O voto facultativo e a eleição direta do conselho tutelar

José Heitor dos Santos

O Conselho Tutelar é um órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. Em cada município deve ter, no mínimo, um Conselho Tutelar, composto de cinco membros, eleitos pelos cidadãos locais para mandato de três anos, permitida uma reeleição.
O candidato a membro do Conselho Tutelar deve preencher alguns requisitos legais, como reconhecida idoneidade moral, ter mais de vinte e um anos de idade, residir no município, além de outros requisitos previstos nas leis municipais.
O voto, para escolha do Conselheiro, é facultativo.
O primeiro Conselho Tutelar dos municípios de Bálsamo e de Mirassolândia foi eleito há três anos e no último dia 11 de fevereiro realizou-se eleição para escolha dos novos Conselhos.
Em Mirassolândia decidiu-se que a eleição seria através do voto direto, repetindo a eleição passada. Em Bálsamo, o prefeito municipal, vereadores e o conselho municipal de direitos da criança e do adolescente decidiram que desta vez, ao contrário da anterior, a eleição seria através do voto direto, ou seja, todos os eleitores do município teriam direito de escolher os membros do novo Conselho Tutelar, sepultando, portanto, a eleição indireta, tornando inquestionavelmente mais democrática a eleição.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, porém, dispõe que não é a justiça eleitoral, nem da infância e da juventude, quem preside o processo de escolha dos membros do Conselho Tutelar, mas o conselho municipal de direitos da criança e do adolescente, formado por pessoas do próprio município, indicadas pelo prefeito municipal e entidades não governamentais, de forma paritária.
Noutras palavras, a eleição teria de ser realizada pelos próprios municípios, através dos Conselhos Municipais de Direitos da Criança e do Adolescente.
Havia, pois, uma grande expectativa de como seriam as eleições, principalmente em Bálsamo, já que cerca de cinqüenta candidatos estavam concorrendo aos cinco cargos, número de candidatos, aliás, superior ao de vereadores nas últimas eleições, deixando evidente que a participação dos eleitores e da população seria expressiva, o que exigia do Conselho Municipal seriedade na organização das eleições.
Estivemos em Bálsamo, pois o promotor de justiça da infância e da juventude tem a obrigação legal de fiscalizar todo o processo eleitoral, e constatamos, com surpresa e admiração, que a eleição foi muito bem organizada pelo Conselho Municipal, que, com competência, dedicação e, acima de tudo, imparcialidade, cuidou de todos os detalhes, desde o processo de votação até a apuração, tanto que não houve qualquer incidente, irregularidade, protesto, tumulto, enfim não houve absolutamente nada de anormal.
Candidatos fizeram suas campanhas, respeitando-se, acompanharam a abertura e o fechamento das urnas, assim como a apuração; professores da rede municipal e estadual uniram-se ao Conselho Municipal e voluntariamente fizeram-se presentes na organização dos trabalhos, a exemplo do prefeito municipal, funcionários públicos, policiais militares e civis, delegado de polícia e da Ordem dos Advogados do Brasil.
Aliás, a OAB, secção de Mirassol, tornou a eleição ainda mais legítima e transparente, pois advogados presidiram as mesas receptoras e as juntas apuradoras, fato inovador e que ganhou o aplauso e o reconhecimento de todos.
Enfim, o que se viu em Bálsamo foi uma grande festa cívica, organizada com competência pelas Autoridades locais, com a participação expressiva da população, que de forma ordeira e pacífica, compareceu para votar, muito embora o voto fosse facultativo.
Em Bálsamo votaram quase 2.600 eleitores, ou seja, quase metade dos eleitores do Município, número altamente expressivo e que coloca Bálsamo como exemplo, pois não há notícia de que em outro município do Brasil tenha havido igual número de votantes, em percentual, exceção de Mirassolândia, que também faz parte da Comarca de Mirassol, onde o número de votantes, em percentual, foi superior.
Em Mirassolândia, onde também estivemos em companhia de advogados, para fiscalizar a eleição, votaram 1.233 eleitores de um total de 2.550, muito embora o voto fosse facultativo. A eleição, nesse município, também foi tranqüila e bem organizada pelo Município e Conselho Municipal de Direitos.
Louve-se a participação de todos e principalmente dos agentes jovens, que sob a liderança de pessoas da comunidade, fizeram o trabalho de conscientização dos eleitores tanto de Bálsamo, como de Mirassolândia e, além disso, ainda colaboraram no dia da eleição.
Depois de tudo o que houve em Bálsamo e Mirassolândia, é possível afirmar com absoluta segurança que a população acompanhará de perto a atuação e o desempenho dos novos Conselheiros Tutelares, os quais terão a missão de efetivamente zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, encaminhando soluções, denunciando maus tratos, agressões, violência, abusos sexuais etc.
Mas, em verdade, o grande vitorioso nessas eleições foi o adolescente e a criança, que ganharam a preocupação, o carinho, atenção e o respeito das comunidades de Bálsamo e de Mirassolândia e principalmente das Autoridades que estiveram presentes, participando e organizando as eleições, pois, com tais participações, assumiram publicamente o compromisso de zelar pelos direitos da criança e do adolescente.
Por fim, considerando que nem todos conhecem o Conselho Tutelar, que no Brasil ele existe há 10 anos e em Bálsamo e Mirassolândia foi criado há 3 anos, é preciso refletir, a partir das experiências de Bálsamo e Mirassolândia, onde o voto foi facultativo, se o voto para outros cargos públicos deve ser obrigatório e, além disso, se deve a Justiça Eleitoral continuar presidindo as demais eleições, afinal, é bom lembrar, ela preside o processo eleitoral e depois julga eventuais conflitos eleitorais, o que pode, em tese, retirar sua imparcialidade no julgamento.

José Heitor dos Santos é Promotor de Justiça em São Paulo.

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