dos pais ou filhos, ou parentes mais próximos, os quais por falta de apoio da sociedade, seja por objetivos capitalistas, seja pela ausência de uma política social mais adequada, acabam por ser alijados do processo de desenvolvimento profissional ou mesmo alienados do meio, ocasionando um aumento de dependentes da previdência social”, ponderou o magistrado.

Tutela antecipada

Diante do contexto, o juiz concluiu estarem presentes os requisitos para atender o pedido da tutela antecipada, ou seja, a probabilidade do direito e o perigo de dano irreparável caso se deixe a decisão para o fim da tramitação do processo. Citou o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) que se baseia no Princípio da Dignidade da Pessoa Humana estabelecido na Constituição e defende o objetivo, também constitucional, de afastamento de discriminação em quaisquer setores, incluindo as relações de trabalho. Para isso, deve-se aplicar a chamada isonomia no aspecto material (tratar os desiguais na medida da sua desigualdade). O tema também tem amparo na Convenção 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em vigor no Brasil desde 1991.

O magistrado observou ainda que a Lei 13.370/2016 prevê horário de trabalho especial, sem perda salarial ou necessidade de compensação de horas, quando for pessoa com deficiência ou houver cônjuge, filho ou dependente em tal condição.

Quanto à urgência, o juiz apontou que ela se evidencia “à medida que os tratamentos são contínuos ao longo da vida dos menores, em especial daquele que detém o TEA, sendo inegável que o acompanhamento é medida necessária e atual.”

Assim, determinou a redução da carga horária da trabalhadora em 50%, passando de 30 horas para 15 horas semanais, sem necessidade de compensação e sem redução e comprometimento da remuneração. O processo se encontra em segredo de justiça, razão pela qual o número não pode ser divulgado.

TJ/TO: “No meio do caminho havia um buraco que o município não fechou”, frisa juiz ao condenar Prefeitura a indenizar motorista por danos morais

“Quando a administração pública permite a permanência de buracos nas estradas, expõe a população a risco de vida, a danos físicos, a prejuízos materiais”, ponderou o juiz Océlio Nobre ao condenar o Município de Palmas a indenizar Istergnon Almeida dos Santos em R$ 5 mil por danos morais e ainda a ressarci-lo em R$ 356,00 em razão dos prejuízos causados por ele ter danificado sua motocicleta ao cair em um buraco na TO-050.

Respondendo pela Vara da Fazenda e Reg. Públicos de Palmas, o magistrado ressaltou que os valores, tanto do ressarcimento frente aos prejuízos com a motocicleta, quanto os relacionados ao dano moral terão que ser corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios, desde a data do sinistro (03/03/2017). A decisão ocorreu no Procedimento Comum Cível n° 0022050-27.2018.8.27.2729/TO.

Ao fundamentar sua decisão, o juiz Océlio Nobre lembrou que a “controvérsia da demanda delimita-se em verificar se houve conduta/omissão do Município de Palmas apta ao reconhecimento da responsabilidade por eventuais danos morais e materiais supostamente sofridos pelo autor em razão de acidente automobilístico causado por buraco na via pública”.

Quando a administração pública permite a permanência de buracos nas estradas, expõe a população a risco de vida, a danos físicos, a prejuízos materiais

Legitimidade ativa

Consta nos autos que a parte requerente (Istergnon Almeida dos Santos) não teria legitimidade ativa para integrar o feito, por não ser o proprietário da motocicleta na data do sinistro (03/03/2017).

“Esta alegação não tem acolhida jurídica, eis que a ação de ressarcimento cabe a quem suportou o dano, não necessariamente ao proprietário formal do bem”, rebateu o magistrado, lembrando que jurisprudência “tem reconhecido a possibilidade de o condutor do veículo promover a ação de ressarcimento ainda que não seja o proprietário do bem”, destacando na sequência vários julgados do próprio Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO).

Ainda segundo o juiz, a situação dos autos exige a reparação do dano sofrido pela vítima e, caso o Município entenda necessário, promova a ação regressiva contra o servidor omisso. “No meio do caminho havia um buraco, que o Município não fechou; lá, uma pessoa sofreu acidente, sofreu danos, o ente público deve indenizar”, citou o juiz, parafraseando Carlos Drumond Andrade.

Processo n° 0022050-27.2018.8.27.2729/TO

TRT/DFT-TO aumenta indenização devida a trabalhadora que sofreu assédio racial e sexual

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) aumentou o valor da indenização devida a uma trabalhadora que sofreu assédio moral (racial) e sexual durante a fase de contratação para emprego. A juíza de primeiro grau arbitrou o valor em R$ 3 mil, mas o colegiado entendeu que a quantia não tem a significância necessária para minimizar os efeitos dos danos sofridos e nem os efeitos pedagógicos característicos da medida, majorando a indenização para R$ 15 mil.

A trabalhadora conta que, ainda na fase de tratativas para assumir o emprego, passou a receber do sócio da empresa telefonemas e mensagens com vídeos e áudios que demonstrariam o assédio. A autora narra que não compareceu ao trabalho, mas recebeu, por mensagem de voz, determinação para buscar um aparelho, pesando cerca de 10kg, e que no áudio foi chamada de “negra forte”, e que por isso suportaria realizar a tarefa. Na contestação, o próprio sócio reconheceu que abordou a autora para fins não profissionais, com intenção de estabelecer um relacionamento amoroso, entendendo que existiria interesse recíproco.

A defesa chegou a alegar que o sócio teria tentando apenas impressionar a autora, por ter se interessado por ela, e que o máximo que poderia se cogitar é que o réu não teve habilidade na paquera ou na tentativa de conquista.

Desafios

Em seu voto, o relator, desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, diz que ao ler as provas documentais, fica claro a extrapolação do vínculo empregatício, com destaque para questões raciais e de gênero. Os autos, segundo o relator, revelam os desafios vivenciados por mulheres no mundo do trabalho e, em especial, pelas mulheres negras. “É possível extrair do documento estratégias discursivas cotidianas acerca de mulheres, quando se busca invisibilizar, desqualificar ou pôr em dúvida as percepções de mulheres sobre os fatos por elas vivenciados”. O desembargador explicou que o Poder Judiciário brasileiro vive novos tempos, onde pautas identitárias vinculadas a raça, gênero e orientação sexual, em especial, têm alcançado maior visibilidade e consequente resposta institucional por meio de atos normativos do Conselho Nacional de Justiça, em diálogo com a sociedade civil. Essa situação, segundo o relator, “convoca Tribunais a reverem seus julgados, tanto no mérito como nos montantes condenatórios, podendo impactar, inclusive, em majoração do quantum compensatório em situações de dano moral”.

Racismo estrutural

A expressão “negra forte” tem sua origem no racismo estrutural, que naturaliza uma condição de força por ser uma mulher negra, que tudo suporta. Tal comentário, afirma o relator, não se caracteriza como um elogio, como sustenta o sócio. Revela, na verdade, o olhar racializado e racista frente à trabalhadora negra que acabara de contratar. Quando o racismo com pessoas negras acontece – o que muitas vezes é até difícil provar – evoca feridas históricas que atravessam gerações e se enraíza, cotidianamente, na vida de pessoas afrodescendentes neste país, ao ponto de, ao aparecer o racismo em uma fase pré-contratual, como é o caso em tela, poderá reacender ou desencadear sofrimentos psíquicos que podem perdurar por tempo indeterminado, que demandarão, inclusive, cuidados especializados de saúde, revela o magistrado.

Assédio

Quanto ao assédio, o relator ressalta que a naturalidade com que o sócio da empresa relata, confessando mesmo, a prática de assédio em sua própria defesa chega a ser acintosa, considerando inclusive que, naquele momento, se iniciava uma relação de trabalho, após um processo seletivo. Não se trata do teor do vídeo ou da música encaminhados pelo sócio à trabalhadora, como tentativa de minimizar a gravidade dos fatos, “mas, no mínimo, da importunação na madrugada a uma mulher que, necessitando manter sua sobrevivência, acabara de conseguir uma oportunidade no mundo do trabalho e se viu conduzida a estabelecer um diálogo remoto com seu novo empregador em horário que lhe seria de descanso”.

Com esses argumentos e levando em conta a gravidade dos fatos e a confissão, o relator considerou devida a indenização, mas decidiu votar para aumentar para R$ 15 mil, uma vez que o valor inicialmente arbitrado não teria se demonstrado significativo para minimizar os efeitos dos danos sofridos.

Processo n. 0001004-45.2022.5.10.0019

TRT/RN mantém justa causa de empregado que comprou com cartão do colega

A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (TRT-RN) manteve demissão por justa causa de fisioterapeuta que utilizou o cartão de crédito do colega de trabalho para compra de uma televisão pela Internet.

De acordo com o fisioterapeuta, que trabalhava em um hospital em Natal, não houve prova robusta que tenha utilizado o cartão do colega.

Além disso, no horário em que foi realizada a compra de um aparelho de televisão no site Mercado Livre, com a utilização do cartão de crédito, não se encontrava na sala das fisioterapeutas, onde o colega teria deixado o cartão.

“Até a presente data não se sabe de onde partiu a compra, se de um computador ou de um aparelho celular, nem muito menos a quem pertencia esse equipamento”, concluiu ele.

No entanto, de acordo com a desembargadora Auxiliadora Rodrigues, relatora do processo no TRT-RN, “não faz qualquer sentido” a alegação do fisioterapeuta de que a sua conta no site Mercado Livre e de seu e-mail tenham sido hackeados.

A desembargadora levou em conta, para essa conclusão, o fato de que o “endereço de entrega do produto adquirido ser rigorosamente o mesmo em que ele reside”.

Auxiliadora Rodrigues destacou, ainda, que, no horário em que foi realizada a compra da televisão, a sala de repouso dos fisioterapeutas estava trancada, como demonstra o registro da câmera de vídeo instalada defronte a ela.

A sala foi fechada minutos após a saída dos fisioterapeutas, incluindo o titular do cartão e o acusado de pegá-lo.

Assim, seria inócua a alegação de que não estava presente na sala dos fisioterapeutas, porque, “além de a compra não ter sido ali realizada, seria perfeitamente possível a sua concretização por meio de outro equipamento, v.g., telefone celular…”.

“Em hipóteses de extrema gravidade, como a que ora se analisa, não se exige a gradação de penas porque a fidúcia necessária para a manutenção do empregado nos quadros da empresa já foi totalmente quebrada”, concluiu a desembargadora.

A compra da televisão foi cancelada pelo dono do cartão após ser notificado pela operadora.

A decisão da Primeira Turma do TRT-RN foi por unanimidade e manteve o julgamento inicial da 4ª Vara do Trabalho de Natal.


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