TJ/SP: Candidato com desvio de septo nasal não pode ser eliminado de concurso

Inaptidão extrapola proporcionalidade e razoabilidade.


A 10ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão da 15ª Vara da Fazenda Pública Central da Capital, proferida pela juíza Gilsa Elena Rios, que anulou a eliminação de um candidato em concurso para policial militar que foi diagnosticado com desvio de septo nasal e reconheceu seu direito de participar das fases seguintes do certame.

Os autos narram que o autor havia sido eliminado após exame médico constatar a condição clínica, sendo considerado inapto ao cargo de soldado PM, conforme prevê o edital de abertura para o concurso. No entanto, ainda que esteja previsto no regulamento do certame que tal diagnóstico seja passível de eliminação, o relator do recurso, desembargador José Eduardo Marcondes Machado, salientou que tal previsão “extrapola o exercício do poder discricionário da Administração Pública”, destacando que os editais devem respeitar os limites da proporcionalidade e razoabilidade no que diz respeito às exigências para investidura em cargos públicos.

“Afigura-se ilegal o ato administrativo questionado, uma vez que não se explicitou de que maneira o desvio de septo prejudicaria ou impossibilitaria o exercício da função policial militar pelo candidato”, pontuou o magistrado. “Além de não ser possível concluir que a condição do autor impeça ou dificulte o exercício do cargo, é de se observar que houve aprovação em teste de aptidão física, a presumir que o desvio de septo nasal não traz grandes consequências para seu sistema respiratório, conforme sustentado pela recorrente”, concluiu.

Também participaram do julgamento os desembargadores Antonio Carlos Villen e Antonio Celso Aguilar Cortez. A decisão foi unânime.

Processo nº 1062601-31.2021.8.26.0053

TJ/RN: Plano de saúde terá que realizar cirurgia bariátrica

A 4ª Vara Cível da Comarca de Mossoró determinou a um plano de saúde, por meio de decisão interlocutória de antecipação de tutela, o custeio de procedimentos cirúrgicos para uma paciente que teve sequelas após realizar uma cirurgia bariátrica.

Conforme consta no processo, a paciente demandante pesava 122 quilos e passou a pesar 75 quilos após o procedimento cirúrgico. Todavia, passou a apresentar “intensa flacidez, sinais de envelhecimento precoce, dificuldade de higiene, assaduras nas dobras das peles, bem como, ansiedade, alterações relacionadas ao humor, alterações relacionadas ao sono, dificuldades de controle emocional, baixa autoestima”, de modo que esses últimos seriam sintomas de “transtorno dismórfico corporal”.

Em razão disso, o médico que assiste a demandante prescreveu a realização de procedimentos cirúrgicos reparadores como “dermolipectomia abdominal para correção de abdome em avental e correção de lipodistrofia e plástica para reconstrução da mama com próteses”. Entretanto, o plano demandado não autorizou a realização das indicações médicas.

Ao analisar o processo, o magistrado Manoel Padre destacou inicialmente o artigo 300 do Código de Processo Civil estabelecendo que a “tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.

Em seguida, o juiz apontou que a documentação trazida aos autos “comprova tanto a existência de relação contratual firmada entre as partes, quanto a prescrição através da qual o médico que assiste a autora atestou a necessidade da realização das cirurgias indicadas”. E acrescentou que vem sendo firmado o entendimento nos tribunais de que as cirurgias, quando necessárias após a realização de cirurgia bariátrica, “devem ser entendidas como continuidade do tratamento da obesidade e devem ser custeadas pelo plano de saúde”.

Nesse sentido o magistrado acrescentou que há situações em que a cirurgia plástica “não se limita a aperfeiçoar a beleza, mas se destina, primordialmente, a reparar ou a reconstruir parte do organismo humano, ou, ainda, prevenir males de saúde”, não bastando à operadora se limitar ao custeio da cirurgia bariátrica.

E, dessa forma, foi concedida a decisão provisória de antecipação de tutela a ser cumprida pelo plano de saúde demandado no prazo de 48 horas, sob pena de bloqueio de suas contas bancárias, em relação às despesas realizadas pela paciente com sua saúde.

TJ/RN: Município terá que indenizar por contratar pessoal sem concurso público

A 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte negou recurso e manteve sentença que condenou o Município de Touros, em uma Ação Civil Púbica ajuizada pelo Ministério Público Estadual, em virtude da realização de contratação de pessoal feita sem obedecer o caráter excepcional e temporário. Na ação, o MP também denunciou não ficou comprovado o vínculo laboral mediante prévia aprovação em concurso público e que o limite de gastos foi ultrapassado.

A decisão do órgão julgador ocorreu à unanimidade. Entre as condenações, mantidas pelo Tribunal de Justiça, está a que determina que o ente público local se abstenha de celebrar novos contratos temporários e a renovar os contratos que se vencerem, bem como realizar processos seletivos, quando não se tratar de necessidade comprovadamente temporária.

Ficou determinado ainda que, no prazo de 180 dias, o Município de Touros adote as medidas de redução de despesas com pessoal previstas no art. 169, §§ 3º e 4º, da Constituição Federal, especialmente a redução em, pelo menos, 20% das despesas com cargos em comissão, contratos temporários e funções de confiança.

Decisão

Os desembargadores que compõem a 3ª Câmara Cível também mantiveram a determinação para que o Município a realizar a contratação de pessoal com observância da Constituição Federal, em especial, a realização de concurso público, nos termos do art. 37 da CF.

Durante o julgamento, foi considerado as informações de um Inquérito Civil contendo: diversos contratos temporários para diferentes áreas de atuação; vários ofícios requisitando informações ao Município de Touros; relatório fornecido com nomes de pessoas contratadas temporariamente; Relatório do Tribunal de Contas do Estado do RN indicando que o Município ultrapassou limites de gasto com pessoal em 2015 a 2018, inclusive do segundo bimestre de 2019 e termo de alerta de responsabilidade fiscal do Tribunal de Contas do Estado (TCE).

O relator do processo no TJ, juiz convocado Diego Cabral, explicou que o contrato temporário tem o objetivo de suprir, a título emergencial, o interesse público. No entanto, ele observou nos autos como nítida a ilegalidade das contratações, pois não ficou evidenciada a situação excepcional necessária para o ajuste, daí estar configurada, com clareza, uma necessidade permanente, a qual deve ser suprida por concurso público o que, na sua visão, não ocorreu.

“No município de Touros há diversos processos propostos em desfavor do Município objetivando recebimentos de verbas não pagas oriundo de contratos temporários renovados por vários anos, caracterizando a ausência da temporariedade dos referidos contratos de trabalho”, diz um trecho do voto do relator, mantendo a sentença da Comarca de Touros.

Processo nº 0800374-36.2019.8.20.5158

TJ/AM: Concessionária deve indenizar consumidores por apagão de energia elétrica

Empresa argumentou ausência de culpa, mas entendimento do colegiado é pela responsabilização, pela necessidade de manutenção periódica dos cabos de transmissão e restabelecimento do serviço em tempo razoável.


Na sessão desta segunda-feira (24/04), a Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas analisou diversos recursos interpostos quanto a sentenças proferidas na Comarca de Iranduba em processos sobre o apagão ocorrido naquele município em 2019.

Durante a sessão, houve sustentação oral por parte da Amazonas Distribuidora de Energia, destacando a juntada de laudo pericial sobre o rompimento de cabos de transmissão, que demonstraria a ausência de culpa da concessionária e, por consequência, da obrigação de indenizar os consumidores afetados.

Mesmo com a sustentação comum para 11 processos da pauta, o colegiado julgou cada um de forma separada, pelas características de cada recurso; da mesma forma os processos foram analisados e julgados individualmente em 1.º Grau, com sentenças proferidas conforme cada caso.

Quanto à responsabilidade, o colegiado julgou tratar-se de caso fortuito interno, de avarias decorrentes da própria atividade desenvolvida que trouxeram prejuízos inesperados para o consumidor, ao acompanhar o voto da desembargadora Joana Meirelles, na Apelação Cível n.º 0603434-02.2021.8.04.4600. “Sendo assim, em razão do serviço público essencial prestado, deveria a empresa ré averiguar e promover periodicamente a manutenção dos cabos, além de viabilizar o restabelecimento do fornecimento normal de energia elétrica em prazo razoável, fato este que não ocorreu no presente caso”, afirmou a relatora.

Quanto aos danos morais, o colegiado julgou estarem configurados, citando a ausência de boa-fé no comportamento da apelada, com a má prestação de serviço aos consumidores, em atitude que ofende a dignidade da pessoa e a sua honra, merecendo a devida compensação, como observou a desembargadora Graça Figueiredo.

“Diga-se que prescindem tais danos morais de maiores comprovações, eis que erigidos da própria ação indevida da concessionária de energia elétrica, que negligenciou o serviço que deveria ser contínuo, merecendo ser gizado que, atualmente, o dano moral não se presta unicamente a compensar o ofendido pelas máculas causadas, devendo servir, igualmente, como meio de punir o ofensor pela atitude incorreta, bem como representar um alerta à sociedade em geral para que tal feito não se repita”, afirmou a relatora Graça Figueiredo em seu voto na Apelação Cível n.º 0601323-11.2022.8.04.4600.

Os processos foram julgados por unanimidade e, quanto à indenização por danos morais, o colegiado majorou os valores sentenciados, fixando-os em R$ 4 mil ou R$ 5 mil, conforme cada caso analisado, de acordo com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade.

Foram exceções os processos em que os autores das ações e recorrentes não haviam comprovado serem titulares das unidades consumidoras afetadas pela falta de energia no período, em que os pedidos foram negados nas duas instâncias.

TRT/RS: Trabalhador que teve câncer em razão de exposição a ácido sulfúrico deverá ser indenizado

Um navio de grande porte transportando 12 mil toneladas de ácido sulfúrico se acidentou em 28 de agosto de 1998 no Porto de Rio Grande, no litoral sul do Rio Grande do Sul. Por um problema de pressão nas bombas, a substância vazou no casco da embarcação e, posteriormente, em razão do risco de explosão, foi bombeada para o canal de acesso à Lagoa dos Patos e para o mar.

O navio Bahamas, com bandeira de Malta, ficou oito meses encalhado no Porto de Rio Grande até que as investigações se esgotassem e houvesse uma solução para o problema. A embarcação foi afundada a quinhentos quilômetros da costa. De lá para cá, diversas ações judiciais foram movidas. Na esfera trabalhista, uma delas foi julgada recentemente na segunda instância.

A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) decidiu que um servente que trabalhava no Porto de Rio Grande na época do acidente e teve câncer em razão da exposição ao ácido sulfúrico terá que receber indenização por danos morais, existenciais e materiais.

O caso

O servente, que trabalhou durante 41 anos como servidor público da Superintendência do Porto de Rio Grande, ¿autarquia extinta pelo Estado em 2021, ¿¿alegou que teve um câncer na laringe em razão da sua exposição ao ácido sulfúrico durante os oito meses em que o navio ficou encalhado. No processo, juntou laudos periciais que comprovariam a relação entre a doença e o período em que foi exposto à substância.

Os reclamados argumentaram que os laudos não concluíram pela relação de causalidade entre a doença do autor e o trabalho em contato com ácido sulfúrico, o que afastaria a configuração da responsabilidade civil.

Contudo, a partir das provas do processo e da literatura científica sobre o tema, o juiz da 4ª Vara do Trabalho de Rio Grande, Nivaldo de Souza Júnior, entendeu comprovada a relação de causalidade entre a atividade do servente e o acometimento do câncer de laringe. A sentença condenou o Estado do Rio Grande do Sul ao pagamento de R$ 100 mil a título de danos morais e R$ 100 mil por danos existenciais. Também determinou o pagamento de pensão vitalícia mensal no valor do último salário recebido antes do afastamento definitivo do trabalhador por benefício previdenciário, em 2017. A decisão retirou do processo a SPRG, em razão da extinção da autarquia, e também a União, por entender que ela não contribuiu para a ocorrência do evento nem possui dever legal ou contratual de reparar o dano.

O trabalhador e o Estado do Rio Grande do Sul ingressaram com recursos ordinários junto ao TRT-4. O servente pedia aumento dos valores fixados na sentença e o Estado contestava o mérito da decisão e sustentava a prescrição do caso.

O relator do processo, desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo, decidiu por ampliar o valor da indenização por danos morais para R$ 400 mil. Ele manteve o que havia sido fixado na sentença em relação aos danos existenciais e à pensão vitalícia.

“(…) entendo que não há dúvida quanto ao nexo de causalidade entre a doença sofrida pelo autor e a exposição ao agente cancerígeno, vapor de ácido sulfúrico, havido quando do acidente no navio Bahamas, com exposição diária por longo período, sem o fornecimento de qualquer equipamento de proteção eficaz”, diz o magistrado em seu voto.

Em relação à prescrição sustentada pelo Estado, o desembargador negou provimento ao pedido. Marçal Figueiredo destacou que, apesar do acidente ter ocorrido em 1998, não se trata de “acidente típico do trabalho (imediato), mas de dano físico percebido muitos anos após o fato, de modo que o marco inicial da prescrição, aplicável ao caso segue o entendimento da Súmula 278 do STJ”.

A súmula referida pelo desembargador prevê que “o termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral”.

No acórdão, o relator explica que, tendo em vista o afastamento do reclamante em agosto de 2017, não sendo possível precisar o momento específico no qual ela teve ciência inequívoca da extensão e das consequências da lesão, e tendo sido a ação ajuizada em fevereiro de 2020, “por qualquer ângulo que se aborde a questão, não há prescrição total a ser declarada”.

Também participaram do julgamento os desembargadores Carlos Alberto May e Tânia Regina Silva Reckziegel. Cabe recurso contra a decisão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

STF: Benefício de permanência a magistrados do RJ é inconstitucional

O entendimento é de que a lei estadual criou benefício não previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman).


O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, por unanimidade, a inconstitucionalidade de lei do Estado do Rio de Janeiro que instituía o “benefício de permanência em atividade” a magistrados estaduais, correspondente a 5% por ano que excedesse os 30 de serviço, até o máximo de cinco anos. Na sessão virtual finalizada em 31/3, o colegiado julgou procedente o pedido formulado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2952.

Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes, relator da ação, argumentou que, ao estabelecer o benefício, a Lei estadual 1.856/1991 criou vantagem remuneratória não prevista na Lei Orgânica da Magistratura Nacional – Loman (Lei Complementar 35/79), que continua a disciplinar o Estatuto da Magistratura, até edição da lei complementar prevista no artigo 93 da Constituição.

Mendes explicou que a Loman, em seu artigo 65, enumera as vantagens que podem ser conferidas aos magistrados e veda a concessão de outras parcelas. Portanto, a regra proíbe o legislador ordinário, federal ou estadual, e os tribunais de suprimir ou instituir novos benefícios, e a natureza taxativa desse rol tem sido confirmada pela jurisprudência do STF.

Objeto

Por fim, o relator esclareceu que a edição da Lei Federal 11.143/2005, que fixou o valor do subsídio mensal dos ministros do STF, e sua implementação no âmbito do Judiciário fluminense não esvaziou o objeto da ação. Conforme manifestação do Presidente do TJ-RJ, o “benefício de permanência” não foi extinto, mas absorvido pela parcela única do subsídio. Além disso, foram gerados efeitos patrimoniais desde a edição da lei estadual (1991) até janeiro de 2006.

Processo relacionado: ADI 2952

STF: Crime de infração de medida sanitária pode ser complementado por estados e municípios

Para o STF, a complementação não tem natureza criminal, mas sim caráter administrativo e técnico-científico, o que autoriza que seja editada por atos normativos dos entes federados.


O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou a jurisprudência no sentido de que estados e municípios têm competência para editar normas com determinações que visam impedir introdução ou propagação de doença contagiosa e cujo descumprimento pode configurar o crime do artigo 268 do Código Penal (infração de medida sanitária preventiva). A decisão foi tomada pelo Plenário Virtual da Corte no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1418846 (Tema 1246), que teve repercussão geral reconhecida.

Caso concreto
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) denunciou uma comerciante que manteve em funcionamento seu estabelecimento em Viamão (RS) durante a pandemia da covid-19, contrariando normas estaduais e municipais. Ela foi acusada do delito previsto no artigo 268 do Código Penal (infringir determinação do poder público destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa).

A Justiça gaúcha não aceitou a denúncia sob o fundamento de que somente por meio de norma federal é que o dispositivo do Código Penal poderia ser complementado, em razão da competência privativa da União para legislar sobre direito penal. O entendimento adotado foi o de que não compete aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios complementar ato normativo próprio do poder federal que implique em reflexos na legislação penal.

No recurso ao STF, o MP-RS sustentou que não há qualquer impedimento à utilização de normas estaduais e municipais para a complementação de tipos penais em branco (norma penal que depende de complementação). Além disso, os atos normativos locais não instituem novas condutas criminosas, limitando-se a complementar e dar sentido ao texto do artigo 268 do Código Penal.

Jurisprudência
Em sua manifestação, a relatora, ministra Rosa Weber (presidente do STF), citou inúmeros precedentes da Corte, firmados em processos em que se discutiu medidas no contexto da pandemia da covid-19, nos quais a Corte assentou que a competência para proteção da saúde é compartilhada entre a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios, inclusive para impor medidas restritivas destinadas a impedir a introdução ou propagação de doença contagiosa.

A ministra explicou que a União, ao editar o artigo 268 do Código Penal, exerceu sua competência privativa de legislar sobre direito penal. Mas, por se tratar de norma penal em branco, requer a complementação por atos normativos infralegais (decretos, portarias, resoluções, etc.), de modo a se tornar possível a verificação da conduta de infringir normas estabelecidas pelo Poder Público para evitar a introdução ou disseminação de doença contagiosa.

Tal complementação, apontou a ministra, não apresenta natureza criminal, mas sim de caráter administrativo e técnico-científico, o que autoriza que seja editada por atos normativos estaduais, distrital ou municipais.

Repercussão geral
A ministra Rosa apontou que, somente no âmbito da Presidência da Corte, há 600 recursos semelhantes. Assim, de forma evitar a necessidade de inúmeras decisões idênticas e permitir que o entendimento do Supremo seja uniformemente aplicado por todas as instâncias judiciais, ela se manifestou pelo reconhecimento da repercussão geral da matéria. No mérito, se posicionou pela reafirmação da jurisprudência da Corte e pelo provimento do recurso extraordinário para determinar o prosseguimento da ação penal.

A decisão referente ao reconhecimento da repercussão geral foi unânime. Já no mérito, ficaram vencidos quanto à reafirmação da jurisprudência os ministros Nunes Marques, Luiz Fux e André Mendonça.

Tese
Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “O artigo 268 do Código Penal veicula norma penal em branco que pode ser complementada por atos normativos infralegais editados pelos entes federados (União, estados, Distrito Federal e municípios), respeitadas as respectivas esferas de atuação, sem que isso implique ofensa à competência privativa da União para legislar sobre direito penal (artigo 22, inciso I, da Constituição Federal)”.

Processo relacionado: ARE 1418846

STJ: Tabelião responderá objetivamente por falha no serviço ocorrida antes da Lei 13.286/2016

Ao negar provimento a recurso especial, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o tabelião deve responder objetivamente pelos danos decorrentes da má prestação de serviço cartorário.

No caso dos autos, foi ajuizada ação de indenização contra um tabelião de ofício de notas que visava a reparação dos danos morais e materiais causados pela alienação fraudulenta de seu imóvel, por meio de procuração com assinatura falsa aceita pelo cartório.

O autor informou que em outra ação, já transitada em julgado, foi reconhecida a nulidade da escritura. Nesse mesmo processo, também estariam caracterizados danos morais e patrimoniais, tendo em vista que o imóvel sofreu deterioração excessiva e o proprietário deixou de auferir rendimentos naquele período.

O juízo de primeiro grau condenou o tabelião a pagar lucros cessantes mais danos morais. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios aumentou o valor da condenação.

Não está em discussão a responsabilidade do Estado
No recurso dirigido ao STJ, o réu sustentou que a responsabilidade civil dos tabeliães seria subjetiva, isto é, dependeria da demonstração de culpa ou dolo. Além disso, segundo ele, a questão da responsabilidade do tabelião estaria sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 842.846, razão pela qual pediu que o processo fosse suspenso até o julgamento definitivo. Defendeu, ainda, que a contagem do prazo prescricional deveria começar na data de comunicação da fraude à polícia.

O relator, ministro Moura Ribeiro, observou que o recurso extraordinário já foi julgado e, diferentemente do caso submetido ao STJ, a tese fixada pelo STF “diz respeito à responsabilidade civil subsidiária do Estado em decorrência de danos causados por tabeliães e oficiais de registro no exercício de suas funções”.

“Na hipótese dos autos, não se discute a responsabilidade do Estado, mas, sim, a responsabilidade direta do próprio tabelião em decorrência da má prestação do serviço delegado”, completou.

Fato ocorreu na vigência de lei que previa a responsabilidade objetiva

Moura Ribeiro destacou que tanto a ação declaratória quanto a indenizatória foram propostas quando estava em vigor a Lei 8.935/1994 e antes da vigência da Lei 13.286/2016, a qual passou a considerar que a obrigação de reparar os prejuízos causados a terceiros por tabeliães e registradores é fixada mediante dolo ou culpa – portanto, reponsabilidade subjetiva.

“Antes da Lei 13.286/2016, a responsabilidade dos tabeliães e registradores era objetiva, ou seja, prescindia da comprovação de culpa ou dolo de tais servidores”, confirmou.

Quanto à prescrição, Moura Ribeiro ressaltou que o STJ entende que o prazo para ajuizar ação de indenização por danos morais e materiais por falha na prestação de serviço notarial é de três anos, e que, no caso, tal prazo deve ser contado do trânsito em julgado da decisão que confirmou a nulidade da escritura e do registro do imóvel.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 1849994

TRF1: É possível intervenção judicial quando superados os prazos legais sem análise de requerimento por parte da administração pública

A 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) afirmou que a Administração Pública deve obediência aos princípios da legalidade e da eficiência, assim como deve assegurar a razoável duração do processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitação. Por isso, o Colegiado reformou a sentença que havia negado o pedido de julgamento de um recurso dirigido ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para a concessão de Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência (BPC/Loas).

Segundo consta dos autos, o apelante alegou que formulou um recurso ordinário contra o INSS na 1ª instância em março de 2022, pois o seu pedido de BPC/Loas havia sido negado e o autor solicitou, por meio de um requerimento administrativo, a revisão. Porém, até julho do mesmo ano, data do ajuizamento da ação na Justiça Federal, o requerimento não havia sido analisado, extrapolando o previsto na Lei 9.784/99, que estabelece as normas básicas sobre o processo administrativo na Administração Federal.

Longa espera – Para o relator do caso, desembargador federal Rafael Paulo Soares, “não se pode transferir ao segurado do INSS o ônus de uma longa espera decorrente do déficit de servidores ou de qualquer outro óbice administrativo, haja vista o que dispõe o inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição da República de maneira que a celeridade processual, garantia fundamental do indivíduo, não pode apenas ser utópica, mas deve se manifestar concretamente”.

O magistrado reiterou, ainda, a manifestação do Ministério Público Federal (MPF) que diz: “verifica-se que a impetrante protocolou recurso ordinário em 10/03/2022 visando à análise do recurso para a concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência BPC/Loas. Contudo, até a data do ajuizamento da ação, qual seja, em 18/07/2022, o requerimento ainda não havia sido analisado. A parte impetrante, portanto, trouxe aos autos prova de que os prazos legais foram superados na análise de seu pedido, sem justificativa.”.

Nesse contexto, a Turma, acompanhando o voto do relator, reformou a sentença ao fundamento de estar ela “em sintonia com reiterados precedentes desta Corte nos quais foi reafirmada a possibilidade de intervenção judicial a fim de que seja estabelecida obrigação à autoridade impetrada para que, em prazo razoável, proceda à análise do requerimento administrativo”.

Processo: 1011437-66.2022.4.01.3304

TRF1 determina o cumprimento do contrato de financiamento estudantil (Fies) sem o limite financeiro previsto em portaria editada após a assinatura

A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença da 2ª Vara Federal do Acre que aceitou o pedido de um aluno do curso de Medicina. Com a decisão, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) terá que manter o repasse à União Educacional do Norte (Uninorte) dos valores integrais referentes aos semestres do curso até os limites de créditos estipulados no contrato firmado com o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies).

O estudante pediu, ainda, a ineficácia de qualquer outra medida que possa vir a limitar o valor do financiamento firmado com a instituição de ensino, o que acarretaria diferença de valor a ser pago por ele à universidade.

O autor celebrou contrato de financiamento estudantil tomando por base o custo dos respectivos semestres à época da contratação, com projeção dos valores e acréscimo de margem para cobertura dos reajustes. Após a formalização do contrato, o FNDE editou a Portaria 638/2017 determinando o valor máximo da semestralidade a ser custeada pelo Programa inferior ao que havia sido firmado por ele.

Ao analisar o caso, o relator, desembargador federal Souza Prudente, afirmou que o entendimento do TRF1 é no sentido de que “sendo o fundo de natureza contábil, o Fies está sujeito a restrições de ordem orçamentária e financeira que subordinam o interesse dos estudantes aos recursos disponibilizados pelo programa à instituição de ensino”.

Grave prejuízo – No entanto, segundo o magistrado, o aluno firmou o contrato de financiamento estudantil em data anterior à edição da portaria, o que, por ser ato normativo secundário, não pode retroagir para restringir os valores fixados e pactuados pela Administração em relação contratual constituída anteriormente à sua publicação e “fixar restrição não prevista em lei”.

“Ademais, há de ver-se, ainda, que a tutela jurisdicional buscada nestes autos se encontra em sintonia com o pleno acesso ao ensino superior, como garantia fundamental assegurada em nossa Constituição Federal”, afirmou o desembargador. Segundo ele, a restrição no limite do financiamento estudantil resultaria em grave prejuízo em virtude de o impetrante não ter condições financeiras de custear a cobrança residual relativa ao curso de graduação.

Sendo assim, sustentou o relator, deve ser mantida a sentença que determinou o cumprimento do contrato firmado com o autor sem aplicação do teto de financiamento previsto na Portaria FNDE 638/2017 procedendo aos valores de financiamento firmados entre as partes e garantindo o aditamento nos termos pactuados até a conclusão do curso de medicina.

A Turma acompanhou o voto do relator.

Processo: 1000671-66.2017.4.01.3000


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