Imposto certo – Serviço de corte de árvores deve pagar ISS e não ICMS

por Rodrigo Corrêa Mathias Duarte

Nas atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, e em especial quando ocorre em conjunto à operação de venda de madeira, existem dúvidas acerca da incidência do ISS ou ICMS, pelas empresas, municípios e estados.

Algumas empresas apenas realizam as atividades acima especificadas, mas, outras empresas, principalmente as que atuam no ramo de florestamento, reflorestamento e venda de madeira, muitas vezes vendem a mercadoria (madeira), mas, também prestam como serviços o corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento.

A maioria dos municípios possui normas municipais ou utilizam-se da Lei Complementar Federal 116/03 para exigir o ISS sobre as atividades em questão.

Já alguns estados, ao identificar que as empresas praticaram o florestamento, reflorestamento e venda de madeira em conjunto com a prestação das atividades especificadas pleiteiam a exigência de ICMS sobre o valor decorrente destes serviços, por considerarem que este compõe o preço da mercadoria.

Impostos

O ICMS possui como forma de tributação a não-cumulatividade. Como o próprio nome menciona, o ICMS incide sobre as operações relativas à circulação de mercadorias e prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação. Os contribuintes são os que praticam as operações em que ocorre a incidência. A competência pertence aos Estados e ao Distrito Federal, conforme previsto no artigo 155, II, da Constituição Federal. A legislação básica é a Lei Complementar Federal 87/1996, conhecida como Lei Kandir, que disciplina as normas gerais do ICMS. Os Estados podem legislar e criar seus próprios regulamentos, respeitando os limites contidos na Constituição Federal e na mencionada Lei Complementar.

O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza — ISSQN ou ISS — trata-se de um imposto cumulativo de competência dos municípios e do Distrito Federal, conforme disciplinado no artigo 156, inciso III, da Constituição Federal. O ISS incide sobre a prestação de serviços especificados na lista anexa a Lei Complementar 116/2003, ainda que esses serviços não constituam atividade preponderante do prestador. Os contribuintes são aqueles que praticam os serviços disciplinados na legislação. Os municípios podem instituir e disciplinar o ISS desde que respeitados a Constituição Federal e a Lei Complementar mencionada.

Diante das considerações acerca das principias características dos impostos em questão, nota-se que para verificar se incide ISS ou ICMS nas operações de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, faz-se necessário o desenvolvimento das seguintes questões:

I — O corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, considerando suas características, podem ser considerados serviços?

II — Considerando a resposta na questão I no sentido de que são serviços as atividades, estas estão especificadas na Lei Complementar Federal 116/03?

III — Os municípios podem considerando a Lei Complementar 116/03 criar legislação específica para a exigência do ISS?

IV — As atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, podem constituir fato gerador do ICMS?

V — É possível a realização da venda de árvore em conjunto com a prestação como serviço das atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento?

As respostas aos questionamentos:

I — O corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, considerando suas características, podem ser considerados serviços?

O conceito de serviços a ser analisado é referente ao ato ou efeito de fazer ou servir a outrem, a possibilidade de prestação do ato sob a forma de serviço.

O corte pode ser considerado serviço sob alguns aspectos. A realização do corte no paisagismo, diminuição de floresta, árvore, arbusto, mata, ou no presente caso, o corte ligado à preparação de madeira para venda ou para transformação, pode nitidamente ser considerado como sendo um serviço, pois, é passível de ser prestado e contratado independentemente do mesmo prestador estar ou não ligado à venda a madeira cortada.

A derrubada de árvores consiste no abate de uma árvore ou mata, seja para aproveitar a área para outras atividades ou aproveitar as árvores para algum fim comercial ou industrial. Assim, a derrubada pode ser um ato passível de ser prestado, independente do objetivo pelo qual se realiza a derrubada.

O transporte para carga ou remoção, neste caso, representa o ato ou efeito de remover, transportar algo por alguém ou alguma coisa com o fim de possibilitar o carregamento da madeira. Pelo próprio significado do ato, é notório que este pode ser considerado um serviço, uma vez que, mesmo normalmente possuindo a finalidade ligada ao carregamento, este serviço pode ser prestado de forma desvinculada da operação de venda de madeira.

O carregamento ou carga de madeiras representa o ato de suportar e arrumar, de forma que se concretize a carga; pode ou não estar ligado à remoção. Neste caso, o ato em questão possui natureza de um serviço, pois, pode ser concretizado independente de qualquer operação de venda.

Assim, as atividades são serviços, prestados de forma independente ou em conjunto, pois, o corte ou derrubada podem possibilitar o transporte para carga ou remoção e estes, na seqüência, podem possibilitar o carregamento ou carga.

II — Considerando a resposta na questão I no sentido de que são serviços as atividades, estas estão especificadas na Lei Complementar Federal 116/03?

Vale ressaltar que não existe uma definição legal para o sentido de serviços, mas, para efeito de incidência do ISS, considera-se o serviço descrito de forma geral na Lei complementar 116/03 e de forma mais específica na legislação municipal.

Vale transcrever alguns itens da lista anexa à Lei Complementar 116 de 31 de julho de 2003. Veja:

7.11 — Decoração e jardinagem, inclusive corte e poda de árvores.

7.16 — Florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação e congêneres.

11.04 — Armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda de bens de qualquer espécie.

Conforme anteriormente mencionado, a Lei Complementar 116/03 traz as normas gerais acerca do ISS, e a lista de serviços anexa traz apenas os serviços a título de espécie, e a partir destas disposições, os municípios podem legislar acerca da incidência do ISS de forma mais específica.

Verificando o item 7.16, é possível notar que florestamento, reflorestamento e seus congêneres englobam uma gama de serviços, todos resumidos em alguns sentidos.

Os serviços de florestamento e reflorestamento englobam o ato de plantar árvores para formar florestas, e sequencialmente o futuro corte, a remoção e a carga. E na seqüência, novamente todo o ciclo, configurando o Reflorestamento.

Ou seja, para a concretização do florestamento ou reflorestamento é necessário praticar as atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento. Portanto, inevitavelmente, em certas situações as atividades ou serviços já estão englobadas no florestamento ou reflorestamento.

Quanto ao item 7.16, menciona os congêneres de florestamento, reflorestamento, semeadura, adubação. Tais congêneres, por lógica podem englobar inúmeros serviços a serem discriminados pelos municípios em suas legislações, entre eles, corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, pois, se estes serviços já estão inseridos no contexto de florestamento e reflorestamento, o termo congêneres comporta a discriminação específica de todos os serviços que os compõe.

Ademais, o item 7.11, da lista anexa à LC 116/03, traz os serviços de decoração e jardinagem, inclusive corte e poda de árvores. Conforme especificado no tópico anterior, o corte e derrubada de árvores pode concretizar-se em inúmeras situações, dentre elas no corte e derrubada para fins de comercialização da madeira.

Existem duas interpretações quanto ao presente item 7.11, a primeira é que a legislação ao constar corte especificamente abriu todo e qualquer possibilidade em que se enquadre como corte de árvores. Já a segunda interpretação é a de que seria o corte de árvores ligado à jardinagem. Contudo, considero esta segunda premissa incorreta, pois, a LC 116/03 traz a legislação geral, assim, ao mencionar jardinagem, todos os procedimentos nele inseridos, inclusive o corte de árvore já estão inclusos devido a sua própria natureza. Portanto, apresenta-se mais correta a interpretação de que o corte de árvores é uma espécie e a partir deste ponto, os municípios disciplinam da forma que entenderem conveniente em que situação o corte de árvores será tributado pelo ISS.

Já o item 11.04, da lista anexa á LC 116/03, traz armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda de bens de qualquer espécie. Este item específico menciona que se aplica a bens de qualquer espécie. Assim, quanto ao transporte para carga ou remoção, carga ou carregamento, estes estão inclusos de forma específica como espécie, podendo os municípios disciplinarem a exigência do ISS sobre qualquer bem.

É notório que a carga, descarga e arrumação estão inseridos no contexto de transporte para carga ou remoção, carga ou carregamento. Conforme já havíamos considerado no tópico anterior, no presente caso, o transporte para carga ou remoção é o serviço pelo qual objetiva-se a realização do serviço de carga ou carregamento. Logo, pela legislação, estes serviços estão inseridos em um mesmo contexto para fins da incidência tributária a ser definida pelos municípios.

III — Os municípios podem considerando a Lei Complementar 116/03 criar legislação específica para a exigência do ISS?

Portanto, considerando as duas respostas anteriores e frente à análise dos serviços de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, conclui-se que a Lei Complementar 116/03, traz sob a forma de espécie, dando margem para que a legislação municipal possa disciplinar especificamente a incidência de ISS.

IV — As atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, podem constituir fato gerador do ICMS?

Diante da natureza das atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, assim como diante da legislação (LC 116/03), por regra, não incide ICMS.

Contudo, é inevitável considerar que se o contribuinte realizou a venda da madeira, já incluindo neste preço o corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, estarão incidindo o ICMS inevitavelmente nas atividades em questão.

Se o contribuinte é exclusivamente comerciante de madeiras e as vende com um preço fechado, não contratando nem mesmo terceiros para realizar os serviços, este deve pagar o ICMS sobre a totalidade, pois, o preço da madeira seria a composição da mercadoria com todos os seus custos para venda.

Por outro lado, quando se trata de contribuintes cujo objeto social seja a atuação nos ramos de florestamento, reflorestamento, vendas de madeiras, serviços de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, quando ocorrer a venda da mercadoria, é possível diferenciar quando ocorre a incidência do ICMS sobre a venda da madeira e o ISS sobre os serviços de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento.

Ademais, mesmo que fosse considerado que os serviços em questão não estão inseridos na lista de serviços anexas à Lei Complementa 116/03, não ocorreria a incidência do ICMS sobre estes serviços. Veja a forma como a Constituição Federal especifica a incidência do ICMS:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

II — operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

Nota-se que a legislação é clara ao determinar que o ICMS incide apenas sobre a circulação de mercadorias, sobre os serviços de transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação. Ou seja, os serviços em análise no presente texto não estão inseridos na ocorrência de fato gerador do ICMS. A premissa de que se o serviço não está previsto na LC 116/03 incide ICMS é absolutamente incorreta, pois, a própria Constituição Federal limita a incidência do ICMS.

Portanto, se as atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, forem efetivamente consideradas como serviços realizados pelo contribuinte, mesmo que este também venda a madeira, não ocorre a incidência do ICMS sobre os serviços.

V — É possível a realização da venda de árvore em conjunto com a prestação como serviço das atividades de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento?

Conforme já mencionado no tópico anterior, quando se trata de contribuintes cujo objeto social seja a atuação nos ramos de florestamento, reflorestamento, vendas de madeiras, serviços de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, revela-se plenamente possível à venda de mercadoria e a prestação dos serviços, pois, todas as atividades podem ser exercidas por contribuinte que exista exatamente para este fim.

Nesta situação, o preço dos serviços de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento não compõe o preço da mercadoria (madeira), pois, o contribuinte executa exatamente todas as atividades. Nada na legislação impede que o contribuinte venda a madeira e realize serviços decorrentes desta mesma venda.

Por outro lado, faz-se oportuno mencionar que se o objeto do contribuinte for exclusivamente a venda de madeira, este não pode prestar serviços. Assim, naturalmente o corte, remoção e carga compõem o preço da mercadoria.

Portanto, ocorrendo a venda e o serviços, é possível considerar que ocorre a incidência do ICMS sobre a venda da madeira e o ISS sobre os serviços de corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, pois, o se o objeto do contribuinte é exatamente a realização de todas as atividades, este realiza a venda e presta serviços, vinculados ou não. Assim, os estados e municípios podem exigir os valores apenas sobre o que lhes compete. Nas atividades mencionadas, compete aos estados exigir o imposto sobre a venda de madeira e aos municípios a exigência do imposto sobre a prestação dos serviços.

Do posicionamento jurisprudencial:

Acerca da incidência do ISS no caso em análise, vale transcrever a recentíssima decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

Terceira Turma Cível

Apelação Cível – Lei Especial – N. 2006.014238-2/0000-00 – Três Lagoas.

EMENTA — APELAÇÃO CÍVEL — MANDADO DE SEGURANÇA — AUTONOMIA MUNICIPAL PARA LEGISLAR SOBRE ISS – TAXATIVIDADE DA LISTA DE SERVIÇOS DA LEI COMPLEMENTAR QUE DISCIPLINA O TRIBUTO (LEI MUNICIPAL N. 1.067/91 E LEI COMPLEMENTAR 116/03) — EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS DE ATIVIDADES POR EMPREITADA DE DERRUBADA DE ÁRVORES DE EUCALIPTOS E CARBONIZAÇÃO DE MADEIRA PARA TRANSFORMAÇÃO EM CARVÃO VEGETAL — EXPRESSA PREVISÃO E DESCRIÇÃO DO FATO GERADOR DO IMPOSTO — INCIDÊNCIA DO TRIBUTO — RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA CONFIGURADA — CARACTERIZAÇÃO DA ATIVIDADE-FIM EXERCIDA PELA EMPRESA RECORRENTE — RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

O município possui autonomia para legislar sobre os tributos que se encontrem inseridos na sua competência tributária, mas deve respeitar os limites constitucionalmente estabelecidos, não podendo instituir a cobrança de tributo sobre serviços que não estejam arrolados na Lei Complementar n. 116/03.

A lista anexa à LC n. 116/03 é taxativa, mas comporta interpretação analógica nos casos em que a própria lei possibilita a ampliação do significado do seu texto, incluindo serviços semelhantes aos ali previstos.

A empresa que presta serviços de armazenamento, arrumação, carga e descarga, guarda, faz o acondicionamento e o beneficiamento (transformação dos pedaços de árvore em toras) com a madeira que extrai das árvores que ela própria derruba, deve pagar ISSQN, na medida em que o ordenamento jurídico descreve tais atividades como do fato gerador do tributo.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Terceira Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade e com o parecer, negar provimento ao recurso.

Campo Grande, 13 de novembro de 2006.

Des. Oswaldo Rodrigues de Melo – Relator

Portanto, frente a todo o exposto, conclui-se que são considerados serviços o corte de árvores, derrubadas, transporte para carga, remoção e carregamento, e mesmo que estes serviços ocorram em conjunto com a operação de venda da madeira, se o objeto social da empresa comportar a prestação de serviços e a operação de venda da madeira, o imposto incidente sobre os serviços prestados será o ISS. Já sobre a operação de venda incidirá o ICMS.

Revista Consultor Jurídico

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