TRF4 suspende decisão e União não precisa disponibilizar ferramenta para contestação de auxílio emergencial negado

Nesta terça-feira (27/4), foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) a decisão de primeira instância, determinada pela 6ª Vara Federal de Porto Alegre, que obrigava a União a disponibilizar, no prazo de 30 dias, uma ferramenta na plataforma digital do auxílio emergencial, para dar aos cidadãos que tiveram o benefício negado a possibilidade de contestarem a negativa por meio da juntada de documentos que seriam analisados pelos funcionários do Ministério da Cidadania, órgão responsável pelo deferimento do auxílio. A decisão liminar foi tomada de forma monocrática pelo desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, integrante da 4ª Turma do TRF4.

Primeira instância

Na decisão da 6ª Vara Federal de Porto Alegre fora decidido que a União deveria fornecer o recurso de contestação do indeferimento do auxílio emergencial, ou seja, oferecer a possibilidade de análise da concessão do auxílio por um funcionário público, e não por meio dos bancos de dados da Dataprev, empresa responsável pela gestão da Base de Dados Sociais Brasileira.

A determinação partiu de uma ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública da União (DPU). No processo, a DPU argumentou que existe uma demanda grande por reconsiderações nas decisões sobre o auxílio, já que os bancos de dados da Dataprev estariam desatualizados.

“Considero presente a probabilidade do direito, devendo ser reconhecido aos cidadãos o direito de petição, garantido constitucionalmente, e também o direito ao contraditório e ampla defesa no processo administrativo – igualmente erigido em norma constitucional –, com a possibilidade de oferecer defesa extrajudicial, com a juntada de razões e documentos, independentemente da representação jurídica pela DPU ou por advogado. Entretanto, o acesso às informações sigilosas deve ser restrito aos órgãos públicos”, destacou a decisão da juíza federal substituta Daniela Cristina de Oliveira Pertile Victoria.

A magistrada baseou-se no fato de que se trata de um benefício nacional e uma medida necessária para se fazer cumprir a justiça nas análises de deferimento do auxílio emergencial. Outro ponto considerado por ela seria evitar a judicialização em massa, sobrecarregando os sistemas judiciários com uma demanda inviável para os órgãos responsáveis.

Posição do desembargador

O desembargador federal Cândido Alfredo Silva Leal Júnior, no entanto, suspendeu a decisão de primeira instância, após a União recorrer ao TRF4.

A suspensão foi baseada no fato de que a União já disponibiliza uma forma de contestação, porém por meio de sistemas de cruzamento de dados, e que uma análise individual poderia sobrecarregar o ministério.

“O Ministério da Cidadania não teria condição de alocar a força de trabalho necessária a tal funcionalidade. Mesmo que houvesse capacidade de pessoal, haveria risco de colapso da atuação em áreas finalísticas, inviabilizando políticas do auxílio emergencial”, ressaltou o desembargador.

Além da sobrecarga do ministério, o magistrado também apontou para o fato de que a medida implicaria uma demora incompatível com a urgência do auxílio, que a juntada de documentos não teria o poder de se sobrepor aos bancos de dados, além da possibilidade de ocorrer fraudes, falsidade documental e hackeamento do sistema.

Considerando esses argumentos, Leal Júnior decidiu por deferir o efeito suspensivo ao recurso, retirando assim a obrigatoriedade da União em disponibilizar o serviço de verificação individual dos que tiveram o auxílio emergencial negado.

A ação civil pública segue tramitando na primeira instância da Justiça Federal do RS e ainda deverá ter o seu mérito julgado.

Processo n° 50163413220214040000

TRT/RS reconhece vínculo de emprego entre porteiro e empresa de alimentos

A 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) reconheceu a existência de vínculo de emprego entre uma empresa alimentícia e um trabalhador que atuava como porteiro e realizava serviços de manutenção predial. A decisão confirmou, no aspecto, a sentença da juíza Márcia Carvalho Barrili, da 4ª Vara do Trabalho de Gravataí.

O autor do processo afirmou que começou suas atividades em janeiro de 2018, mediante o preenchimento de uma ficha, e foi demitido em novembro do mesmo ano, sem aviso prévio e sem justa causa. De acordo com a empregadora, ele foi contratado, tacitamente, para controlar o fluxo e a entrada de pessoas durante alguns dias da semana. Em seguida, começou a executar outras atividades, como pintar e reparar paredes do estabelecimento e cortar grama.

A empresa alegou que os serviços prestados eram eventuais e sem salário fixo. Também afirmou que o tipo de relação de trabalho não era de subordinação direta, pois não havia supervisionamento permanente no local e o seu horário de trabalho era livre.

Ao analisar o caso, a juíza ressaltou que, como a empresa reconheceu a prestação de trabalho em seu benefício, deveria provar sua alegação de que o serviço era eventual. Contudo, segundo a magistrada, o depoimento do representante da empresa fez o contrário, trazendo elementos suficientes para demonstrar a existência da relação de emprego.

No seu depoimento, o representante da empresa declarou que o trabalhador realizava atividades das 7h às 18h30min, de três a quatro vezes por semana. Também mencionou que o trabalhador recebia, por semana, em torno de R$ 500. “Assim, não há dúvidas de que o autor trabalhou para a reclamada prestando serviços com pessoalidade, subordinação e não-eventualidade por todo o período vindicado”, concluiu a magistrada. A sentença reconheceu o vínculo de emprego e os direitos dele decorrentes, como aviso-prévio, 13º salário proporcional e férias proporcionais.

A relatora do acórdão no segundo grau, desembargadora Angela Rosi Almeida Chapper, também destacou que era ônus da empregadora comprovar que não havia relação de emprego, já que ela reconheceu a prestação de trabalho. O acórdão ressaltou que “a subordinação é cristalina”, uma vez que o depoimento do representante da empresa demonstrou que havia controle de jornada e que o trabalhador precisava se reportar ao gerente. Também observou que o trabalho era não-eventual, pois o autor trabalhava de três a quatro vezes por semana.

A decisão foi unânime na 5ª Turma. Também participaram do julgamento os desembargadores Manuel Cid Jardon e Cláudio Antônio Cassou Barbosa. A empresa já interpôs recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho.

STJ: Falta de estoque não impede consumidor de exigir entrega do produto anunciado

​​Em virtude do princípio da vinculação do fornecedor à oferta, o consumidor só não poderá exigir a entrega do produto anunciado caso ele tenha deixado de ser fabricado e não exista mais no mercado. Se o fornecedor não entregou o produto, mas ainda tiver como fazê-lo – mesmo precisando adquiri-lo de outras empresas –, fica mantida para o consumidor a possibilidade de exigir o cumprimento forçado da obrigação, prevista no artigo 35, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que, após o descumprimento da entrega de mercadoria comprada pela internet em razão da falta de estoque, entendeu que a cliente não poderia optar pelo cumprimento forçado da obrigação, devendo escolher entre as demais hipóteses do artigo 35 do CDC: aceitar produto equivalente (inciso II) ou rescindir o contrato, com restituição da quantia paga (inciso III).

A relatora do recurso da consumidora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, como previsto pelo artigo 30 do CDC, a informação contida na própria oferta é essencial à manifestação de vontade do consumidor e configura proposta – integrando, por isso, o contrato posteriormente celebrado com o fornecedor.

Como a oferta veiculada obriga o fornecedor ao seu cumprimento, nos termos do artigo 35, a relatora apontou que, em caso de descumprimento no fornecimento, o consumidor pode escolher livremente qualquer das opções do dispositivo legal.

“Todas as opções previstas no artigo 35 do CDC guardam relação com a satisfação da intenção validamente manifestada pelo consumidor ao aderir à oferta do fornecedor, por meio da previsão de resultados práticos equivalentes ao adimplemento da obrigação”, disse a ministra.

Boa-fé
Com base em lições da doutrina, Nancy Andrighi ponderou que a única hipótese que autorizaria a exclusão da opção pelo cumprimento forçado da obrigação seria a inexistência do produto de mesma marca e mesmo modelo no mercado, caso não fosse mais fabricado.

“A possibilidade ou não do cumprimento da escolha formulada livremente pelo consumidor deve ser aferida à luz da boa-fé objetiva”, declarou a ministra. Segundo ela, “não há razão para se eliminar a opção pelo cumprimento forçado da obrigação” quando o fornecedor dispõe de meios para entregar o produto anunciado, mesmo que precise obtê-lo com outros revendedores.

Como o processo não indicou que a falta do produto no estoque do fornecedor fosse impossível de ser contornada, a Terceira Turma reformou o acórdão do TJRS e determinou o retorno dos autos ao primeiro grau, para que a ação prossiga nos termos do artigo 35, inciso I, do CDC.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.872.048 – RS (2019/0301210-9)

TST: Acordo firmado com instalador em comissão de conciliação prévia só quita valores discriminados

O termo de conciliação, no caso, não equivale à quitação geral do contrato de trabalho.


A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1) limitou a eficácia liberatória de um acordo firmado entre a ETE – Engenharia de Telecomunicações e Eletricidade Ltda. e um instalador perante comissão de conciliação prévia (CCP) às parcelas nele discriminadas. Segundo os ministros, os termos do acordo não equivalem à quitação geral do contrato de trabalho.

Acordo
O instalador foi contratado pela ETE para prestar serviços à Oi S.A em Porto Alegre (RS). Na rescisão contratual, assinou o acordo na CCP e, posteriormente, ajuizou a reclamação trabalhista para receber parcelas relativas a equiparação salarial, acúmulo de função e diferenças de adicional de periculosidade, entre outras. Em sua defesa, as empresas sustentaram que, com o acordo, teria havido quitação total dos valores decorrentes do contrato de trabalho.

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região julgaram procedente o pedido, mas a Quinta Turma do TST, em recurso de revista, reconheceu a eficácia liberatória geral do acordo homologado na CCP e extinguiu o processo. O instalador interpôs, então, embargos à SDI-1, órgão responsável pela uniformização da jurisprudência das Turmas do TST.

Ressalvas
Ao examinar o caso, o relator, ministro Alberto Bresciani, explicou que, de acordo com o artigo 625-E, parágrafo único, da CLT, o termo de conciliação é título executivo extrajudicial e terá eficácia liberatória geral, “exceto quanto às parcelas expressamente ressalvadas”. Em relação a esse dispositivo, o Supremo Tribunal Federal (ADI 2237) decidiu que a eficácia liberatória diz respeito aos valores discutidos “e não se transmuta em quitação geral e indiscriminada de verbas trabalhistas”.

No caso, foi acordado que, com o recebimento do montante do acordo, o empregado dava plena quitação dos valores e parcelas expressamente consignadas no termo de conciliação, o que, a seu ver, equivale à ressalva. “Não há como se falar em quitação geral do contrato de trabalho”, assinalou.

Com o provimento dos embargos, a SDI-1 determinou o retorno dos autos à Quinta Turma para exame dos temas considerados prejudicados. A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo n° E-ED-RR-307-50.2012.5.04.0404

TRF4: Envio da notificação de multa pelos Correios é garantia de andamento do processo administrativo

Em decisão monocrática, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou um pedido de reconsideração da decisão de primeira instância que suspendeu a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) de um motorista que perdeu o prazo para contestar uma multa e argumentou que o atraso teria sido provocado pelos Correios. O autor do recurso, morador de Nova Petrópolis (RS), alegou que não recebeu as notificações do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) para que pudesse transferir os pontos descontados para a carteira de motorista do pai, que teria sido quem cometeu a infração de trânsito. A decisão, publicada no último dia 22, é do desembargador federal da 4ª Turma Ricardo Teixeira do Valle Pereira, relator do processo na Corte.

O caso

Nos dias 28 de novembro e 17 de dezembro de 2018, o motorista, na época morador de Horizontina (RS), foi multado por dirigir em velocidade 20% superior ao permitido nas rodovias em que foi flagrado. Em 8 de janeiro de 2019, recebeu uma nova infração por excesso de velocidade que, somando-se às duas anteriores, ocasionou a suspensão do direito de dirigir e o bloqueio de sua CNH.

O motorista, então, apresentou à 5ª Vara Federal de Porto Alegre um pedido de anulação do ato administrativo do Dnit que restringiu seu direito de dirigir. Em sua defesa, alegou que, na verdade, quem cometeu a terceira infração foi seu pai. De acordo com o artigo 257 do Código de Trânsito Brasileiro (CTC), após a notificação da infração, o proprietário do veículo possui 15 dias de prazo para apresentar o verdadeiro condutor no momento da infração. A defesa argumentou, no entanto, que o proprietário do automóvel não foi notificado a tempo, o que acarretou a perda do prazo.

O pedido foi indeferido pela 5ª Vara Federal de Porto Alegre, que constatou não ter ocorrido falha no processo de notificação, já que a entrega dos documentos pelos Correios, que também realizam a impressão, é por si só uma garantia do andamento do processo, não sendo necessário Aviso de Recebimento (AR).

A decisão de primeira instância também concluiu que não havia provas suficientes para demonstrar que o pai do motorista era realmente o verdadeiro condutor do veículo no ato da infração.

O motorista apresentou ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), então, um pedido de reconsideração da decisão.

Carteira suspensa

O desembargador federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira entendeu pela manutenção da decisão da 5ª Vara Federal de Porto Alegre. Para o magistrado, não houve falha no processo de notificação e, tampouco, existem provas concretas de que o condutor do veículo era mesmo o pai do proprietário. O relator do caso indeferiu o pedido de anulação do ato administrativo e, consequentemente, manteve a CNH do motorista suspensa.

TRT/RS: Vendedora externa com jornada de trabalho controlada tem direito a hora extra

A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) deferiu o pagamento de horas extras a uma vendedora pracista que demonstrou que sua jornada era sujeita a controle de horário pela empregadora. Para os desembargadores, a prova colhida nos autos é robusta no sentido que a autora estava sujeita a fiscalização de horário, pois o roteiro do trabalho era pré-determinado, havia contato telefônico com o supervisor, e, ainda, que não poderia haver alteração nas rotas de vendas sem autorização. A decisão unânime da Turma confirmou a sentença proferida pelo juiz Edenir Barbosa Domingos, na ação que tramita na 2ª Vara do Trabalho de Sapiranga.

Ao analisar o caso em primeira instância, o juiz considerou o depoimento de uma testemunha que afirmou que “havia ciência de seu supervisor sobre o roteiro de clientes a ser percorrido, bem como que havia contato telefônico frequente entre ela e seu superior, que no mais das vezes desejava informações sobre número de caixas vendidas e sobre a positivação de clientes”. Com base nesse elemento, o julgador entendeu que havia a possibilidade de controle de jornada. Assim sendo, tinha a empregadora o dever de anotar a jornada e guardar os comprovantes para apresentação em juízo, sob pena de prevalecimento da jornada informada na inicial, o que não fez. Em decorrência, o magistrado acolheu a jornada de trabalho apontada pela autora (das 8h às 19h com 45 minutos de intervalo, de segundas a sextas, bem como das 8h às 14h, sem intervalo, em dois sábados por mês), e condenou a ré no pagamento de horas extras, assim consideradas as excedentes da 8ª diária e 44ª semanal.

As partes recorreram ao TRT-RS. Segundo a relatora do processo na 2ª Turma, desembargadora Maria Silvana Rotta Tedesco, “para que haja enquadramento do trabalhador na situação prevista no art. 62, I, da CLT, além das exigências formais de anotação de não sujeição a horário de trabalho, deve ser demonstrada a efetiva ausência de controle e fiscalização de cumprimento de horário, devido à atividade externa”. No caso do processo, a relatora aponta que a prova colhida é robusta no sentido que a autora estava sujeita a controle e fiscalização de horário pelo empregador, por ser incontroverso que não poderia haver alterações no roteiro e que havia contatos telefônicos com o supervisor. Assim, refere a julgadora que por não estar a empregada enquadrada na exceção do artigo 62, I, da CLT, a ré deveria apresentar os registros de horário do período, encargo do qual não se desincumbiu.

Em decorrência, a Turma manteve a jornada arbitrada na decisão de primeiro grau, “na medida em que fixada com base na prova oral colhida, nos limites da lide e no Princípio da Razoabilidade”, e condenou a ré no pagamento das horas extraordinárias, como deferido na sentença.

Também participaram do julgamento os desembargadores Alexandre Corrêa da Cruz e Clóvis Fernando Schuch Santos. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

STJ: Condomínios residenciais podem impedir uso de imóveis para locação pelo Airbnb

Por maioria de votos, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (20) que, caso a convenção do condomínio preveja a destinação residencial das unidades, os proprietários não poderão alugar seus imóveis por meio de plataformas digitais como o Airbnb. No entanto, a convenção do condomínio pode autorizar a utilização das unidades nessa modalidade de aluguel.

Para o colegiado, o sistema de reserva de imóveis pela plataforma digital é caracterizado como uma espécie de contrato atípico de hospedagem – distinto da locação por temporada e da hospedagem oferecida por empreendimentos hoteleiros, que possuem regulamentações específicas.

Segundo a turma, havendo previsão expressa de destinação residencial das unidades do condomínio, será impossível a sua utilização para a atividade de hospedagem remunerada.

Com a decisão, os ministros mantiveram acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que determinou aos proprietários de duas unidades residenciais em condomínio que se abstivessem de oferecer seus imóveis para locação pelo Airbnb. No entendimento do TJRS, essa prática se caracteriza como atividade comercial e de hospedagem, proibida pela convenção condominial.

Alta rotativida​​de
No voto acompanhado pela maioria do colegiado, o ministro Raul Araújo apresentou uma distinção entre os conceitos de residência (morada habitual e estável), domicílio (residência com a intenção de permanência definitiva) e hospedagem (habitação temporária).

Segundo o magistrado, entre as características da hospedagem estão a alta rotatividade no local e a oferta de serviços – situação presente no caso em julgamento, em que o imóvel era disponibilizado para diferentes pessoas em curto espaço de tempo, com oferta de serviços como lavagem de roupas.

O ministro ressaltou que, como apontado pelo TJRS, o condomínio não se voltou contra a possibilidade de os proprietários fecharem contrato de aluguel de longa duração, mas questionou a exploração de hospedagem remunerada, a qual teria trazido perturbação à rotina do espaço residencial e insegurança aos demais condôminos.

Contrato at​​ípico
No campo normativo, Raul Araújo lembrou que a Lei de Locações considera aluguel para temporada aquele destinado à residência temporária do locatário, por prazo não superior a 90 dias. A legislação, segundo o ministro, não trata da hipótese de oferta de imóveis com alta rotatividade nem da possibilidade de divisão de uma mesma unidade entre pessoas sem vínculo – como ocorreu no caso dos autos.

Por outro lado, o magistrado apontou que as atividades realizadas por meio de plataformas como o Airbnb não possuem o modelo de negócio, nem a estrutura ou o profissionalismo suficientes para serem enquadradas na Lei 11.771/2008 (Política Nacional de Turismo), embora as características desse tipo de locação lembrem um contrato de hospedagem na modalidade atípica.

“Tem-se um contrato atípico de hospedagem, expressando uma nova modalidade, singela e inovadora, de hospedagem de pessoas sem vínculo entre si, em ambientes físicos de padrão residencial e de precário fracionamento para utilização privativa, de limitado conforto, exercida sem inerente profissionalismo por proprietário ou possuidor do imóvel, sendo a atividade comumente anunciada e contratada por meio de plataformas digitais variadas”, explicou o ministro.

Ativida​​de lícita
Em seu voto, Raul Araújo enfatizou que o contrato atípico de hospedagem realizado por meio de plataformas como o Airbnb não configura atividade ilícita, desde que exercida nos limites da legislação.

O ministro apontou que o Código Civil, ao mesmo tempo em que reconhece ao proprietário o direito de dispor livremente de sua unidade residencial, também lhe impõe o dever de observar a sua destinação e usá-la de maneira não abusiva, com respeito à convenção do condomínio – instrumento com força normativa, segundo o próprio código.

“Assim, o direito do proprietário condômino de usar, gozar e dispor livremente do seu bem imóvel, nos termos dos artigos 1.228 e 1.335 do Código Civil de 2002 e 19 da Lei 4.591/1964, deve harmonizar-se com os direitos relativos à segurança, ao sossego e à saúde das demais múltiplas propriedades abrangidas no condomínio, de acordo com as razoáveis limitações aprovadas pela maioria de condôminos, pois são limitações concernentes à natureza da propriedade privada em regime de condomínio edilício”, concluiu o ministro ao manter o acórdão do TJRS.​

Direito de propriedade
No início do julgamento, o relator, ministro Luis Felipe Salomão – que ficou vencido –, havia dado seu voto contra a possibilidade de os condomínios proibirem as locações por meio de plataformas digitais. Para o ministro, essa modalidade não estaria inserida no conceito de hospedagem, mas, sim, no de locação residencial por curta temporada.

Além de entender que essa atividade não poderia ser enquadrada como estritamente comercial, Salomão considerou que, caso fosse permitido que os condomínios vedassem a locação temporária, haveria violação do direito de propriedade.

Segundo o ministro, o condomínio poderia adotar mecanismos para garantir a segurança – como o cadastramento de pessoas na portaria –, mas não seria possível impedir a atividade de locação pelos proprietários. ​

Destaques de hoje
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TRT/RS: Legislação brasileira deve ser aplicada a trabalhador que atuou em navio de cruzeiro com bandeira italiana

A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) decidiu que a Justiça do Trabalho brasileira é competente para julgar o processo de um trabalhador que atuou em um navio de cruzeiro, mesmo que a embarcação tenha bandeira italiana. Isso porque, no entendimento dos desembargadores, o empregado foi contratado no Brasil, o trabalho foi prestado de maneira predominantemente em águas brasileiras e a legislação nacional é mais benéfica ao empregado que a italiana. A decisão confirma, nesse aspecto, sentença da juíza Julieta Pinheiro Neta, da 25ª Vara do Trabalho de Porto Alegre. O acórdão ainda pode ser objeto de recurso diante do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Segundo dados do processo, o trabalhador atuou no navio entre novembro de 2016 e junho de 2017. Ele ingressou com ação na Justiça do Trabalho gaúcha questionando diversos direitos e verbas trabalhistas, tais como horas extras, indenizações por danos morais e existenciais, dentre outras.

Na defesa, as duas agências de turismo que contrataram o empregado, localizadas no Brasil, alegaram que, por tratar-se de navio com bandeira italiana e, portanto, ser considerado como extensão do território da Itália, o foro adequado para tramitação do processo seria a cidade de Gênova, onde está localizada a sede da empresa dona da embarcação.

No entanto, para a juíza que julgou o caso em primeira instância e para os desembargadores da 2ª Turma, a Justiça do Trabalho brasileira é competente para analisar o caso.

Segundo a magistrada, ficou comprovado que o trabalhador foi contratado no Brasil e prestou serviços, na maior parte do seu período de vínculo, em águas brasileiras. Essas circunstâncias, conforme a julgadora, atraem a incidência da teoria do centro de gravidade, segundo a qual o Direito Internacional Privado não será aplicado, excepcionalmente, quando, observadas determinadas situações, verifica-se que a causa tem mais proximidade com outro Direito.

Após analisar a legislação italiana, devidamente traduzida no processo, a magistrada observou que as leis brasileiras são mais benéficas ao empregado, o que também atrai a competência para a Justiça do Trabalho nacional.

Já o relator do caso na 2ª Turma, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, ressaltou que, em depoimentos durante a tramitação do processo, os representantes das agências contratantes não souberam responder informações básicas sobre a relação de emprego, como o local em que o contrato foi celebrado e a região em que o trabalhador atuou, o que fez com que as alegações do trabalhador, de que teria sido contratado no Brasil e atuado de maneira predominante em águas brasileiras, fossem tidas como verdadeiras. “Assim, reconhecida a admissão no território nacional para prestação de serviços em embarcação, ainda que de bandeira estrangeira, dentro de mares brasileiros, inafastável a jurisdição nacional e nossa legislação”, concluiu o relator.

O entendimento foi seguido pelos demais integrantes da Turma Julgadora, desembargadora Tânia Regina Silva Reckziegel e desembargador Marçal Henri dos Santos Figueiredo. O colegiado também determinou que as empresas paguem ao empregado R$ 10 mil como indenização por danos morais, pela solicitação indevida de um exame de HIV e toxicológico antes do embarque para o trabalho no navio, e R$ 20 mil a título de danos existenciais, pela submissão do trabalhador a jornadas muito extensas.

TRT/RS: Empregada dos Correios ganha direito à redução de jornada para cuidar de filho autista

Uma operadora de triagem/translado dos Correios, mãe de um menino com autismo infantil, ganhou direito à meia jornada de trabalho, sem redução salarial e sem compensação, por decisão da 5ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS). Os magistrados deram provimento ao recurso da trabalhadora, que passará a cumprir quatro horas diárias e 20 semanais. Em primeira instância, a juíza Cláudia Elisandra de Freitas Carpenedo, da 3ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, havia deferido parcialmente o pedido, determinando a redução para seis horas diárias e 30 semanais.

A perícia médica confirmou que o menino de 11 anos necessita de atendimento médico multidisciplinar permanente. Os tratamentos, de acordo com o laudo, são indispensáveis para o desenvolvimento de habilidades psicomotoras e sociais, como progressos na fala, locomoção, manipulação de objetos e equilíbrio. Segundo o psiquiatra, o acompanhamento dos familiares, sobretudo da mãe, nas sessões de fonoaudiologia e de terapia ocupacional, bem como durante a consulta com a psicóloga e a psicopedagoga, permite a aplicação dos resultados na “vida real” com maior êxito. O pai do menino, chefe de um açougue em um supermercado, não dispõe de qualquer possibilidade de jornada especial.

Em contestação, os Correios alegaram que a Lei nº 8.112/90, que rege os servidores públicos da União, não é aplicável aos seus empregados, por não serem servidores em sentido estrito. Argumentaram, ainda, que a empresa está sujeita ao princípio da legalidade, como ente da Administração Pública, não podendo deferir o pedido da operadora de triagem. Também sustentaram que a liberação parcial da autora afrontaria o princípio da prevalência do interesse público.

A juíza Cláudia confirmou em sentença a decisão de tutela de urgência que determinou a redução da jornada para seis horas diárias e 30 horas semanais, sem redução salarial ou compensação. Para a magistrada, os princípios constitucionais da dignidade humana, proteção do trabalhador, valores sociais do trabalho, proteção da criança e do adolescente e da pessoa com deficiência amparam o pedido da trabalhadora. Somados a tais princípios, ainda há a Lei nº 12.764/12, que define diretrizes para a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. “À vista da prova dos autos, resta evidente a necessidade de participação ativa dos pais nos tratamentos realizados pela criança, bem como o acompanhamento constante à sua rotina de atividades, a fim de melhorar o desenvolvimento das suas habilidades sociais e cognitivas”, declarou a juíza.

As partes recorreram ao TRT-RS. A trabalhadora para obter a redução de 50% da carga horária e os Correios para afastar a redução concedida em primeiro grau.

O relator do acórdão, desembargador Cláudio Antônio Cassou Barbosa, ratificou o entendimento de que a redução se impõe pelo princípio da dignidade da pessoa humana, que deve ser observado e tutelado pela Administração Pública para proteger o desenvolvimento do menor. “O procedimento adotado pela reclamada reveste-se de conteúdo discriminatório e fere o princípio da boa-fé, que norteia as relações contratuais, bem assim o princípio da dignidade da pessoa humana, aqui ressaltado em exponencial gravidade por se tratar de tutelar a saúde de um menor que exige tratamento diferenciado com acompanhamento permanente de seu núcleo familiar”, ressaltou o desembargador.

A decisão foi unânime na 5ª Turma. Também participaram do julgamento as desembargadoras Rejane Souza Pedra e Angela Rosi Almeida Chapper. As partes podem apresentar recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

STJ afasta multa e honorários sobre crédito que recuperanda não podia quitar voluntariamente

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o crédito sujeito ao processo de recuperação judicial, decorrente de ação que demandava quantia ilíquida, não pode ser acrescido da multa e dos honorários advocatícios previstos para a hipótese de recusa ao cumprimento voluntário de sentença (artigo 523, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil de 2015).

O caso analisado diz respeito a ação declaratória de inexistência de débito com pedido de indenização, em fase de cumprimento de sentença, ajuizada por uma consumidora contra operadora de telefonia em recuperação judicial. A empresa foi condenada por ter incluído indevidamente o nome da consumidora em cadastro restritivo de crédito.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) reconheceu a sujeição do crédito da consumidora aos efeitos da recuperação, mas determinou que o valor fosse acrescido da multa e dos honorários previstos no artigo 523, parágrafo 1º, do CPC.

No recurso ao STJ, a operadora de telefonia alegou que a conclusão do TJRS viola o princípio da igualdade entre os credores.

Habilitação do crédito
Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, “o fato gerador do crédito em discussão é anterior ao pedido de recuperação, de modo que não há dúvidas acerca de sua sujeição aos efeitos do processo de soerguimento”.

No entanto – observou a magistrada –, em se tratando de crédito decorrente de ação na qual se demanda quantia ilíquida, o artigo 6º, parágrafo 1º, da Lei 11.101/2005 determina que a ação de conhecimento prossiga no juízo original até a definição do valor do crédito, quando então deverá ser habilitado no quadro geral de credores, ficando impedido a partir daí o andamento da execução singular.

Além disso, a relatora destacou que, conforme o artigo 59, caput, da Lei 11.101/2005, o plano de recuperação implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e o pagamento das dívidas da recuperanda deve respeitar as condições pactuadas, sempre com respeito à igualdade de tratamento entre os credores de cada classe.

Obrigação inexigível
Para Nancy Andrighi, diante de tais circunstâncias, a fase de cumprimento da sentença nem poderia ter sido iniciada, pois a liquidação do crédito só ocorreria depois de devidamente habilitado e de acordo com as disposições do plano de recuperação.

Assim – concluiu a ministra –, não se pode considerar que houve recusa voluntária ao pagamento, que seria a causa de aplicação da multa e dos honorários previstos no parágrafo 1º do artigo 523 do CPC, “uma vez que o adimplemento da quantia reconhecida em juízo, por decorrência direta da sistemática prevista na Lei 11.101/2005, não constituía obrigação passível de ser exigida da recuperanda”.

Ao dar provimento ao recurso especial, a relatora acrescentou que, estando em curso processo recuperacional, a livre disposição, pela devedora, de seu acervo patrimonial para pagamento de créditos individuais sujeitos ao plano de soerguimento violaria o princípio segundo o qual os credores devem ser tratados em condições de igualdade.

Veja o acórdão.
Processo n° 1.873.081 – RS (2020/0106169-7)


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