O Estado não é responsável por prejuízos decorrentes de enchente se não foi negligente ou omisso. O entendimento é da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Os desembargadores confirmaram a decisão de primeira instância que livrou o município de Passos de indenizar um morador por danos morais e materiais.
De acordo com o processo, em janeiro de 2003, a casa do munícipe foi inundada por uma enchente. Ele perdeu móveis, roupas e eletrodomésticos. O prejuízo material foi de cerca de R$ 6 mil. O dano moral teria sido causado porque ele deixou de receber visitas em sua casa, já que não tinha móveis suficientes para isso.
Em primeira instância, a juíza Alessandra Bittencourt dos Santos Deppner, da comarca de Passos, julgou improcedente o pedido de indenização. Segundo ela, a enchente foi causada por fenômeno natural, o que escapa da responsabilidade do município.
Alessandra também afirmou que não foi comprovado que a enchente foi causada devido ao entupimento dos bueiros. A decisão foi mantida pelo TJ mineiro. O relator, desembargador Mauro Soares de Freitas, ressaltou o depoimento de uma testemunha que afirmou que o município providenciou a ampliação das galerias e a limpeza dos bueiros, o que impediu a ocorrência de novas enchentes.
“O risco administrativo não significa que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; pois há determinadas circunstâncias que excluem ou diminuem a responsabilidade do Estado, como dito acima”, considerou o desembargador.
“Jamais poder-se-ia responsabilizar a Administração local pelos prejuízos oriundos de uma enchente eventual e esporádica, uma vez que, o evento lesivo era absolutamente imprevisível”, concluiu. Os desembargadores Cláudio Costa e Maria Elza votaram com o relator.
Processo 1.0479.05.086761-9/001
Leia a decisão
Número do processo: 1.0479.05.086761-9/001(1)
Relator: MAURO SOARES DE FREITAS
Relator do Acórdão: MAURO SOARES DE FREITAS
Data do Julgamento: 13/12/2007
Data da Publicação: 29/01/2008
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL — AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS — RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO — TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO — RESPONSABILIDADE SUBJETIVA — ENCHENTE — CULPA — NÃO COMPROVAÇÃO — FORÇA MAIOR — PEDIDO IMPROCEDENTE — SENTENÇA MANTIDA. O risco administrativo não significa que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; pois há determinadas circunstâncias que excluem ou diminuem a responsabilidade do Estado, como dito acima. O fundamento da teoria do risco administrativo é o nexo de causalidade existente entre a execução de um serviço e o prejuízo causado a um terceiro, se a causa do dano ocorrer aliada a outras circunstâncias, como culpa da própria vítima, força maior, caso fortuito, e até mesmo, culpa de terceiros, a responsabilidade do Estado será excluída ou atenuada, considerando-se que o legislador constituinte não adotou a teoria do risco integral, mas sim a do risco administrativo. Num município que sofre enchentes habituais e regulares numa determinada época do ano, compete à administração local ampliar as galerias pluviais, canalizar o leito do rio, isto é, providenciar meios e modos para impedir o advento do sinistro, pena de poder ser responsabilizado civilmente. Ao contrário, jamais poder-se-ia responsabilizar a Administração local pelos prejuízos oriundos de uma enchente eventual e esporádica, uma vez que, o evento lesivo era absolutamente imprevisível.
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 5ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.
Belo Horizonte, 13 de dezembro de 2007.
DES. MAURO SOARES DE FREITAS – Relator
29/11/2007
O SR. DES. MAURO SOARES DE FREITAS:
VOTO
Trata-se de apelação interposta por Cleanton Geraldo Oliveira em face de Município Passos contra r. decisão que julgou improcedente o pedido na ação de indenização por danos morais e materiais.
Inconformado, o autor recorre do r. decisum requerendo sua reforma, ao fundamento de que, por se tratar de responsabilidade objetiva do Município, não há que se comprovar culpa, mas que nos autos demonstrou-se que a enchente ocorrida no Município em janeiro de 2003 foi ocasionada pelo entupimento das galerias de bueiros, por falta de limpeza. Em sendo assim, espera a procedência de seu pedido.
Contra-razões às fls. 137/145, onde o apelado pugna pela manutenção do r. decisum.
Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.
Relatam os autos ter o autor ajuizado a presente ação de indenização por danos morais e materiais em face do Município de Passos, ao fundamento de que, com a chuva ocorrida em janeiro de 2003, sua casa fora inundada, eis que as ruas ficaram totalmente alagadas, tendo o mesmo, prejuízos em mais de R$ 6.000,00 (seis mil reais), pois perdeu vários móveis, roupas, geladeira, além de ter sofrido um dano moral, pois não poderia convidar amigos e parentes para ir à sua casa, já que não tinha mais móveis suficientes para receber.
Proferida sentença, julgou-se improcedente o pedido entendendo o MM Juiz a quo que a enchente ocorrida na cidade no período de janeiro de 2003 foi ocasionada por força maior, ou seja, um fenômeno da natureza e não por negligência do Município, já que não restou comprovado nos autos que o entupimento das galerias de bueiros se deu por falta de limpeza.
Desta decisão, recorre o requerente pelas razões esposadas acima.
A hipótese dos autos sugere a observância às disposições do §6º, artigo 37, da Constituição Federal, que consagra a responsabilidade objetiva do Estado, sob a modalidade do risco administrativo. Segundo o dispositivo, as entidades estatais e seus desdobramentos respondem pelos danos causados a terceiros, por seus agentes, independentemente da prova de culpa pela lesão.
Como esclarece o autor Hely Lopes Meirelles, na obra Direito Administrativo Brasileiro, “o essencial é que o agente da Administração haja praticado o ato ou a omissão administrativa no exercício de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las”, p. 565, bastando ao terceiro, para obter o devido ressarcimento, a comprovação do ato lesivo e injusto que lhe fora causado.
Nesse sentido, cumpre ressaltar que, embora seja dispensada a comprovação da culpa, pode o Poder Público, com o escopo de excluir ou minorar a indenização, demonstrar a responsabilidade integral ou parcial da vítima, como adverte o doutrinador acima citado, verbis:
“O risco administrativo não significa que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; significa, apenas e tão-somente, que a vítima fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, caso em que a Fazenda Pública se eximirá integral ou parcialmente da indenização”, p. 562.
A meu ver, esta responsabilidade não é integral, pois há determinadas circunstâncias que excluem ou diminuem a responsabilidade do Estado, como dito acima. O fundamento da teoria do risco administrativo é o nexo de causalidade existente entre a execução de um serviço e o prejuízo causado a um terceiro, se a causa do dano ocorrer aliada a outras circunstâncias, como culpa da própria vítima, força maior, caso fortuito, e até mesmo, culpa de terceiros, a responsabilidade do Estado será excluída ou atenuada, considerando-se que o legislador constituinte não adotou a teoria do risco integral, mas sim a do risco administrativo. Daí por que a Jurisprudência, mui acertadamente, tem exigido, a prova da culpa da Administração nos casos de enchentes e vendavais. Nessas hipóteses a indenização pela Fazenda Pública só é devida se ficar comprovada a culpa da Administração. Deste entendimento resulta que não está totalmente revogado o art. 15 do Código Civil, mas apenas derrogado no que se refere aos atos comissivos, isto é, com relação aos atos omissivos há de se demonstrar a conduta culposa, nos exatos termos do art. 15 do Código Civil Pátrio.
Assim, tem-se que, num município que sofre enchentes habituais e regulares numa determinada época do ano, compete à administração local ampliar as galerias pluviais, canalizar o leito do rio, isto é, providenciar meios e modos para impedir o advento do sinistro, pena de poder ser responsabilizado civilmente.
Ao contrário, jamais poder-se-ia responsabilizar a Administração local pelos prejuízos oriundos de uma enchente eventual e esporádica, uma vez que, o evento lesivo era absolutamente imprevisível.
No presente caso, ao que parece, não era comum este tipo de enchente no Município de Passos, além do que, à época dos fatos choveu muito mais que o habitual, conforme relatado, o que dificultou a previsão dos danos que poderiam ocorrer.
Ademais, o depoimento de uma das testemunhas (f. 86) demonstra que, após o ocorrido o Município providenciou a ampliação das galerias, limpeza dos bueiros e não mais ocorreu enchente naquele local.
Portanto, no presente caso, não houve a comprovação precisa que pudesse afirmar ser o Município de Passos o responsável pela inundação na casa do autor, pelo que, deve-se manter a sentença.
Ante tais considerações, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença recorrida.
Custas pelo apelante, cujo pagamento fica suspenso nos termos do art. 12 da Lei 1.060/50.
É como voto.
O SR. DES. CLÁUDIO COSTA: De acordo com o Relator.
A SRª. DESª. MARIA ELZA: Senhor Presidente. Peço vista dos autos.
SÚMULA : PEDIU VISTA A VOGAL. O RELATOR E O REVISOR NEGAVAM PROVIMENTO.
O SR. PRESIDENTE (DES. DORIVAL GUIMARÃES PEREIRA):
O julgamento deste feito foi adiado na Sessão do dia 29.11.07, a pedido da Vogal, após votarem o Relator e o Revisor negando provimento.
Com a palavra a Desembargadora Maria Elza.
A SRª. DESª. MARIA ELZA:
VOTO
Cuida-se de recurso de apelação cível interposto por CLEANTON GERALDO OLIVEIRA contra sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Passos que, nos uma ação de indenização por danos morais e materiais ajuizada pelo recorrente em face do MUNICÍPIO DE PASSOS, ora parte recorrida, julgou improcedente o pedido inicial, ao fundamento de que o fato narrado resultou de força maior.
Em razões recursais de f. 118/135 — TJ, o apelante alega que o apelado deve ser responsabilizado pelos danos materiais e morais decorrentes da inundação. Sustenta que somente após o evento providências foram adotadas pelo recorrido. Cita jurisprudência favorável à sua tese recursal. Pede, por tais motivos, seja provido o recurso.
Em resposta ao recurso, a parte apelada pede, à f. 137/145 – TJ, o não-provimento da apelação.
É o relato. Decido.
Conheço do recurso, pois presentes os requisitos legais de admissibilidade.
Adiro ao entendimento do relator, porquanto a chuva, que resultou na inundação que provocou prejuízos ao apelante, caracterizou-se como um evento de força maior, contra o qual o apelado nada podia fazer. (Precedente do STF: RE 81.751 — SP).
O conjunto probatório aponta que a quantidade de chuva que caiu na manhã do dia 02 (dois) de janeiro de 2003, na cidade de Passos, foi excepcional, superando a média de chuva de um mês. Vide documento de f. 21 — TJ.
Nesse sentido, o depoimento de f. 88 — TJ da testemunha Robson Vasconcelos Valadão:
“que a chuva naquele dia foi muito brava, que não chove tanto como naquele dia;”
Destarte, não há como responsabilizar o Município de Passos, visto que a inundação decorreu de chuva incomum, nada podendo fazer o ente municipal para evitar o ocorrido.
Sobre o tema cito o seguinte precedente deste Tribunal:
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO — RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA — INEXISTÊNCIA DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE O ACIDENTE E O DANO CAUSADO — CASO FORTUITO — ACIDENTE CAUSADO POR CHUVA INCOMUM — EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO. A responsabilidade da Administração Pública assenta-se na teoria do risco administrativo, nos termos do art. 37, § 6º da Constituição Federal de 1988, porém havendo a necessidade de comprovação do nexo de causalidade entre o acidente ocorrido e o dano causado, havendo a exclusão de responsabilidade do Município caso comprovado que aquele se deu em decorrência de caso fortuito.” (Apelação Cível n. 000.298.451-6/000, relator Desembargador Pedro Henriques).
Pelo exposto, nego provimento ao recurso. Por litigar sob o pálio da justiça gratuita, fica suspenso o pagamento da verba de sucumbência pelo apelante.
Revista Consultor Jurídico