STJ: Mesmo sob investigação, advogado não pode violar sigilo profissional e fazer acordo de colaboração premiada

Por maioria, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é inadmissível a prova proveniente de acordo de colaboração premiada firmado com violação do sigilo profissional de advogado. Com esse entendimento, o colegiado anulou a colaboração do advogado Sacha Reck, bem como as provas e as denúncias dela decorrentes, em ação penal contra a empresa de transportes coletivos Pérola do Oeste, para a qual o advogado trabalhava.

Segundo o processo, a empresa foi alvo de investigação do Ministério Público do Paraná (MPPR), instaurada com o objetivo de apurar a existência de associação criminosa formada para fraudar licitações de concessão do serviço público de transporte no estado.

O advogado Sacha Breckenfeld Reck, um dos investigados, acabou celebrando acordo com o MPPR, depois de ser denunciado e preso em 1º de julho de 2016. O acordo foi feito entre os dias 6 de julho e 8 de agosto de 2016 e deu suporte a novas investigações, bem como a um aditamento da denúncia em março de 2017. Foram adicionados à denúncia os nomes de dois ex-administradores da empresa, os quais recorreram ao STJ para anular a colaboração do advogado.

Para o relator do caso, ministro Sebastião Reis Junior, o advogado não poderia ter quebrado o seu sigilo profissional. “Esse ônus do advogado não pode ser superado mesmo quando investigado, sob pena de se colocar em fragilidade o amplo direito de defesa”, ponderou.

Delatados podem questionar legalidade do acordo de colaboração
O ministro explicou que, atualmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) admite a possibilidade de terceiros, como os delatados, questionarem a validade do acordo de colaboração premiada. Para o ministro, ainda que haja precedentes em sentido contrário, não há razão para não permitir que os delatados questionem a legitimidade desse tipo de acordo.

“A partir do momento em que sua esfera jurídica foi afetada pelo teor da delação, é evidente a sua legitimidade para questionar esse acordo, que, de forma negativa, afeta direitos seus”, disse o ministro. Ele acrescentou que, uma vez constatada a ilegalidade do acordo, as provas decorrentes devem ser invalidadas.

Sigilo profissional não pode ser violado pelo advogado para atenuar a própria pena
Segundo o relator, a quebra do sigilo profissional do advogado para atenuar a sua própria pena, em processo no qual ele e o cliente figuram como investigados, não está autorizada pelo Código de Ética da Advocacia. Sebastião Reis Junior destacou que o artigo 25 admite essa possibilidade apenas em caso de grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado for afrontado pelo cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo – porém, sempre restrito ao interesse da causa.

A confissão de um crime, alertou o ministro, com a indicação das informações previstas no artigo 4º da Lei 1.2850/2013, não se inclui entre essas hipóteses. “Ao delatar, o advogado que oferece informações obtidas exclusivamente em razão de sua atuação profissional não está defendendo sua vida ou a de terceiros; nem sua honra (afinal, confessa não só um crime como a sua participação em organização criminosa); nem está agindo em razão de afronta do próprio cliente (ao contrário), nem em defesa própria (não está usando as informações sigilosas para se defender, para provar sua inocência em razão de acusação sofrida, mas sim para atenuar sua pena)”, afirmou.

O ministro lembrou decisão recente da Quinta Turma que, em caso semelhante, entendeu pela ilegalidade da conduta de um advogado que, mesmo sem ser alvo de investigação, delatou a empresa para a qual prestou serviços. Naquele julgamento, o relator, ministro João Otávio de Noronha, ressaltou que “o sigilo profissional do advogado é premissa fundamental para o exercício efetivo do direito de defesa e para a relação de confiança entre defensor técnico e cliente”.

Possibilidade de delatar quando o advogado também integra organização criminosa
O ministro Rogerio Schietti Cruz, que ficou vencido no julgamento, apresentou voto divergente em que afirmou que é necessário dividir a conduta do colaborador em dois momentos: o primeiro abrange o período entre sua contratação e os fatos descritos na acusação, no qual não há notícia de atuação antiética ou delituosa; e o segundo abrange o período descrito na denúncia, no qual teria havido sua incorporação à organização criminosa para dar aparência de legalidade aos procedimentos jurídicos entabulados na contratação.

“Nessa perspectiva, penso que a proteção do sigilo profissional não alcança o período descrito na denúncia, em que haveria a participação ativa do insurgente [o advogado] na suposta organização criminosa”, disse. Na sua avaliação, o sigilo de algumas profissões “não pode servir de escudo para acobertar a prática de crimes por profissionais que detenham esse dever, impedindo-os de confessar, delatar ou mesmo colaborar com o Estado para revelar o cenário criminoso de que não apenas tiveram conhecimento, mas também efetivamente participaram”.

Veja o voto do ministro Sebastião Reis Junior, relator, no RHC 179.805.
veja o voto divergente do ministro Rogerio Schietti Cruz.
Processo: RHC 179805

TRF4: Caixa é condenada a indenizar cliente transgênero e incluir novo nome de registro em serviços e produtos

A Justiça Federal do Paraná condenou a Caixa Econômica Federal (CEF) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) a um cliente transgênero pela não utilização do novo nome de registro nos serviços prestados. A decisão é da juíza federal Marta Ribeiro Pacheco, da 1ª Vara Federal de Guarapuava.

O autor afirmou que realizou a alteração de seu nome e gênero no registro civil em 2021, adotando novo nome de registro em todas as suas documentações. Alegou que se deslocou presencialmente até a agência da Caixa para que o banco atualizasse os dados de modo a se adequar a sua realidade, tendo sido informado que a alteração havia ocorrido. No entanto, relatou que seu antigo nome de registro continuava sendo apresentado em todos os ambientes de atendimento do banco como aplicativos, transferências e PIX.

Por possuir uma micro empresa individual de promoção de vendas, a cada transferência recebida ou realizada, o autor era obrigado a explicar a situação para os clientes, que em certos casos apresentavam resistência pela diferença no nome na prestação do serviço e no momento do pagamento, gerando constrangimentos para o autor. Nas várias tentativas para solucionar o problema, o autor era informado que a atualização cadastral de seu nome social havia sido efetuada, e que a Caixa não poderia fazer mais nada em relação ao assunto.

Em sua decisão, a juíza federal ressaltou que o direito a alteração do nome e do gênero da pessoa encontra-se amparado pelo ordenamento jurídico e implica, consequentemente, no dever das instituições educacionais, de saúde, bancárias, entre outras, a atualização de seus cadastros, sendo inadmissível qualquer oposição.

A magistrada considerou que a situação relatada trouxe mais do que meros incômodos ao autor. “Não há dúvidas quanto aos fatos, seja acerca da alteração do nome e gênero, seja a exposição perante terceiros, por pelo menos 7 meses, cujos comprovantes das transações são gerados também para o recebedor. O abalo moral se dá in re ipsa, isto é, presumido, pois decorre do próprio fato. Nestes termos, é inegável o dever de indenizar”, afirmou Marta Ribeiro Pacheco.

A juíza federal cita uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em uma caso de uso de nome social por aluno em escola, entendendo que é inadmissível a violação ao direito fundamental à igualdade. “Sendo assim, os fatos narrados nos autos, foram corroborados no curso do processo e mostram-se suficientes para gerar abalo severo, a ponto de criar situações de constrangimento, humilhação ou degradação e reconheço a necessidade de indenização por dano moral em favor do autor”, complementou.

A sentença determinou ainda que a Caixa realize as alterações do nome/gênero do autor em todos os cadastros/sistemas com a instituição, inclusive no sistema PIX e no aplicativo CaixaTem.

TRF1: Justiça Federal deverá analisar novamente ação popular para julgar lesão a patrimônio público em Almirante Tamandaré/PR

A Justiça Federal no Distrito Federal deverá analisar novamente uma ação popular para decidir se a Agência Nacional de Mineração (antigo Departamento Nacional de Exploração Mineral) prejudicou o patrimônio público do município de Almirante Tamandaré/PR quando deixou de cobrar, de uma empresa de água, coleta e tratamento de esgoto, a Contribuição Financeira de Exploração Mineral (CFEM).

Essa decisão foi tomada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) que acompanhou, de forma unânime, o voto do relator, desembargador federal Novély Vilanova.

Sobre a Contribuição Financeira de Exploração Mineral

A Contribuição Financeira de Exploração Mineral está prevista na Constituição Federal (art. 20, §1º).

Essa contribuição é assegurada à União, aos Estados, aos Distrito Federal e aos Municípios sempre que é feita a exploração de petróleo, de gás natural, de recursos hídricos (para fins de geração de energia elétrica) e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva.

Segundo informações do site da Agência Nacional de Mineração, quem paga por essa contribuição são as seguintes pessoas jurídicas ou físicas:

1 – O titular de direitos minerários que exerça a atividade de mineração;

2 – O primeiro adquirente de bem mineral extraído sob o regime de permissão de lavra garimpeira;

3 – O adquirente de bens minerais arrematados em hasta pública e

4 – A pessoa que exerça, a título oneroso ou gratuito, a atividade de exploração de recursos minerais com base nos direitos do titular original.

Somente a Agência Nacional de Mineração (ANM) está autorizada a cobrar esse valor dos responsáveis pela exploração.

O caso concreto

Segundo informações do processo, uma empresa teria explorado recursos na região do município de Almirante Tamandaré, no estado do Paraná/PR. Embora sob essa exploração fosse devida à cobrança da CFEM, a ANM não teria cobrado a empresa a tempo.

Pela omissão, o Poder Judiciário posteriormente pronunciou a prescrição/decadência de ação judicial que foi proposta por essa empresa. Com isso, o município ficou privado de receber a parcela da contribuição.

Foi então que a autora ingressou com ação popular para tentar conseguir a condenação da ANM a pagar indenização correspondente às receitas que seriam devidas ao município de Almirante Tamandaré. Nos argumentos da ação popular foi destacado que, por não ter recebido os valores referentes à contribuição, foram perdidos milhares de reais que serviriam para mitigar impactos ambientais e de saúde provenientes da exploração mineral.

No entanto, o Juízo do caso na primeira instância havia entendido que a questão não poderia ser resolvida por meio de uma ação popular – assim, ele negou o pedido de analisar a lesão ao patrimônio público e extinguiu o processo sem resolver o mérito por inadequação da via eleita. Para a magistrada, a ação popular somente poderia anular atos que tenham acontecido e não aqueles que não ocorreram (no caso, a falta de cobrança).

Mas o TRF1 corrigiu o entendimento dessa decisão esclarecendo que a ação popular também pode ser admitida na Justiça como via para julgar as “omissões lesivas”, ou seja, aqueles atos que, por não terem sido realizados por quem tinha a obrigação de fazê-los, prejudicaram o patrimônio público.

Assim, a 8ª Turma do Tribunal determinou que a sentença fosse anulada e o mérito da questão julgado pelo Juízo no Distrito Federal.

Processo nº 1012062-45.2018.4.01.3400

TST: Capataz ferido em briga de touros tem direito a indenização

O manejo de animais de grande porte é considerado atividade de risco.


A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou um agropecuarista de Umuarama (PR) a indenizar em R$ 25 mil um capataz vítima de acidente de trabalho envolvendo touros da fazenda. A decisão segue o entendimento de que o manejo rural de animais de grande porte envolve riscos maiores em relação à média das demais atividades, acarretando a responsabilidade do empregador por eventuais acidentes.

Porteira atingiu rosto do capataz e gerou sequelas
Na reclamação trabalhista, o capataz disse que a propriedade tinha cerca de 1.100 cabeças de gado sob sua responsabilidade. O acidente ocorreu em novembro de 2018, quando ele trabalhava sozinho manejando o gado de um pasto para outro a cavalo.

Nesse processo, os touros começaram a brigar e, ao baterem na porteira entre os dois pastos, o capataz foi atingido no rosto. Com o choque da madeira, ele ficou desmaiado até retornar sua consciência e buscar ajuda. O arame que fechava a porteira enrolou em sua mão, fraturando dedos da mão esquerda. Ainda segundo seu relato, os dedos perderam a mobilidade e o nariz “ficou nitidamente torto” e só voltaria ao lugar por cirurgia não coberta pelo SUS.

O agropecuarista, por sua vez, atribuiu o acidente ao próprio trabalhador, que teria sido imprudente ao fechar a porteira e desmontar do cavalo próximo ao gado. Segundo ele, não haveria equipamento de segurança que pudesse evitar o acidente, que jamais teria ocorrido se não fosse pelo ato inseguro praticado pelo empregado, “que negligenciou seu dever de segurança”.

Pedido de indenização foi negado pelo TRT
O juízo da Vara do Trabalho de Paranavaí julgou procedente o pedido de indenização. De acordo com a sentença, touros são “animais temperamentais e imprevisíveis”, e seu manejo representa riscos excepcionais de acidentes.

Contudo, o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) reformou a sentença, por achar que não houve relação entre o dano sofrido pelo capataz e algum ato do empregador. Na avaliação do TRT, o acidente ocorreu por razões circunstanciais, alheias à vontade e às determinações do pecuarista, que não poderia ser responsabilizado por ele.

Atividade de risco implica responsabilização
No TST, o entendimento foi outro. Segundo o ministro Alberto Balazeiro, relator do recurso de revista do capataz, ele sofreu lesões materiais, estéticas e teve o seu direito de personalidade atingido. O ministro lembrou que o TST, em casos semelhantes, tem enquadrado as atividades de vaqueiro em manejo de grandes animais como de risco, o que afasta a necessidade de demonstração de culpa para fins da responsabilização do empregador.

A decisão foi unânime.

Veja o acórdão.
Processo: RR-1705-26.2019.5.09.0023

TRF4: INSS deve retomar pagamento de benefício assistencial à pessoa que sofre de paralisia cerebral

A Justiça Federal condenou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ao restabelecimento do benefício assistencial à pessoa com paralisia cerebral. A mulher vive em Ponta Grossa (PR) e necessita de cuidados especiais e diários de sua irmã. Na decisão do juiz federal Fabrício Bittencourt da Cruz, da 4ª Vara Federal da cidade, contrária à suspensão do Benefício de Prestação Continuada (BPC), destacou-se que o ponto controverso é a situação socioeconômica da parte autora.

A autora da ação informou que pelos requisitos autorizadores – deficiência e miserabilidade – obteve a concessão do Benefício de Assistência de Prestação Continuada (BPC) em 1997, uma vez que sua paralisia é incurável. Explicou que o benefício foi injustamente cessado pela autarquia em 30 de novembro de 2018, pelo motivo ‘ausência da prova de vida’, descrevendo erro administrativo, pois à época foi até uma agência para realizar a prova.

Reiterou ainda em sua inicial que o INSS atuou em imenso desrespeito, assegurando que a prova de vida seria suficiente quando se apresentou e, mesmo assim, o instituto previdenciário omitiu a informação no sistema, o que resultou no injusto cancelamento do benefício.

Ao analisar o caso, o juiz federal destacou que o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, está patente a partir da verificação das condições socioeconômicas da mulher. O magistrado ressaltou que é possível a concessão de antecipação de tutela por ocasião de sentença concessiva de benefício, privilegiando-se, assim, “o direito provável do requerente em detrimento do direito improvável do INSS, dividindo-se os ônus da demora do processo entre as partes”.

“Ainda, a implantação do benefício não é medida material ou juridicamente irreversível, sendo, ao contrário, irreversível ao requerente o sofrimento de não poder garantir sua sobrevivência. Afirmada a probabilidade do direito, a antecipação de tutela propicia maior dignidade, diminuição do desconforto, melhoria da expectativa de vida, cura de doenças e a segurança de sobrevivência, bens jurídicos de maior relevância e urgência do que os interesses do INSS ora em jogo”, complementou.

“Assim, considerando os argumentos expostos, concedo a antecipação de tutela a fim de que seja implantado o benefício à parte autora imediatamente”. O montante devido pelo INSS corresponde às parcelas devidas, mês a mês, a partir da data de cessação do benefício, sendo que o valor deve ser corrigido com juros desde a data de sua cessação.

TST: Justiça do Trabalho deve julgar ação sobre homicídio de ex-empregado dentro de madeireira

Para o TST, a questão está diretamente ligada ao trabalho.


A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que a Justiça do Trabalho tem competência para julgar uma ação de indenização por danos morais em razão do homicídio de um ex-empregado ocorrido três meses após o seu desligamento dentro das instalações de uma madeireira em Campina Grande do Sul (PR). Para o colegiado, ficou claro que o episódio, motivado por conhecida rixa entre colegas, teve origem durante a relação de emprego sem que a empresa tivesse tomado medidas para evitar a situação.

Estrangulamento
O autor do homicídio e a vítima haviam sido colegas de trabalho da Bublitz, Bublitz & Cia Ltda. O crime ocorreu durante um jantar no alojamento, em que os dois discutiram e a vítima teria sido alvo de uma marmita arremessada contra ele. De acordo com testemunha, na mesma noite, o colega teria ameaçado a vítima com uma faca, enquanto este estava visivelmente embriagado. Segundo relatos, ele teria sido levado para uma cama do alojamento e, na manhã do dia seguinte, foi encontrado morto, vítima de enforcamento. A suspeita é que o colega teria se aproveitado dessa situação de vulnerabilidade para asfixiá-lo até a morte.

Ação rescisória
A empresa foi condenada a pagar R$ 50 mil de indenização para cada uma das duas filhas do ex-funcionário falecido. Na ação rescisória, a Bublitz tentou anular a decisão definitiva da condenação, argumentando que, no momento do homicídio, a vítima já não era mais sua empregada, e sua presença no alojamento não estava relacionada ao vínculo de trabalho anterior.

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) julgou improcedente a ação rescisória, levando a empresa a recorrer ao TST.

Competência
A relatora, ministra Liana Chaib, observou que os detalhes narrados na sentença demonstram que a morte resultou de uma animosidade entre colegas surgida durante o contrato de trabalho da vítima e que poderia ter sido evitada pela empresa. Isso se deve ao fato de que um dos sócios estava presente durante a discussão entre os dois na noite do homicídio e, mesmo sabendo do histórico de conflito entre eles, permitiu que o ex-funcionário, desacordado e vulnerável, passasse a noite no mesmo local em que o agressor.

Lesão pós-contratual
Para a ministra, a vinculação direta entre o episódio e o contrato de trabalho era clara porque, sem essa relação de trabalho anterior, nenhum dos eventos subsequentes teria ocorrido. Assim, a Justiça do Trabalho é competente para julgar o caso, porque os efeitos do contrato se estendem para além do seu término, tratando-se de lesão pós-contratual.

Ficaram vencidos os ministros Amaury Rodrigues Pinto Junior, Sergio Pinto Martins e a ministra Morgana de Almeida Richa.

Processo: ROT-479-50.2022.5.09.0000

TRF4: INSS é condenado a conceder benefício de auxílio-acidente após cessar auxílio-doença

A Justiça Federal determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conceda auxílio-acidente a um morador de Umuarama (PR) desde a cessação do auxílio-doença pago em virtude de acidente de trânsito. A decisão é do juiz federal Pedro Pimenta Bossi, da 3ª Vara Federal de Umuarama/PR.

O autor da ação é beneficiário do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e, em março de 2022, sofreu um acidente de trânsito que resultou em fratura de fêmur. Requereu junto ao INSS a concessão de benefício, sendo deferido o auxílio-doença em 27/03/2022 até 28/02/2023. Entretanto, alegou que após parar de receber o benefício, permaneceu com a redução de sua capacidade laboral e que a concessão do auxílio-acidente em data imediatamente posterior ao término do auxílio-doença deveria ter acontecido de maneira automática pela via administrativa, mas não aconteceu.

Ao analisar o caso, o juiz federal citou julgamento do Superior Tribunal de Justiça que definiu algumas diretrizes para a concessão do benefício: será devido o auxílio-acidente quando demonstrado o nexo de causalidade entre a redução de natureza permanente da capacidade laborativa e a atividade profissional desenvolvida, sendo irrelevante a possibilidade de reversibilidade da doença. Sendo assim, o STJ firmou a seguinte tese: exige-se, para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão.

“No caso concreto, o perito judicial relatou que o autor sofreu acidente de automóvel em 11.03.2022, com fratura exposta do fêmur direito. Na época exercia a função de motorista de empresa de engenharia elétrica. Foi submetido a procedimento cirúrgico, fíbula com tratamento conservador. Houve incapacidade pelo período de 10 a 12 meses, mas após sequelas estavam consolidadas, com redução aproximada de 25% da funcionalidade pois há dificuldade para caminhadas, permanência em pé, carregar peso e subir escadas”, destacou Pedro Pimenta Bossi.

O magistrado complementou ainda que para o período de incapacidade total já houve cobertura previdenciária, haja vista o autor ter recebido auxílio-doença.

“A qualidade de segurado e o período de carência estão cumpridos, porquanto o autor usufruiu de auxílio-doença até 28.02.2023, além de manter vínculo como segurada empregada. Portanto, o autor faz jus à conversão em auxílio-acidente, nos termos acima expendidos”.

O juiz finalizou sua sentença reiterando que o INSS deve pagar as prestações vencidas do benefício entre a data de início do benefício (DIB) e a Data do Início dos Pagamentos (DIP) devidamente corrigidas.

STJ: Segurado que se obrigou a manter ex-esposa em seguro de vida por acordo judicial não pode retirá-la unilateralmente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou nula a alteração de beneficiária de seguro de vida em grupo realizada por segurado que se obrigou, em acordo de divórcio homologado judicialmente, a manter a ex-esposa como única favorecida do contrato. Para o colegiado, ao se comprometer a manter a ex-mulher como beneficiária, o segurado renunciou à faculdade de livre modificação da lista de agraciados e garantiu a ela o direito condicional (em caso de morte) de receber o capital contratado.

No mesmo julgamento, o colegiado entendeu que o pagamento feito a credores putativos – ou seja, credores aparentes – não poderia ser reconhecido no caso dos autos, pois a seguradora agiu de forma negligente ao não tomar o cuidado de verificar quem, de fato, tinha direito a receber o benefício.

Na origem, a mulher ajuizou ação contra a seguradora para anular a nomeação dos beneficiários de seguro de vida deixado por seu ex-marido falecido, que refez a apólice após o segundo casamento e a excluiu da relação de favorecidos. No processo, a ex-esposa provou que fez um acordo judicial de divórcio com o segurado, em que constava que a mulher seria a única beneficiária do seguro de vida em grupo ao qual ele havia aderido.

O juízo de primeiro grau julgou improcedente a ação por considerar que a seguradora agiu de boa-fé ao pagar a indenização securitária aos beneficiários registrados na apólice, de modo que não poderia ser responsabilizada pela conduta do segurado. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), entretanto, reformou a sentença e determinou que a ex-esposa recebesse a indenização sob o fundamento de que a estipulação feita no acordo de divórcio tornava ilícita a exclusão da mulher como beneficiária do seguro.

Ao STJ, a seguradora alegou que o pagamento feito por terceiro de boa-fé a credor putativo é válido. Dessa forma, argumentou, ela não poderia ser responsabilizada por seguir o disposto na apólice, em situação de aparente legalidade.

Segurado desrespeitou direito garantido à ex-esposa
Segundo o relator do caso, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o artigo 791 do Código Civil permite a substituição de beneficiários do contrato de seguro de vida pelo segurado, a menos que a indicação esteja vinculada à garantia de alguma obrigação ou o próprio segurado tenha renunciado a tal faculdade.

Nesse contexto, apontou, se o segurado abrir mão do direito de substituição do beneficiário, ou se a indicação não for feita a título gratuito, o favorecido deve permanecer o mesmo durante toda a vigência do seguro de vida. Segundo explicou o relator, nessa situação, o beneficiário “não é detentor de mera expectativa de direito, mas, sim, possuidor do direito condicional de receber o capital contratado, que se concretizará sobrevindo a morte do segurado”.

No caso dos autos, em razão do acordo homologado pela Justiça em que havia obrigação de manter a ex-esposa como beneficiária exclusiva do seguro de vida, o ministro Cueva entendeu que “o segurado, ao não ter observado a restrição que se impôs à liberdade de indicação e de alteração do beneficiário no contrato de seguro de vida, acabou por desrespeitar o direito condicional da ex-esposa, sendo nula a nomeação na apólice feita em inobservância à renúncia a tal faculdade”, observou.

Devedor deve demonstrar boa-fé e postura diligente
Em relação ao pagamento feito aos credores que aparentemente teriam direito ao crédito (credores putativos), Villas Bôas Cueva destacou que sua validade depende da demonstração da boa-fé objetiva do devedor. Dessa forma, segundo ele, seria necessária a existência de elementos suficientes para que o terceiro tenha sido induzido a acreditar que a pessoa que se apresenta para receber determinado valor é, de fato, o verdadeiro credor.

Por outro lado, o relator ressaltou que a negligência ou a má-fé do devedor tem como consequência o duplo pagamento: uma, ao credor putativo e outra, ao credor verdadeiro, sendo cabível a restituição de valores a fim de se evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes.

Para o ministro, a situação do processo indica que a seguradora não adotou a cautela necessária para pagar o seguro à verdadeira beneficiária.

“Ao ter assumido a apólice coletiva, deveria ter buscado receber todas as informações acerca do grupo segurado, inclusive as restrições de alteração no rol de beneficiários, de conhecimento da estipulante. Diante da negligência, pagou mal a indenização securitária, visto que tinha condições de saber quem era o verdadeiro credor, não podendo se socorrer da eficácia do pagamento a credor putativo”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial.

Veja o acórdão.
Processo: REsp 2009507

TRF4: Justiça determina que INSS conte período de atividade especial e garante aposentadoria integral a trabalhador

Um morador de Carambeí (PR) conseguiu na justiça o reconhecimento de atividade especial, sendo convertida em atividade comum urbana, o que contribui para sua aposentadoria. A decisão é da juíza federal Melina Faucz Kletemberg, da 4ª Vara Federal de Ponta Grossa, que determinou que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) conceda o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, bem como o pagamento das prestações vencidas do benefício, acrescidas de correção monetária a partir do vencimento de cada prestação, e de juros de mora.

A parte autora requereu, administrativamente, a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição junto à agência do INSS no ano de 2022. Relatou que, se a autarquia tivesse reconhecido/averbado todo período devido, contaria com o tempo de contribuição suficiente para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

Ao decidir o caso, a magistrada destacou que, enquanto trabalhador rural – ele realizava atividade de pulverização com um trator acoplado a um pulverizador de arrasto – esteve vinculado à pessoa física, o que seria óbice ao enquadramento com base na lei.

“Ocorre que o Cadastro Nacional de Informações Sociais registra o recolhimento parcial de contribuições previdenciárias, enquanto trabalhador rural, somente a partir de 01/1990”, ponderou.

“Desse modo, não cabe aqui o argumento de que antes da Lei nº 8.213/91 o autor não era ainda considerado um segurado do Regime Geral da Previdência Social, porque apesar de ser trabalhador rural, foram recolhidas contribuições como segurado urbano, extraindo-se a condição de empresa agroindustrial ou agrocomercial”, complementou Melina Faucz Kletemberg.

“Em outras palavras, o fato de estar atrelado a um empregador pessoa física não é empecilho ao enquadramento para o período de 01/01/1990 a 12/12/1990, anterior à lei de 1991, com registro parcial do recolhimento de contribuições”.

Sobre a existência de recolhimentos para o enquadramento, a juíza da 4ª Vara Federal de Ponta Grossa, reiterou que antes da Constituição Federal, havia expressa distinção entre os trabalhadores urbanos e rurais para efeitos previdenciários, e não existia sequer a possibilidade de o trabalhador rural contribuir para um regime previdenciário. “A única exceção era quanto ao empregado de empresa agroindustrial ou agrocomercial que, embora prestando exclusivamente serviço de natureza rural, era considerado segurado da Previdência Social Urbana. E o autor não comprovou que atuou como trabalhador agropecuário”.

“Tem-se, portanto, como cabível o reconhecimento da especialidade, por enquadramento, no período de 01/01/1990 a 12/12/1990”, finalizou.

TRF4: Quantia resultante da venda de bem de família também não pode ser penhorada

“Os valores decorrentes da alienação de bem de família também são impenhoráveis, sendo abrangidos pela proteção conferida pela Lei 8.009/1990, especialmente, quando destinados à aquisição de um novo imóvel para residência do executado e de seu núcleo familiar”. O entendimento foi manifestado pelo do juiz Bruno Rodolfo de Oliveira Melo, da 7ª Unidade de Apoio em Execução Fiscal da Justiça Federal, ao dar ganho de causa a uma pessoa que teve bloqueada uma quantia referente à venda do imóvel onde morava. A sentença foi proferida em 4/4, em um processo de embargos a uma execução promovida pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).

“No presente caso, está provado que o imóvel (…) o único pertencente ao embargante, que efetivamente o utiliza para a residência de sua família, conforme fatura de energia elétrica, de modo que está presente a impenhorabilidade”, observou o juiz. “Ainda, a afirmação dos embargantes de que há a intenção de utilização dos valores para a aquisição de um novo imóvel, bem de família, [pelo executado], é verossímil, já que não possui outro imóvel de sua propriedade e, diante disso, necessita adquirir um novo lar”, concluiu Oliveira Melo. A família reside em Itá, Oeste de Santa Catarina.

O juiz afirmou que a Lei 8.009/1990 deve ser interpretada de acordo com a Constituição, que protege o direito à moradia e a função da propriedade dos núcleos familiares, considerados direitos fundamentais. “Tais são considerados como direitos humanos, já que previstos em diplomas internacionais, como o Pacto de San José da Costa e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (Pidesc)”.

Para Oliveira Melo, “existindo colisão entre o direito fundamental à moradia do executado e o direito à satisfação de crédito decorrente de multa administrativa do exequente, entendo que o primeiro deve prosperar, entendimento esse balizado pelos sistemas global e interamericano de direitos humanos”.

O juiz também não aceitou o argumento da ANTT de que a impossibilidade de penhora da quantia não teria sido informada no prazo determinado pela legislação. “A impenhorabilidade do bem de família e, por extensão, dos valores sub-rogados e decorrentes de sua alienação é matéria de ordem pública, sendo passível de invocação a qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição”, ressaltou. Cabe recurso.


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