STJ: Sindicato responde por prejuízos causados por advogado que se apropriou de valores em ação de filiado

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que reconheceu a legitimidade de um sindicato para responder, ao lado do advogado que indicou, em ação na qual um filiado buscou a restituição de valores que teriam sido levantados e retidos indevidamente pelo defensor em processo movido com o auxílio da entidade sindical.

Na decisão, o colegiado entendeu que, estando configurada a relação jurídica entre o sindicato e o advogado – que foi colocado à disposição dos filiados para prestar assistência jurídica –, o ente sindical responde de forma objetiva e solidária pelos atos ilícitos praticados pelo defensor contra o associado.

De acordo com os autos, o filiado foi ao setor jurídico do sindicato para obter informações sobre o andamento de ação de interesse dos sindicalizados, momento em que o advogado solicitou que ele revogasse procuração anterior e o outorgasse poderes para que fosse requerido o levantamento de valores na ação. Posteriormente, o filiado descobriu que o advogado havia levantado o dinheiro no processo, mas não havia repassado nada a ele.

Em primeiro grau, ao reconhecer que houve lesão ao filiado, o juízo condenou o sindicato e o advogado, de forma solidária, ao pagamento de cerca de R$ 41 mil, além de fixar indenização por danos morais de R$ 8 mil. O acórdão foi mantido pelo TJSP.

No recurso ao STJ, o sindicato alegou que não poderia ser responsabilizado solidariamente pela condenação, pois não teria participação no levantamento indevido realizado pelo advogado. Segundo o ente sindical, a mera indicação de um profissional para tutelar as ações dos associados não poderia gerar uma obrigação inerente à atuação do defensor.

Parceria entre sindicato e advogado
O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, afirmou ser incontroverso nos autos que o sindicato indicou o advogado para prestar assistência jurídica ao sindicalizado, bem como que o defensor se apropriou indevidamente da quantia que cabia apenas ao filiado.

No tocante à relação entre o advogado e o sindicato, o magistrado destacou que, segundo apontado pelo TJSP, à época dos fatos, havia uma relação de parceria entre ambos, de forma que os serviços prestados pelo patrono caracterizavam um tipo de benefício aos sindicalizados, mas também resultavam em atrativo para a filiação de novos funcionários.

Sob o aspecto legal, Bellizze apontou que, a princípio, a reponsabilidade civil é individual, mas o artigo 932 do Código Civil prevê casos excepcionais em que a pessoa deve suportar as consequências do fato com outro. Entre elas, o inciso III estabelece a responsabilidade do empregador ou comitente, em relação a seus empregados e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.

“O artigo 933 do mesmo diploma, por sua vez, preceitua que todos os responsáveis designados no dispositivo anterior responderão pelo ato praticado pelos terceiros, mesmo que não haja culpa, sendo a responsabilidade civil, portanto, objetiva e solidária (artigo 942, parágrafo único, do CC)”, declarou o ministro.

Advogado contratado pelo sindicato
Para a configuração da responsabilidade objetiva indireta, o relator observou que “é prescindível a existência de um contrato típico de trabalho, sendo suficiente que alguém preste serviço sob o interesse e o comando de outrem”.

No caso dos autos, Marco Aurélio Bellizze apontou que o instrumento de mandato outorgado pelo filiado define expressamente o defensor como contratado do sindicato, o que evidencia a conexão entre a atuação do patrono e o serviço de assistência jurídica prestado pelo ente sindical aos associados.

“Dessa forma, sendo incontroverso que os danos causados ao autor foram decorrentes do ato ilícito perpetrado por profissional, não apenas indicado, mas que mantinha relação jurídica com o sindicato, a fim de atuar na defesa dos interesses de seus associados, de rigor a aplicação dos artigos 932, III, e 933 do Código Civil”, concluiu o ministro ao manter o acórdão do TJSP.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.920.332 – SP (2020/0183158-3)

TST: Operadora de telemarketing terá acesso a sistema Simba para tentar buscar bens de devedor

O sistema permite procurar eventual patrimônio oculto dos devedores por meio das movimentações financeiras.


A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho deferiu a uma operadora de telemarketing de São Paulo (SP) a possibilidade de acesso ao Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias (Simba) para tentar, em processo de execução, receber créditos trabalhistas em ação contra a Contractors Peopleware and Technology Serviços de Teleatendimento Ltda. De acordo com o colegiado, o não pagamento da condenação é suficientemente grave para autorizar o uso do mecanismo, que permite procurar a existência de patrimônio oculto dos devedores.

Simba
O Sistema Simba e o outros mecanismos semelhantes, como o Sistema Comprot, da Receita Federal, e a Rede Lab-LD, voltado para a lavagem de dinheiro, são utilizados pela Justiça do Trabalho, mediante convênios específicos, para acessar bancos de dados e ferramentas eletrônicas variadas, com o objetivo de localizar bens de devedores e obter as informações necessárias a uma execução efetiva. No caso do Simba, ele permite acessar informações financeiras além das compreendidas pelo sistema Bacen-Jud, que trata da localização e do bloqueio de valores em contas bancárias.

Movimentação
Após ganhar a reclamação trabalhista, a operadora pediu a realização de pesquisas por meio do Simba, com o argumento de que o processo tramita há mais de 10 anos e que diligências realizadas por outros meio, como o Bacen-Jud e o RenaJud, não tiveram sucesso. Segundo ela, com o Simba, seria possível consultar a movimentação de dados bancários da empresa e seus sócios e verificar eventuais transferências de recursos a terceiros.

Medida excepcional
O pedido foi indeferido tanto pelo primeiro grau quanto pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), que a utilização do sistema implicaria a quebra do sigilo bancário dos executados, medida excepcional que somente seria autorizada se houvesse indícios da ocorrência de ilícitos. Para o TRT, o não pagamento dos valores devidos não se enquadraria entre os ilícitos previstos na Lei Complementar 105/2001, que trata do sigilo das operações das instituições financeiras.

Ilícito trabalhista
O relator do recurso de revista da empregada, ministro José Roberto Pimenta, assinalou que o fundamento do TRT está em descompasso com a postura do TST e de sua Comissão Nacional de Efetividade da Execução Trabalhista, que utiliza e preconiza o uso intenso desse mecanismo e de vários outros. “Todo o desgaste e o esforço das partes e do aparato jurisdicional caem por terra se a sentença se transforma apenas em um pedaço de papel, sem resultados práticos”, afirmou.

Para o relator, a Lei Complementar 105/2001, ao prever a necessidade da existência de indícios da prática de ilícitos pelo alvo da investigação que determina o levantamento do sigilo bancário, está se referindo aos ilícitos em geral, e não apenas aos criminais. “No caso, o ilícito que autoriza a utilização desses mecanismos tecnológicos extremamente eficazes e avançados é um ilícito trabalhista, caracterizado pelo não pagamento de um débito de natureza alimentar ao titular desse direito”, explicou.

Acesso à Justiça
Na avaliação do ministro, a negativa do TRT de autorizar a utilização do sistema viola direta e frontalmente os dispositivos da Constituição da República (artigo 5º, incisos XXXV e LXXVIII) que asseguram o acesso à justiça e a razoável duração do processo. “Não há injustiça maior do que ganhar um processo com decisão transitada em julgado e não conseguir o resultado prático, palpável, econômico de direitos que têm expressão financeira”, concluiu.

Com a decisão, unânime, o processo deverá retornar ao primeiro grau para que seja dado prosseguimento à execução.

Veja o acórdão.
Processo n° RR-484-34.2010.5.02.0050

TJ/SP: Alegação de incapacidade técnica de cooperativa não impede ingresso de agricultor

Cooperativas devem seguir princípio da livre adesão.


A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo reformou decisão de 1º grau e determinou que cooperativa da Comarca de Capão Bonito inscreva agricultor em seu quadro de cooperados. De acordo com o colegiado, a alegação de ausência de capacidade técnica por parte da cooperativa em receber mais um cooperado contraria princípios que regem esses tipos de sociedade.

O autor da ação, agricultor há mais de cinco anos, possui maquinário próprio para lavoura e desde o início de suas operações utiliza os serviços da requerida em sua atividade rural, mas não como cooperado. Em 2018, solicitou seu ingresso no quadro da apelada, mas foi recusado, já que a cooperativa alega que não possui capacidade técnica para atender agricultor.

Segundo o relator da apelação, desembargador Alexandre Lazzarini, as cooperativas são regidas pelo princípio da adesão livre. Assim, é livre o ingresso nas cooperativas a todos que desejarem utilizar os serviços prestados pela sociedade, que somente pode ser negado em caso de impossibilidade técnica do pretendente, e não da cooperativa. “No caso, nada demonstrou a apelada contrariamente à capacidade técnica do autor/apelante, sendo que o autor, por outro lado, demonstrou estar, a princípio, apto ao ingresso, como agricultor e produtor de soja”, escreveu o magistrado. O relator destacou também que elementos dos autos demonstram que a cooperativa vem encontrando formas de realizar os seus objetivos junto aos cooperados, contrariando as alegadas limitações de capacidade de beneficiamento e armazenagem de grãos.

O julgamento, de votação unânime, teve a participação dos desembargadores Azuma Nishi e Fortes Barbosa.

Processo nº 1003153-19.2018.8.26.0123

STJ: Tomada de empréstimo sem garantia para cumprir requisito do direito de preferência não configura abuso

​A origem do dinheiro utilizado para a realização do depósito de valor idêntico ao preço pago por estranho na aquisição de bem em condomínio não tem relevância para o exercício do direito de preferência previsto no artigo 504 do Código Civil. Assim, a tomada de empréstimo para fazer o depósito, por exemplo, não configura abuso no direito de preferência, ainda que a operação seja realizada sem a oferta de garantia.

O entendimento foi estabelecido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que entendeu ter havido abuso no direito de preferência porque a autora do pedido, sem patrimônio para fazer frente à aquisição do bem, pegou empréstimo sem a prestação de garantia.

Na ação que deu origem ao recurso, a mulher – que morreu no curso do processo, sendo substituída pelo espólio – alegou que teve união estável reconhecida judicialmente com um homem já falecido e que os herdeiros venderam um imóvel da herança sem que fosse respeitado o seu direito de preferência.

Ela pediu a declaração de ineficácia da venda e a adjudicação do imóvel mediante o exercício do direito de preferência, com base em depósito apresentado nos autos. O pedido foi acolhido em primeiro grau, mas o TJSP reformou a sentença por concluir que houve simulação no exercício do direito de preferência.

Requisitos do direito de preferência são taxativos
A ministra Nancy Andrighi explicou que o artigo 504 do CC enumera taxativamente os requisitos que devem ser observados para o exercício do direito de preferência: indivisibilidade do bem; ausência de prévia ciência, pelo condômino preterido, sobre a venda a estranho; depósito do preço, que deve ser idêntico àquele pago pelo estranho; observância do prazo decadencial de 180 dias.

Embora a origem dos recursos empregados no depósito não seja um requisito previsto em lei, ressaltou a relatora, o TJSP concluiu que o fato de a mulher não ter demonstrado possuir renda ou patrimônio para adquirir o bem ou mesmo para pagar o empréstimo comprovaria a simulação.

“Tais fundamentos, contudo, não são suficientes para, por si sós, tolher o exercício do direito de preferência da recorrente, que prestou observância aos requisitos exigidos pelo artigo 504 do CC. Ademais, a comprovação de renda ou a prestação de garantia pelo mutuário integram a esfera de faculdade do mutuante ao contratar”, esclareceu a ministra.

Meras suspeitas de simulação
Em seu voto, Nancy Andrighi reconheceu a gravidade da prática da simulação – com repercussão social equiparável à fraude contra credores – e as dificuldades na apuração desse tipo de vício no negócio jurídico. Entretanto, apontou que não seria possível admitir conclusão nesse sentido em razão de meras suspeitas levantadas pela parte contrária.

De acordo com a relatora, quem teve comportamento “duvidoso” no caso foram os herdeiros, que, “cientes da reconhecida condição de coproprietária da autora falecida e descumprindo a ordem judicial emanada do protesto contra a alienação de bens, alienaram a totalidade da coisa comum, sem respeitar o seu direito de preferência”.

TRT/SP: Tomadora de serviços tem responsabilidade subsidiária sobre dispensa discriminatória

A Lei da Terceirização (13.429/2017) reforçou o raciocínio segundo o qual a tomadora de serviços (contratante) responde de forma subsidiária pelos eventuais débitos da contratada. Com esse entendimento, a 57ª Vara do Trabalho do TRT da 2ª Região manteve o Sebrae no polo passivo de uma ação para responder subsidiariamente pelos créditos trabalhistas.

A sentença, prolatada pela juíza Luciana Bezerra de Oliveira, diz respeito a um caso de dispensa discriminatória de um trabalhador com câncer, doença considerada estigmatizante. A decisão condenou uma empresa de terceirização de serviços, que alocava o empregado no Sebrae, ao pagamento em dobro de verbas que seriam devidas desde a data de dispensa até a data de ajuizamento da ação, além de indenização por danos morais no valor de R$ 20 mil.

De acordo com os autos do processo, o próprio Sebrae tornou incontroversa a prestação de serviços no período indicado pelo reclamante por meio de documentos. Além disso, as provas testemunhais comprovaram que o profissional esteve a serviço da entidade durante todo o curso do contrato.

Assim, o contratante arcará com todas as condenações em caso de inadimplemento por parte da empresa interposta, “não havendo qualquer fundamento jurídico ou legal para a exclusão dessas verbas”, conforme ressaltou a juíza titular da 57ª Vara.

Por medida de celeridade e economia, o Sebrae poderá indicar, em liquidação de sentença, bens da empresa de prestação de serviços que poderiam dar efetividade ao pagamento do crédito reconhecido, caso os meios ao alcance da vara não sejam suficientes para tal. Esgotada essa oportunidade, o Sebrae responde pela execução.

Processo nº 1001169-51.2020.5.02.0057

TJ/SP: Lei que concede isenção no transporte a passageiros com obesidade mórbida é inconstitucional

Processo legislativo ofendeu princípio da separação dos poderes.


O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo declarou, por votação unânime, a inconstitucionalidade da Lei nº 5.104/20, de Guaratinguetá, que concedeu isenção no transporte público local aos portadores de obesidade mórbida tipo III.

A ação foi proposta pelo Sindicato das Empresas de Transporte Urbano de Passageiros do Interior do Estado de São Paulo. De acordo com o relator da ação, desembargador Costabile e Solimene, ao dispor sobre regras referentes ao transporte coletivo do município, a lei, proposta na Câmara Municipal, invadiu a competência privativa do Chefe do Executivo, uma vez que a disciplina dos transportes públicos municipais se situa na reserva da administração. “A fixação de preço público (tarifa) de serviço público é ato da competência privativa do Poder Executivo, prevista nos artigos 120 e 159, parágrafo único, da Carta Estadual. Por conta disso é patente a incompatibilidade das benesses com o princípio da separação de poderes. A inclusão de isenção no curso de contrato administrativo de concessão dos transportes públicos importa violação ao artigo 117 da Constituição Estadual, repito, exatamente porque não estariam resguardadas as condições efetivas da proposta do edital de licitação, base da definição da equação econômico-financeira do contrato”, escreveu.

Segundo o magistrado, a sanção do prefeito não basta para resolver a infração à separação dos Poderes. “O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, que resulte da usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado”, afirmou.

O relator ressaltou que foi analisada a inadequação do processo legislativo que deu origem à lei, não seu conteúdo. “Sendo interesse do Prefeito, ele próprio poderá, no momento que entenda oportuno e conveniente, e uma vez respeitados os ditames do contrato administrativo que regula a concessão/permissão, criar o mesmo benefício imune de vícios legais.”

Processo nº 2277327-08.2020.8.26.0000

TJ/SP: Rede social não indenizará por apagar posts com desinformação sobre a Covid-19

Conteúdo violou regras da comunidade.


A 11ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo negou pedido de indenização por danos morais de usuária que teve post em rede social apagado por violar os padrões da comunidade ao propagar desinformação em relação à pandemia da Covid-19.

Consta nos autos que a autora da ação publicou supostos estudos sobre a eficácia de fármaco no tratamento da Covid-19. Os posts foram deletados por contrariam as regras da rede social sobre desinformação que pode causar dano físico.

Em sua decisão, o juiz Luiz Gustavo Esteves destacou que pesquisa junto à rede mundial de computadores verificou que a fonte dos estudos é duvidosa. “Não se tendo certeza científica da eficácia do tratamento em questão, pelo contrário, as informações dão conta da sua ineficácia”, complementou.

Sendo assim, o magistrado afirmou que a divulgação pretendida pela usuária realmente não se mostrava segura, ainda mais considerando-se o alcance da rede social. “Tratando-se de saúde pública, deve viger o princípio da precaução”, pontuou o juiz. “Em conclusão, agindo no exercício regular do seu direito, não há que se falar em indenização por danos morais na espécie.”

Cabe recurso da decisão.

Processo nº 1050851-85.2021.8.26.0100

STJ: Espólio de usufrutuária vitalícia tem legitimidade para propor ação de rescisão de arrendamento rural

Durante a vigência do contrato de arrendamento rural, a morte da arrendadora usufrutuária – causa de extinção do usufruto, nos termos do artigo 1.410, inciso I, do Código Civil –, sem que haja a restituição ou reivindicação de posse pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos sucessores da pessoa falecida. Essa condição, porém, não constitui impedimento para o exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento rural pelo espólio em relação ao terceiro arrendatário, pois as relações jurídicas do usufruto e do arrendamento são diferentes e autônomas.

O entendimento foi estabelecido pelo Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que reconheceu a legitimidade do espólio para propor ação de despejo cumulada com cobrança e rescisão contratual, buscando a extinção de contrato de arrendamento rural, a reintegração da posse do imóvel e o pagamento de dívidas em aberto.

O contrato foi celebrado pela falecida arrendadora (que tinha usufruto vitalício do imóvel) e o arrendatário (também falecido) – que, posteriormente subarrendou a propriedade.

Os pedidos foram julgados procedentes em primeira instância; em segundo grau, o TJSP apenas ajustou os critérios da condenação mantendo a legitimidade do espólio para ajuizar a ação.

Dívidas posteriores à morte
Em recurso especial, o recorrente alegou que o espólio não teria legitimidade ativa, pois a posse da autora da herança sobre o imóvel objeto do arrendamento seria oriunda de usufruto, o qual se extinguiu com a sua morte.

Sustentou, também, que o falecimento da usufrutuária ocorreu em 2004 e as alegadas dívidas em aberto do arrendamento rural seriam do período ente 2009 e 2014, quando já havia sido extinto o direito real de usufruto que legitimava a posse da arrendadora.

Usufruto como direito real
O ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do recurso, explicou que o usufruto consiste em uma espécie de direito real (artigo 1.225, inciso IV, do Código Civil) que pode recair sobre um ou mais bens, móveis ou imóveis, conferindo, temporariamente, a alguém – denominado usufrutuário –, o direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos.

Tratando-se de bem imóvel, o relator apontou que o registro em cartório é pressuposto necessário do direito real de usufruto – tanto no caso de sua constituição quanto na hipótese de sua desconstituição –, a partir do qual passará a produzir os efeitos legais, especialmente em relação a terceiros.

Por outro lado, o ministro Bellizze destacou que, no caso de morte da usufrutuária, surge causa extintiva do usufruto (artigo 1.410, inciso I, do CC/2002), o qual, diante do seu caráter personalíssimo, não se transmite aos herdeiros, de forma que é descabido no ordenamento jurídico brasileiro o caráter sucessivo desse direito real.

Arrendamento não se integra ao usufruto
Entretanto, Bellizze afirmou que, por causa do efeito constitutivo do registro no cartório imobiliário, o falecimento do usufrutuário não opera efeitos automaticamente, de maneira que, mesmo que seja descabida a sucessão do usufruto, as implicações do instituto permanecerão enquanto não for cancelado o registro e retomado o pleno domínio do bem pelo proprietário.

Além disso, o ministro apontou que a cessão do exercício do usufruto ao terceiro arrendatário, mediante contrato de arrendamento, não possui o poder de integrá-lo à relação jurídica do usufruto em si, principalmente pela vedação expressa de alienação desse direito real (artigo 1.393 do CC/2002).

No caso dos autos, o ministro lembrou, ainda, que a averbação do cancelamento do usufruto na matrícula do imóvel foi realizada em 2016, ou seja, após ao período de cobrança levantado pelo espólio e do ajuizamento da ação, em 2015 – situação que mantém o interesse do espólio na ação.

De possuidor direito a indireto
Em seu voto, Bellizze reforçou que, efetivado o usufruto, ocorre o desdobramento da posse, passando o proprietário à condição apenas de possuidor indireto, e o usufrutuário à posição de possuidor direto. Já no caso de cessão do exercício do usufruto a terceiro, mediante contrato de arrendamento, há o desdobramento sucessivo da posse, tornando-se possuidores indiretos o proprietário e o usufrutuário/arrendador, e direto o arrendatário.

“Sobrevindo a morte do usufrutuário (que é causa de extinção desse direito real), a posse, enquanto não devolvida ou reivindicada pelo proprietário, transmite-se aos sucessores daquele, mas com o caráter de injusta, dada a sua precariedade, excepcionando a regra do artigo 1.206 do CC. Com isso, o possuidor não perde tal condição em decorrência da mácula que eventualmente recaia sobre sua posse”, disse o ministro.

Ao manter o acórdão do TJSP, o relator ainda ressaltou a natureza jurídica do espólio como uma universalidade de direito que, nos termos do artigo 91 do Código Civil, é caracterizado como o complexo de relações jurídicas de uma pessoa, dotadas de valor econômico, motivo pelo qual a relação jurídica de direito pessoal decorrente do contrato de arrendamento integra o espólio da arrendadora / usufrutuária.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.758.946 – SP (2018/0058107-5)

STJ: Pela natureza executória, cabe à Justiça apreciar ação de despejo mesmo quando há compromisso arbitral

​Por unanimidade, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, em razão de sua natureza executória, é da competência do juízo estatal a ação de despejo por falta de pagamento, mesmo quando existir compromisso arbitral firmado entre as partes.

Na controvérsia analisada pelo colegiado, um shopping center ajuizou ação de despejo por falta de pagamento contra uma empresa locatária. Além de parar de pagar, a empresa teria abandonado o imóvel locado em 17 de junho de 2010, acumulando-se uma dívida de R$ 182 mil.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) confirmou a sentença que declarou o contrato de locação rescindido. A corte estadual afastou a competência do juízo arbitral sob o fundamento de que, por estar resolvido o contrato de pleno direito, em razão do abandono do imóvel, teria sido superada a necessidade de apresentação do objeto do litígio ao árbitro, estando exaurido o seu conteúdo.

Ao STJ, a locatária sustentou que as partes celebraram expressamente o compromisso de submeter ao juízo arbitral todos os litígios decorrentes do contrato, renunciando ao direito de recorrer ao Poder Judiciário.

Cláusula arbitral tem força vinculante
O ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso, explicou que a jurisprudência do STJ é uníssona no sentido de que, por acordo de vontades, as partes podem subtrair do Judiciário a solução de determinadas questões, submetendo-as aos árbitros (REsp 1.331.100).

O magistrado destacou que, na hipótese analisada, a controvérsia surgiu exatamente pela previsão, no contrato, de cláusula estabelecendo que a solução das demandas ocorreria na instância arbitral, regida pela Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996).

Para Salomão, a cláusula arbitral, uma vez contratada pelas partes, goza de força vinculante e caráter obrigatório, definindo a competência do juízo arbitral eleito para dirimir os litígios relativos aos direitos patrimoniais sobre os quais os litigantes possam dispor – o que revoga a jurisdição estatal.

Árbitro não tem poder coercitivo direto
Todavia, ressalvou o ministro, embora a convenção arbitral exclua a apreciação do Judiciário, tal restrição não se aplica aos processos de execução forçada, pois os árbitros não têm poder para a prática de atos executivos – como afirmam vários precedentes do tribunal.

“Especificamente em relação ao contrato de locação e à sua execução, a Quarta Turma do STJ decidiu que, no âmbito do processo executivo, a convenção arbitral não exclui a apreciação do magistrado togado, já que os árbitros não são investidos do poder de império estatal para a prática de atos executivos, não tendo poder coercitivo direto”, destacou o relator.

Ação de despejo
No caso julgado, segundo Salomão, não se tratou propriamente de execução de contrato de locação, mas de ação de despejo por falta de pagamento e imissão na posse em razão do abandono do imóvel. Mesmo assim, ressaltou, não é possível designar a competência ao juízo arbitral.

Despejo é ação executiva lato sensu
“A ação de despejo tem o objetivo de rescindir a locação, com a consequente devolução do imóvel ao locador ou proprietário, sendo enquadrada como ação executiva lato sensu, à semelhança das possessórias”, observou o magistrado.

“Diante da sua peculiaridade procedimental e sua natureza executiva ínsita, com provimento em que se defere a restituição do imóvel, o desalojamento do ocupante e a imissão na posse do locador, não parece adequada a jurisdição arbitral para decidir a ação de despejo”, acrescentou.

Assim, o relator negou provimento ao recurso especial – por fundamento diverso do adotado pelo acórdão do TJSP – e reconheceu a competência exclusiva do juízo togado para apreciar a ação de despejo, “haja vista a natureza executória da pretensão”.​

TRT/SP mantém prescrição de ação baseada em risco potencial de exposição à poeira do amianto

A 17ª Turma do Tribunal do Trabalho da 2ª Região (TRT-2) manteve sentença de 1º grau que havia decidido pela prescrição total dos pedidos de assistência médica integral, danos morais, existenciais e materiais, pleiteados em ação civil pública por entidades que representam os ex- trabalhadores expostos à poeira de amianto na antiga fábrica Brasilit S/A. A prescrição é a perda da exigibilidade do direito pelo decurso do tempo e decorre do princípio da segurança jurídica, que confere estabilidade às relações jurídicas.

Os pedidos do autores da ação, Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário (Solidariedade) e Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), tinham como premissa um dano potencial “…decorrente da mera exposição ao amianto, inclusive de familiares de ex-empregados, ainda que não estivessem acometidos com doenças passíveis de associação com a exposição ocupacional ao amianto”.

Em seu voto, a desembargadora-relatora Maria de Lourdes explicou que, desde 2007, quando foi publicado o Decreto 6.042/2007, que alterou o Regulamento da Previdência Social, foi dada publicidade oficial acerca de todos os riscos oriundos do amianto. Mas no Brasil, “pode-se dizer com segurança que, desde a Portaria nº 1.339/1999, de 18 de novembro de 1999, do Ministério da Saúde foi dado reconhecimento oficial e geral à relação de causalidade entre a exposição ao asbesto ou amianto e a potencial aquisição de diversas doenças”, explicou a desembargadora-relatora Maria de Lourdes Antonio em seu voto.

Em razão desses fatores, como a propositura da ação se deu em fevereiro de 2017, houve prescrição total do direito de ação. Como a fábrica da Brasilit estava fechada definitivamente desde 1990 e “a causa de pedir da presente Ação Civil Pública está baseada no risco potencial gerado pela exposição ao amianto no curso do contrato de trabalho e independe do fato de os ex-trabalhadores já estarem, ou não, acometidos com doenças passíveis de associação com a exposição ocupacional ao amianto”, não se poderia afastar o cômputo da prescrição desde a divulgação do Decreto 6.042/2007.

Entenda o caso

O Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário (Solidariedade) e a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea) ingressaram, em 2017, com ação civil pública com o objetivo de condenar a reclamada Saint-Gobain do Brasil Produtos Industriais e para Construção Ltda (sucessora da Brasilit S/A) à implementação de assistência médica integral aos ex-trabalhadores e familiares expostos ao amianto.

A substância, altamente cancerígena, era oriunda do processo produtivo realizado pela fábrica Brasilit, que funcionou no município de São Caetano do Sul entre os anos de 1937 e 1990. Os reclamantes também pediram o ressarcimento de danos morais, existenciais e materiais experimentados individualmente por cada ex-trabalhador ou familiar de ex-trabalhador da empresa que tenha sido exposto ou tenha adoecido em decorrência do contato com a poeira de amianto.

Processo n° 1002144-94.2017.5.02.0472.


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