por Itamar de Carvalho Júnior
De longa data a discussão em torno da adoção de cláusula de solução de conflitos entre o contratado e a administração pública contratante que antecipe a apreciação pelo Poder Judiciário. Trata-se da adoção de compromisso arbitral em contratos administrativos ou com entes administrativos.
Dentre as teses, a que mais ganhou força é a possibilidade de a arbitragem ser adotada pelas estatais, em especial pelas sociedades de economia mista por se tratar neste caso de opção constitucional de aplicação preponderante das normas de direito privado.
Neste sentido há precedentes judiciais acolhendo a tese e possibilitando a adoção do compromisso arbitral por estas empresas. Como exemplo há o MS 11308 julgado pelo Superior Tribunal de Justiça com relatoria do ministro Luiz Fux. Em seu voto o ministro enfrenta as teses contrárias e as rechaça com o argumento acima (opção constitucional no caso de sociedade de economia mista), e da doutrina administrativista que traz a distinção entre interesse público primário e interesse público secundário, e neste ponto assenta que a adoção do compromisso arbitral está inserido na opção de gerência dos interesses e poderes internos da administração, interesse público secundário, projetando para o interesse público primário, que seria no caso, a adoção da forma menos dispendiosa para solucionar o conflito.
Aparentemente solucionou-se o problema de adoção pelas sociedades de economia mista (podendo se falar das estatais puras também) do compromisso arbitral, conduto, remanesce o “problema” quando o compromisso arbitral for adotado pela administração pública central nos contratos de concessão de serviço público comum e nos de parceria público-privado onde não se aplica as normas de direito privado e a questão do interesse público primário ganha mais força.
Pensamos que em sede de contrato de concessão de serviço público comum e nos contratos regidos pela Lei Federal de PPP (concessão administrativa e patrocinada), não cabe mais a discussão de impossibilidade, tendo em vista o teor das Leis 11.079/04 e Lei 8.987/95, com redação dada pela Lei 11.196/05, que expressamente possibilita a adoção da arbitragem na solução dos conflitos entre a administração concedente e o concessionário.
Quanto à legalidade do contrato que preveja a solução de conflitos por meio de arbitragem, está superada a discussão em decorrência das leis supracitadas, cabendo (dever-poder) ao administrador público adotar esta solução sempre que se mostrar oportuna e conveniente em razão do caso concreto.
Neste ponto específico calha trazer ao lume as lições do emérito Professor Celso Antônio Bandeira, in verbis:
“Uma vez que a atividade administrativa é subordinada à lei, e firmado que a Administração assim como as pessoas administrativas não tem disponibilidade sobre os interesses públicos, mas apenas o dever de curá-los nos termos das finalidades predeterminadas legalmente, compreende-se que estejam submetidos aos seguintes princípios: a) da legalidade, com suas implicações ou decorrências; a saber: princípios da finalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da motivação e da responsabilidade do Estado;”
Resta por fim saber se as leis que conferiram competência à administração para celebrar contratos prevendo compromisso arbitral coadunam-se com os ditames constitucionais e preservam sua integridade frente à Constituição Federal de 1988.
Não vemos na possibilidade de instituição de cláusula de compromisso arbitral qualquer mácula de inconstitucionalidade, razão que, nestes casos, não estará a administração pública atentando contra a indisponibilidade do interesse público, pois como assentado no voto do ministro Luiz Fux acima citado, a cláusula de compromisso arbitral tem o condão de, no estágio atual do Poder Judiciário brasileiro, minimizar os desgastes para as partes em caso de litígio, atingindo assim o interesse público primário.
Outrossim, pensamos que a opção legislativa é adequada ao possibilitar e criar novos instrumentos para que a administração pública, no exercício de suas funções, possa alcançar as finalidades públicas não só com respeito ao princípio da legalidade, mas também de maneira mais eficiente, transparente, menos desgastante e dispendiosa, tal como prescrito no artigo 37 da Constituição Federal.
Como sabemos e tem sido paulatinamente apontado pelos especialistas, o Brasil deverá passar por grande transformação nos próximos anos em especial na elaboração e execução de projetos em infra-estrutura, e institutos como o do compromisso arbitral terá grande função ao minimizar a criação de obstáculos jurídicos.
Papeis importantes também terão os órgãos internos e externos de fiscalização dos gastos públicos e na aplicação idônea do compromisso arbitral nos contratos administrativos.
Revista Consultor Jurídico