STJ: Fisioterapeuta e terapeuta ocupacional podem diagnosticar e indicar tratamentos

Ao julgar os embargos de declaração no REsp 1.592.450, a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, concluiu que é permitido ao fisioterapeuta e ao terapeuta ocupacional diagnosticar doenças, prescrever tratamentos e dar alta terapêutica.

Com essa decisão, o colegiado reformou seu entendimento anterior de que caberia exclusivamente ao médico a tarefa de diagnosticar, prescrever tratamentos e avaliar resultados, enquanto o fisioterapeuta e o terapeuta ocupacional, diferentemente, ficariam responsáveis apenas pela execução das técnicas e dos métodos prescritos.

Médicos alegaram invasão de suas atribuições privativas
Na origem do processo, o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) ajuizou ação para impugnar resoluções e outros atos do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Coffito) que, supostamente, teriam invadido a esfera privativa dos médicos e estariam colocando em risco a saúde e a vida das pessoas.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) considerou legais as normas editadas pelo Coffito, afirmando que elas não ultrapassam o âmbito de atuação do conselho nem interferem nas atribuições dos profissionais da medicina.

No STJ, a Primeira Turma entendeu, em um primeiro momento, que as resoluções do Coffito teriam invadido a esfera de prescrição de tratamentos reservada aos médicos. Com isso, o colegiado decidiu que os fisioterapeutas e os terapeutas ocupacionais poderiam praticar as atividades de acupuntura, quiropraxia e osteopatia, mas não diagnosticar, prescrever tratamentos e avaliar resultados.

O Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Crefito) da 5ª Região e o Coffito, em embargos de declaração, sustentaram que o acórdão foi omisso, uma vez que não analisou os vetos da Presidência da República ao dispositivo legal que define as atividades privativas dos médicos (artigo 4º da Lei 12.842/2013) e também deixou de apreciar as razões de tais vetos.

Judiciário deve respeitar discussões já desenvolvidas no processo legislativo
Segundo o relator do recurso, ministro Gurgel de Faria, a mensagem de veto de trechos da Lei 12.842/2013 indica que um dos incisos vetados no artigo 4º previa como atividades privativas do médico a formulação do diagnóstico nosológico e a respectiva prescrição terapêutica.

Nas razões do veto – prosseguiu o ministro –, a Presidência da República considerou que o inciso, da forma como estava redigido, impediria a continuidade de inúmeros programas do Sistema Único de Saúde (SUS) que funcionam a partir da atuação integrada dos profissionais de saúde, contando, inclusive, com a realização do diagnóstico nosológico por profissionais de outras áreas que não a médica.

Para Gurgel de Faria, as razões do veto indicam que o acórdão anterior da Primeira Turma errou ao entender que o ordenamento jurídico impediria o fisioterapeuta e o terapeuta ocupacional de diagnosticar ou indicar tratamentos, ao fundamento de que sua função seria apenas executar métodos e técnicas prescritos pelos médicos.

“Assim, mantendo-se fidelidade ao raciocínio desenvolvido no acórdão recorrido, mas promovendo interpretação sistemática e histórica de toda a legislação supracitada, inclusive das razões de veto, entendo que o Judiciário deve prestar deferência às discussões que já foram desenvolvidas na via própria, durante o processo legislativo, e que melhor refletem valores democráticos”, concluiu o ministro ao acolher os embargos declaratórios para sanar a omissão e negar provimento ao recurso especial do Simers.

Processo: REsp 1592450

TRF4: Homem é condenado por publicação com teor discriminatório contra indígenas em rede social

A 1ª Vara Federal de Rio Grande (RS) condenou um homem por escrever um comentário com teor de discriminação étnica contra indígenas numa publicação na rede social Facebook. A sentença, publicada ontem (24/11), é do juiz Gabriel Borges Knapp.

O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com a ação narrando que o homem, em janeiro de 2021, fez o seguinte comentário numa postagem da Secretaria Municipal de Saúde do município relativa à vacinação contra Covid-19 na população indígena residente na cidade: “Índio é vagabundo, sustentado po (pelo) governo, cacique é explorador dos índios, índio é corrupto”. O autor destacou que o denunciado, por meio desta conduta, praticou, induziu e incitou a discriminação contra os povos indígenas.

Em sua defesa, o réu argumentou não haver provas suficientes da prática do crime, pois a acusação se baseia em um único comentário, que foi feito para manifestar indignação com a ordem de prioridades da vacinação, tendo em vista ser caminhoneiro e estar impossibilitado de trabalhar em função do distanciamento social. Pontuou que fez o comentário dentro do seu direito constitucional à liberdade de expressão, criticando a precedência a um grupo que historicamente vive de forma mais isolada e, portanto, estaria menos suscetível à transmissão da doença.

Ao analisar o caso, o magistrado afirmou que o crime tratado na ação consiste em praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Ele salientou que a garantia constitucional da liberdade de expressão não contempla o discurso de ódio, pois a Carta Magna coloca como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

“Assim, a proteção constitucional da livre manifestação do pensamento não prevalece diante de manifestações que caracterizam ilícito penal e não pode ser utilizada como salvaguarda para a promoção do preconceito e da intolerância, sob pena de erodir os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade”.

O juiz concluiu que o comentário publicado pelo réu apresentava caráter discriminatório e revelava desprezo e preconceito em relação à população indígena como um todo. Além disso, foi feito numa rede social de notório alcance, o que pode suscitar e estimular o julgamento prévio e negativo, além do desprezo a essas etnias.

Ele destacou ainda que a postagem promoveu “segregação histórica e racismo contra os povos indígenas em momento de acentuada vulnerabilidade dessas populações, visto que as suas condições socioeconômicas os tornavam particularmente suscetíveis aos efeitos da pandemia de COVID-19 e o comentário na rede social foi inserido justamente em publicação da Prefeitura Municipal do Rio Grande relativa ao início da vacinação na população indígena das aldeias Kaingang e Guarani Mbya”.

Confirmada a materialidade, autoria e dolo, o magistrado julgou procedente a ação condenando o réu a dois anos de reclusão. A pena privativa de liberdade foi substituída por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de cinco salários mínimos. Cabe recurso da decisão ao TRF4.

TRT/RS: Empregado que desenvolveu transtorno de adaptação em razão do trabalho deve ser indenizado

O ambiente de trabalho caótico e desorganizado desencadeou no empregado o transtorno psiquiátrico de adaptação, acarretando afastamento das suas funções. Esse foi o entendimento dos desembargadores da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) ao determinar o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10 mil a um empregado de uma administradora de clínicas odontológicas. Segundo os magistrados, ficou demonstrado no processo que o trabalho foi fator desencadeante da moléstia do trabalhador, dadas as condições em que vinha se desenvolvendo antes do seu afastamento. A decisão reforma sentença da 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

O trabalhador tinha a função de negociador na empresa. Segundo o relato feito no processo, a empregadora enfrentou uma crise que levou ao inadimplemento dos dentistas contratados, ao não pagamento de seus fornecedores e que culminou com o encerramento das atividades. Durante esse período, o empregado acumulou a função de compra de materiais, de gestão operacional e, por fim, a função de recepcionista. Ele precisava lidar com clientes que vinham em busca de tratamentos que foram vendidos por ele e não foram entregues pela clínica odontológica. Entre setembro e dezembro de 2018, afastou-se em benefício previdenciário por acidente de trabalho, em função do transtorno psiquiátrico de adaptação, diagnosticado pelo seu psiquiatra e confirmado pelo perito médico designado no processo.

O juízo de primeiro grau entendeu que não ficou comprovado o ambiente caótico de trabalho, tampouco o fato de que o empregado se sentia culpado pela venda de serviços que não seriam entregues pela empresa. “Não desconhece o juízo que no laudo pericial a principal queixa do autor está centrada justamente nessa culpa por ter vendido planos que a empresa não entrega e não vai entregar, contudo, embora esta alegação tanto ao perito médico como ao perito do INSS, novamente não há prova destas alegações”, declarou a magistrada. Nesse panorama, o pedido foi julgado improcedente.

Descontente, o empregado recorreu ao TRT-4. Ao analisar o caso na 1ª Turma, a relatora do processo, desembargadora Carmen Gonzalez, mencionou como meios de prova do ambiente desorganizado as sucessivas transferências do empregado para outras filiais, devido ao fechamento de unidades, bem como o fato de o autor ter sido encaminhado para tratamento psiquiátrico em agosto de 2018, vindo a fruir benefício previdenciário de setembro a dezembro daquele ano. “É incontroverso que o autor efetivamente esteve acometido de transtorno de adaptação, por conta do que permaneceu afastado do trabalho em benefício previdenciário”, concluiu.

Entretanto, ainda que se reconhecesse a garantia no emprego por ter sido acometido de doença de origem ocupacional, o empregado deixou de retornar ao trabalho após a cessação do benefício previdenciário, motivo pelo qual foi despedido com justa causa por abandono de emprego. A dispensa foi mantida.

Com relação aos danos morais, foi deferida a indenização por conta da doença ocupacional decorrente das deletérias condições de trabalho a que submetido o empregado. “À luz do disposto no art. 944 do novo Código Civil, bem assim o fato de que o trabalho atuou como causa para o desencadeamento da moléstia, o curto período de inatividade do reclamante e o porte econômico da reclamada”, fundamentou a relatora.

A decisão foi tomada por maioria, vencido o desembargador Fabiano Holz Beserra. A desembargadora Rosane Serafini Casa Nova também participou do julgamento. Não cabem mais recursos.

TRF4: Empresa do RS deve pagar contribuições previdenciárias sobre vale-transporte e refeição e plano de saúde

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou pedido de uma empresa de comércio de peças de veículos, sediada em Gravataí (RS), de não pagar as contribuições sociais previdenciárias incidentes sobre os valores que são descontados do salário dos empregados a título de vale-transporte, vale-refeição e planos de saúde e odontológico. A decisão unânime foi proferida pela 1ª Turma em 10/11. O colegiado entendeu que o desconto das quantias correspondentes ao vale-transporte e refeição e convênios de saúde e odontológicos se qualificam como remuneração dos empregados e, assim, devem integrar a base de cálculo das contribuições previdenciárias do empregador.

A ação foi ajuizada em maio de 2022 pela empresa que vende pneus, peças e acessórios para veículos e oferece serviços de manutenção e reparação de automotores. Ela narrou que “paga mensalmente as contribuições sociais previdenciárias patronal, além daquelas destinadas ao custeio dos benefícios concedidos em razão dos riscos ambientais do trabalho (SAT/RAT) e a outras entidades e fundos terceiros (INCRA, SEBRAE, SESC, SENAC, SESCOOP, SEST, SENAT e Salário-Educação)”.

A empresa alegou ter direito de não pagar as contribuições previdenciárias sobre os valores descontados a título de vale-transporte, vale-refeição e de planos de saúde e odontológicos dos empregados. Também pediu à Justiça a restituição das quantias recolhidas nos últimos cinco anos.

A 13ª Vara Federal de Porto Alegre julgou a ação improcedente e a autora recorreu ao TRF4.

A relatora do caso na 1ª Turma, desembargadora Luciane Corrêa Münch, destacou que “a pretensão relaciona-se com os valores descontados da remuneração dos empregados por vale-transporte, vale-refeição e convênios de saúde/odontológico. No entanto, de acordo com a Lei nº 8212/91, que dispõe sobre a organização da Seguridade Social, a base de cálculo das contribuições previdenciárias é o total das remunerações devidas ou creditadas aos segurados empregados”.

Ao negar o recurso, ela concluiu que “o valor descontado do salário do empregado não representa encargo adicional à folha de pagamento do empregador, ou seja, a importância do salário ao qual o trabalhador tem direito não se modifica quando existem descontos correspondentes a sua participação no custeio dos benefícios recebidos. Logo, tratando-se os descontos de vale-transporte, vale-refeição, e convênios de saúde/odontológicos de parcelas da remuneração devida ao empregado, não há sentido em desconsiderá-los da base de cálculo da contribuição previdenciária”.

Processo nº 5027223-59.2022.4.04.7100/TRF

TRF4: Ex-funcionário do Banco do Brasil é condenado por desviar valores de clientes e obter financiamentos mediante fraude

A 7ª Vara Federal de Porto Alegre condenou um ex-funcionário do Banco do Brasil (BB) por peculato e obtenção de financiamento mediante fraude. Ele foi condenado a reparar o dano causado à instituição financeira e recebeu pena de mais de sete anos de reclusão. A sentença foi publicada ontem (22/11).

Autor da ação, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou que, entre novembro/2004 e setembro/2011, o homem teria desviado para ele valores pertencentes aos clientes do BB, valendo-se do cargo de caixa executivo da agência em Condor (RS). Ao atender os correntistas que pretendiam pagar operações de crédito, ele solicitava o cartão da conta e pedia que se inserisse a senha, mas não realizava a operação, entregando ao cliente o recibo do saque como sendo o do pagamento.

Segundo o MPF, o réu ainda teria obtido diversos financiamentos, na modalidade Pronaf, utilizando de terceiros, incluindo parentes, sem o conhecimento dos mutuários.

Em sua defesa, o ex-funcionário negou as acusações. Afirmou que, embora tenha realizado as operações, todas foram feitas com o consentimento e assinatura de um superior. Argumentou ainda que o valor de clientes com pagamento antecipado ia para a conta interna e quitava outros clientes devedores.

Ao analisar as provas juntadas ao processo, o juízo pontuou que as irregularidades foram apuradas em auditoria interna a partir das reclamações de clientes, que identificou o réu como responsável pelas transações. Ficou evidente que ele, ao invés de liquidar as operações de crédito rural com o valor fornecido pelos correntistas, sacava e se apropriava dos valores e deixava os clientes com a dívida em aberto.

A 7ª Vara Federal concluiu que a materialidade, autoria e dolo foram comprovados e condenou o réu pelos crimes de obtenção de financiamento em instituição financeira mediante fraude em 26 oportunidades e peculato em 11. Ele recebeu pena de sete anos e 13 dias de reclusão e deverá reparar o dano causado em mais de R$ 404 mil.

TRT/RS: Empregada de limpeza que desenvolveu alergia respiratória sem nexo com sua atividade não deve ser indenizada

Uma empregada que trabalhava com limpeza pesada alegou no processo ter adquirido alergia grave pelo contato com o produto de higienização hipoclorito e, em decorrência, pediu uma indenização por danos morais e materiais. Os desembargadores da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) acolheram o laudo pericial que atestou que a enfermidade não possui relação com o trabalho, no mesmo sentido da sentença proferida pelo juiz Silvonei do Carmo, da 2ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves. Por conseguinte, os pedidos da trabalhadora foram julgados improcedentes.

De acordo com o processo, a empregada, após realizar limpeza com hipoclorito, passou a apresentar congestionamento nasal. Com o passar dos dias, os sintomas foram ficando mais graves, tais como diarreia, tosse, coriza e febre. Ela foi diagnosticada como portadora de alergia não especificada grave, cujo gatilho teria sido a exposição ao agente de limpeza. No entanto, de acordo com o laudo pericial médico realizado no processo, a alergia não possui nenhuma relação com o trabalho. Segundo a perita médica, a causa da moléstia são fatores próprios da trabalhadora, tal como o quadro de rinite alérgica crônica que apresenta.

A decisão de primeiro grau acolheu as conclusões periciais. De acordo com o magistrado, “frente ao resultado da perícia médica e não havendo nos autos elementos técnicos capazes de elidir a conclusão pericial, não é possível reconhecer que a patologia que acomete a reclamante possui origem ocupacional”. Nesse panorama, o pedido foi julgado improcedente.

A trabalhadora recorreu ao TRT-4. Para a relatora do caso na 1ª Turma, desembargadora Rosane Serafini Casa Nova, nos casos de responsabilidade subjetiva, o dever de indenizar o acidente de trabalho (ou a doença equiparada) decorre da conduta do empregador no cumprimento das normas de segurança do trabalho e de seu dever geral de cautela, que de alguma forma tenha concorrido no resultado do evento. “A dedução indenizatória exige, portanto, a comprovação do dano, do nexo de causalidade entre o fato e o efetivo prejuízo, assim como da conduta dolosa ou culposa (negligência, imprudência ou imperícia) do empregador”. No caso do processo, segundo a magistrada, não ficou comprovada a existência de nexo causal ou concausal entre as atividades e a doença. Nesse sentido, os desembargadores negaram provimento ao recurso da empregada, mantendo a sentença de improcedência.

A decisão foi unânime no colegiado. Também participaram do julgamento a desembargadora Carmen Gonzalez e o desembargador Fabiano Holz Beserra. A decisão transitou em julgado sem interposição de recurso.

STJ: Existência de testamento não impede inventário extrajudicial se os herdeiros são capazes e concordes

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, mesmo havendo testamento, é admissível a realização de inventário e partilha por escritura pública, na hipótese em que todos os herdeiros são capazes e concordes.

O colegiado destacou que a legislação contemporânea tem reservado a via judicial apenas para hipóteses em que há litígio entre os herdeiros ou algum deles é incapaz.

No caso dos autos, foi requerida a homologação judicial de uma partilha realizada extrajudicialmente, com a concordância de todas as herdeiras. Nessa oportunidade, foi informado que o testamento havia sido registrado judicialmente.

Instâncias ordinárias aplicaram a literalidade do dispositivo
O juízo de primeira instância negou o pedido de homologação sob o argumento de que, havendo testamento, deve ser feito o inventário judicial, conforme previsto expressamente no artigo 610, caput, do Código de Processo Civil (CPC), não podendo ser substituído pela simples homologação de partilha extrajudicial. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS).

No recurso dirigido ao STJ, sustentou-se que as herdeiras são capazes e concordes, por isso o inventário e a partilha poderiam ser feitos por escritura pública, nos moldes do artigo 610, parágrafo 1º, do CPC. Também foi assinalado que existem precedentes do próprio STJ e de outros tribunais que autorizam o inventário extrajudicial.

Interpretação moderna visa à desjudicialização
A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou em sua decisão que o caso exige uma interpretação teleológica e sistemática dos dispositivos legais, para se chegar a uma solução mais adequada, e mencionou precedente da Quarta Turma que autorizou a realização de inventário extrajudicial em situação semelhante (REsp 1.808.767).

Segundo ela, a exposição de motivos do projeto de lei que criou a possibilidade de inventários extrajudiciais no Brasil revela que o legislador teve a preocupação de impedir a sua prática quando houvesse testamento em razão da potencial existência de conflitos.

No entanto, para a relatora, “a exposição de motivos reforça a tese de que haverá a necessidade de inventário judicial sempre que houver testamento, salvo quando os herdeiros sejam capazes e concordes, justamente porque a capacidade para transigir e a inexistência de conflito entre os herdeiros derruem inteiramente as razões expostas pelo legislador”.

A ministra observou que a tendência contemporânea da legislação é estimular a autonomia da vontade, a desjudicialização dos conflitos e a adoção de métodos adequados de resolução das controvérsias, ficando reservada a via judicial apenas para os casos de conflito entre os herdeiros. Ela destacou os artigos 2.015 e 2.016 do Código Civil como exemplos dessa tendência.

“Sendo os herdeiros capazes e concordes, não há óbice ao inventário extrajudicial, ainda que haja testamento”, concluiu Nancy Andrighi.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 1951456

TRF4: Empresa de vinhos não é obrigada a contratar químico

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou apelação do Conselho Regional de Química da 5ª Região (CRQ/RS) e manteve decisão que liberou uma empresa produtora de vinhos de Caxias do Sul (RS) de pagar multa. Segundo a decisão, proferida pela 4ª Turma no dia 11/11, a fabricação a granel ou envaze de vinhos não se situa na área da química.

O CRQ apelou ao tribunal após a 4ª Vara Federal de Caxias do Sul julgar procedente o pedido de embargos à execução de dívida impetrado pela empresa. O conselho alegava que, tendo a pessoa jurídica se registrado voluntariamente, passava a ter a obrigação de adimplir a anuidade.

A 4ª Turma, entretanto, manteve a decisão de primeira instância. Segundo a relatora, desembargadora Vivian Josete Pantaleão Caminha, o fato gerador da dívida questionada judicialmente não foi o não pagamento de anuidade, mas multa pela falta de um profissional de química na empresa.

“Não comporta acolhimento a argumentação pertinente ao registro voluntário, tendo em vista que os embargos à execução dizem respeito à multa e não à cobrança de anuidades referentes a um período em que o apelado teria se registrado voluntariamente no Conselho de Química”, afirmou Caminha.

Quanto à causa da multa, a desembargadora observou: “não estando a atividade principal da empresa ligada à área da química, não há obrigatoriedade de inscrição do Conselho e de contratação de profissional da área. Logo, indevida a cobrança de anotação de função técnica (AFT)”.

Processo nº 5004588-97.2021.4.04.7107/TRF

TRF4: Improbidade administrativa para professor que recebia remuneração de dois serviços ao mesmo tempo

A 2ª Vara Federal de Pelotas (RS) condenou um professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (IFSul) por improbidade administrativa. Ele foi acusado de atuar como professor de cursinho preparatório ao vestibular enquanto recebia dedicação exclusiva da universidade. A sentença, publicada no dia 10/11, é do juiz Cristiano Bauer Sica Diniz.

O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação narrando que o professor, desde 2008, desenvolveu atividades paralelas em diversos cursos preparatórios que são incompatíveis com o regime que se submeteu na IFSul. Alegou ainda que ele praticou atos atentatórios aos princípios que regem a administração pública ao se envolver com suas alunas da instituição universitária.

Em sua defesa, o professor sustentou não haver relação hierárquica com a aluna indicada pelo autor. Em relação ao regime de dedicação exclusiva, afirmou que não recebe mais desde abril de 2018.

Ao analisar o caso, o magistrado pontuou que a Lei de Improbidade Administrativa sofreu profundas alterações com a edição da Lei 14.230/2021, entre elas que a caracterização do ato que importe em violação dos princípios norteadores administração pública passou a ter rol taxativo. Nas hipóteses descritas na norma, não se encontra a conduta narrada pelo MPF relativa ao envolvimento do professor com alunas.

O juiz passou então a examinar o conjunto probatório anexado ao processo para concluir se houve ou não enriquecimento ilícito decorrente da violação do regime de dedicação exclusiva, pois apontou que este regime não impede a atuação de docentes em atividades alheias à instituição de ensino, como participar, de forma esporádica, de palestras, conferências e atividades artísticas e culturais, desde que observado procedimento interno de cada instituição e mediante autorização específica.

“No caso dos autos, contudo, a prova é contundente quanto à efetiva violação das restrições impostas pelo referido regime, seja porque as atividades desenvolvidas pelo réu não eram esporádicas, seja porque ocorreram à revelia da instituição de ensino com a qual o réu mantinha vínculo estatutário”, afirmou.

Diniz julgou parcialmente procedente a ação condenando o professor pela prática de ato de improbidade administrativa a pena de perda dos valores indevidamente recebidos a título de retribuição por dedicação exclusiva, que será verificada no cumprimento de sentença. Ele também pagará multa civil equivalente ao valor acréscimo patrimonial. Cabe recurso da decisão ao TRF4.

TRT/RS: Servidor de autarquia municipal despedido por justa causa por motivos políticos deve ser indenizado

A 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) determinou o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil a um servidor de um município do Rio Grande do Sul despedido por justa causa por motivos políticos. Ele também deve receber os salários do período em que ficou afastado após a despedida, já que uma decisão em mandado de segurança da 1ª Seção de Dissídios Individuais do Tribunal já havia determinado a reintegração ao serviço. A decisão da 7ª Turma quanto às indenizações confirma sentença do juiz Jorge Fernando Xavier de Lima, da 2ª Vara do Trabalho de Bagé.

De acordo com informações do processo, o trabalhador é concursado do departamento de água e esgoto do município desde 2005. Em 2017, após uma transferência que o servidor considerou indevida e motivada por posicionamentos políticos, foi aberto um Processo Administrativo Disciplinar para apurar a veracidade de uma gravação feita pelo próprio trabalhador junto a dirigentes da autarquia, que comprovaria a perseguição alegada. O referido PAD concluiu que a gravação era verdadeira e poderia ser considerada prova lícita.

No entanto, em 2018, o servidor acabou despedido por justa causa, por um motivo diferente do objeto do PAD, qual seja, a participação, durante o horário de trabalho, em uma sessão da Câmara de Vereadores da cidade em que se discutiu um Projeto de Lei que regulamentaria cargos em comissão da autarquia. A opinião do servidor era contrária ao projeto e ele foi acusado de deslealdade com o órgão, o que motivou a despedida por justa causa.

Em processo ajuizado pelo trabalhador após a dispensa motivada, a justa causa foi julgada nula também pela 7ª Turma do TRT-4. Na ocasião, a relatora do caso no colegiado, desembargadora Denise Pacheco, considerou comprovada a perseguição política ao servidor, já que foram acrescidos fatos novos ao PAD para embasar a despedida. Além disso, segundo a desembargadora, o fato do servidor ter opinião e atuar politicamente de forma contrária ao referido Projeto de Lei não poderia ser considerado um ato de deslealdade, já que o posicionamento político é um direito acessível a qualquer cidadão.

Ao ajuizar uma segunda ação para cobrar as indenizações, o trabalhador afirmou ter sido alvo de chacotas públicas após ser dispensado por justa causa. Conforme as alegações, servidores comissionados da autarquia teriam divulgado piadas em redes sociais mencionando o fato e fazendo alusões pejorativas ao seu sobrenome. Também afirmou que o próprio prefeito do município teria feito referências ao ocorrido durante uma audiência pública. Diante disso, pleiteou a indenização por danos morais e também por danos materiais, pelo período em que ficou sem receber salários, entre novembro de 2018 e abril de 2019.

Na sentença, o juiz de Bagé entendeu que as alegações do trabalhador foram verídicas, já que a prova testemunhal confirmou as piadas e a menção por parte do prefeito. “A mera cobrança de posturas, quando ordinária, sem caráter de perseguição/discriminação (dirigidas a todos), de forma respeitosa, insere-se no poder de direção do empregador”, argumentou o magistrado. “Mas configura abuso de direito (do exercício regular do direito – poder diretivo) quando essa cobrança, na forma como efetuada, busca o prejuízo e a humilhação do empregado ou coloca este em situação vexatória, como no caso”, concluiu.

Diante desse entendimento, a autarquia apresentou recurso ao TRT-4. Segundo o relator do caso na 7ª Turma, desembargador João Pedro Silvestrin, “A situação fática revela, de maneira inconteste, que o reclamante sofreu perseguição por parte do reclamado em decorrência de divergências políticas. Assim, comprovada a abusividade da administração pública na rescisão do contrato de trabalho do reclamante, bem como os danos causados à sua honra e imagem, lhe é devida indenização por danos morai”.

A conclusão foi seguida por unanimidade pelos demais integrantes do colegiado. Também participaram do julgamento a desembargadora Denise Pacheco e o desembargador Emílio Papaléo Zin. Ainda cabem recursos.


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