por Claudio Fonteles
A visão positivista, ainda presente no conduzir-se das pessoas, reduzindo o agir humano ao que pode ser visto e aferido, enclausura os que assim se conduzem numa atitude mecanicista.
A vida humana não pode ser compreendida por perspectiva tão acanhada, típica no pensamento da uniformidade, que não tolera a diversidade, abomina o inesperado, conduzindo-nos quando não ainda à clonagem da espécie humana, mas ao estabelecer padrões comuns de expressão visual.
A vida humana é dinamismo essencial.
Na fecundação – união do espermatozóide com o óvulo – e a partir da fecundação a célula autônoma – zigoto – que assim surge, por movimento de dinamismo próprio, independente de qualquer interferência da mãe, ou do pai, realiza sua própria constituição, bipartindo-se, quadripartindo-se, no segundo dia, no terceiro dia, e assim por diante.
É, portanto, primeiramente embrião, depois feto, bebê, criança, jovem, adulto, velho.
A vida humana é dinamismo essencial.
Justo, se assim compreendida, a vida humana é única e irrepetível.
Não é linear, de modo que sejamos todos nós, no estágio existencial em que nos encontramos, vistos como no traçado imperturbável de uma linha reta.
A vida humana não é assim.
Complexa, surpreendente, imprevisível dota-se de parâmetros próprios a cada etapa do seu ser.
Esse quadro de inesgotabilidade do viver, que fundamenta a dignidade como ínsita ao ser humano, por isso que inviolável, não autoriza seja eliminada a vida humana, em qualquer etapa do seu ciclo existencial.
Bem recentemente, citado em matéria jornalística produzida em nosso país, o pediatra alemão Roberto Wüsthof, a propósito da bebê anencéfala Marcela de Jesus Galante Ferreira, que já completou seu primeiro ano de vida, sentenciou:
“Casos como o de Marcela certamente seriam incluídos nos protocolos de eutanásia na Holanda. Não faz sentido ser diferente. É como se ela fosse um computador sem processador.” (Veja – 15/08/2007 – reportagem da jornalista Adriana Dias Lopes)
Aí está: “É como se fosse um computador, sem processador”.
Esta é a frase, matriz eloqüente de setores empresariais, científicos, políticos e midiáticos, que querem impor o stablishment mecanicista. O stablishment que reduz a vida humana a algo aferível, coletiva e funcionalmente: “não faz sentido ser diferente”.
A vida humana é dinamismo essencial inesgotável.
Eis porque se impunha ao procurador-geral da República o questionamento do artigo 5º, da Lei nº 11.105, que permite o uso de células tronco embrionárias, obtidas de embriões humanos, para fins terapêuticos.
Não me omiti, quando no exercício do cargo, em fazê-lo.
Não se pode matar a vida, ainda que em estágio embrionário, a pretexto de cura.
A um, porque no caso das células-tronco embrionárias não há, no mundo, a comprovação, inclusive, de resultado terapêutico favorável.
A dois, porque aberto fica amplíssimo horizonte de pesquisas científicas, com as chamadas células tronco adultas, que já apresentam resultados terapêuticos favoráveis.
Aliás, a evolução da ciência é fator inconteste. Hoje, já se sabe que o cordão umbilical é fonte importante à pesquisa da medicina regenerativa, dada a possibilidade real de pluripotência, que encerra.
E mais, em dias recentes, o método científico de Reprogramação Genética de Células Adultas do próprio paciente, encaminha para a obtenção das propriedades de totipotência nas células adultas, sem que se comprometa o embrião humano.
Reitero, a procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade, que promovi, significa cessar uma única linha de pesquisa, propiciando permaneça presente amplo leque de pesquisas.
Assim, a Ação Direta de Inconstitucionalidade em nada compromete a liberdade de pesquisa, até porque liberdade não há quando signifique eliminar vidas humanas na etapa embrionária.
A vida humana é dinamismo essencial inesgotável.
Do embrião ao ancião seja-nos permitido vivê-la.
Revista Consultor Jurídico