TST: Cabe à justiça do trabalho julgar ação contra cobrança de taxa de inscrição por agência de emprego

Para a 3ª Turma, a matéria diz respeito à fase pré-contratual da relação de emprego.

Resumo:

  • A Justiça do Trabalho tem competência para julgar uma ação do Ministério Público do Trabalho contra uma agência de emprego que cobrava taxa dos candidatos a uma vaga.
    Anteriormente, o TRT-4 havia entendido que a relação entre a agência e os clientes era comercial e de consumo.
  • Mas, para a 3ª Turma do TST, a questão diz respeito à fase pré-contratual da relação de trabalho e tem impacto direto nas condições de acesso ao emprego.

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou a competência da Justiça do Trabalho para julgar uma ação contra a cobrança de taxa de inscrição para candidatos às vagas de trabalho por uma agência de empregos de Passo Fundo (RS). Segundo o colegiado, a forma de atuação das agências de emprego afeta diretamente as circunstâncias de exercício do direito ao trabalho e compreende a fase pré-contratual das relações trabalhistas.

Custo para encontrar vaga era repassado ao candidato
A ação foi ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra uma empresária individual, com nome fantasia de Realiza RH, que cobrava de candidatos a vagas de emprego taxas de inscrição para encaminhamento a entrevistas. Na avaliação do MPT, o custo de seleção de candidatos a vagas de trabalho deve ser suportado pelo empregador, por meio de agências de recrutamento, e não pelo trabalhador que busca colocação no mercado de trabalho.

Depois de tentar sem sucesso um termo de ajuste de conduta com a empresária, o MPT pediu na Justiça sua condenação ao pagamento de indenização de R$ 50 mil por danos morais coletivos.

Empresária sustentou que contrato era comercial
A empresária, em sua defesa, questionou a competência da Justiça do Trabalho para julgar a ação, por entender que se trata de relação comercial, e não de trabalho, e argumentou que seus clientes procuram seus serviços livremente. “Eles poderiam buscar o SINE, que presta serviços de forma gratuita”, argumentou a empresária, em referência ao Serviço Nacional de Emprego.

As taxas cobradas eram de R$ 95 na abertura do cadastro, mais 30% do primeiro salário, ou de R$ 170 na abertura do cadastro, que teria validade de seis meses. Segundo ela, os valores cobrados se referem ao ressarcimento dos custos pelo serviço prestado, ao qual os candidatos aderem “de livre e espontânea vontade”.

Para o TRT, trata-se de relação civil de natureza consumerista
A 4ª Vara do Trabalho de Passo Fundo acolheu os argumentos do MPT apenas na obrigação de não cobrar qualquer valor dos candidatos e de expor no site da empresa que a cobrança é indevida. A condenação por danos morais foi rejeitada.

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) declarou a incompetência da Justiça do Trabalho, por entender que se tratava de relação civil de natureza consumerista. “Não há controvérsia quanto ao fato de que os agenciados não exercem nenhuma atividade em prol da Realiza RH, mas apenas buscam os seus serviços de assessoramento”, diz a decisão.

Caso envolve fase pré-contratual das relações do trabalho
No TST, o entendimento foi outro. Segundo o relator, ministro Mauricio Godinho Delgado, a competência da Justiça do Trabalho se justifica porque a intermediação feita pela agência de emprego compreende a fase pré-processual das relações de trabalho. Nessa fase, ainda que não envolva, inicialmente, a figura do empregador, a agência figura como condição do êxito do trabalhador em conseguir uma vaga de emprego e tem impacto significativo no mercado de trabalho local.

De acordo com o ministro, o oferecimento do trabalhador para vagas de emprego é considerada uma prática sensível para a Organização Internacional do Trabalho (OIT), que define que “o trabalho não é uma mercadoria”.

Com a decisão, o processo voltará ao TRT para julgamento do recurso interposto pelo MPT.

Veja o acórdão.
Processo: RR-20202-46.2019.5.04.0664

TRT/RS: Empresa deve indenizar estoquista despedido após retirada de tumor cerebral

A 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) considerou discriminatória a despedida de um trabalhador diagnosticado com tumor cerebral. Ele foi dispensado assim que retornou ao trabalho depois de um período de afastamento para realização de cirurgia de retirada do tumor.

O colegiado determinou o pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10 mil. O pedido de reintegração ao emprego não foi concedido, uma vez que ele já havia conseguido emprego como assistente administrativo em outra empresa. Indenização por danos materiais também foi negada, pois não ficou comprovado o nexo causal entre a doença e o trabalho desempenhado.

O que diz o trabalhador

O trabalhador, que atuou como estoquista em uma agroindústria entre 2019 e 2022, afirma que foi exposto diariamente a produtos químicos perigosos, como hipoclorito de sódio e formol, sem receber equipamentos de proteção individual (EPIs) adequados. Ele relata que também carregava manualmente grandes quantidades de substâncias pesadas, o que agravou sua saúde. Em 2021, foi diagnosticado com um tumor cerebral, que atribui à exposição química no trabalho. Após cirurgia e afastamento pelo INSS, retornou ao trabalho em 2022, mas foi despedido.

O que diz a empresa

A agroindústria nega que o trabalhador tivesse contato direto com produtos químicos, afirmando que ele realizava tarefas administrativas no almoxarifado e que eventuais substâncias no local estavam devidamente lacradas. A empresa rejeita a alegação de que a doença tenha sido causada pelo trabalho, argumentando que o tumor pode ter causas diversas, inclusive hereditárias, e que o afastamento pelo INSS foi por auxílio-doença comum, não ocupacional. Além disso, afirma seguir todas as normas de segurança e fornecer EPIs necessários, o que, segundo a empresa, a isenta de responsabilidade.

Sentença

O juízo da Vara do Trabalho de Montenegro entendeu que não há nexo causal entre as atividades realizadas pelo trabalhador na agroindústria e o tumor cerebral diagnosticado. Com base no laudo pericial, sustenta que os produtos químicos aos quais ele teria sido exposto não estão diretamente associados ao tipo de tumor apresentado, além de não haver prova de exposição direta ou intoxicação no local de trabalho. O juízo considerou a dispensa válida, indeferindo os pedidos de reintegração, indenização por danos morais e materiais, e estabilidade provisória.

Acórdão

O trabalhador ingressou com recurso no TRT-RS. A 7ª Turma reconheceu o caráter discriminatório da despedida. “A doença que acometeu o reclamante, portanto, envolve gravidade no seu tratamento e possíveis repercussões, o que torna presumível que, à vista do seu empregador, ele passou a sofrer o estigma da fragilidade, da falta de saúde, da possibilidade de novo afastamento do emprego por recidiva. Ou seja, é presumível a intenção do empregador de desfazer-se de um ‘empregado problema’, diminuído por ter enfrentado grave problema de saúde. E esta presunção não foi afastada por qualquer outro elemento, aliás, nem sequer invocado”, destacou o relator do acórdão, juiz convocado Marcelo Papaléo de Souza.

Assim, a 7ª Turma condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil. “Essa indenização, que possui natureza predominantemente ressarcitória, não pode servir como artifício para alçar o autor, em nome de sua dor, à situação econômica privilegiada em relação àquela preexistente ao ato ilícito do ofensor. O valor da indenização deve ser suficiente para permitir que o ofendido possa amenizar sua dor e para que se habilite a enfrentar com dignidade o seu convívio sociofamiliar, jamais servindo como meio de obtenção de enriquecimento sem causa”, explicou o magistrado.

Também participaram do julgamento os desembargadores Emílio Papaléo Zin e Wilson Carvalho Dias.

A empresa ingressou com recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho.

TRT/RS: Empresa que não afastou motorista integrante do grupo de risco para covid-19 deve indenizar viúva e filho

Resumo:

  • Empresa foi condenada a pagar indenização por danos materiais e morais à família de motorista de micro-ônibus falecido durante a pandemia.
  • Mesmo pertencendo a grupo de risco por obesidade grau III, ele não foi afastado das atividades de maior potencial de contágio.
  • A prova indicou que houve a responsabilidade civil da transportadora, uma vez que as medidas preventivas não foram adotadas de modo satisfatório.

A 6ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) condenou uma empresa de transporte a indenizar os familiares de um motorista falecido em razão da covid-19. Em decisão unânime, os desembargadores reformaram a sentença da 6ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul.

Esposa e filho do trabalhador devem receber R$ 50 mil a título de reparação por danos morais, para cada um. A esposa ainda deverá ser indenizada por danos materiais, em uma única parcela, em valor equivalente a dois terços da remuneração do empregado até que ele atingisse os 76 anos de idade.

O motorista dirigia ônibus que transportavam trabalhadores de uma empresa e de um hospital de Flores da Cunha. Na perícia judicial, o perito afirmou que o homem pertencia ao grupo de risco para a doença em razão de obesidade grau III.

Testemunhas confirmaram que o transporte era feito em micro-ônibus com cabine sem refrigeração e com ventilação natural. A partir dos depoimentos e do laudo pericial, foi comprovado que as medidas de segurança não foram atendidas de modo suficiente.

As máscaras, cujo tipo fornecido não foi sequer identificado, e orientações de segurança foram dadas aos empregados apenas até maio de 2020, primeiro ano da pandemia. A sanitização do veículo tampouco era feita diariamente. De acordo com o perito, as medidas de segurança comprovadas no processo “deixaram a desejar”.

Entre outros argumentos, a empregadora alegou que o contágio não aconteceu em função do trabalho. Em primeiro grau, o magistrado julgou o pedido improcedente, acolhendo a tese de defesa.

Diferentes matérias foram objeto de recurso ao Tribunal por ambas as partes. A partir das provas, a relatora do acórdão, desembargadora Maria Cristina Schaan Ferreira, considerou que a conduta da reclamada “potencializou enormemente o risco de o empregado ser contaminado pelo vírus”.

“A negligência da empresa é inegável e configura ilícito capaz de lhe impor o dever de indenização aos autores. Embora jamais se saiba com certeza absoluta a exata fonte de contágio do autor, certo é que a reclamada deve responder proporcionalmente ao imenso perigo a que sujeitou o trabalhador”, afirmou.

A magistrada ainda ressaltou o fato de que no período de contágio e morte do motorista, março de 2021, todo o estado estava em “bandeira preta”, classificação que indicava a maior gravidade no risco de contágio.

Além disso, mencionou trecho do laudo pericial que informou que desde abril do ano anterior a Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul havia publicado a recomendação para que os integrantes de grupos de risco fossem deslocados para atividades com menor probabilidade de contágio ou teletrabalho.

“A empresa não colocou adequadamente em prática todas as medidas de segurança imprescindíveis para reduzir os riscos de contágio”, concluiu.

Também participaram do julgamento os desembargadores Simone Maria Nunes e Fernando Luiz de Moura Cassal. Cabe recurso da decisão.

TRT/RS: Vendedor de consórcios tem vínculo de emprego reconhecido após ser obrigado a prestar serviços como PJ

Resumo:

  • 4ª Turma reconheceu o vínculo de emprego durante período de oito anos em que um vendedor de consórcios prestou serviços à antiga empregadora por meio de contratos comerciais.
  • Além do vínculo, foi reconhecida a unicidade contratual pelo período de 12 anos.
  • Foi comprovada a prática da pejotização, em evidente fraude à legislação trabalhista, conforme artigo 9º da CLT.

Ideia de venda de consórcios: homem aponta ícones de casa e de carro.Por maioria de votos, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reconheceu o vínculo de emprego e a unicidade contratual pleiteada por um vendedor de consórcios com a empresa na qual trabalhou por 12 anos. A decisão reformou sentença da 10ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

Após trabalhar como empregado entre 2008 e 2012, o vendedor constituiu pessoa jurídica com idêntica finalidade da empresa anterior. Segundo ele, a determinação para abertura da empresa partiu da empregadora. Durante oito anos, os serviços foram prestados à antiga empregadora por meio de contrato comercial.

Ao responder a ação na qual o trabalhador buscou o reconhecimento do vínculo, a empresa alegou que não havia subordinação, interferência ou fiscalização das atividades do vendedor. A presença concomitante da pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação é necessária para o reconhecimento do vínculo.

Uma testemunha confirmou que foi obrigada a trabalhar da mesma forma que o autor da ação e que todos os demais vendedores tiveram que constituir pessoa jurídica. Outros depoentes afirmaram não ser subordinados e não ter contratos de exclusividade com a empresa de consórcios.

No primeiro grau, não foi reconhecido o vínculo de emprego. A juíza entendeu que o trabalhador tinha autonomia para realizar suas atividades e que as testemunhas divergiram quanto às cobranças de metas. O vendedor recorreu ao TRT-RS.

O relator do acórdão, desembargador André Reverbel Fernandes, ressaltou que, admitida a prestação de serviços pela seguradora, a existência da relação de emprego é presumida. No caso, é ônus processual da empresa demonstrar que a prestação do trabalho não teve as características do vínculo empregatício, nos termos dos artigos 373, inciso II, do CPC e 818 da CLT.

“A reclamada não se desincumbe de seu ônus processual, restando comprovados os elementos caracterizadores do vínculo de emprego com o reclamante em período posterior ao anotado na CTPS do trabalhador, nos termos dos arts. 2º e 3º da CLT”, afirmou.

O relator ainda relembrou que vige no Direito do Trabalho o princípio da continuidade da relação de emprego, cabendo à empresa a prova de que a relação com a reclamante perdeu o caráter empregatício após a sua despedida formal.

“Nesse sentido é o entendimento esposado na Súmula n° 212 do TST: o ônus de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado”, salientou o desembargador André.

Para o magistrado, ficou evidenciada a chamada “pejotização”. Houve, conforme o relator, fraude à legislação trabalhista, nos termos do art. 9º da CLT. Mesmo com a continuidade da relação de emprego nos moldes anteriores, o empregado foi despedido e tentou-se encobrir a prática pela constituição de pessoa jurídica.

Também participaram do julgamento o desembargador João Paulo Lucena e o juiz convocado Roberto Antônio Carvalho Zonta. Não havendo a reforma da decisão, o processo deve voltar ao primeiro grau para julgamento dos pedidos decorrentes do reconhecimento do vínculo.

TJ/RS: Venda de Smartphone ou Smartwatch sem adaptador de tomada não constitui venda casada nem prática abusiva

A Turma de Uniformização Cível do TJRS decidiu, por maioria, que a venda de aparelho de celular (Smartphone) ou Smartwatch sem adaptador de tomada para carregamento da bateria não constitui venda casada nem prática abusiva. Atualmente, apenas o cabo de energia acompanha os produtos. A decisão transitou em julgado na segunda-feira (18/11), não cabendo mais recurso.

O incidente de uniformização para pacificação do entendimento sobre o tema foi admitido pelo Presidente da Turma de Uniformização Cível, Desembargador Jose Vinicius Andrade Jappur, a partir de pedido da 3ª Turma Recursal Cível que suspendeu o julgamento de um recurso inominado interposto pela Apple Computer Brasil LTDA contra sentença do Juizado Especial Cível (JEC) da Comarca de Sarandi. A decisão atacada havia condenado a empresa a fornecer, sem qualquer custo extra, dois carregadores compatíveis com os aparelhos adquiridos por um consumidor que entrou com ação judicial no JEC.

Segundo o relator do pedido de uniformização, Juiz de Direito Fábio Vieira Heerdt, o assunto estava dividindo as quatro turmas recusais do TJRS. Em seu voto, o magistrado pontuou que a nova política de venda adotada pela fornecedora em 2020 em todos os países – de entregar apenas o cabo de energia sem o adaptador de tomada – “não configura conduta ilícita ou ilegal que autoriza a intervenção do Estado, sob pena de violação aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, insculpidos no artigo 170 da Constituição Federal”.

O relator destaca ainda a ostensiva informação prestada pela fabricante sobre a ausência de adaptador de tomada junto à embalagem do telefone celular e a possibilidade do uso do fio com entrada USB-C com dispositivos de outras marcas ou em aparelhos eletrônicos como notebooks, em automóveis, carregadores por indução e tomadas com essa entrada. Na decisão, o Juiz Fabio afirma também que a empresa, por livre iniciativa, colocou o produto no mercado nessas condições e o consumidor, por livre autonomia de vontade, optou por pagar o preço cobrado, mesmo tendo a opção de não efetuar a compra.

Também participaram do julgamento o Juiz Roberto Behrensdorf Gomes da Silva e a Juíza Ana Cláudia Cachapuz Silva Raabe.

TRT/RS reconhece responsabilidade subsidiária da Ifood por verbas trabalhistas devidas a motoboy que lhe prestava serviços

Resumo:

  • O motoboy fazia entregas para restaurantes clientes do aplicativo Ifood, contratado por uma prestadora de serviços de entregas;
  • Os desembargadores entenderam que a relação entre a Ifood e a empregadora do motoboy configura uma terceirização;
  • De acordo com os magistrados, é aplicável o entendimento da Súmula 331, IV, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que prevê a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços quanto às obrigações trabalhistas não pagas pelo empregador.

Um entregador de moto veste capacete e carrega uma mochila térmica vermelha grande com a marca “iFood” em destaque. A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reconheceu a responsabilidade subsidiária da plataforma Ifood pelas verbas trabalhistas a serem pagas a um motoboy que realizava entregas para restaurantes clientes do aplicativo, contratado por uma prestadora de serviços de entregas.

Os desembargadores entenderam que a relação entre a Ifood e a empregadora do motoboy configura uma terceirização, sendo aplicável o entendimento da Súmula 331, IV, do Tribunal Superior do Trabalho (TST). A decisão unânime do colegiado manteve, no aspecto, a sentença da juíza Julieta Pinheiro Neta, da 25ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

A Ifood e a prestadora de entregas mantinham um contrato de intermediação de negócios, pelo qual o motoboy fazia entregas para o aplicativo. A relação de trabalho perdurou de abril de 2019 a outubro de 2022, sem ter sua carteira de trabalho assinada. O trabalhador obteve, no processo, o reconhecimento do vínculo de emprego com a prestadora de serviços.

Com base na prova produzida no processo, a decisão de primeiro grau concluiu que o contrato de intermediação de negócios equivale a um contrato de prestação de serviços. De acordo com a julgadora, a Ifood foi a verdadeira beneficiária dos serviços do trabalhador. Dessa forma, a magistrada entendeu que a responsabilidade da plataforma decorre da condição de tomadora dos serviços, na forma da Súmula nº 331, IV, do TST, ainda que de forma analógica.

Nessa linha, a juíza ressaltou que “fere a equidade transpor ao trabalhador o ônus da decisão do beneficiário de seu labor, de ajustar contrato de prestação de serviços, quando podia suprir a sua necessidade de mão de obra mediante a contratação direta de trabalhadores”.

A plataforma recorreu ao TRT-RS. O relator do caso na 4ª Turma, desembargador André Reverbel Fernandes, destacou que os serviços de entregas partem sempre do aplicativo da Ifood, gerando demandas que devem ser atendidas pelos empregados da empresa de entregas. Segundo ele, trata-se tipicamente de serviço de terceirização, no qual o tomador de serviços (Ifood) responde subsidiariamente pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas.

“Há uma relação jurídica estabelecida entre as empresas que tem por objeto a prestação de serviços de entregas em benefício do Ifood, a qual condiciona, no contrato de intermediação, vários requisitos a serem cumpridos, como a escala de trabalhadores e a prestação de serviços condizente com a atividade que está sendo exercida”, afirmou o magistrado. Segundo o julgador, a utilização da plataforma de aplicativos, que é a ferramenta de trabalho direta dos trabalhadores, é apenas a forma de intermediar a mão de obra, viabilizando a prestação de serviços contratada pela Ifood diretamente com a primeira reclamada, empregadora do motorista.

Com esse entendimento, a Turma manteve a sentença e negou o recurso da Ifood. Também participaram do julgamento a desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse e o desembargador João Paulo Lucena. A Ifood interpôs Recurso de Revista para o TST.

STJ: Pedido para alcançar patrimônio do sócio da falida tem natureza incidental, e recurso cabível é o agravo de instrumento

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o pedido para que o patrimônio pessoal do sócio seja alcançado na falência tem natureza processual de incidente, e não de ação autônoma; desse modo, o ato judicial de primeiro grau que soluciona a questão é uma decisão interlocutória, e o recurso cabível para impugná-lo é o agravo de instrumento.

Na origem, foi apresentado nos autos de uma ação de falência o pedido de extensão dos efeitos da quebra para a pessoa física do sócio. O juízo, ao julgar o pedido improcedente, tratou a pretensão como “ação de responsabilidade” e chamou o seu próprio pronunciamento de “sentença”. Já o tribunal de segundo grau não conheceu da apelação interposta por entender que se tratava de um incidente de desconsideração da personalidade jurídica e, assim, o recurso cabível contra a decisão seria o agravo de instrumento.

Para a corte local, o princípio da fungibilidade recursal (que permite à Justiça, em certos casos, receber um recurso errado como se fosse o correto) não seria aplicável no caso, porque teria havido erro grosseiro na interposição de apelação para impugnar uma decisão interlocutória.

Ação de responsabilização de sócio não se confunde com incidente de desconsideração
A relatora do recurso especial no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a ação de responsabilização de sócios é demanda autônoma que segue o disposto no artigo 82 da Lei 11.101/2005. Segundo ela, esse procedimento tem como objetivo ressarcir a sociedade falida em razão de prática dos próprios sócios ou administradores e é decidido por ato judicial que tem a natureza de sentença, sendo cabível o recurso de apelação.

A ministra enfatizou que a ação autônoma de responsabilização não deve ser confundida com o caso em análise, que trata, na verdade, de incidente de desconsideração da personalidade jurídica – instituto incluído na Lei de Falências em 2019, por meio do artigo 82-A, com o objetivo de responsabilizar pessoalmente o sócio pelas dívidas da falida.

A relatora lembrou que, quando o instituto da desconsideração ainda não havia sido integrado ao texto legislativo, o STJ já entendia que o patrimônio dos sócios poderia ser atingido, de forma incidental, nas hipóteses de fraude, abusos, desvios, entre outras, e em tais casos não era necessário o ajuizamento de ação autônoma, bastando um requerimento nos autos da falência.

De acordo com a ministra, tanto nos casos de desconsideração da personalidade jurídica quanto nos incidentes admitidos anteriormente pela jurisprudência do STJ, o recurso cabível é o agravo de instrumento, porque se trata de decisões interlocutórias, conforme o artigo 1.015, inciso IV, do Código de Processo Civil (CPC).

Imprecisão técnica justifica aplicação do princípio da fungibilidade
Ao determinar o processamento do recurso interposto em segunda instância, a ministra reconheceu que o comportamento do juízo ensejou dúvida objetiva quanto à natureza do ato judicial impugnado.

Segundo explicou, a imprecisão técnica do ato judicial – por exemplo, ao dizer que se tratava de uma “sentença” – afasta a configuração de erro grosseiro da parte recorrente e possibilita a aplicação do princípio da fungibilidade recursal para permitir a análise do recurso pelo tribunal de origem.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2135344

TRT/RS: Empresa deverá indenizar técnica de segurança assediada sexualmente por chefe

Resumo:

  • A trabalhadora afirmou que seu superior hierárquico tentou agarrá-la e beijá-la em uma festa da empresa, além de dirigir olhares para ela quando estava de costas, no trabalho;
  • A 5ª Turma do TRT-RS entendeu comprovado o assédio sexual e condenou a empregadora a pagar uma indenização de R$ 10 mil, por danos morais;
  • Também foi reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho.

A imagem mostra a mulher com as mãos na frente do corpo, com os punhos cerrados, sugerindo tensão ou desconforto.Uma técnica de segurança do trabalho, vítima de assédio sexual por parte de seu superior hierárquico, deve receber uma indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil. Além disso, foi reconhecida a rescisão indireta do contrato de trabalho, por falta grave da empregadora, o que garante o pagamento das verbas rescisórias.

A decisão foi proferida por unanimidade pela 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), que analisou o caso com uma perspectiva de gênero e confirmou o assédio.

A trabalhadora afirmou que, durante uma festa de fim de ano, o chefe tentou agarrá-la e beijá-la. Como prova, apresentou uma gravação telefônica na qual o supervisor minimiza o ocorrido, chamando-o de “brincadeira” e alegando que a empregada já havia lhe dito “besteiras” anteriormente.

O juiz Gustavo Jaques, da Vara do Trabalho de Estância Velha, reconheceu a dificuldade de comprovar assédios sexual e moral no ambiente de trabalho. “A prova nesses casos deve ser analisada com sensibilidade, considerando os indícios presentes e os princípios do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero”, afirmou o magistrado.

Com base na gravação, o juiz concluiu que o supervisor ultrapassou os limites de sua autoridade, ofendendo a honra e a dignidade da funcionária.

Ambas as partes recorreram ao TRT-RS. A desembargadora Rejane de Souza Pedra, relatora do caso na 5ª Turma, aplicou as diretrizes do Protocolo com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ressaltou que as atitudes do superior, como encará-la de forma invasiva enquanto estava de costas, contribuíram para a criação de um ambiente de trabalho hostil. Para a desembargadora, tais comportamentos causaram constrangimento e perturbação, o que configura o assédio.

A relatora destacou: “Nos casos de assédio sexual, não se trata de entender que a palavra da vítima sempre preponderará em relação aos demais elementos dos autos, mas de compreender que, diante de situações em que a discriminação está enraizada na estrutura da sociedade, como no caso de gênero, a percepção de testemunhas, por exemplo, pode significar a reprodução da naturalização de comportamentos que embora possam ainda ser socialmente admitidos, devem ser refutados pela Justiça do Trabalho”.

Diante dos fatos, a 5ª Turma manteve a decisão de primeira instância, incluindo o valor da indenização por danos morais.

Também participaram do julgamento a desembargadora Ângela Rosi Almeida Chapper e o desembargador Cláudio Antônio Cassou Barbosa. As partes recorreram do acórdão para o Tribunal Superior do Trabalho (TST).

TRT/RS: Trabalhador em contato intermitente com rede de esgoto tem direito a adicional de insalubridade em grau máximo

Resumo:

  • Um agente de serviços operacionais da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) ganhou o direito de receber adicional de insalubridade em grau máximo;
  • Ele trabalha com manutenção e conserto de redes de água e tem contato intermitente, ou seja, intervalado, com redes de esgoto, devido ao rompimento de redes cloacais;
  • O trabalhador deverá receber adicional de insalubridade em grau máximo, no percentual de 40%, em parcelas vencidas e vincendas, ou seja, até a incorporação em folha de pagamento, com reflexos;
  • A decisão unânime da 3ª Turma do TRT-RS manteve a sentença do juiz Edenir Barbosa Domingos, da Vara do Trabalho de São Jerônimo.

Um agente de serviços operacionais da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) ganhou o direito de receber adicional de insalubridade em grau máximo. Ele trabalha com manutenção e conserto de redes de água e tem contato intermitente com redes de esgoto.

Os desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) consideraram, com base no laudo pericial, que há contato com agentes insalutíferos biológicos, ainda que de modo intermitente, devido ao rompimento de redes cloacais e outras atividades em contato com esgoto. A decisão unânime da Turma manteve o entendimento da sentença do juiz Edenir Barbosa Domingos, da Vara do Trabalho de São Jerônimo.

O agente de serviços ingressou com a ação pleiteando, entre outros direitos, o adicional de insalubridade de 40%. Segundo ele, durante o trabalho nas redes de água há contato ocasional com esgoto.

O laudo do perito técnico que atuou no processo concluiu que o trabalhador se expõe a riscos biológicos, ainda que de modo intermitente, quando há o rompimento de redes cloacais e redes pluviais mistas. Segundo o perito, a atribuição deve ser equiparada às atividades insalubres listadas no anexo nº 14 da NR-15.

A sentença de primeiro grau acolheu as conclusões do perito e concedeu ao agente adicional de insalubridade em grau máximo, no percentual de 40%, em parcelas vencidas e vincendas, ou seja, até a incorporação em folha de pagamento, com reflexos.

A Corsan recorreu da sentença ao TRT-RS. O relator do caso na 3ª Turma, desembargador Clóvis Fernando Schuch Santos, destacou que a presunção relativa de veracidade das informações obtidas por meio do laudo pericial não foi rebatida por prova em sentido contrário. Nessa linha, a Turma manteve a sentença de procedência.

Também participaram do julgamento os desembargadores Marcos Fagundes Salomão e Ricardo Carvalho Fraga. Cabe recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

STJ: Ação de produção antecipada de prova pode ser ajuizada no local em que está o objeto a ser periciado

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a ação de produção antecipada de prova pericial pode ser processada na comarca onde está o objeto que vai ser periciado, e não no local de domicílio da parte ré – que, no caso julgado, coincidia com o foro eleito em contrato.

Segundo o processo, foi movida ação de produção antecipada de prova contra uma metalúrgica, para que fosse realizada a perícia de um equipamento fornecido por ela, o qual se encontrava na sede de uma empresa cliente da autora. A ação foi ajuizada na comarca onde se encontrava o equipamento, enquanto o foro eleito no contrato entre autora e ré era o de domicílio desta última.

Após o tribunal de segunda instância não acolher a tese proposta pela ré em exceção de incompetência, a metalúrgica recorreu ao STJ sustentando que a cláusula contratual de eleição de foro deveria prevalecer.

STJ flexibilizou a regra de competência antes da mudança do CPC
A relatora, ministra Nancy Andrighi, observou que a possibilidade de pedir a produção antecipada de prova ao juízo do local onde ela deva ser produzida, prevista no artigo 381, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015), não tinha equivalente no CPC/1973, o qual estabelecia como regra geral que a competência para a ação cautelar era do juízo competente para a ação principal (artigo 800 do CPC/1973).

Apesar disso – acrescentou a ministra –, antes mesmo da vigência do CPC/2015, o STJ já vinha admitindo a flexibilização dessa competência em relação aos procedimentos cautelares, sobretudo quando se tratasse de produção antecipada de provas, por uma questão de praticidade.

“A facilitação da realização da perícia prevalece sobre a regra geral do ajuizamento no foro do réu por envolver uma questão de ordem prática, tendo em vista a necessidade de exame no local onde está situado o objeto a ser periciado”, completou.

A relatora destacou ainda que o artigo 381, parágrafo 3º, do CPC/2015 prevê expressamente que o foro no qual tramitar a ação cautelar de produção de prova não ficará prevento para a futura ação principal. Assim, segundo ela, afasta-se qualquer ideia de prejuízo à parte ré, pois, caso seja ajuizada a ação principal, o foro eleito no contrato – que coincide com o local de sua sede – poderá prevalecer.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2136190


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