TRF1: Legítima decisão que autorizou quebra do sigilo telemático das conversas privadas já armazenadas

Acusados da prática dos crimes de organização criminosa, descaminho, falsidade ideológica, lavagem e ocultação de bens e valores impetraram Habeas Corpus requerendo a declaração de nulidade das provas cautelares e elementos informativos da medida de afastamento do sigilo telemático, relacionados à sociedade empresarial, seus sócios proprietários, gerentes e funcionários, e, em razão da nulidade apontada, pedem o retirada das informações do inquérito, e ainda, determinando o trancamento da ação penal, por falta de justa causa para o prosseguimento da ação penal.

A parte impetrante sustenta que as provas cautelares teriam sido constituídas com excesso da medida de interceptação das comunicações telemáticas, violando, portanto, os princípios constitucionais do devido processo legal, da intimidade, da vida privada, da inviolabilidade do sigilo da correspondência, das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas.

Alegam também que as decisões judiciais que autorizaram as quebras do sigilo das comunicações telemáticas não permitiram acesso às conversas privadas já armazenadas nas contas dos e-mails dos investigados, havendo, portanto, evidente excesso na execução da medida de interceptação das comunicações telemáticas. Argumentam que a autorização teria autorizado a coleta de dados contados da decisão, sem autorização de acesso aos e-mails antigos, já armazenados.

O relator, desembargador federal Leão Alves, sustentou que a quebra de sigilo telemático tem por objetivo, exatamente, o acesso às conversas, áudios e demais elementos já armazenados, “porquanto que, depois da deflagração da operação policial, o investigado não utilizará o aparelho apreendido”.

Nesse contexto, assinalou o magistrado, o acesso ao conteúdo dos atos de comunicação pretéritos é inerente ao deferimento da quebra do sigilo telemático. Nesse contexto, sustentou o relator, é legítimo o acesso aos dados contidos nos celulares dos investigados, dada a existência de autorização judicial para perícia do seu conteúdo, de modo que não há falar em ilicitude das provas.

Como a autorização de acesso ao conteúdo dos atos de comunicação foi expressamente deferido pelo Juízo da 1ª Instância, o Colegiado denegou a ordem de Habeas Corpus, nos termos do voto do relator.

Processo: 1041156-14.2022.401.0000

STF anula decisões proferidas pela Lava Jato contra Marcelo Odebrecht

Acordo de colaboração segue válido. Ministro Dias Toffoli considerou que houve conluio entre magistrados e procuradores da República integrantes da operação, que adotaram medidas arbitrárias na condução dos processos contra o empresário.


O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou nesta terça-feira (21) todos os atos praticados pelo juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba contra Marcelo Bahia Odebrecht no âmbito da Operação Lava Jato.

O ministro determinou ainda o trancamento de todos os procedimentos penais instaurados contra o empresário, mas ressaltou que a anulação não engloba o acordo de delação premiada firmado por ele durante a operação.

Em sua decisão, Toffoli considerou que integrantes da Lava Jato, atuando em conluio, ignoraram o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa e a própria institucionalidade para garantir seus objetivos – pessoais e políticos -, o que não se pode admitir em um Estado Democrático de Direito.

“Diante do conteúdo dos frequentes diálogos entre magistrado e procurador especificamente sobre o requerente, bem como sobre as empresas que ele presidia, fica clara a mistura da função de acusação com a de julgar, corroendo-se as bases do processo penal democrático”, afirmou Toffoli.

Segundo o ministro, a prisão de Marcelo Odebrecht, a ameaça dirigida a seus familiares, a necessidade de desistência do direito de defesa como condição para obter a liberdade e a pressão retratada por seu advogado “estão fartamente demonstradas nos diálogos obtidos por meio da Operação Spoofing”, o que atesta que magistrado e procuradores de Curitiba desrespeitaram o devido processo legal, agiram com parcialidade e fora de sua esfera de competência.

Além disso, destacou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em recente relatório de correição realizada pelo Ministro Luís Felipe Salomão, na qualidade de corregedor-nacional de Justiça, revelou a gestão absolutamente caótica dos recursos oriundos da Operação Lava Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba.

A decisão atendeu a um pedido da defesa de Marcelo Odebrecht na Petição (PET 12357). Os advogados alegaram que o caso do empresário era semelhante a de outros réus da Lava Jato que tiveram seus processos anulados por irregularidades na condução das investigações, avaliadas na Reclamação (RCL 43007).

Veja a decisão.
Processo 12.357 DF

STJ: Mesmo sob investigação, advogado não pode violar sigilo profissional e fazer acordo de colaboração premiada

Por maioria, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que é inadmissível a prova proveniente de acordo de colaboração premiada firmado com violação do sigilo profissional de advogado. Com esse entendimento, o colegiado anulou a colaboração do advogado Sacha Reck, bem como as provas e as denúncias dela decorrentes, em ação penal contra a empresa de transportes coletivos Pérola do Oeste, para a qual o advogado trabalhava.

Segundo o processo, a empresa foi alvo de investigação do Ministério Público do Paraná (MPPR), instaurada com o objetivo de apurar a existência de associação criminosa formada para fraudar licitações de concessão do serviço público de transporte no estado.

O advogado Sacha Breckenfeld Reck, um dos investigados, acabou celebrando acordo com o MPPR, depois de ser denunciado e preso em 1º de julho de 2016. O acordo foi feito entre os dias 6 de julho e 8 de agosto de 2016 e deu suporte a novas investigações, bem como a um aditamento da denúncia em março de 2017. Foram adicionados à denúncia os nomes de dois ex-administradores da empresa, os quais recorreram ao STJ para anular a colaboração do advogado.

Para o relator do caso, ministro Sebastião Reis Junior, o advogado não poderia ter quebrado o seu sigilo profissional. “Esse ônus do advogado não pode ser superado mesmo quando investigado, sob pena de se colocar em fragilidade o amplo direito de defesa”, ponderou.

Delatados podem questionar legalidade do acordo de colaboração
O ministro explicou que, atualmente, o Supremo Tribunal Federal (STF) admite a possibilidade de terceiros, como os delatados, questionarem a validade do acordo de colaboração premiada. Para o ministro, ainda que haja precedentes em sentido contrário, não há razão para não permitir que os delatados questionem a legitimidade desse tipo de acordo.

“A partir do momento em que sua esfera jurídica foi afetada pelo teor da delação, é evidente a sua legitimidade para questionar esse acordo, que, de forma negativa, afeta direitos seus”, disse o ministro. Ele acrescentou que, uma vez constatada a ilegalidade do acordo, as provas decorrentes devem ser invalidadas.

Sigilo profissional não pode ser violado pelo advogado para atenuar a própria pena
Segundo o relator, a quebra do sigilo profissional do advogado para atenuar a sua própria pena, em processo no qual ele e o cliente figuram como investigados, não está autorizada pelo Código de Ética da Advocacia. Sebastião Reis Junior destacou que o artigo 25 admite essa possibilidade apenas em caso de grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado for afrontado pelo cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo – porém, sempre restrito ao interesse da causa.

A confissão de um crime, alertou o ministro, com a indicação das informações previstas no artigo 4º da Lei 1.2850/2013, não se inclui entre essas hipóteses. “Ao delatar, o advogado que oferece informações obtidas exclusivamente em razão de sua atuação profissional não está defendendo sua vida ou a de terceiros; nem sua honra (afinal, confessa não só um crime como a sua participação em organização criminosa); nem está agindo em razão de afronta do próprio cliente (ao contrário), nem em defesa própria (não está usando as informações sigilosas para se defender, para provar sua inocência em razão de acusação sofrida, mas sim para atenuar sua pena)”, afirmou.

O ministro lembrou decisão recente da Quinta Turma que, em caso semelhante, entendeu pela ilegalidade da conduta de um advogado que, mesmo sem ser alvo de investigação, delatou a empresa para a qual prestou serviços. Naquele julgamento, o relator, ministro João Otávio de Noronha, ressaltou que “o sigilo profissional do advogado é premissa fundamental para o exercício efetivo do direito de defesa e para a relação de confiança entre defensor técnico e cliente”.

Possibilidade de delatar quando o advogado também integra organização criminosa
O ministro Rogerio Schietti Cruz, que ficou vencido no julgamento, apresentou voto divergente em que afirmou que é necessário dividir a conduta do colaborador em dois momentos: o primeiro abrange o período entre sua contratação e os fatos descritos na acusação, no qual não há notícia de atuação antiética ou delituosa; e o segundo abrange o período descrito na denúncia, no qual teria havido sua incorporação à organização criminosa para dar aparência de legalidade aos procedimentos jurídicos entabulados na contratação.

“Nessa perspectiva, penso que a proteção do sigilo profissional não alcança o período descrito na denúncia, em que haveria a participação ativa do insurgente [o advogado] na suposta organização criminosa”, disse. Na sua avaliação, o sigilo de algumas profissões “não pode servir de escudo para acobertar a prática de crimes por profissionais que detenham esse dever, impedindo-os de confessar, delatar ou mesmo colaborar com o Estado para revelar o cenário criminoso de que não apenas tiveram conhecimento, mas também efetivamente participaram”.

Veja o voto do ministro Sebastião Reis Junior, relator, no RHC 179.805.
veja o voto divergente do ministro Rogerio Schietti Cruz.
Processo: RHC 179805

TJ/TO: Homem é multado em mais de R$ 14 mil e vai cumprir 2 anos de prisão por ameaça de divulgar fotos íntimas da ex

Denunciado em janeiro deste ano por perseguição virtual à ex-companheira, um morador de Tocantinópolis, de 40 anos, foi condenado a pagar mais de R$ 14,8 mil de multas por ter ameaçado a vítima de divulgar fotos e vídeos íntimos da mulher em redes sociais.

A sentença do juiz Alan Ide Ribeiro da Silva, da 2ª Vara de Augustinópolis/TO, publicada na segunda-feira (20/5), também condena o réu à prisão. A pena é de 2 anos e 3 meses de prisão e 405 dias-multa, pelo crime de perseguição, e mais 6 meses e 11 dias de detenção pelo crime de constrangimento ilegal.

A multa tem o valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo em vigor no ano de 2021, quando ocorreram os crimes. Para ilustrar o valor, um trigésimo de R$ 1.100 resulta em R$ 36,6 por dia. Multiplicados pelos 405 dias-multa resultam em R$ 14.850,00. O valor ainda será corrigido quando for executado, o que ocorre 10 dias após acabarem todos os recursos contra a condenação e devem ser pagos ao Fundo Penitenciário do Estado Tocantins (FUNPES).

Quando chegar a hora de executar a sentença, momento do início do cumprimento das penas, o regime de reclusão será aberto. Nesta modalidade, ele está livre para trabalhar durante o dia, mas permanece recolhido em instituição prisional no período noturno.

Crime de Stalking (perseguição)
O stalking, termo de origem inglesa, destaca o juiz, está previsto na Lei n.º 14.132, de 31 de março de 2021, que enquadra neste crime toda conduta de perseguir, de modo obsessivo, outra pessoa, com “a finalidade de causar transtorno à vítima, seja físico ou psicológico”.

Conforme destacado na sentença, a norma define que a ação criminosa deve ocorrer de forma reiterada e gerar ameaça à integridade física ou psicológica, com restrição de locomoção ou, de qualquer forma, invadir ou perturbar a liberdade ou a privacidade da vítima.

A pena prevista é de 6 meses a 2 anos, e multa e pode ser aumentada quando é cometida contra criança, adolescente ou idoso; contra mulher por razões da condição de sexo feminino e quando há participação de mais de duas pessoas ou uso de arma.

O caso julgado
Conforme o processo, os dois tiveram um relacionamento como casal por sete anos, mas após atos de violência, a mulher se separou e saiu de casa. Após investidas dele para retomar a relação, a vítima conseguiu medidas protetivas, que o proibiam de fazer qualquer contato com ela, mas foram descumpridas várias vezes.

Consta na ação, que ele invadiu todas as contas de mídias sociais e e-mail da vítima e também abriu diversas contas falsas em um dos aplicativos, na tentativa de “fazer amizade” com ela.

Por meio de contato por aplicativo de mensagens, ele enviou várias fotos e vídeos dos dois durante relações sexuais para ilustrar a ameaça de divulgar o acervo nas redes sociais, o que levou a vítima a entregar copias das mensagens à Polícia Civil. Na ocasião, ela revelou que jamais percebeu que as relações sexuais eram gravadas e não deu permissão para nenhuma imagem íntima.

O Judiciário determinou busca e apreensão do computador e celular do réu, cumprida pela Polícia Civil. Todo o material apreendido compõem as provas usadas na denúncia ministerial julgada pelo juiz Alan Ide Ribeiro.

“Restou demonstrado pelas declarações harmônicas da vítima em todas as fases em que foi ouvida, que o acusado, mediante mensagens via WhatsApp, a constrangeu, mediante grave ameaça, de postar fotos e vídeos íntimos dela nas redes sociais, caso não reatasse o relacionamento com ele, chegando até a enviar uma foto íntima dela na conversa para comprovar que ele tinha os arquivos salvos”, conclui o magistrado.

O juiz também afirma que o réu confessou aos investigadores o envio do material para vítima e das ameaças de divulgação. “Restou satisfatoriamente demonstrado nos autos que, com seus atos, o agente tinha a consciência e a efetiva vontade de constranger a vítima”.

STJ absolve homem condenado por estupros que ficou 12 anos preso injustamente

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão unânime, absolveu um homem que ficou preso por 12 anos, após ser condenado em vários casos de estupro. Segundo o colegiado, as condenações foram baseadas unicamente na palavra das vítimas, que o reconheceram por foto e pessoalmente, mas sem observar as regras legais do reconhecimento, e nas declarações de policiais sobre o envolvimento do acusado em outros crimes semelhantes.

Considerando essas circunstâncias, a turma julgadora anulou os reconhecimentos realizados em quatro dos 12 processos em que o réu foi condenado. Nos outros oito casos, as condenações já haviam sido revertidas após exames de DNA comprovarem que ele não era o autor dos crimes.

Leia também: Pesquisa no STJ mostra ainda resistências à jurisprudência sobre reconhecimento de pessoas
O homem foi condenado a mais de 170 anos de prisão, apontado como o autor de uma série de estupros cometidos em situações parecidas. Ele ficou conhecido como o “Maníaco da Castello Branco”.

Ao STJ, a defesa alegou que as quatro condenações restantes também se basearam somente nas palavras das vítimas e em reconhecimentos induzidos. Sustentou, ainda, que todas as condenações nasceram da falsa percepção de que o homem era o responsável por uma série de estupros nas cidades de Barueri e Osasco, na região metropolitana de São Paulo.

Reconhecimento pessoal não observou os procedimentos legais
O relator na Quinta Turma, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, observou que os procedimentos de reconhecimento, por foto ou pessoalmente, na fase policial ou judicial, sempre ignoraram a disciplina do artigo 226 do Código de Processo Penal (CPP).

O ministro destacou que, em um dos processos, o reconhecimento realizado possui os vários vícios desse tipo de procedimento, inclusive com a colocação do suspeito ao lado de um policial já conhecido da vítima e de outra pessoa que não tinha semelhança com ele.

Quanto às outras três condenações, o relator apontou que todas apresentam particularidades que revelam não apenas o descumprimento das normas do CPP, mas, principalmente, a falha da própria investigação, com verdadeira perda de uma chance probatória, em virtude da não produção de provas essenciais para a elucidação dos fatos.

Leia também: Quinta Turma aplica teoria da perda da chance e absolve menor acusado com base em testemunhos indiretos
Análise do material genético no banco de dados apontou para outra pessoa

O ministro também ressaltou que a análise do material genético no banco de dados revelou o perfil genético de outra pessoa, que possui diversas condenações por crimes semelhantes. “O Innocence Project Brasil, com ajuda do Ministério Público em Barueri, obteve cinco exames de DNA, todos elaborados pelo Instituto de Criminalística do Estado de São Paulo, os quais demonstram, sem sombras de dúvida, que o paciente não é o estuprador noticiado”, afirmou.

Dessa forma, para Reynaldo Soares da Fonseca, apesar da relevância que se dá à palavra da vítima em crimes sexuais, não é possível manter a condenação com fundamento em reconhecimentos viciados e desconstituídos por meio de prova pericial que não identificou o perfil genético do condenado nos materiais coletados das vítimas.

“Se as condenações foram servindo de confirmação umas às outras, tem-se que, da mesma forma, a identificação do perfil genético de pessoa diversa acaba por esvaziar a certeza dos reconhecimentos realizados pelas vítimas sem atenção à importante disciplina do artigo 226 do Código de Processo Penal”, concluiu.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

TRF1: Condenação definitiva por fato posterior não configura maus antecedentes

A 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) reformou parcialmente a sentença do Juízo da 12ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal (SJDF) que condenou um homem pela prática do crime de roubo, previsto no art. 157 do Código Penal, à pena de 4 anos e 6 meses de reclusão.

Consta nos autos que o réu, juntamente com um indivíduo não identificado, abordou um motorista de transporte de valores e, sob a mira de revólver, determinou que a vítima parasse em um local onde foram subtraídos 11 malotes com cheques e documentos das instituições financeiras Caixa Econômica Federal (Caixa), Banco do Brasil (BB) e bancos Bradesco e Itaú. Assim, a defesa do réu pede a absolvição alegando falta de provas, visto que ele não foi reconhecido pela vítima e não confessou o crime.

A relatora do caso, desembargadora federal Solange Salgado da Silva, ao analisar o processo, afirmou que, ao contrário do afirmado pelo réu, a vítima reconheceu o acusado na delegacia quando colocado juntamente com outros indivíduos com características semelhantes, apontando-lhe como a pessoa que teria efetuado o assalto.

Destacou a magistrada, ainda, que o resultado do laudo pericial papiloscópico foi positivo ao confrontar as impressões digitais do acusado com as encontradas no veículo.

Sustentou a desembargadora federal que a prova pericial está associada com as declarações feitas na delegacia e em juízo, o que é suficiente para demonstrar a existência do crime (materialidade) e a identificação do autor, sendo irrelevante que o acusado não tenha confessado o crime.

Mas por entender necessária a apreensão da arma de fogo, o que não ocorreu, bem como considerar insuficientes as provas em relação ao concurso de pessoas (crime praticado com outra pessoa) e o desconhecimento do acusado de estar praticando o crime contra transporte de valores, o juízo sentenciante afastou a incidência das causas especiais de aumento de pena, podendo ser acolhido o pedido da defesa para que não seja considerada a “valoração negativa dos antecedentes criminais para reduzir a pena-base para o mínimo legal”.

A relatora argumentou que “o entendimento das partes converge no sentido de que a condenação utilizada com fundamento para a valoração negativa dos antecedentes é oriunda de fato delitivo posterior (ocorrido em 2008) ao sub judice (datado de 19/05/2006)”. Assim, a magistrada votou no sentido de reduzir a pena, fixando-a em quatro anos de reclusão, a ser cumprida no regime inicial aberto, e de estabelecer o pagamento de 10 dias-multa.

O voto foi acompanhado pelo Colegiado.

Processo: 0003834-11.2012.4.01.3400

TJ/TO nega indulto natalino a ex-prefeito condenado por doar lote a instituto sem autorização legislativa

A 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça negou, por unanimidade, recurso a um ex-prefeito de Nova Olinda/TO e manteve a decisão que negou indulto natalino ao ex-gestor, condenado à prisão por apropriação de rendas públicas e pela doação de um terreno público a um instituto sem autorização legislativa.

Conta no processo que no ano de 2008 o então prefeito doou o terreno para um instituto sem processo legislativo ou licitatório, o que o levou a ser denunciado pelo Ministério Público do Tocantins (MPTO) e condenado por crime de responsabilidade, no ano de 2014.

A primeira condenação é de 5 anos de prisão pela prática de apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio, conforme prevê o artigo 1º, inciso I do Decreto-Lei 201, de 1967.

A segunda condenação é de 2 anos e 3 meses de detenção, pela prática do previsto inciso X, do mesmo decreto, que considera crime de responsabilidade alienar ou onerar bens imóveis, ou rendas municipais, sem autorização da Câmara Municipal, ou em desacordo com a lei.

Após ter as penas confirmadas nos tribunais superiores, o ex-prefeito pediu à 3ª Vara Criminal da Comarca de Araguaína o indulto natalino com base no Decreto Federal de nº 11302, editado em dezembro de 2022, que estipulava diversos tipos de beneficiados.

Conforme o processo, o juiz indeferiu o indulto sob o fundamento de que ainda não havia sido cumprida a pena do crime impeditivo (de cinco anos), o que motivou o recurso julgado pelos desembargadores na terça-feira (14/5).

Segundo o relator, desembargador Pedro Nelson de Miranda Coutinho, a soma das penas máximas impostas ao ex-prefeito supera os 5 anos previstos no decreto, o que inviabiliza o indulto.

Ao embasar a decisão, o desembargador cita o artigo 11 do decreto, no trecho que determina que as penas correspondentes a infrações diversas (concurso de crimes) serão unificadas ou somadas até 25 de dezembro de 2022.

Também ressalta o previsto no artigo 5º do mesmo decreto, que concede indulto natalino às pessoas condenadas por crime com pena privativa de liberdade máxima não superior a cinco anos. A regra ressalta que no cálculo para o indulto será considerada, individualmente, a pena privativa de liberdade máxima mesmo em hipótese de concurso de crimes.

A unanimidade da decisão da 4ª Turma Julgadora da 2ª Câmara Criminal contou com os votos das desembargadoras Angela Issa Haonat e Jacqueline Adorno de La Cruz Barbosa.

Indulto Natalino

Publicado tradicionalmente no fim do ano pela Presidência da República, o indulto natalino, ou indulto coletivo, extingue a pena ou permite a comutação (diminuição) de pena de condenados em casos específicos, como preso com doença grave impossível de ser tratada na prisão. O indulto natalino é diferente da saída temporária em datas comemorativas, a exemplo do natal, também conhecida como “saidão de natal”, que é autorizada pelo juiz para os presos do regime semiaberto em algumas ocasiões, inclusive o natal, desde que observadas algumas condições. A saída não pode passar de sete dias, por exemplo.

STJ: Governador do Acre vira réu em ação que apura fraude à licitação, desvio de recursos públicos e formação de organização criminosa

Por unanimidade, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) recebeu, nesta quarta-feira (15), a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) contra o governador do Acre, Gladson Cameli, pelos crimes de participação em organização criminosa, corrupção passiva, peculato, lavagem de dinheiro e fraude à licitação. O político é acusado de liderar um esquema que teria desviado mais de R$ 16 milhões em recursos públicos.

Apesar de receber a denúncia contra o governador, o colegiado entendeu não ser o caso de determinar o afastamento de Cameli do cargo, tendo em vista que os fatos investigados, de 2019, não são atuais o bastante para justificar a medida. Contudo, segundo a relatora da ação penal, ministra Nancy Andrighi, essa decisão não impede que a necessidade do afastamento seja reavaliada nos outros inquéritos que correm contra o governador no STJ.

As investigações tiveram origem na Operação Ptolomeu III. Segundo o MPF, a empresa Murano teria sido contratada pelo estado do Acre por meio de adesão a ata de registro de preços de Goiás. Os serviços previstos na ata diziam respeito a manutenção predial, porém o MPF afirma que a maior parte da execução contratual no Acre tinha relação com obras viárias.

Leia também:
Corte Especial desmembra denúncia sobre esquema criminoso no Acre e mantém competência do STJ para processar o governador

Relatora afasta sigilo de denúncia contra governador do Acre; prejuízo ao estado passaria de R$ 11 milhões

Ainda segundo o MPF, logo após a contratação, a Murano teria firmado contrato de parceria com outra empresa, de propriedade do irmão do governador, em uma espécie de contratação indireta da sociedade comandada por parente próximo a Cameli.

Governador teria atuado para liberar recursos para a empresa contratada sem licitação

A ministra Nancy Andrighi destacou que, conforme detalhado na denúncia, a organização criminosa supostamente liderada pelo governador teria sido formada a partir de vários núcleos (político, familiar, empresarial e operacional).

Em relação ao contrato entre o Acre e a empresa Murano, a ministra comentou que, além da dispensa indevida de licitação, a Controladoria-Geral da União (CGU) apontou indícios de que teria havido terceirização integral e subcontratação total do objeto do contrato, o que é vedado pela legislação.

A relatora também reforçou a existência de elementos que indicam que, na posição de governador, Gladson Cameli teria atuado para liberar recursos para a Murano e, dessa forma, obtido favorecimento pessoal, inclusive por meio da empresa subcontratada que era controlada pelo seu irmão.

Quanto aos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, Nancy Andrighi enfatizou que, de acordo com as provas reunidas nos autos até o momento, o pagamento da vantagem indevida ao governador teria sido viabilizado com a compra de um apartamento de luxo em São Paulo – avaliado em mais de R$ 5 milhões – e de um veículo.

Com o recebimento da denúncia, tem início a ação penal contra o governador. Não há prazo para o julgamento do mérito do processo pela Corte Especial.

Processo: Inq 1475

STJ: concede regime domiciliar para presa cuidar das filhas durante calamidade no RS

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, concedeu habeas corpus para assegurar a uma mulher em prisão preventiva a passagem para o regime domiciliar, de modo que possa cuidar de suas duas filhas pequenas durante o estado de calamidade pública enfrentado pelo Rio Grande do Sul.

Segundo o colegiado, em situações de desastres públicos, a flexibilização das prisões pode ser justificada por motivos humanitários ou por questões práticas e operacionais relativas à crise e aos órgãos responsáveis pelo gerenciamento das ações estatais. “Eventos como pandemias, catástrofes naturais ou emergências em larga escala exigem uma reavaliação das prioridades e capacidades do sistema prisional, que pode ser gravemente afetado nessas circunstâncias”, afirmou a relatora do recurso, ministra Daniela Teixeira.

Presa em flagrante sob a acusação de tráfico de drogas (artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006), a mulher teve seu pedido de habeas corpus negado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), o qual considerou que o fato de ela ser mãe de duas filhas menores de 12 anos não era motivo suficiente para a concessão do regime domiciliar, pois não haveria evidências claras de que a acusada detinha a guarda das crianças.

Ao STJ, a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul alegou que as filhas, uma delas com apenas cinco meses de vida, dependem inteiramente dos cuidados maternos. Sustentou também que a acusada é tecnicamente primária e que o delito imputado a ela não envolveu violência ou grave ameaça, estando presentes os pressupostos das diretrizes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a flexibilização das prisões provisórias no Rio Grande do Sul durante a situação de calamidade pública provocada pelas enchentes.

Aplicação de medidas alternativas pode aliviar a pressão sobre as prisões
A relatora observou que, do ponto de vista humanitário, a superlotação e as condições muitas vezes precárias das prisões podem se tornar ainda mais problemáticas durante uma calamidade como a enfrentada pelo Rio Grande do Sul. Para a ministra, as prisões podem se transformar em focos de propagação de doenças, representando um risco não apenas para os detentos, mas também para os funcionários e a comunidade em geral.

Daniela Teixeira comentou que a liberação temporária ou a aplicação de medidas alternativas, como a prisão domiciliar ou a liberdade condicional, podem ser necessárias para aliviar a pressão sobre as prisões e permitir que a administração prisional direcione recursos para proteger os detentos que não podem ser liberados devido à gravidade de seus crimes.

“Tais ações podem ser consideradas uma maneira de garantir a incolumidade e os direitos humanos das pessoas presas, garantindo que não sejam desproporcionalmente prejudicadas durante uma crise que requer medidas extraordinárias. É crucial que tais decisões sejam baseadas em avaliações minuciosas e personalizadas dos riscos envolvidos para cada detento, a fim de assegurar que a segurança pública permaneça como prioridade”, disse.

Orientações do CNJ contribuem para a preservação dos direitos das crianças
A ministra ressaltou que a adoção das diretrizes 8 e 9 do CNJ, nesse caso, contribui para a preservação dos direitos das crianças e evita a reiteração da suposta conduta criminosa. De acordo com Daniela Teixeira, a prisão domiciliar da mãe junto às suas filhas concilia a contenção do direito de ir e vir da acusada, o que a impede de eventualmente voltar a cometer delitos, e a convivência necessária com as crianças, centrada no papel de mãe em casa.

Seguindo o voto da relatora, a turma julgadora concedeu o habeas corpus, mas negou o pedido da Defensoria Pública para que a medida fosse estendida a todas as presas do estado que se encontrassem na mesma situação. “A extensão extraprocessual pretendida extrapola a competência da turma, uma vez que pleiteada em habeas corpus individual”, declarou a ministra.

Processo: RHC 191995

TJ/DFT: Distrito Federal é condenado a indenizar vítima de tortura policial

O Distrito Federal terá que indenizar uma vítima de atos de tortura praticados por policiais militares. O Juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública do DF observou que a ação dos agentes públicos causou lesões físicas e psicológicas ao autor.

Narra o autor que, após ser acusado de suposto envolvimento no sequestro da esposa de um militar, policiais militares foram até sua casa em julho de 2015. Conta que foi retirado a força do imóvel e que os agentes dispararam armas de eletrochoque em diversas partes do corpo. Relata que, além disso, foi agredido com murros nas pernas, no peito e na cabeça e ameaçado de morte. Informa que os agentes envolvidos foram condenados, em primeira instância, pelo crime de tortura na esfera criminal. O autor destaca que era menor de idade e que as torturas sofridas causaram traumas e prejuízos. Defende que o réu deve responder pelos atos praticados por seus agentes no exercício da função pública. Pede para ser indenizado pelos danos sofridos.

Em sua defesa, o Distrito Federal alega a ocorrência de prescrição, uma vez que os fatos ocorreram em 2015. Argumenta, ainda, que o valor pretendido a título de danos morais é exorbitante e que a indenização deve observar os princípios da proporcionalidade, exemplaridade e razoabilidade.

Ao analisar o caso, o magistrado destacou que as provas do processo demonstram que houve “a prática da tortura (ato ilícito) pelos policiais militares em face do autor”. O julgador lembrou que, além de o Distrito Federal não contestar os fatos narrados, o laudo do exame de corpo de delito e as provas do processo criminal mostram que houve ofensa à integridade e comprovam os fatos alegados pelo autor.

“Restou devidamente demonstrada, portanto, a prática de atos de tortura por policiais militares contra a parte autora, o que desencadeia a responsabilização do réu pelas agressões apontadas, na medida em que o primeiro elemento ensejador da responsabilidade civil, qual seja, o ato ilícito, está cabalmente demonstrado”, pontuou, destacando que também “está devidamente caracterizado o nexo de causalidade entre os atos ilícitos narrados e os danos experimentados pelo autor”.

No caso, segundo o Juiz, “a responsabilidade civil do Estado gera o dever de compensar os danos experimentados pelo autor”. “A situação narrada revela lesão direta à integridade física que repercute de modo severo na esfera jurídica extrapatrimonial do autor, sobretudo sua honra subjetiva. (…) As circunstâncias descritas evidenciam a ocorrência de tratamento cruel e indigno ao demandante, que foi submetido a retaliação pessoal e ilegítima”, destacou.

Dessa forma, o Distrito Federal foi condenado a pagar ao autor a quantia de R$ 100 mil a título de danos morais.

Alegação de prescrição
Quanto a alegação do DF de que houve prescrição, uma vez que os fatos ocorreram em 2015 e a ação cível foi proposta em 2024, o magistrado explicou que, “em caso de processo criminal com impacto cível, há suspensão do prazo prescricional para a propositura de ação indenizatória”. O magistrado explicou que cabe a vítima escolher por ingressar com ação cível de forma antecipada ou após o final do processo criminal.

“Desta forma, não há que se falar em prescrição na espécie, mesmo que a vítima tenha optado por ajuizar a ação reparatória antes do término da ação criminal. (…) No caso em comento, a vítima optou por ingressar com a demanda após a apuração dos fatos e a condenação na primeira instância criminal, que reconheceu a tortura praticada contra a mesma”, disse.

Cabe recurso da sentença.

Processo: 0700731-89.2024.8.07.0018


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento
Init code Huggy.chat