TST/SP: Supressão de cinco minutos no intervalo intrajornada não enseja indenização da hora completa

A 17ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região não deferiu demanda de trabalhador de uma montadora de veículos que, durante um período, realizava cinco minutos a menos do intervalo intrajornada, que deve durar uma hora, segundo previsto em lei.

De acordo com o autor da ação, desde a admissão, em fevereiro de 2012, até maio de 2015, houve supressão no tempo de pausa para refeição e descanso. A empresa, por sua vez, alegou a existência de um acordo coletivo que possibilitaria a prática.

Embora entenda que o intervalo intrajornada só pode ser reduzido mediante autorização governamental, sendo impossível a supressão de período por negociação coletiva, o desembargador-relator Sidnei Alves Teixeira entendeu que a fruição de 55 minutos não prejudica o alcance da finalidade do intervalo.

Segundo o magistrado, o período de intervalo proporcionou ao trabalhador o tempo necessário à sua alimentação e recuperação orgânica. O relator concluiu que, uma vez atingido o disposto no art. 71 da CLT, não é razoável desconsiderar o período efetivamente usufruído pelo trabalhador para indenizá-lo pela hora completa.

A ação versou ainda sobre valores relativos a dano moral, pensão mensal vitalícia em razão de doença ocupacional, entre outras demandas.

Ainda cabe recurso.

Processo nº 1002653-86.2016.5.02.0463.

TJ/SP rejeita plano de recuperação judicial aprovado em assembleia

Pagamento de credores com CRI contraria disposição legal.


A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a rejeição de plano de recuperação judicial de empresa de informática. De acordo com os autos, consta do plano que o pagamento dos credores trabalhistas será realizado por meio de títulos imobiliários, os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), relativos à venda de Unidade Produtiva Imobiliária (UPI), cujo pagamento será feito em aproximadamente sete anos. Apesar de ter sido aprovado em Assembleia de Credores, o plano foi rejeitado em Juízo.

O relator do recurso, desembargador Cesar Ciampolini Neto, afirmou que “o fato de o plano de recuperação ter sido aprovado pelos credores presentes em assembleia não afasta a necessidade de compatibilização de suas regras com o ordenamento jurídico”. Segundo o magistrado, sete anos para pagamento dos créditos trabalhistas é “expediente inadmissível”, pois a lei estipula prazo não superior a um ano.

Além disso, Cesar Ciampolini apontou que o plano de recuperação infringe o que dispõe a Consolidação das Leis de Trabalho em seu artigo 463, ao propor o pagamento de salários em títulos, e não em dinheiro. “Já se disse na decisão inicial, mas não custa enfatizar que reza a C.L.T. que o pagamento de salários se faça em moeda corrente”, ressaltou o desembargador. “Dessa forma, enfim, não se pode admitir a homologação do plano de recuperação judicial.”

Participaram do julgamento, que teve votação unânime, os desembargadores Eduardo Azuma Nishi e Marcelo Fortes Barbosa Filho.

Processo nº 2268472-74.2019.8.26.0000

STJ: Falta de intimação do MP só anula processo contra empresa em recuperação se intervenção for indispensável

​​​​Nos termos do artigo 279 do Código de Processo Civil de 2015, a nulidade processual decorrente da ausência de intimação do Ministério Público só deve ser decretada quando sua intervenção como fiscal da ordem jurídica for indispensável. Além disso, a Lei de Falência e Recuperação não exige a atuação do MP em todas as ações que tenham empresas em recuperação como partes.

Esse cenário legislativo levou a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que anulou sentença proferida em execução de título extrajudicial porque a ação envolvia empresa em recuperação e não houve a intimação do MP. A decisão foi unânime.

Relatora do recurso especial, a ministra Nancy Andrighi lembrou que a intervenção do MP em processos judiciais deve ocorrer sempre que a matéria controvertida envolver, em alguma medida, discussão de interesse público, como previsto pelo artigo 127 da Constituição e pelo artigo 178 do CPC/2015.

Dispositivo vet​​ado
A ministra também lembrou que, no projeto que deu origem à Lei 11.101/2005, o Congresso Nacional havia previsto a obrigatoriedade de intervenção do MP nos processos de recuperação judicial e de falência. Entretanto, esse dispositivo foi vetado porque, entre outros fundamentos, sobrecarregaria o MP e reduziria a sua importância institucional.

“Percebe-se, a toda evidência, que se procurou alcançar solução que, ao mesmo tempo em que não sobrecarregasse a instituição com a obrigatoriedade de intervenção em ações ‘irrelevantes’ (do ponto de vista do interesse público), garantisse a atuação do ente naquelas em que os reflexos da discussão extrapolassem a esfera dos direitos individuais das partes, assegurando-lhe requerer o que entendesse pertinente quando vislumbrada a existência de interesses maiores”, explicou a relatora.

Interesses pri​vados
Ainda que o dispositivo vetado estivesse em vigor, Nancy Andrighi observou que ele não justificaria a necessidade de atuação do MP em processos como a execução de título extrajudicial, pois o projeto de lei originalmente exigia a participação ministerial apenas no curso do próprio processo de recuperação judicial.

No caso dos autos, a ministra ressaltou que a ação que envolve a empresa em recuperação é marcada pela contraposição de interesses privados e discute direitos disponíveis, sem repercussão relevante na ordem econômica ou social. Por isso – apontou –, o fato de a empresa estar em recuperação não é suficiente para atrair a necessidade de atuação do MP.

“Ademais, considerando o princípio da instrumentalidade das formas, a anulação da sentença por ausência de intervenção ministerial somente poderia se justificar se caracterizado efetivo prejuízo às partes, circunstância não verificada no particular” – finalizou a ministra, ao reformar o acórdão do TJSP e determinar o prosseguimento da ação.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.765.288 – SP (2018/0231883-0)

TST: Empresa pagará parte de créditos devidos a auxiliar que prestava serviço a várias tomadoras

A empresa sustentava que o trabalhador prestou serviços a mais de um tomador de serviços.


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso da Caedu Comércio Varejista de Artigos do Vestuário Ltda., de Jandira (SP), contra a condenação ao pagamento de créditos trabalhistas, de forma solidária, a uma auxiliar de produção que prestava serviços a várias empresas. Segundo o colegiado, a prestação de serviços simultânea a vários tomadores não impede a responsabilização.

Condenação
A auxiliar era contratada pela Cabilog Comércio e Logística Ltda., que prestava serviços para diversas empresas do setor de vestuário, como Caedu, Renner e Walmart. Na reclamação trabalhista, ajuizada contra as quatro empresas, ela pedia o pagamento de parcelas não cumpridas pela empregadora.

A Caedu e as demais empresas foram condenadas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), de forma subsidiária, ao pagamento das parcelas. Segundo o TRT, todas haviam se beneficiado da força de trabalho da auxiliar.

Súmula 331
Na avaliação da Caedu, a prestação de serviços a mais de um tomador afastaria a responsabilidade subsidiária reconhecida pela Súmula 331 do TST. Ainda, segundo a empresa, seria impossível mensurar o volume de trabalho prestado a cada empresa.

Responsabilidade
Para o relator do recurso de revista, ministro Alberto Bresciani, ficou claro que a empresa havia se beneficiado diretamente dos serviços prestados pela empregada. Da mesma forma, segundo ele, a questão de não ser possível determinar a extensão do trabalho para cada empresa não é suficiente para excluir a responsabilidade subsidiária. Nesse caso, a responsabilidade de cada tomador de serviços fica limitada ao período de vigência do contrato firmado com a empresa prestadora.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo n RR-1002399-89.2017.5.02.0201

TRF3 autoriza transferência de recursos a hospital filantrópico

Entidade, que depende de repasses do governo, possuía restrições por inadimplência.


A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) deu provimento ao recurso da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Bariri/SP para suspender a restrição de transferência de recursos federais, estaduais e municipais em decorrência de inadimplência e de registros no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados (Cadin) e no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI).

O hospital buscava a emissão de certidão positiva com efeitos de negativa, da Fazenda Nacional, alegando ser entidade filantrópica voltada para a área da saúde e totalmente dependente das transferências dos recursos para sua manutenção. A sentença havia julgado improcedente o pedido, mas, no TRF3, a Quarta Turma reverteu a decisão.

Segundo a desembargadora federal Marli Ferreira, relatora do acórdão, a expedição da certidão negativa de débitos ou certidão positiva com efeitos de negativa a quem efetivamente não esteja quite com a Fazenda Nacional caracteriza falsa declaração sobre fato juridicamente relevante.

No entanto, “tratando-se de entidade sem fins lucrativos, atuante na área de saúde, a exigência de regularidade fiscal deve ser mitigada, sobretudo em razão da atividade exercida, a qual se dá em benefício do interesse público, suprindo a ausência de plena atuação estatal nestas áreas”, declarou.

A magistrada observou que a intervenção no hospital ocorreu por impugnação do Ministério Público ao gerenciamento da entidade pela Organização Social Vitale Saúde após inquérito civil. No entanto, as partes celebraram Termo de Ajustamento de Conduta, dando concretude ao que restou decidido na ação civil pública nº 1000273-43.2018.8.026.0062, que tramitou na Justiça Estadual.

A desembargadora afirmou, ainda, que a Lei n° 10.522/02, em seu artigo 26, determina que a inadimplência não constitui óbice à liberação de recursos destinados a ações sociais, sendo tal situação também excepcionada pelo artigo 25, §3°, da Lei Complementar n° 101/00, nos casos de verbas voltadas para educação, saúde e assistência social.

Assim, a Quarta Turma, por unanimidade, acompanhou o voto da relatora e deu provimento à apelação do hospital.

Processo n° 5000220-06.2019.4.03.6117

TJ/SP mantém multa a provedor de e-mails por descumprimento de determinação judicial

Empresa não forneceu informações solicitadas pela Justiça.


A 4ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve multa fixada contra empresa provedora de e-mails que descumpriu ordem judicial de quebra de sigilo de dados de investigado. Foram bloqueados R$ 50 mil, relativos à multa por descumprimento.

Consta nos autos que a empresa não cumpriu ordem judicial de quebra de sigilo de dados telemáticos de indivíduo que figurava como averiguado em investigação criminal, alegando que não é legalmente obrigada a fornecer as informações e que a execução de ordem era tecnicamente inexequível.

O desembargador Camilo Léllis, relator do mandado de segurança, em seu voto destaca que, tendo o juízo fornecido nome e sobrenome do investigado, “estavam satisfeitos os requisitos legais para o cumprimento da ordem”. Além disso, a empresa não comprovou a alegada impossibilidade técnica. “Curioso notar que outros provedores destinatários de idêntica ordem acataram a decisão judicial e nada suscitaram sobre impossibilidade técnica, o que rechaça a tese aqui apresentada”, escreveu. “Uma vez verificada a desídia do ora impetrante, bem como a utilidade da medida na busca da verdade real, valeu-se a autoridade impetrada de importante instrumento coercitivo, a saber, a fixação de astreintes”, continuou. Assim, concluiu o magistrado, “razoável a manutenção da astreinte tal como decidido na origem, dado seu caráter coercitivo e de resguardo do interesse público, especialmente em casos de verdadeiro desdém por parte do destinatário da ordem judicial para com a seriedade do comando recebido e consequências de sua inobservância”.

Em voto convergente, o desembargador Edison Brandão afirmou: “Este ‘ignorar’ da autoridade judicial brasileira é inconcebível. Trata-se da requisição como se fosse uma mera correspondência comercial. A ordem não constitui curiosidade por parte do magistrado. Há uma vítima sendo lesada, há o Ministério Público, que precisa buscar o autor de determinada prática. Isso não pode ser ignorado”. “Se uma empresa desse porte não possui condições de fornecer um dado tão simples – se alguém, com aquele nome, possui conta registrada -, de acordo com o Marco Civil da Internet, sequer poderia operar no país. Ou seja, a ordem era dotada de total razoabilidade e os dados tinham plana condição de serem recuperados”, ponderou.

Completou o julgamento, decidido por unanimidade, o desembargador Roberto Teixeira Pinto Porto.

TST: Exame sem idade gestacional inviabiliza pagamento de indenização estabilitária a auxiliar de limpeza

Não foi possível demonstrar que ela estava grávida ao ser dispensada


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso de uma auxiliar de limpeza que buscava indenização referente à estabilidade no emprego da gestante. A ultrassonografia apresentada por ela não comprovou que estava grávida ao ser dispensada pela A. Frugoni Locação de Mão de Obra Ltda., de São Paulo (SP), pois não informava a idade gestacional. Sem a certeza sobre a data do início da gravidez, o pedido de indenização foi indeferido desde o primeiro grau.

Exame sem idade gestacional
A auxiliar de limpeza, contratada pela A. Frugoni, prestava serviços num cartório eleitoral do desde 2014. Dispensada em 6/4/2016, ela alegou, na reclamação, que estava grávida e tinha direito à estabilidade prevista no artigo 10, inciso II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que garante a estabilidade provisória da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Ela anexou ao processo o resultado de uma ultrassonografia realizada em 2/6/2016. Mas, segundo o juízo de primeiro grau, o documento não indicava a idade gestacional.

Certidão inservível
O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT), ao manter a sentença, registrou que nenhum dado demonstrava que o início da teria ocorrido na vigência do contrato de trabalho, pois a dispensa se dera em 6/5/2016, enquanto a ultrassonografia era de 2/6/2016. O TRT registrou, ainda, que a certidão de nascimento com que a empregada pretendia provar a data de nascimento da criança chegou aos autos de forma incompleta e já em fase recursal, sendo inservível como prova.

O relator do recurso de revista da auxiliar, ministro Alberto Bresciani, observou que, a partir dos trechos transcritos da decisão do TRT, o momento da concepção era duvidoso e, portanto, não seria possível dizer que houve violação ao direito à estabilidade. “A condenação, nesta circunstância, seria condicional, o que não se pode admitir’, afirmou.

Bresciani destacou que a verificação dos argumentos da parte demandaria o reexame do conjunto probatório dos autos, procedimento não permitido nesta fase, conforme a Súmula 126 do TST. A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo n° RR-1001575-31.2016.5.02.0601

TRF3 nega penhora de imóvel e de valores repassados pelo SUS à Santa Casa

Decisão ressaltou a importância no atendimento à população da região do interior paulista, sobretudo em época de pandemia da Covid-19.


A Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), por unanimidade, rejeitou o pedido da Caixa Econômica Federal (Caixa) para reformar decisão que indeferiu a penhora de imóvel e de recursos repassados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) à Santa Casa de Misericórdia de Sorocaba/SP, para pagamento de dívida da entidade filantrópica.

Para o colegiado, a retenção dos valores implicaria, inegavelmente, na redução do atendimento prestado pela instituição à população da região de Sorocaba. “Ademais, considerando a situação de pandemia Covid-19 que vem sendo vivenciada no momento, mais imprescindível ainda se torna a manutenção dos serviços de saúde prestados pela Santa Casa”, afirmou o desembargador federal relator Carlos Francisco.

A penhora já havia sido negada em decisão monocrática proferida em março deste ano. No recurso, a instituição bancária alegou que o julgamento propôs um acordo de forma unilateral, cerceando a manifestação da credora e determinando coercitivamente o seu cumprimento.

Ao analisar o caso, o relator ressaltou que o banco não apresentou nenhum argumento apto a invalidar o entendimento da decisão anterior. “Ainda, cumpre observar que na ausência de novos argumentos no agravo interno (art. 1.021 do CPC), embutindo questões relativas ao mérito do agravo de instrumento, fica ele prejudicado”, disse.

O magistrado reforçou que a Caixa deve aceitar o acordo determinado judicialmente que prevê o pagamento mensal de R$ 120 mil oferecido pela Santa Casa, para abatimento da dívida. Além disso, o desembargador pontuou que a jurisprudência considera impenhoráveis os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em saúde.

Assim a Segunda Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento e julgou prejudicado o agravo interno proposto pela instituição financeira. Por fim, o colegiado concluiu que é cabível a fixação de multa por descumprimento de decisão judicial.

Processo n° 5009259-45.2019.4.03.0000

TRT/SP: Falta de documento de identificação não impede oitiva de parte em audiência

Os magistrados da 14ª Turma do TRT da 2ª Região decidiram, por unanimidade de votos, acolher o pedido de uma trabalhadora para poder ser ouvida em audiência mesmo tendo perdido seu documento de identificação. A turma reformou a decisão de origem e determinou o retorno do processo à vara (61ª VT/SP), a realização de nova audiência de instrução (com oitiva da parte e das testemunhas) e a prolação de outra sentença conforme entendimento do juízo de 1º grau.

Na decisão original, a reclamante havia sido declarada ausente e confessa por não portar documento hábil de identificação, mesmo estando presente em sala de audiência. Também fora indeferida sua oitiva, assim como de suas testemunhas, ante a confissão ficta aplicada. A empregada, entretanto, havia apresentado boletim de ocorrência e comprovante de solicitação da segunda via do seu documento de identificação, “restando bastante claro que a perda do registro de identidade de fato ocorreu”, conforme acórdão de relatoria do desembargador Davi Furtado Meirelles.

A decisão em 2º grau considerou ainda que “em face da ausência de identificação da autora em audiência de instrução, o juízo sentenciante bem poderia ouvi-la, oportunizando na sequência prazo de 15 (quinze) dias para a sua comprovação, tendo em vista que estavam anexados ao feito, junto à petição inicial, documentos de sua identificação, tais como a cópia do RG e da sua CTPS, ou então que se designasse o ato processual para data posterior, conforme preconiza o § 2º do art. 844 da CLT”.

Processo nº 1001189-64.2019.5.02.0061

STJ concede habeas corpus a mais de mil presos de SP que cumprem pena indevidamente em regime fechado

Diante do reiterado descumprimento da jurisprudência das cortes superiores pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para fixar o regime aberto a todas as pessoas condenadas no estado por tráfico privilegiado, com pena de um ano e oito meses.

A medida – decidida p​or unanimidade – foi adotada também em caráter preventivo, para impedir a Justiça paulista de aplicar o regime fechado a novos condenados nessas situações.​

Segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo, apresentados pela Defensoria Pública daquele estado, havia – em março – 1.018 homens e 82 mulheres cumprindo a pena mínima por tráfico em regime fechado, pois o TJSP – contrariando o entendimento do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) e ignorando direitos previstos em lei – não lhes autorizou o regime aberto, nem a substituição da pena.

Para o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, a insistente desconsideração das diretrizes normativas derivadas das cortes superiores, por parte das demais instâncias, “produz um desgaste permanente da função jurisdicional, com anulação e/ou repetição de atos, e implica inevitável lesão financeira ao erário, bem como gera insegurança jurídica e clara ausência de isonomia na aplicação da lei aos jurisdicionados”.

Jurisprudência cons​​olidada
O ministro afirmou que é consolidada e antiga a interpretação do STF de que não é crime hediondo o tráfico de drogas na modalidade prevista no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006 – quando a quantidade de drogas apreendida não é elevada, o agente é primário, de bons antecedentes, não se dedica a delitos nem integra organização criminosa. Nessa situação, a pena pode ser reduzida em até dois terços, chegando ao mínimo legal de um ano e oito meses.

Segundo Schietti, em decorrência dessa interpretação, o STF já se pronunciou no sentido de que a natureza não hedionda do crime de tráfico privilegiado desautoriza a prisão preventiva sem a análise concreta dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal; afasta a proibição de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, prevista no artigo 44 da Lei de Drogas; e impõe tratamento penal mais benigno.

O ministro observou que, além da jurisprudência dos tribunais superiores sobre a matéria, a Lei 13.964/2019 deu nova redação ao artigo 112, parágrafo 5º, da Lei 7.210/1984 (Lei de Execução Penal), e dispôs que “não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 11.343/ 2006”.

No entanto, como apontou o relator, é costumeira a desconsideração pelo TJSP das Súmulas 718 e 719 do STF e da Súmula 440 do STJ, que espelham a mesma orientação jurisprudencial.

“O que se pratica, em setores da jurisdição criminal paulista, se distancia desses postulados, ao menos no que diz respeito aos processos por crime de tráfico de entorpecente na sua forma privilegiada, em que a proporcionalidade legislativa – punir com a quantidade de pena correspondente à gravidade da conduta, mas também na sua espécie e em seu regime de cumprimento – é desfeita judicialmente”, afirmou.

Dados preocu​​​pantes
Schietti lembrou que, em agosto, a Sexta Turma declarou a ilegalidade de uma decisão do TJSP em situação idêntica e pediu uma atuação mais harmônica das instâncias ordinárias em questões jurídicas pacificadas. Na ocasião, revelou-se que, dos 11.181 habeas corpus impetrados pela Defensoria Pública de São Paulo no STJ em 2019, a ordem foi concedida em 6.869 (61,43% das impetrações).

Para o ministro, esses dados são a tradução “inequívoca e indesmentível” de que o volume de trabalho das turmas criminais do STJ, ocupadas em mais de 50% por habeas corpus oriundos do TJSP – dos 68.778 habeas corpus distribuídos no STJ em 2019, 35.534 vieram de lá –, “em boa parte se resume a simplesmente reverter decisões que, contrárias às súmulas e à jurisprudência das cortes superiores, continuam a grassar, crescentemente, em algumas das 16 câmaras criminas daquele tribunal”.

Em seu voto, o relator criticou o aumento exponencial do encarceramento de pessoas sob a acusação de tráfico, cujo número aumentou 508% entre 2005 e 2017 apenas no estado de São Paulo, segundo dados da Secretaria de Administração Penitenciária.

O relator ainda destacou pesquisa do Instituto Conectas segundo a qual o estado de São Paulo é responsável por cerca de 50% das prisões por tráfico no país. O estudo concluiu que os juízes de primeira instância, em São Paulo, continuam aplicando tratamento desproporcional ao tráfico privilegiado, em comparação a outros delitos sem violência de igual pena.

Na avaliação de Schietti, isso contribui para “uma trágica realidade”: mesmo com o expresso reconhecimento de que não possuem antecedentes nem integram organização criminosa ou exercem atividade delitiva, mais de mil homens e mulheres permaneceram presos durante o processo, foram condenados à pena mínima prevista para o tráfico privilegiado – ou, quando muito, a uma pena menor que quatro anos de reclusão – e tiveram negado o direito de recorrer em liberdade. E, no julgamento da apelação, o TJSP não apenas confirmou a sentença condenatória, como também manteve o regime fechado e a proibição de substituição da pena.

Fundamentação ​​​​inidônea
O habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública de São Paulo foi em favor de um preso, com pedido de extensão a todos os demais nas mesmas condições. No caso individual, o réu foi denunciado por armazenar 23 pedras de crack (com peso líquido de 2,9g) e quatro saquinhos de cocaína (com peso líquido de 2,7g), supostamente para comércio ilícito. Ele foi condenado a um ano e oito meses de reclusão, no regime inicial fechado, mais multa.

O TJSP manteve o regime fechado com base na natureza das drogas, pois “quanto maior a capacidade de viciar da droga, em abstrato, maior a reprovabilidade”. Para Schietti, a fundamentação para manter o regime fechado não foi idônea, uma vez que a quantidade de drogas apreendidas não era relevante e o réu preenchia os requisitos para a caracterização do tráfico privilegiado – tanto que a pena foi fixada no mínimo legal.

Ao fixar o regime aberto em favor do paciente, o colegiado determinou a mesma providência para todos os presos que se encontrem em situação igual no estado e estejam no regime fechado, e também para todos os que forem condenados futuramente.

Em relação aos condenados por tráfico privilegiado com penas acima da mínima, mas menores que quatro anos de reclusão, os ministros determinaram que os juízes das Varas de Execução Penal reavaliem, com a máxima urgência, a situação de cada um, de modo a verificar a possibilidade de fixação do regime aberto em razão do desconto do tempo em que tenham permanecido em prisão preventiva.

Ponderação am​​pla
Na opinião do ministro Nefi Cordeiro, as situações narradas pela Defensoria Pública de São Paulo – bem precisas e delimitadas – não deixam dúvida de que é devida a incidência do regime mais brando, em razão da pena fixada. Ao acompanhar o relator, o ministro ressaltou que a “gravidade da repetição de feitos exige uma ponderação mais ampla do cabimento de medidas definidoras do direito por esta corte”.

O ministro Antonio Saldanha Palheiro disse que tem verificado a renitência de vários magistrados em seguir a letra da lei e a orientação da jurisprudência dos tribunais superiores. “Esse tipo de comportamento transborda a independência jurídica. Não é independência jurídica externar a sua opinião para o caso concreto, é simplesmente a afirmação de um posicionamento ideológico, independentemente da posição dos tribunais superiores – que têm o papel de unificar a jurisprudência para pacificar os conflitos”, declarou.​

A ministra Laurita Vaz destacou que o relator, em seu voto, fez uma análise profunda da situação para justificar a concessão do habeas corpus coletivo. Segundo ela, a concessão da ordem nessas condições deve ser delimitada por um critério objetivo, como no caso.

Para o ministro Sebastião Reis Júnior, a postura extremamente punitivista não tem sido suficiente para combater a criminalidade. “É absurda essa insistência totalmente injustificável das instâncias ordinárias em simplesmente ignorar precedentes já pacificados no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal e, sem qualquer fundamentação jurídica, insistir em teses há muito superadas”, afirmou.

Insistênc​​​ia hedionda​
Ao se manifestar durante o julgamento, o defensor público estadual Rafael Ramia Muneratti lembrou que esses casos vêm se repetindo em todo o país. “Infelizmente, diuturnamente, continuamos a nos deparar com decisões, tanto em primeiro grau quanto em segundo, de aplicação do regime fechado em razão da suposta hediondez do crime de tráfico de drogas privilegiado”, frisou. Para ele, não é viável continuar “inundando o STJ” com habeas corpus relativos a matérias já pacificadas.

O subprocurador-geral da República Domingos Sávio da Silveira criticou a posição – frequentemente adotada no TJSP – de considerar que o tráfico privilegiado é crime hediondo. “Hedionda é essa jurisprudência, essa insistência em manter o corpo do pobre, do preto, do periférico nas masmorras do estado de São Paulo”, afirmou.​

Veja o acórdão.
Processo n° 596.603 – SP (2020/0170612-1)


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